E
o Círculo das Lojas de Carácter e Tradição de Lxª ?
Sim, C.M.L., Paulo Ferrero , Fórum Cidadania, agora é que é mostrar o que se vale na verdadeira acção e
nos resultados efectivos.
OVOODOCORVO
Goodbye
Casa Alves? Mais uma loja tradicional de Lisboa em risco de fechar
João Pedro Pincha /
26/11/2015, OBSERVADOR
Mercearia
que existe no bairro da Sé desde tempos longínquos e está nas mãos
da mesma família há quase 60 anos recebeu ordem de despejo para os
próximos meses.
Tarde atípica no
bairro lisboeta da Sé. Está um calor estranho para uma quinta-feira
do final de novembro, há muitos tuk-tuks sem turistas parados junto
à catedral e as ruas estão praticamente desertas. Na Casa Alves, o
rádio passa Shakira. O número 112 da Rua São João da Praça é há
muitos anos uma das mais typical mercearias de Lisboa, mas está em
risco de desaparecer. A meio de novembro, o dono da Casa Alves foi
notificado de que tem de se ir embora no prazo de seis meses.
A história que José
Luís Alves tem para contar é igual a tantas outras que se encontram
por Lisboa. O prédio de azulejos azuis e verdes onde funciona a
mercearia era pertença de duas “senhoras de muita idade”. Com a
morte delas, os herdeiros venderam o imóvel e o novo proprietário,
uma empresa de investimentos imobiliários, quer fazer obras.
Atualmente, a Casa Alves é a única ocupante do prédio, que está
devoluto do rés-do-chão para cima. Quando as obras estiverem
feitas, a localização privilegiada é um dos atrativos para a
instalação de um hotel ou de apartamentos para turismo.
Enquanto o futuro
não chega, José Luís Alves, filho do fundador da casa, fala do
passado. Os pais nasceram em Melgaço e mudaram-se para as ruas
estreitas da Sé na década de 1950. “Isto já era uma mercearia”,
de um tal sr. Leitão, que só deixou o espaço quando já tinha uns
80 e muitos anos. Foi em 1957 — há 58 anos, portanto. O pai de
José Luís ficou com a casa, ele serviu de moço de recados por lá
e, anos mais tarde, quando a vida deu as voltas normais, acabou por
lá ficar definitivamente. “Quando vim para aqui fiz obras e quis
manter a mesma traça”, diz o Alves atual, explicando que parte das
prateleiras em madeira de cor creme são acrescentos posteriores à
fundação da casa.
Antigamente, na zona
onde hoje estão os cestos de fruta, havia um balcão em mármore e a
mercearia tinha cerca de metade do tamanho atual. José Luís
esticou-a para a área onde existia o armazém, mas não quis
desfazer-se dos armários em madeira, dos cartazes a promover o vinho
da casa, o café moído na hora e os géneros “de primeira
qualidade”. Tudo isso ainda lá está e, se a Casa Alves fechar
mesmo, lá não fica. “Se é para destruir, levo tudo”, diz José
Luís, para quem “o maior problema é estragarem isto”, não
respeitarem “o essencial das coisas antigas”.
Porque é que eu
guardo o sacana do moinho de café e a medida antiga de azeite?
Porque acho que tenho de preservar isto”
Um candeeiro a
petróleo, cestos, medidas de cereais, o “sacana” do moinho e a
medida de azeite adornam a montra
Na carta que recebeu
a anunciar que tem de se ir embora, os novos senhorios “nem falam”
do pagamento de uma indemnização, diz José Luís, que entrou em
contacto com um advogado e com a União de Associações de Comércio
e Serviços de Lisboa (UACS) para tentar travar o fim da loja. O
Observador tentou contactar o novo proprietário do imóvel, a
empresa Átrio das Glicínias, mas nem sequer conseguiu obter um
número de telefone.
Foi a presidente da
UACS que chamou a atenção para o caso da Casa Alves e o de outras
lojas históricas em risco na reunião pública da Câmara Municipal
de Lisboa esta quarta-feira. Prevendo que o prédio venha a ter um
fim turístico, Carla Salsinha apelou à autarquia para que proteja o
comércio típico e as lojas com tradição da cidade, refreando “a
euforia de hotéis” em Lisboa. A câmara lançou em setembro o
programa “Lojas com História”, uma iniciativa da ex-vereadora da
Economia, Graça Fonseca (agora secretária de Estado da Modernização
Administrativa), que pode ajudar à preservação do património de
centenas de espaços comerciais.
Se ainda há
salvação para a Casa Alves parece que só o tempo dirá. José
Luís, que há trinta anos tem “uma vida escrava” à custa da
mercearia, quer reformar-se. “Um gajo levanta-se às seis da manhã
e deita-se às dez da noite. Praticamente não tem sábado e ao
domingo é para dormir.” Isso não quer dizer que não queira
defender a casa que a família criou e manteve durante anos. “Eu
vou resistir o mais que possa. Doa a quem doer. Vai doer-me a mim, se
calhar…”
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