segunda-feira, 26 de novembro de 2018

Moradores de Belém queixam-se de agressões, vandalismo e consumo de droga por adolescentes à porta de casa



Mais um caso de apatia das Autoridades e de ausência de policiamento e presença interessada da CML … Este a juntar à zona do jardim do Adamastor …
OVOODOCORVO

Moradores de Belém queixam-se de agressões, vandalismo e consumo de droga por adolescentes à porta de casa

Sofia Cristino
Texto
26 Novembro, 2018

Residentes na Rua Alexandre de Sá Pinto, onde funcionam várias escolas, queixam-se de, todas as semanas, serem vítimas de bullying e agredidos por estudantes da Escola Secundária Marquês de Pombal. É comum ver os jovens sentados no capô dos carros, parados no meio da rua, impedindo a circulação normal do trânsito, a queimarem estores das habitações com isqueiros, a riscarem viaturas ou a grafitarem paredes. Os residentes sentem-se inseguros e dizem que o estabelecimento de ensino não tem condições para receber estes alunos “fora do sistema de ensino e com percursos pautados por delinquência”. O ambiente piorou, no último ano, e depois de um morador ter sido agredido à porta de casa, os habitantes, desesperados, decidiram fazer um abaixo-assinado. Exigem que a escola tome medidas urgentes e que tenha uma atitude mais pedagógica com os estudantes.

No 19 de Outubro, Rosa Gonçalves, 85 anos, estava à porta do café de que é proprietária e de onde observa o movimento da Rua Alexandre de Sá Pinto, em Belém, quando aconteceu o que nunca pensou ver na zona onde trabalha há mais de 65 anos. “Estavam muitos miúdos à volta do meu genro, achei estranho. De repente, só o vejo a descer a rua com um olho ensanguentado. Tinha levado um pontapé na cabeça”, relata. Augusto, 60 anos, preparava-se para abrir a porta de casa quando o grupo de estudantes o abordou. “Barraram-me e disseram-me que não podia entrar. Até fui cordial com eles, disse-lhes que morava aqui e era a minha casa, mas não gostaram da resposta e bateram-me, podia ter ficado cego”, recorda o agredido a O Corvo.

O morador diz ter sido atacado por jovens com idades entre os 16 e os 18 anos, a frequentarem os Cursos de Educação e Formação (CEF), na Escola Secundária Marquês de Pombal. Já passou um mês, mas ainda são visíveis as cicatrizes dos pontos que levou no olho direito. “Eles são praticamente homens, são mais velhos, porque para esta escola vêm todos os repetentes das outras escolas da cidade. Não acho que seja uma boa política juntá-los todos, temos medo de viver aqui”, critica o morador na zona há mais de três décadas. Quando estava na esquadra de polícia, a apresentar queixa, os elementos da força de segurança garantiram-lhe que haviam recebido mais chamadas de desacatos na zona. “Se houvesse um jardim, por exemplo, não se espalhavam pela rua. Nas escolas dizem que o que se passa fora da escola não é com eles. Fecham-se em copas, não querem saber”, acusa.

O marido de Rosa Gonçalves, que não quis ser identificado, também já foi surpreendido por um grupo de jovens sentados nas escadas junto ao átrio de entrada, no momento em que ali chegava. “Estavam a fumar droga e a queimar papéis. O mais preocupante é como entraram, queimaram a maçaneta da porta, de plástico. Quando olhei, estava tudo a arder”, conta. No arruamento, onde há várias escolas a funcionar em dois edifícios contíguos, estes casos não são isolados. No início deste ano lectivo, vários moradores queixam-se da conduta dos alunos e dizem sentir a sua segurança comprometida. É frequente ver os estudantes, durante o dia, sentados no capô dos carros, parados no meio da rua – com dois sentidos – impedindo a circulação normal do trânsito, a queimarem estores das habitações com isqueiros, a riscarem viaturas ou a grafitarem as paredes.

 “Param no meio da rua, propositadamente, para provocarem os condutores”, conta Maria Teresa, 68 anos. A habitante também está assustada com o comportamento dos adolescentes maioritariamente frequentadores da Escola Secundária Marquês de Pombal – onde, neste ano lectivo, estudarão cerca de 1300 alunos, sete centenas dos quais serão provenientes da Escola Artística de Música do Conservatório Nacional. “Uma vez, caí ao chão e estavam a passar umas jovens que, para minha surpresa, não me ajudaram. Riram-se de mim. Ainda temos de ser meiguinhos com eles, porque, se levantamos a voz, são agressivos”, diz. Recentemente, partiram-lhes as janelas de casa e já teve de reforçar a fechadura.



Os actos de vandalismo, dizem, podem até não acontecer todos os dias, mas há muito tempo que acordam diariamente com ruído. “Sentam-se às 8h00 da manhã, à porta de nossas casas, a beber e a fumar drogas, com colunas de som portáteis. É o novo despertador da vizinhança”, conta uma moradora, que não quis ser identificada por medo de represálias, a viver ali há cinco anos. Mais do que uma vez, a habitante estava a voltar para casa e, assim que abriu a porta, entraram-lhe pelo rés-do-chão a dentro.

 “Tive de gritar com eles para saírem e ainda se riram. Isto é surreal. Um dia, estavam a fazer imenso barulho e pedi-lhes, já com um ar mais chateado, para pararem. Arrependi-me logo porque, durante algumas semanas, baterem-me à porta dias seguidos e queimaram-me os estores”, conta. A moradora diz ainda ter sofrido agressões verbais, durante várias semanas, e até de a terem apalpado. Outra das queixas é a quantidade de lixo deixada pelos jovens a frequentarem aquela parte do bairro. “Limpo a rua por vergonha alheia”, desabafa.

Maria Pereira, 95 anos, há 77 anos a viver naquela artéria da cidade, diz que a zona nunca foi tão problemática. “Piorou muito, fazem barulho, partem tudo, dão pontapés com força nos pneus e, se ralho com eles, ainda me dizem ‘ó velha, cala a boca!’”, conta. Nas ruas transversais à Rua Alexandre de Sá Pinto, os moradores dizem não sentir tantos desacatos, mas não há semana que não vejam a polícia a rondar a zona. “A polícia é chamada mais ocasiões do que seria suposto e, várias vezes, chega a polícia de intervenção de duas esquadras, de Belém e do Calvário. A zona precisava de mais policiamento e mais rondas, passar um carro não é suficiente”, diz Hermínia Pina, 48 anos.

 Os moradores garantem que, mais do que uma vez, tentaram falar com a direcção da Escola Marquês de Pombal, mas esta terá descartado responsabilidades. “Não nos sentimos ouvidos por ninguém. Os contactos com a escola são sempre muito tensos, dão-nos sempre a mesma resposta, que não é da competência deles, mas da Junta de Freguesia”, conta Elisabete Fanado. Por sua vez, a Junta de Freguesia de Belém diz que a responsabilidade é da Polícia de Segurança Pública (PSP).

 Elisabete Fanado, moradora e autora da petição, que conta agora com quarenta e três assinaturas, já enviou cartas ao Ministério da Administração Interna, ao Ministério da Educação, à Direcção-Geral dos Estabelecimentos Escolares (DGEST), e à Câmara Municipal de Lisboa (CML). Segundo a habitante, apenas a CML e a DGEST responderam. O município terá reencaminhado as questões para a Polícia Municipal de Lisboa (PML) e a DGEST encaminhou uma resposta do director da Escola Marquês de Pombal, que, segundo a moradora, não apresentou soluções.

 “Andamos aqui numa espécie de jogo de pingue-pongue e estamos saturados. As entidades demitem-se por completo das suas funções. Estamos numa zona nobre da cidade, a poucos metros do Palácio de Belém, e somos completamente desprezados”, critica Elisabete Fanado. A moradora, que também foi aluna da escola há vinte anos, diz que o ambiente da zona tem vindo a degradar-se, nos últimos sete anos, e que os próprios funcionários da escola têm medo de repreender os alunos. “Fumam e bebem nas barbas da escola, toda a gente os vê a consumirem drogas, e ninguém diz nada. Em 2015, quando tive a minha primeira filha, chamava muitas vezes a polícia e, depois, sofria agressões verbais durante meses”, conta.

 O estabelecimento de ensino, segundo os moradores, terá muitos alunos sinalizados e com pulseiras electrónicas, de várias partes de Lisboa. “A escola não serve Belém, ninguém na freguesia frequenta a escola. Os miúdos vão todos para a escola secundária do Restelo ou para a Rainha Dona Amélia, também por estes problemas, estes jovens estão numa situação de fim de linha”, afirma Elisabete.

 Os habitantes reuniram, no início deste mês de Novembro, com a PSP, e aguardam agora uma resposta aos pedidos. No abaixo-assinado, ainda a circular pela freguesia, os moradores pedem o encerramento dos Cursos de Formação e Educação (CEF) de forma a garantir a segurança de todos. Outra das sugestões é a criação de espaços de lazer, com mesas, bancos e cadeiras, para os alunos não permanecerem em cima dos carros. Os habitantes sugerem ainda que a escola leve a cabo acções de sensibilização a nível das drogas.

 De acordo com a resposta da escola aos moradores, a que O Corvo teve acesso, o dirigente do estabelecimento de ensino diz que “as situações de violência referidas não podem ser relacionadas exclusivamente com alunos da Escola Secundária Marquês de Pombal, na medida em que os grupos de jovens que frequentam a Rua Alexandre Sá Pinto pertencem a várias instituições de ensino”. Os moradores dizem, por sua vez, que observam os alunos que fazem os desacatos a entrarem para este equipamento escolar.

 A escola diz ainda não ter autoridade sobre os locais de permanência no exterior da escola de alunos maiores de idade, “os quais possuem direitos e deveres, como qualquer outro cidadão”. “A existência de comportamentos incorrectos no espaço exterior à escola ultrapassa as nossas competências, sendo um caso de polícia. Temos uma excelente relação institucional com a PSP, a qual conhece bem a situação”, lê-se ainda.

 Os “jovens e adultos, que estão integrados nos cursos CEF, mas passam o tempo fora da escola”, lê-se, são cidadãos “com direitos e deveres iguais a todos os outros, não possuindo a ESMP autoridade sobre a sua vivência fora do espaço escolar”. As condições de acesso à frequência dos citados cursos CEF, nomeadamente absentismo, retenções repetidas e abandono, “não são responsabilidade da ESMP, a qual apenas segue o que está legalmente disposto”, conclui na referida resposta.

 O presidente da Junta de Freguesia de Belém, Fernando Rosa (PSD), admite já ter recebido queixas dos moradores, mas desvaloriza o problema. “Os alunos falam alto, atiram coisas para o chão, sentam-se às portas e as pessoas não conseguem passar. É chato, mas são coisas normalíssimas de miúdos, nada de especial. Estamos num estado de direito e não podemos evitar que as pessoas estejam sentadas na via pública”, diz o autarca.

Fernando Rosa avança ainda que estes estudantes danificam, frequentemente, o parque infantil da Avenida da Índia, mas também desconsidera o acto de vandalismo. “É aborrecido termos de gastar dinheiro a compor”, diz. Quando confrontado com os casos de bullying e de violência que os moradores dizem sofrer, o presidente da Junta de Freguesia de Belém diz desconhecer estas situações e não serem da sua competência. “Não estou a ver alunos daquela idade a fazerem isso, mas é um caso de polícia. Se é assim tão grave o que está a acontecer, espero que não se limitem a mandar as queixas só para a Junta de Freguesia e enviem também para a polícia”, diz.

 O autarca garante que a polícia passa várias vezes naquela zona para dissuadir algumas situações e que a Junta de Freguesia ofereceu uma viatura e duas bicicletas a esta força de segurança para melhor fazer o patrulhamento. “Não podemos substituir-nos à polícia, estamos atentos”, conclui.

 O Corvo contactou telefonicamente a Escola Secundária Marquês de Pombal, mais do que uma vez, mas o director do agrupamento, Jaime Carlos, não estava disponível para esclarecimentos. Enviou, posteriormente, questões à direcção, mas até ao momento da publicação deste artigo não obteve resposta.

Sem comentários: