Merkel
ganha mais tempo de portas abertas com regras de asilo mais duras
FÉLIX RIBEIRO
29/01/2016 - PÚBLICO
Disputas
no interior da coligação governamental tornam-se mais evidentes à
medida que se aproximam as eleições regionais. Chanceler vai
reavaliar política depois de cimeira europeia.
No final de uma
semana em que os três países escandinavos endureceram o tom e
políticas de acolhimento a refugiados, a Alemanha anunciou na noite
de quinta-feira um plano para tornar o seu próprio sistema de asilo
mais severo. Berlim vai reduzir o apoio financeiro do Estado aos
candidatos e começar a exigir uma espera de dois anos antes de
permitir a reunião de familiares. As deportações serão
facilitadas para criminosos e aceleradas em pedidos falhados de
asilo.
Mas ao contrário
dos seus vizinhos na Suécia, Angela Merkel diz encarar as novas
regras não como uma derrota da sua política de portas abertas, mas
como um balão de oxigénio. “Sinto-me fortificada”, disse a
chanceler alemã na conferência de imprensa que se seguiu ao
encontro entre os três partidos da coligação governamental.
"Estamos a conseguir que muito seja feito.”
É pouco provável
que as novas leis de asilo reduzam imediatamente o número de
refugiados na Alemanha, que só em 2015 recebeu 1,1 milhões de
pessoas, muito mais do que qualquer outro país europeu. O que a
reforma anunciada quinta-feira faz para já é aliviar alguma da
pressão vinda do seu partido, os democratas-cristãos da CDU, e da
formação irmã da Baviera, o CSU. Entre os dois, perto de cem
deputados discordam da escala de acolhimento defendida por Merkel,
segundo as contas do Financial Times.
As tensões
partidárias são cada vez mais evidentes à medida que se aproximam
as eleições de Março em três estados. Este mês, um grupo de 40
deputados dos dois partidos irmãos defendeu numa carta a Merkel a
imposição de controlos de fronteira e a imposição severa das
regras de Dublin, o que faria com que fosse possível impedir a
entrada a quase todos os requerentes de asilo que hoje chegam à
Alemanha.
Os
cristãos-democratas temem que as eleições regionais se tornem um
plebiscito às políticas de acolhimento da chanceler e que mesmo na
Baviera – onde a CSU governa há décadas de forma quase
indisputada – os eleitores escolham votar no partido antimigração
e extrema-direita, o Alternativa para a Alemanha, a quem as últimas
sondagens dão 11% dos votos a nível nacional – nas eleições de
2013 ficou aquém dos 5% necessários para entrar no Bundestag.
Angela Merkel já
prometera "reduzir visivelmente" o número de chegadas e
fazer um balanço sobre as políticas de asilo em meados de
Fevereiro, depois da próxima cimeira europeia. A chanceler ainda
terá por essa altura margem de manobra antes das eleições e de uma
renovada vaga de refugiados que espera para a Primavera para viajar.
Até lá, segundo escreve o Financial Times, Merkel tentará
fortalecer a resposta europeia, até agora incipiente.
Já está em
movimento para o fazer. Passadas semanas de desacordo, a chanceler
conseguiu esta sexta-feira que o primeiro-ministro italiano aceitasse
o envio de 3000 milhões de euros em ajuda humanitária para a
Turquia a troco de Ancara controlar melhor as suas fronteiras. Da
visita a Berlim, Matteo Renzi recebeu elogios e mais flexibilidade
nas suas finanças, segundo escreve a versão europeia da revista
Politico.
Violência em duas
frentes
A pressão sobre a
chanceler sente-se diariamente, alimentada pela recente vaga de
ataques sexuais contra mulheres em Colónia, cometidos sobretudo por
homens imigrantes e requerentes de asilo vindos do Norte de África.
Nesta sexta-feira, por exemplo, a revista Focus publicou uma sondagem
em que anuncia que 40% dos alemães acreditam que Angela Merkel se
deve demitir pela sua política de asilo.
Apesar disto – a
sondagem entrevistou pouco mais de 2000 pessoas –, as últimas
sondagens dão o bloco cristão-democrata e os sociais-democratas do
SPD, terceiro membro da coligação, no mesmo patamar dos últimos
meses, embora um pouco abaixo dos resultados das últimas eleições.
A coligação
prepara-se para absorver parte dos receios sobre novos ataques ao
retirar Tunísia, Marrocos e Argélia da lista dos países de risco,
o que torna muito mais difícil a cidadãos destes países
conseguirem asilo na Alemanha. Mas a medida pode não ser muito
eficaz: a Der Spiegel publica esta semana uma reportagem em que
documenta as grandes dificuldades que existem em deportar milhares de
cidadãos para estes três países por falta de cooperação entre
governos.
A revista descreve
para além disso a falta de condições na polícia alemã para
responder ao aumento da violência cometida por e contra imigrantes e
requerentes de asilo. O ministro alemão da Justiça anunciou esta
sexta-feira que só no último ano se registaram 1005 ataques contra
centros de acolhimento, cinco vezes mais do que em 2014. De acordo
com Heiko Maas, quase todos – 90% – são cometidos por activistas
de extrema-direita. Na madrugada desta sexta-feira os seguranças num
centro em Villingen-Schwenningen encontraram uma granada no interior
do edifício que, “por pura sorte”, não explodiu.
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