PAN
Pareceres jurídicos apoiam proposta do PAN sobre ligação à maçonaria ou Opus Dei
Constitucionalista Jorge Miranda considera que a criação de um registo facultativo da filiação ou ligação a organizações “discretas” não viola a Constituição. Outros pareceres vão mais longe e defendem que a declaração seja obrigatória.
Liliana Borges
Liliana Borges 11 de Fevereiro de 2020, 6:33
Devem ou não os políticos e titulares de cargos públicos dizer se pertencem a organizações como a maçonaria e a Opus Dei? O debate foi lançado através de uma proposta do PAN entregue à Assembleia da República e na qual o partido defende a criação de um registo facultativo da filiação ou ligação a “organizações de carácter discreto”. As reacções à proposta começaram a chegar a São Bento nos últimos dias. E se há quem concorde com a proposta do PAN, há quem vá mais longe e defenda a obrigatoriedade deste mecanismo de transparência de forma a evitarem suspeições e se assegurar uma maior eficácia.
Uma das vozes ao lado da proposta do PAN é a de Jorge Miranda, professor de Direito Constitucional e antigo deputado constituinte. Num parecer entregue na Assembleia da República, ao cuidado da comissão de transparência e estatuto dos deputados, o constitucionalista defende que o princípio de transparência deve dominar numa “democracia pluralista e aberta”.
Apesar de reconhecer que a Constituição não proíbe associações ou organizações “discretas” ou secretas, Jorge Miranda considera que estas organizações "dificilmente se coadunam com princípios do Estado de Direito democrático”.
Para Jorge Miranda, a proposta do PAN não é inconstitucional e trata apenas um “princípio geral de transparência que deve dominar a vida política”. “Trata-se de uma exigência de ética republicana”, conclui no seu parecer.
Tal como Jorge Miranda, também a Associação Nacional de Juízes Portugueses, o professor universitário e politólogo do Instituto de Ciências Sociais, Luís de Sousa, e o advogado José Miguel Júdice enviaram os seus pareceres ao Parlamento. E se todos eles aprovam a proposta do PAN, igualmente todos sugerem a obrigatoriedade da medida em lugar do carácter facultativo proposto pelo partido de André Silva.
Apesar da filiação de juízes não ser proibida, a Associação Nacional de Juízes Portugueses considera que “suscita problemas de natureza ética que não se esgotam no plano das incompatibilidades processuais”. A associação recorda ainda que a discussão não é recente e já em 2009 houve uma “profunda e participada reflexão interna e externa” na qual se concluiu que, “ainda que legal” a pertença dos juízes a organizações desta natureza é “eticamente reprovável”. Por isso, a associação de juízes não só dá luz verde à proposta do PAN como considera que “deve ser obrigatória e não facultativa”.
O politólogo Luís de Sousa considera que o carácter facultativo “é um convite à indiferença do declarante" e antecipa uma total opacidade, susceptível de gerar dúvidas sobre a isenção ou integridade da conduta. O politólogo afirma ainda que existem motivos suficientes em Portugal para defender este escrutínio, lembrando os vários escândalos de corrupção e tráfico de influências e sugere a extensão desta obrigação declarativa a outras associações e fundações.
Também José Miguel Júdice acredita que sem a obrigatoriedade da declaração é impossível assegurar a transparência.
O que diz o PAN
A proposta entregue pelo PAN em Dezembro do último ano estabelece que a declaração de rendimentos, património, interesses, incompatibilidades e impedimentos que os titulares de cargos políticos e altos cargos públicos têm que entregar no início e final do mandato (e sempre que houver grandes alterações) passe a incluir um “campo de preenchimento facultativo” em que a pessoa declara se é ou não filiada ou tem alguma “ligação a associações ou organizações de carácter discreto”, assim como a sua natureza. Caso seja aprovada, a proposta irá abranger deputados, membros do Governo, administradores de empresas públicas e de entidades reguladoras.
Na sua proposta, o PAN considera inconcebível que, “num contexto em que o escrutínio dos cidadãos é cada vez mais exigente”, os políticos e titulares de cargos públicos “sob quem impendem deveres especiais de transparência, continuem a não ter incentivos autónomos para declarar a sua filiação em organizações que têm regras de funcionamento marcadas por uma forte opacidade, por um grande secretismo e que apelam a fortes laços de hierarquia e solidariedade entre os seus membros”.
À data, o PS afirmou que no actual modelo os políticos já são obrigados a declarar se pertencem aos cargos dirigentes de qualquer organização, sendo facultativo no caso de serem membros.
Os pareceres, que por estes dias têm chegado à Assembleia da República, podem dar força ao desafio então colocado pelos socialistas ao PAN: o de apresentação de um projecto de lei que estipule a obrigatoriedade da declaração da filiação a estas associações.
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