Duplicam casos de mutilação genital feminina na Grande Lisboa em 2019
129 casos de mutilação genital feminina foram identificados no ano passado, o dobro em reação a 2018
DN/Lusa
06 Fevereiro 2020 — 21:28
Os profissionais de saúde da região de Lisboa registaram 129 casos de mutilação genital feminina em 2019, o dobro em relação a 2018, quando foram conhecidos 64 casos, revelou esta quinta-feira o secretário de Estado da Saúde, António Sales.
Os números fazem parte do primeiro balanço do projeto "Práticas Saudáveis -- Fim à Mutilação Genital Feminina", apresentado esta quinta-feira, em Lisboa, no mesmo dia em que se assinala o Dia Internacional da Tolerância Zero a esta prática.
Para o secretário de Estado da Saúde o aumento do número de casos registados reflete o sucesso do projeto que visa capacitar profissionais de saúde para o diagnóstico destas situações.
Em 2019, foram formados para esta área 1176 profissionais da saúde e da educação no âmbito do projeto "Práticas Saudáveis", desenvolvido em cinco agrupamentos de centros de saúde na Área Metropolitana de Lisboa, nas zonas com maior população em risco (Almada-Seixal, Amadora, Arco Ribeirinho, Loures-Odivelas e Sintra).
Em declarações à agência Lusa, a secretária de Estado para a Cidadania e Igualdade, Rosa Monteiro, que esteve também presente na apresentação, referiu que as 68 ações de formação realizadas mostraram que os profissionais não conseguiam, muitas vezes, diagnosticar casos de mutilação. "Houve um maior número de registos na plataforma de dados de saúde, significa que há mais identificação e sinalização dos casos, e isso reflete uma maior capacitação dos profissionais de saúde para identificarem aquilo que são as consequências de uma mutilação", considerou Rosa Monteiro.
O objetivo, segundo António Sales, é alargar o projeto a mais áreas e já em 2020 vão ser incluídos mais cinco agrupamentos de centros de saúde: Cascais, Estuário do Tejo, Lisboa Central, Lisboa Ocidental e Oeiras, e Lisboa Norte.
Além dos profissionais de saúde, este projeto tem-se ocupado com a formação noutros setores, incluindo professores e educadores para a prevenção deste crime.
Segundo a secretária de Estado da Cidadania e Igualdade, estes profissionais são essenciais na deteção precoce de situações de risco e António Sales acrescentou que a escola é o "espaço por excelência" da promoção e consciencialização para estes temas.
O projeto foi lançado em 2018 e é coordenado em parceria pela Comissão para a Cidadania e a Igualdade de Género, a Administração Regional de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo e o Alto Comissariado para as Migrações.
Portugal regista 237 meninas sujeitas a mutilação genital
As unidades de saúde portuguesas indicam 237 casos de Mutilação Genital Feminina (MGF) desde 2014. São mulheres, mas tinham menos de 7 anos quando foram mutiladas, a maioria na Guiné-Bissau.
Céu Neves
24 Setembro 2018 — 20:29
Os casos de mutilação genital feminina foram descobertos nas comunidades imigrantes entre abril de 2014 e janeiro de 2018 em mulheres que dizem ter sido sujeitas a esta prática nos países de origem da família. Os registos pertencem a unidades da Região de Saúde de Lisboa e Vale do Tejo (LVT).
As mulheres têm atualmente 31 anos em média, num intervalo que varia entre os 14 e 64 anos.
Em 61 casos (25,7%) desconhece-se com que idades sofreram a mutilação genital e, em 163 situações (68,8%), a idade média foram 6,6 anos. Em 7,2 % das mutilações, as crianças tinham meses e em 80 % menos de 9 anos.
"O facto de todos os registos terem sido feitos por profissionais de unidades de saúde de LVT pode ser enquadrado, por um lado, na maior concentração de mulheres migrantes oriundas de países onde se pratica a mutilação genital feminina, por outro, na realização de diversas ações de formação e de sensibilização destinadas a profissionais de saúde nesta mesma região, não tendo havido formação noutras regiões do país. Apenas na região de LVT, existem profissionais sensibilizados para a importância dos registos quer em consulta (cuidados de saúde primários ou hospitalares), quer em internamento", sublinha o relatório Mutilação Genital Feminina, 2014 2017, divulgado esta sexta-feira pela Direção Geral de Saúde (DGS). Conclusão que aponta para a existência de mais casos em outras zonas do país.
A mutilação resultou em complicações para 133 mulheres (47,7%) e em seis casos mais do que três problemas de saúde cada.
Os técnicos de saúde analisaram as mutilações do tipo III dada "a sua gravidade". É a infibulação, prática que consiste em fechar a abertura vaginal da mulher, podendo ou não incluir a remoção do clítoris (ou clitoridectomia, tipo I). De acordo com os registos, estas realizaram-se "na Guiné-Bissau (3), na Guiné Conacri (3) e na Somália (2). A "A MGF foi realizada até aos 18 anos de idade, tendo as mulheres atualmente entre 18 e 50 anos. Foram consideradas todas as complicações: psicológica, da resposta sexual, obstétricas e uro-ginecológicas", sublinham,
A maioria (130) sofreu uma mutilação do tipo II, ou excisão, que consiste em retirar não apenas o clítoris mas também os pequenos lábios e, por vezes, os grandes lábios.
Esta prática é crime em Portugal, lei n.º 83/2015, de 5 de agosto, autonomizando-se este crime e criando os crimes de perseguição e casamento forçado. A legislação alterou também os crimes de violação, coação sexual e importunação sexual, em cumprimento do disposto na Convenção de Istambul que Portugal ratificou.
Em 2012, foi criada a Plataforma de Dados da Saúde que regista dados clínicos de cada utente, tendo-se autonomizado os casos de MGF a partir de 2013.
A MGF é considerada pelas organizações internacionais, nomeadamente a UNICEF e a Comissão Europeua, como uma grave violação dos direitos humanos. Foi, inclusive, criado o Dia Internacional da Tolerância Zero Mutilação Genital feminina, 6 de fevereiro. Mas ainda é praticada em diversos países africanos, um dos quais a Guiné-Bissau.
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