sábado, 2 de março de 2013

"Não é, pois, a democracia que está em causa. Pelo contrário, ela está a aprofundar-se e a exigir mais da classe que a representa."



Democracia fragmentária

A classe política anda preocupada. Os protestos multiplicam-se à sua porta, uns mais agudos do que outros, e de vez em quando desaguam nas ruas em enchentes avassaladoras, como hoje pode voltar a acontecer em Portugal. Nalguns países, como agora a Itália, os votos dividem-se de tal forma que cristalizam a dificuldade de governar, pelo menos nos moldes tradicionais: com maioria confortável, com coligações fiáveis, com parceiros, no mínimo, conhecidos.

Compreende-se. A democracia representativa tal como a conhecemos está em crise e as lições da História já não bastam. Algo de novo está a surgir como parceiro político: a fragmentaridade. E esta nada tem que ver com anarquia. Não é a ausência de poder político o que os eleitores querem, mas evitar a concentração de poder. Evitar que alguém receba o voto como um cheque em branco para um mandato. Obrigar à negociação, à concertação, à busca constante de legitimidade.
O que os eleitores querem — atrevo-me a dizer — é serem, de facto, representados. Exigem que se cumpra o contrato social: que se governe em nome de quem elege, a bem de quem elege, para favorecer quem elege. E não quem é eleito.

Não é, pois, a democracia que está em causa. Pelo contrário, ela está a aprofundar-se e a exigir mais da classe que a representa. O maior perigo para a democracia é chamar antidemocráticos aos protestos pacíficos contra os poderes. E com esse argumento tentar substituir a democracia por outra coisa qualquer.

Por Leonor Botelho , Hoje , in Público.

Sem comentários: