Oito
razões a favor do Papa
Francisco
fala dos problemas de hoje com a linguagem de hoje e, para isso, nem
precisa de ver televisão.
BÁRBARA REIS
10 de Março de
2017, 7:36
Uns dias depois do
atentado contra o Charlie Hebdo, o Papa Francisco disse que “não
se pode provocar, não se pode insultar a fé dos outros, não se
pode ridicularizar a religião dos outros”. Na altura, escrevi aqui
as oito razões que me levavam a discordar do Papa. Hoje, chegou o
momento de fazer a crónica-espelho prometida ao Hugo Torres, então
nosso editor de comunidades, que teve de gerir os leitores
indignados. Crentes ou ateus, temos oito grandes razões para
aplaudir este Papa.
1. Francisco é um
reformista e enfrenta os católicos retrógrados. Com elegância e
sem medo. Só três exemplos. Abriu a possibilidade de os católicos
divorciados e recasados poderem receber a comunhão, uma forma de
reconhecer as novas família e não alienar (ainda mais) católicos.
Demitiu o grão-mestre da Ordem de Malta, o príncipe britânico
Matthew Festing, que afastara um cavaleiro alemão que fechara os
olhos ao uso de preservativos num projecto de saúde. E há anos que
faz frente ao cardeal americano Raymond Burke, que além de sonso e
intriguista, trava um combate feroz contra os católicos
progressistas. Burke é amigo de Steve Bannon (o amigo de Donald
Trump), apoia a ideia de um muro a separar os EUA e o México, e diz
que foi o "feminismo radical" que criou vários dos
problemas da igreja, entre os quais os abusos sexuais de menores. É
a ala radical de Burke que acusa Francisco de ter criado uma
“confusão sem precedentes na Igreja Católica”. É caso para
dizer: viva a confusão.
2. Francisco defende
os refugiados muçulmanos todos os dias. Defende tanto que os seus
críticos dizem que está "quase obcecado” com a ideia (de os
receber bem) que "já nem consegue ver que o Islão é uma
religião agressiva”, como disse esta semana, ao Financial Times, o
professor de História italiano Roberto de Mattei, que repete ideias
extraordinárias como os tsumanis serem "castigos divinos"
e o Império Romano ter desaparecido por causa do "contágio da
homossexualidade".
3. Francisco leva a
sério os problemas do ambiente e das alterações climáticas.
4. Mostra aos 80
anos que ser moderno não tem a ver com a idade que temos, mas com a
cabeça que temos. Foi ele que disse: "Se uma pessoa procura
Deus de boa vontade e é gay, quem sou eu para a julgar?" Foi
ele que alargou a todos os padres o poder de absolver as mulheres que
abortam.
5. Francisco é o
autor das duas melhores expressões do século: "Alzheimer
espiritual" e "terrorismo da intriga". O tema da
intriga é uma constante sua. Critica a intriga dentro e fora do
Vaticano ("os que dizem mal do seu vizinho são hipócritas e
não têm a coragem de reconhecer as suas próprias limitações")
e coloca-a na lista das "15 doenças" do nosso tempo. As
outras incluem o exibicionismo, o “excesso de trabalho”, “a
excessiva planificação” e o "sentir que somos
indispensáveis”. A esses deu um conselho: visitem um cemitério e
vejam o nome de tantos que “se achavam imortais, imunes e
indispensáveis”.
6. Francisco fala
dos problemas de hoje com a linguagem de hoje e, para isso, nem
precisa de ver televisão (coisa que não pratica desde 1990). Dos
telemóveis: “O que aconteceria se tratássemos a Bíblia como
tratamos os nossos telemóveis? Se andássemos sempre com a Bíblia
connosco ou pelo menos com uma versão de bolso? ‘Esqueci-me do
telemóvel — Oh! Volto para trás à procura dele.' Se as pessoas
lerem as mensagens de Deus como lêem as mensagens do telemóvel…”.
Da guerra: “Estamos na III Guerra Mundial aos bocadinhos. E fala-se
de uma possível guerra nuclear como se fosse um jogo.” Da noção
ridícula de que amamentar em público é obsceno e erótico — para
não falar do argumento dos “fluidos corporais”: "Amamentem
os vossos filhos com "naturalidade e sem medo, como Maria".
Quantos Papas enviaram um inquérito às dioceses de todo o mundo
para medir o fosse entre o que os católicos pensam e o que ouvem na
missa? Um: Francisco.
7. Francisco não
acredita em muros e é o mais radical político anti-Trump.
8. Last, but not
least, Francisco prefere bons ateus a maus católicos.
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