Marcelo
espera que caso da conferência cancelada não se repita
O
Presidente da República disse ter ficado "mais confortado"
com a posição que lhe foi transmitida pelo reitor da Universidade
Nova de Lisboa.
LUSA 10 de Março de
2017, 19:12
O Presidente da
República afirmou esta sexta-feira esperar que o caso da conferência
cancelada na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (FCSH) da
Universidade Nova de Lisboa seja "uma lição para o futuro"
e não se repita.
Em resposta aos
jornalistas, no final de um seminário sobre incêndios, em Lisboa, o
chefe de Estado, Marcelo Rebelo de Sousa disse ter ficado "mais
confortado" com a posição que lhe foi transmitida pelo reitor
da Universidade Nova de Lisboa, António Rendas, quanto à liberdade
de expressão naquela instituição. "O reitor da Universidade
Nova de Lisboa garantiu-me que também considera ser um valor
fundamental. Portanto, eu espero que seja uma lição para o futuro e
que não haja equívocos como este e situações absurdas como esta",
declarou o chefe de Estado.
Na quarta-feira, o
Presidente da República pediu um esclarecimento sobre o cancelamento
da conferência do politólogo Jaime Nogueira Pinto pela FCSH,
considerando que "é incompreensível uma decisão daquelas por
parte de uma instituição pública".
Na segunda-feira, a
direcção da faculdade decidiu cancelar uma conferência organizada
pelo movimento Nova Portugalidade, e que contaria com a presença de
Nogueira Pinto, alegando razões de segurança e suscitando críticas
de vários quadrantes sobre uma suposta privação do direito de
liberdade de expressão. Mais tarde, a reitoria explicou que o evento
tinha sido adiado e não cancelado.
Esta sexta-feira, no
final de um seminário na Reitoria da Universidade de Lisboa, Marcelo
Rebelo de Sousa não quis comentar a forma como este assunto foi
debatido na Assembleia da República: "Eu não vou comentar o
Parlamento, eu disse a minha posição, a posição é clara".
"É
incompreensível e absurdo haver qualquer tipo de iniciativa por
parte de uma instituição - que é autónoma, de facto, não depende
do Governo nem depende do Estado, mas é pública - que questione
aquilo que é um dos valores fundamentais da Constituição, que é a
liberdade de expressão de pensamento", reiterou.
Cancelamento de
conferência na FCSH leva a dura troca de acusações entre BE e
direita
O Presidente da
República salientou que, entretanto, o reitor da Universidade Nova
de Lisboa o informou "acerca do sucedido" e lhe garantiu
"que tudo seria feito para precisamente assegurar a liberdade de
expressão como um valor fundamental" naquela entidade pública.
"Portanto, eu
naturalmente fiquei mais confortado pelo facto de saber que a
Universidade Nova de Lisboa tinha a noção exacta de que há valores
nos quais não se toca", acrescentou.
Liberdade
de expressão? Dia sim, dia não...
Ninguém
concordou com o cancelamento mas...
FRANCISCO TEIXEIRA
DA MOTA
10 de Março de
2017, 6:44
O mais chocante no
episódio do cancelamento da conferência do politólogo Jaime
Nogueira Pinto na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (FCSH) da
Universidade Nova de Lisboa, no meu entender, não é a clamorosa
inépcia do director da faculdade ao cancelar o evento nem a
ignorância liberticida dos jovens da associação de estudantes que
aprovaram uma moção no sentido do cancelamento. Sendo inaceitáveis
as atitudes da associação e do director numa sociedade democrática,
importa sublinhar que a favor do director abonam o seu invocado
receio de confrontos físicos e o facto de, no domínio do confronto
político, o seu trabalho mais recente ser o livro A mensagem
política de Jeremias na crise de 609-587 antes de Cristo.
Em defesa dos jovens
esquerdistas, importa lembrar que há quem veja a juventude como uma
doença mas que felizmente tem cura. Não partilho, seguramente,
dessa opinião, mas reconheço que a juventude, por vezes, é um
problema. Neste caso concreto, os jovens esquerdistas, face a uma
organização direitista, decidiram aprovar uma moção no sentido do
cancelamento da conferência, nomeadamente porque os jovens de
direita se referiam à descolonização pós-25 de Abril de 1974 como
um trágico equívoco!
Será que para estes
jovens a descolonização tem de ser aceite por todos os portugueses
como tendo sido louvável e exemplar? Não há espaço público para
os que consideram que a descolonização foi um erro expressarem a
sua opinião? E para os que defendem que se deveria ter construído
uma comunidade de nações lusas ou um Estado Federal lusitano? Quiçá
com a capital a circular rotativamente por Lisboa, Luanda e Lourenço
Marques? Será proíbida a expressão pública das utopias de
direita? Para além dos amanhãs que cantam do comunismo, não é
admissível sonharmos com os africanos a dançarem o vira do Minho do
fascismo? Não se pode ter uma imensa saudade dos chineses vestidos
de campinos à porta do Hotel Lisboa em Macau?
Parece que não.
Segundo um dos jovens censores, identificado como militante do Bloco
de Esquerda, o problema deles não era com o politólogo de direita,
que até tencionavam convidar para outros debates, mas sim com facto
de, no seu entender, a liberdade de expressão não é dizer tudo o
que se quer!
Como é evidente,
ninguém concordou com o cancelamento do evento e foram numerosos os
comentadores que se pronunciaram com veemência contra esta triste
negação do espaço universitário. Mas, o que mais me chocou, foi
ver surgir na praça pública, como paladino da liberdade de
expressão o político Manuel Alegre que veio lembrar os seus tempos
de estudante em Coimbra, no século passado, em que, segundo nos
informou: havia colóquios proibidos, mas isso era no tempo da
ditadura. Em democracia não é possível, porque a democracia é
feita de debate e de pluralismo.
Parece este político
querer fazer-nos esquecer que o ano passado, após porfiados
esforços, conseguiu nos tribunais portugueses a condenação do
tenente-coronel piloto-aviador João José Brandão Ferreira numa
pena de multa de 1800 euros acrescida de uma indemnização de 25 mil
euros por ter escrito num blogue que o militante socialista era um
traidor à Pátria, tendo em conta o que considerava ter sido a
actuação do cidadão Manuel Alegre como membro da Frente Patriótica
da Libertação Nacional aos microfones da “Rádio Voz da
Liberdade” em Argel.
Ora o que pensarão
e diriam – muito provavelmente se sobre isso fossem questionados –
o politólogo em causa e os direitistas jovens organizadores da
conferência sobre o comportamento deste político durante a guerra
do ultramar? Como classificariam o facto de Manuel Alegre na "Rádio
Voz da Liberdade" com a sua tonitruante voz combater o
patriótico regime de Salazar/Caetano e apoiar os movimentos
terroristas, enquanto os soldados portugueses morriam às mãos dos
guerrilheiros? Não entenderão eles, muito provavelmente, que foi um
traidor à Pátria? E, pergunta-se (retoricamente) ao político
Manuel Alegre, não podem ter esse entendimento? E expressá-lo
publicamente ao abrigo da sua liberdade de expressão?
Moral da história:
não se pode dizer Je suis Charlie à terças, quintas e sábados e
Pas du tout às segundas, quartas e sextas, deixando os domingos para
ir à caça.
Negar
a universidade e a liberdade
Ao
ceder, o director da FCSH negou a sua função e o papel de uma
universidade.
SÃO JOSÉ ALMEIDA
11 de Março de
2017, 7:17
Quando uma
universidade decide suspender uma conferência, está a fazer algo
que é negar a sua própria essência e razão de existir. A
universidade deve ser a casa da cultura, da formação humana, do
crescimento intelectual, o que só acontece através do debate, de
nos ouvirmos uns aos outros, de aprendermos com os outros, de nos
reconhecermos nos outros e descobrirmos através dos outros. É para
isso que serve uma universidade, e quando a direcção de uma
universidade aceita ceder à pressão política dos grupos que vivem
no seu seio, o que está a fazer é negar a sua própria razão de
ser. Para além, claro, de pôr em causa uma regra estruturante das
democracias modernas: o direito à liberdade de expressão.
Estas duas coisas
aconteceram esta semana em Portugal com a decisão tomada pelo
director da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (FCSH),
Francisco Caramelo, de suspender uma conferência anunciada para as
suas instalações em que o orador era Jaime Nogueira Pinto,
intitulada “Populismo ou Democracia: O 'Brexit', Trump e Le Pen”,
organizada por um grupo de alunos chamado “Nova Portugalidade”.
O processo
desenrolou-se com novos métodos comunicacionais, nas redes sociais,
e com métodos tradicionais de luta, com a realização de uma
Reunião Geral de Alunos (RGA), enquanto assembleia legitimadora da
vontade popular do universo de alunos da FCSH. A nota publicada na
página de Facebook da associação de estudantes dá conta da
aprovação na RGA de “uma moção que vinculava” aquela direcção
associativa “a tudo fazer" para que a conferência “não
acontecesse”, numa votação com 24 votos a favor, quatro contra e
três abstenções.
A leitura da nota
evidencia um radicalismo censor e excludente dos que pensam diferente
com base em argumentação risível e confrangedora pela ignorância
que revela. A saber. Diz a Associação de Estudantes da FCSH que
“emite, abertamente, uma nota de repúdio ao evento e ao cariz
ideológico nacionalista e colonialista do núcleo que o promove e
que se refere de forma indirecta à descolonização no seu manifesto
como ‘trágico equívoco’”. E mais à frente dá um salto
conceptual de monta ao afirmar: “Por sermos, efectivamente, uma
universidade onde a liberdade de pensamento e o pensamento crítico
são promovidos, não compactuamos com eventos apresentados como
debates sob a égide de propaganda ideológica dissimulada de cariz
inconstitucional”.
Vamos por partes. A
Constituição proíbe de facto “organizações racistas ou que
perfilhem a ideologia fascista” no ponto 4 do Artigo 46.º. Mas daí
dar o salto quântico de classificar de “propaganda ideológica
dissimulada de cariz inconstitucional” a actividade de um grupo que
caracteriza como de “cariz ideológico nacionalista e
colonialista”, acrescentando como prova o facto de este grupo se
referir “de forma indirecta à descolonização no seu manifesto
como ‘trágico equívoco’”, é, no mínimo, fazer uma maionese
conceptual sobre o que é o fascismo, o nacionalismo e o colonialismo
e acabar a misturar o toucinho com o presunto. Desde quando é que
fascismo é nacionalismo ou colonialismo? Não houve colonialismo em
regimes liberais? Não houve e não há nacionalismos em democracias
liberais? Desde quando ser nacionalista é anticonstitucional? Desde
quando considerar a descolonização um “trágico equívoco” é
ser colonialista?
Mais: confundir
Nogueira Pinto com o fascismo é de uma miopia intelectual que apenas
revela que quem o faz ou nunca ouviu e leu Nogueira Pinto ou então
não sabe o que é o fascismo. Ele é tão fascista que mantém um
programa de rádio semanal em que debate a evolução histórica ao
longo do século XX com Ruben de Carvalho, membro do Comité Central
do PCP.
Jaime Nogueira Pinto
é de direita, é nacionalista, mas tem tanto direito a expor o seu
pensamento e a ser ouvido como eu tenho direito a ser de esquerda
social-democrata e escrever o que penso. Esse é o valor supremo da
democracia. Esse é o valor sagrado da liberdade de expressão. Esse
devia ser o papel de uma universidade que se prezasse enquanto espaço
de cultura, de debate, de aprendizagem. Ao ceder, o director da FCSH
negou a sua função e o papel que uma universidade deve ter numa
sociedade democrática diversificada e inclusiva.
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