sexta-feira, 17 de março de 2017

Cada vez mais degradado, antigo Cinema Paris continua à espera de uma solução



Cada vez mais degradado, antigo Cinema Paris continua à espera de uma solução
POR O CORVO • 17 MARÇO, 2017 •

O problema já é antigo e tarda em encontrar um desfecho. O edifício do antigo Cinema Paris, na Rua Domingos Sequeira, entre a Basílica da Estrela e Campo de Ourique, está entregue a um progressivo processo de degradação desde há três décadas e tudo indica que a demolição acabará por ser o seu destino mais provável. Apesar das sucessivas notificações da Câmara Municipal de Lisboa (CML) ao proprietário do prédio edificado em 1931, para que este assegure um estado de conservação mínimo, evitando assim pôr em perigo a segurança do espaço público, é quase certo que a solução passará pela demolição. Isto já depois de, em 2015, ser ter chegado a falar da tomada de posse administrativa por parte da autarquia. Solução entretanto abandonada.

Isto porque a CML tem outros objectivos para aquela zona. Depois de libertos, os terrenos da antiga sala de espectáculos deverão integrar uma unidade execução, a constituir juntamente com as parcelas formadas pelo quarteirão da Guarda Nacional Republicana (GNR) e por uma antiga fábrica de chocolates, para que ali nascer nova construção – numa área que, em conjunto, tem mais de 12 mil metros quadrados. Mas tal objectivo está a revelar-se de difícil concretização. Isso mesmo reconhece a câmara. “Apesar dos esforços de concertação por parte da CML, não foi possível, até ao momento, um acordo entre todos os proprietários para formalizar a unidade de execução”, informa, em resposta escrita a um conjunto de questões do Corvo sobre o assunto.

Tal projecto de criação de uma unidade de execução foi tornado público por Manuel Salgado, vereador do Urbanismo, durante uma sessão da Assembleia Municipal de Lisboa (AML), em Novembro passado. Nela, o autarca dera conta dos frustrados esforços da câmara, através de autos de intimação para conservação e reabilitação, visando que os donos do Paris – a empresa NCI, Novas Construções Imobiliárias – estancassem o avançado estado de degradação do edifício, que está listado no Inventário do Património Municipal. Tais intimações surgiram na sequência de vistorias feitas em 2013 e 2014 e já em julho do ano passado.

“O edifício encontra-se num estado de degradação muito avançado, não justificando, neste momento, um investimento para repor o cinema”, afirmou há quatro meses, notando também que se haviam registado preocupantes sinais de intensificação da degradação, com a queda de elementos em betão das varandas. Tal levou, já no verão passado, ao levantamento de um processo de intimação “para execução de medidas urgentes e cautelares”. Entre elas estava a demolição de elementos que pusessem em risco pessoas e bens. Em 2003, a demolição total do imóvel chegou a ser autorizada pela CML, na sequência de uma vistoria do ano anterior, que referia “perigo de aluimento de tectos e desagregação de fachadas”.

Tal destino acabou por não se concretizar, em virtude da forte contestação por parte de um grupo de cidadãos, que criticavam o que consideravam a insensibilidade da autarquia para com o património da cidade. Passada mais de uma década, todavia, nada aconteceu para além do acentuar da decrepitude do antigo cinema. Em janeiro de 2015, O Corvo dava conta da forte possibilidade da câmara em tomar posse administrativa do mesmo, na sequência da intimação para conservação e reabilitação de 2014. Desfecho de que a autarquia parece ter, entretanto, desistido. Até porque, em 23 de novembro de 2015, outra notícia do Corvo dava já conta da mais que provável demolição.

Na notícia de janeiro desse ano, o presidente da Junta de Freguesia da Estrela, Luís Newton (PSD), dizia-se preocupado pelos potenciais riscos colocados pelo velho edifício, não apenas no que toca à segurança como também à saúde pública, dada a profusão de pragas diversas e a acumulação de detritos num local também frequentado por toxicodependentes. “O edifício corre o risco de abater, se nada for feito”, avisava, pedindo uma solução rápida para o imóvel e os terrenos da antiga fábrica de chocolates e do local que foi casa do Regimento de Infantaria da GNR. Algo que, volvido um par de anos, repete. “Aquela área tem de ser rapidamente intervencionada, não pode continuar como está, até por ser um foco sério de perigo para a saúde pública”, reitera agora.

O autarca social-democrata acha “inconcebível que quem tem os instrumentos de planeamento não faça nada” não apenas com o cinema e seu logradouro como também com “o terreno enorme e de valor incalculável” situado nas suas traseiras, diz, numa referência à aparente dificuldade da CML em encontrar uma solução. Lamentando o destino do cinema, Luís Newton considera já se ter ultrapassado o prazo razoável o manter. “Já a partir de 2010, era muito difícil reverter o processo de degradação. A não ser que a CML quisesse investir nisso, mas, ainda assim, seria sempre para demolir e voltar a erguer”, diz.

Como salienta o presidente da junta da Estrela, trata-se de uma área significativa que se encontra “inacessível e ao abandono”, há cerca de uma década. Mas cujo potencial de valorização urbanística é enorme. Perspectiva que terá, desde há muito, levado os proprietários do antigo Cinema Paris a não equacionarem a sua reabilitação. Será junto a ele que deverá ser criada uma passagem pedonal – ligando a Rua Domingos Sequeira às ruas Saraiva de Carvalho e da Estrela -, no caso de vir a ser concretizada a tal unidade de execução que englobe as três propriedades (cinema, quartel da GNR e fábrica de chocolates), informou Manuel Salgado, na mencionada sessão da assembleia municipal.


Texto: Samuel Alemão

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