Declaração
de Roma: a Europa caminhará numa só direcção, mas a várias
velocidades
Na
celebração dos 60 anos, os líderes falaram numa UE mais social no
futuro, e com mais unidade - um antídoto para o populismo. “A
Europa como entidade política ou estará unida, ou não será nada”,
disse Tusk.
VASCO GANDRA
Bruxelas 25 de Março de 2017, 18:03
Os líderes europeus
celebraram em Roma os 60 anos da União Europeia numa numa cerimónia
que culminou com a assinatura de uma Declaração que aponta o rumo,
as prioridades políticas e os valores que devem guiar o bloco
comunitário nos próximos dez anos, após o "Brexit".
Num contexto marcado
pelo divórcio do Reino Unido, os líderes dos 27 prometem uma Europa
“forte” para o futuro e fazem juras de unidade. “A nossa União
é indivisa e indivisível”, afirmam na Declaração.
Ainda que de forma
suavizada, a Declaração de Roma reconhece o princípio de uma
Europa a várias velocidades e lança uma agenda política para a
próxima década assente em várias prioridades, em que uma das
promessas é a aposta na “Europa social”.
Na Sala dos Horácios
e Curiácios do Capitólio romano, onde em Março de 1957 os
primeiros seis países - República Federal Alemã, França, Itália,
Bélgica, Holanda e Luxemburgo -, assinaram os tratados fundadores do
projecto comunitário, os líderes europeus tentaram mostrar-se à
altura da tarefa: celebrar o caminho percorrido até hoje
reconhecendo a dificuldade dos actuais desafios, e apontar o rumo
para a próxima década.
Talvez inspirados
pelo histórico e soalheiro cenário da capital italiana, os líderes
das instituições comunitárias e dos 27 Estados-membros (sem
Theresa May) apareceram mais descontraídos do que no habitual
contexto cinzento de Bruxelas. Ao final da manhã, assinaram um a um
a Declaração de Roma, um documento de três páginas redigidas na
habitual linguagem formal e pouco enfática.
Os líderes
manifestam o seu orgulho nas “conquistas da União Europeia”, um
“empreendimento audacioso”, e no seu caracter “ímpar” de
paz, liberdade, democracia e direitos humanos. Sublinham que hoje
“estamos unidos e mais fortes” mas reconhecem que o bloco
comunitário enfrenta desafios sem precedentes: conflitos regionais,
terrorismo, pressões migratórias crescentes, protecionismo e
desigualdades sociais e económicas.
Os 27 e as
instituições europeias querem tornar a União Europeia “mais
forte e resiliente” mediante mais unidade e solidariedade. No seu
discurso, o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk deixou o
alerta: “A Europa como entidade política ou estará unida, ou não
será nada”.
A Declaração
reconhece também a opção da chamada Europa a várias velocidades
que permite a um grupo de países avançar na integração em áreas
específicas, sem esperar pelos reticentes. Os seis países
fundadores são os principais defensores deste princípio sem o qual,
consideram, a UE está condenada ao bloqueio.
“Actuaremos em
conjunto, a ritmos e com intensidades diferentes quando for
necessário, avançando todos na mesma direcção”, respeitando os
Tratados e “mantendo a porta aberta àqueles que se nos queiram
juntar mais tarde”, diz o documento. Esta formulação foi diluída
em relação a uma versão anterior por forma acomodar as
preocupações dos Estados-membros de leste que receiam a criação
de várias categorias de países dentro do bloco.
Para fazer face às
várias crises e dificuldades que a UE enfrenta, os dirigentes
europeus lançaram a Agenda de Roma com vários pontos prioritários
nos próximos tempos: uma Europa segura e protegida, próspera e
sustentável, mais forte no plano internacional com o reforço de uma
segurança e defesa comuns. Os 27 e as instituições prometem ainda
apostar numa “Europa social” que “fomente o progresso económico
e social, bem como a coesão e a convergência”.
O primeiro-ministro
maltês, cujo país assume a presidência semestral do Conselho da
UE, sublinhou em conferência de imprensa que a UE vai mesmo avançar
na área social e que esta pode funcionar como “antídoto ao
crescimento do populismo”. O anfitrião da cerimónia, o italiano
Paolo Gentiloni garantiu que a Declaração representa “um passo em
frente” para a UE em áreas como a defesa, a economia e o social.
Por seu turno, o
primeiro-ministro, António Costa, disse ter “muito esperança e
confiança” em que a “renovação de votos” feita pelos líderes
se traduza em “respostas concretas”. “É muito importante que
esta celebração que hoje aqui fazemos possa continuar amanhã e
para que isso aconteça é fundamental podermos responder de uma
forma positiva àquilo que são os anseios, as angústias, o medo que
muitos cidadãos têm e para os quais a União Europeia é mesmo a
única entidade que pode dar uma boa resposta”, declarou o chefe de
Governo, minutos depois de assinar a “Declaração de Roma”,
segundo a Lusa.
Este sábado, todos
os caminhos da Europa foram dar a Roma para um dia de celebrações e
promessas. Face aos desafios e ao ciclo eleitoral que a Europa
enfrenta, os líderes europeus não têm tempo a perder para
apresentar resultados. Como disse Donald Tusk: “Provem hoje que são
os líderes da Europa, que podem cuidar desse grande legado que
herdámos dos heróis da integração europeia há 60 anos”.
Quase
tudo ou quase nada
A
Europa estabelece quatro prioridades que, se forem levadas a sério,
podem ser um bom ponto de partida. A dúvida é mesmo essa: se vão
ser levadas a sério.
Teresa
de Sousa
25 de Março de
2017, 19:15
1. Ninguém quis
estragar a festa, em Roma, no Capitólio onde, há 60 anos, seis
países europeus selaram um novo destino para a Europa. Nem a
primeira-ministra polaca, nem o seu homólogo grego. Ambos
subscreveram, com os seus 25 pares, a Agenda de Roma, com os seus
quatro compromissos para os próximos dez anos. A cerimónia esteve à
altura das circunstâncias. A cidade encheu-se das cores europeias,
as salas magníficas do Capitólio iluminaram os líderes, as
manifestações a favor ou contra encheram as ruas e um Papa a muitos
títulos excepcional desafiou-os líderes europeus a não esquecerem
os seus valores.
Serviu de alguma
coisa? Serviu pelo menos para demonstrar que a Europa ainda respira,
mesmo que com dificuldade. A Declaração de Roma acaba por ser uma
pequena manta de retalhos para satisfazer toda a gente. Era quase
inevitável. A Europa chegou aos 60 anos demasiado dividida para se
poder esperar outra coisa. Mesmo assim, estabelece quatro prioridades
que, se forem levadas a sério, podem ser um bom ponto de partida. A
dúvida é mesmo essa: se vão ser levadas a sério. O risco é que
os líderes europeus, regressados às suas agendas domésticas,
esqueçam rapidamente o compromisso que assumiram. As eleições na
Alemanha, em França e na Itália (ainda sem data marcada) vão
ajudar a “esquecer” por algum tempo alguns desses compromissos.
2. A chanceler alemã
tem uma batalha interna a travar pelo seu quarto mandato. A Europa
está no centro do debate político do seu país e os alemães
continuam a apoiar a forma como ela a conduz. Mas Merkel vai ter pela
frente um candidato à sua altura, coisa que esteve muito longe de
acontecer nas duas últimas batalhas eleitorais que travou com o SPD.
Realisticamente, a maioria dos governos europeus sabe que as grandes
decisões vão ter de esperar pelo dia 24 de Setembro. A questão que
falta saber é se Martin Schulz, o candidato do SPD que conseguiu a
proeza de igualar a chanceler nas sondagens, vai estabelecer alguma
diferença entre o seu programa europeu e o da chanceler. Em França,
os campos estão claramente separados pela questão europeia.
Emmanuel Macron não tem um grama de eurocepticismo e elogia a forma
como Merkel lidou com os refugiados. A sua eleição pode ajudar a
reconstituir uma parceria franco-alemã menos desigual e mais
equilibrada (ou seja, menos alemã), fundamental para devolver à
Europa uma liderança política. Mas se houve uma preocupação
franco-alemã neste compromisso de Roma, ela foi a de abrir as portas
a uma Europa que permita a integração a várias velocidades, mesmo
que a expressão não conste do texto final.
3. A necessidade de
concluir a reforma da União Económica e Monetária (UEM) também
vai ter de esperar pelas eleições em França e na Alemanha, até
que seja possível um novo entendimento entre os dois países. E essa
é, para o Governo de Lisboa, a questão mais importante. Como o
primeiro-ministro português repetiu ontem em Roma, Portugal não
quer “fugas para a frente”, antes que os “alicerces” estejam
suficientemente sólidos. Ou seja, a zona euro tem de completar a sua
reforma para estabilizar a moeda, evitar choques assimétricos e
criar condições para a convergência económica, antes de se lançar
em novos projectos. António Costa conseguiu o que pretendia, e não
era muito. A Declaração refere, no seu compromisso número dois,
que é preciso incentivar a convergência económica “através do
investimento, das reformas estruturais e trabalhando no sentido de
completar a UEM”. Falta passar das palavras aos actos.
4. Como superar este
desfasamento entre a agenda europeia e as agendas nacionais, é a
grande questão que será testada nos próximos meses. O que sabemos
hoje é que foi muito difícil negociar um texto que todos pudessem
assinar. Tão difícil que o resultado final tira boa parte do
sentido a cada um dos quatro compromissos, produzindo um resultado
onde cabe tudo à custa de não significar quase nada.
5. Mas há ainda uma
verdade que prevalece. Citado pela Reuters, o actual Presidente
polaco, Andrzej Duda, tratou de esclarecer que o seu país continua
“totalmente comprometido com a Europa”, para lá de todas as
divergências. Ele próprio explica porquê: “Hoje, qualquer
partido que viesse a público dizer que quer sair da Europa não
teria qualquer hipótese na cena política nacional”.
Quando recebeu no
Vaticano os líderes europeus, o Papa conseguiu resumir numa frase o
que está em jogo para a Europa: “Quando um organismo perde o
sentido do caminho a seguir, deixa de ser capaz de olhar em frente,
acabará por regredir e, no longo prazo, corre o risco de morrer.”
É isso mesmo.
Europe’s
elite put on grand show of unity in Rome
European
leaders sign Rome Declaration as centerpiece of 60th anniversary
celebrations.
By MATTHEW
KARNITSCHNIG AND FLORIAN EDER 3/25/17, 3:21 PM CET Updated 3/25/17,
4:17 PM CET
ROME — Europe’s
prominence descended on the Italian capital Saturday to celebrate
their union’s 60th anniversary with a single aim: fare bella
figura.
After a year in
which the EU has had to stomach the Brexit vote, bitter fights over
refugees and the resurgence of far-right populism, failure was not an
option. Yet for a club riven by division over matters large and
small, keeping up appearances was no small order.
The setting, a vast
palazzo on Capitoline hill that was once the site of a temple ancient
Romans believed would stand for eternity, offered an apt reminder of
the EU’s own fragility.
But somehow —
whether inspired by the weight of the moment, the ghosts of their
predecessors or the warm Roman spring — the 27 heads of government
and state, pulled it off. For a day, at least, they put their
squabbles aside to celebrate the unlikely success of an idea born out
of catastrophe.
Gathered in the hall
of Horatii and the Curiatii, the opulent marbled chamber where the
Treaty of Rome was signed in 1957, the continent’s leaders
reasserted the EU’s founding principles, while vowing to carry the
region’s integration forward.
When Greek Prime
Minister Alexis Tsipras signed, someone from the audience muttered
“at last.”
One by one, the
leaders were called to a wide table at the head of the hall to put
their signature to an 800-word document dubbed the Rome Declaration.
Each signature, all in thick black ink from the same hefty pen, was
greeted with a round of applause, backslaps and smiles.
What looked
effortless from afar, was preceded by weeks of pitched debate and
recriminations over the content of the declaration. In particular,
Poland and Greece objected to key aspects of the aspects of the text,
threatening to upend the show of unity.
Both governments
were trying to send a signal to their electorates. Poland needed to
show it is still listened to by Brussels after losing out in the vote
on the re-appointment of Donald Tusk as European Council president.
Greece needs to sell another round of economic reforms demanded by
Europe to its skeptical public.
Just hours before
the signing, having sated their home crowds’ appetite for defiance,
they dropped their objections.
When Greek Prime
Minister Alexis Tsipras signed, someone from the audience muttered
“at last.” After Polish Prime Minister Beata Szydło signed, she
made a gesture that an aide to one prime minister interpreted as,
“You see? I did it”.
“I believe that
what we succeeded to do in the past days and hours marks a new
awakening,” a visibly relieved Jean-Claude Juncker told reporters
afterwards. “Contrary to expectations, it didn’t come to a
clash.”
Donald Tusk, who was
born in the same year of the Rome Treaty, recalled his childhood
behind the Iron Curtain in the rubble of Gdańsk, a city destroyed
during the war.
That was in large
part due to the day’s careful choreography. Unlike most EU summits,
which are followed by a cacophony of conflicting messages when
leaders speak to the press, the organizers left nothing to chance.
Leaders were kept on
a tight leash. Instead of individual national press briefings, the
ceremony was followed by a press conference hosted by Juncker, Tusk,
Italian Prime Minister Paolo Gentiloni, European Parliament president
Antonio Tajani and Maltese Prime minister Joseph Muscat who holds the
rotating EU presidency. Though hundreds of journalists were in
attendance, they took just a handful of questions.
Juncker offered a
very Italian justification for calling it short: “I’m hungry,”
he said before following the other leaders to the presidential palace
for lunch with Italy’s president Sergio Mattarella.
The ceremony itself
lasted little more than an hour, with five set-piece speeches.
The highpoint came
during an address by Tusk who who was born in the same year of the
Rome Treaty. He recalled his childhood behind the Iron Curtain in the
rubble of Gdańsk, a city destroyed during the war.
“Back then, that
really was a two-speed Europe,” he said. “And that is why today I
have the right to loudly repeat this simple truth: that nothing in
our life is granted forever; that to build a free world requires
time, great effort and sacrifice…To destroy such a world is very
easy. It only takes a short moment. As it happened once, with my
Gdańsk.”
Tusk’s remarks,
the most personal of the day, left many of those present, including
German Chancellor Angela Merkel visibly moved.
The weighty tone for
the day’s festivities was set Friday night, when leaders were
received in the Vatican by the Pope.
The pontiff urged
them to resist the “false forms of security” promoted by populist
parties across the Continent.
“Europe finds new
hope in solidarity, which is also the most effective antidote to
modern forms of populism,” the Pope told them.
“We’re not proud
enough of what we’ve achieved in Europe” — Jean-Claude Juncker
The EU’s success
“will depend on its readiness to work together once again, and by
its willingness to wager on the future.”
He got his message
across — Szydło energetically kissed his ring after the speeches.
The big question
hanging over the meeting was whether the show of solidarity on
display in Rome will last. In the coming months, the EU’s remaining
27 will not only have to find common purpose over Brexit. The biggest
challenge they face will be to agree on a broader overhaul of the
Union, which for all its success, is in sore need of reform.
To push the project
forward, Juncker told his colleagues, will require more confidence.
“We’re not proud
enough of what we’ve achieved in Europe,” he said.
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