quarta-feira, 22 de março de 2017

Alojamento local é “tragédia” e “praga” nos bairros históricos, diz presidente de junta / Os efeitos da Turistificação de Lisboa

 Reconhecendo a argumentação de dependência económica, reflexo de uma teia de debilidade económica que leva a aceitar o Turismo como tábua de salvação mesmo que muito temporária e curta, devemos então entregarmo-nos passivamente a esta`fatalidade ' incontorrnável ?
Neste caso, ao entregarmo-nos a esta omnipotência paralisante e inibidora da fatalidade, esta, torna-se realmente fatal pela sua irreversibilidade e omnipresença destruidora.
Assim, depois desta vaga de “gafanhotos” predadores, ao não qualificarmos o conceito do Turismo, iremos perder não só os turistas, mas, acima de tudo, o nosso habitat, a nossa identidade e a nossa cidade. Cidade, agora transformada numa plataforma híbrida de diversões passageiras e efémeras, cada vez mais artificiais.
Estas questões têm que ser GERIDAS e nada se pede a Medina e Salgado mais de que cumpram as suas missões como eleitos e que comecem, a exemplo de outras cidades Europeias, a fazê-lo desde já, reconhecendo a urgência determinante destas questões para o futuro da cidade.
António Sérgio Rosa de Carvalho
OVOODOCORVO

Alojamento local é “tragédia” e “praga” nos bairros históricos, diz presidente de junta
POR O CORVO • 23 MARÇO, 2017

O presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria Maior, Miguel Coelho (PS), volta a pedir medidas legais para travar o processo de esvaziamento demográfico dos bairros do centro histórico de Lisboa por parte das classes mais desfavorecidas, consequência da revolução turística em curso. A multiplicação da oferta do alojamento local está a matar comunidades como as de Alfama e da Mouraria, diz. O autarca, que nos últimos meses tem vindo a intensificar uma pública discordância com o presidente da Câmara Municipal de Lisboa sobre a melhor forma de lidar com o fenómeno, diz que “não há que ter medo das palavras quando se vê o que está acontecer um pouco por todo o lado como uma praga”. E para combatê-la há que tomar medidas concretas, possivelmente através de mudanças nos regulamentos, defende.

“Os culpados não são os turistas, os culpados são os portugueses que querem alugar casas a turistas”, disse o presidente da junta, ao final da tarde desta quarta-feira (22 de março), durante a cerimónia de inauguração de um painel de fotografia sobre mosaico, de autoria da artista inglesa Camila Watson e feito como homenagem às pessoas da Mouraria. A obra, denominada “Canto de Sol”, foi colocada numa parede do Centro de Inovação da Mouraria (CIM), na Travessa dos Lagares. E fica de frente para o prédio com número 25 da Rua dos Lagares que, há poucas semanas, foi notícia por todos os seus inquilinos terem recebido uma ordem colectiva de despejo, cujo intuito será o de dar espaço para novos apartamentos turísticos. O processo, entretanto, mereceu o interesse da CML e poderá não ser concretizado. Mas o presidente da junta de Santa Maria Maior promete estar vigilante.

“A junta estará sempre do seu lado”, disse, quando se referiu aos residentes deste prédio ameaçado de ser engolido pela onda turística – e já depois de um deles, Carla Pinheiro, se ter manifestado revoltada com o que “está a acontecer não apenas aqui no bairro, como em toda a Baixa e noutro sítios”. “Estamos a mobilizar todos os recursos que temos, vamos tentar resistir o máximo que pudermos, aqui e noutros locais, para evitarmos esta tragédia em curso”, disse Miguel Coelho, alertando para a forte possibilidade de, muito em breve, surgirem situações análogas à que se está a viver no edifício da Rua dos Lagares. Há, neste momento, um caso que o preocupa na Rua das Farinhas, confessou – embora a natureza contratual dos arrendamentos seja algo distinta.

Questionado, logo de seguida, por O Corvo, sobre o teor das palavras que acabara de proferir, Miguel Coelho disse que “é errado fazer um discurso anti-turista, mas importa fazer discursos sobre a necessidade da sustentabilidade do turismo”. “E isso só acontece com as pessoas que aqui moram”, defende. Durante a cerimónia, o eleito socialista já frisara a importância vital de manter ali os moradores tradicionais destes bairros do centro da capital, que qualificou como “pessoas com história, pessoas autênticas”. “O que seria da Mouraria se viessem cá os turistas e não encontrassem as pessoas que são os seus moradores?”, perguntou, ante o aplauso de algumas dezenas de pessoas, moradores e não só.

Ao Corvo, e à semelhança do que fez numa recente reunião pública, o autarca voltou a defender a adopção de medidas legais que impeçam o surgimento de alojamento local em prédios em que os moradores se oponham a tal. Mas também deseja que sejam criados mecanismos que impeçam a concentração do negócio do alojamento local, “que está a favorecer bancos e grandes especuladores”. “Aqui na freguesia, os investimentos neste negócio estão nas mãos de três ou quatro entidades”, afirma. Admitindo a dificuldade em alterar as leis, Miguel Coelho sugere que as restrições por si sugeridas possam ser conseguidas através de mudanças nos regulamentos. “É um assunto que temos que estudar”, diz.


Texto: Samuel Alemão


Os efeitos da Turistificação de Lisboa
Cada vez mais gente e menos lisboetas. Câmara entrega a gestão da habitação ao aluguer online de alojamento para férias

ANTÓNIO SÉRGIO ROSA DE CARVALHO
23 de Novembro de 2016, 9:45

Fernando Medina não acompanha a Imprensa internacional. Se o fizesse, ter-se-ia apercebido de uma avalanche de notícias na Imprensa local de Nova Iorque e de várias cidades Europeias sobre os efeitos perversos conjugados e interactivos da Turistificação desenfreada, da Globalização desmedida e da Gentrificaçào galopante na vida quotidiana dos habitantes locais nestas cidades.

Um clamor profundo, uma agitação permanente de insatisfação e um desejo urgente e imperativo de mudança, de regulamentos, de fiscalização e de liderança por parte dos habitantes, ameaça traduzir-se em consequências políticas, e faz acordar os autarcas.

Temos ouvido sobre as situações em Barcelona e Berlim e das condições impostas à AIRBNB que vão desde a proibição total na capital alemã até à imposição de um rigoroso regulamento na cidade da Catalunha.

Numa longa luta do Municipal com a Airbnb [aluguer de alojamento para férias], Nova Iorque quer agora proibir o aluguer de alojamentos através da AIRBNB por um período inferior a 30 dias. Medida destinada a proteger a cidade dos efeitos perversos das estadias curtas / low cost do turismo barato, massificado, predador e desinteressante. Densidade intensa de ocupação do espaço físico sem interesse económico e mais valias financeiras, a não ser, para os estabelecimentos também eles “predadores” do comércio tradicional, ou seja, “comes e bebes” e “quinquilharia” pseudoturística em dezenas de lojas asiáticas e afins.

A 6 de Outubro, o “Guardian” publicou um conjunto de três artigos sobre a interligação destes temas, tendo um deles sido dedicado à relação de Amsterdão com a AIRBNB.

Embora Amsterdão tenha imposto um regulamento claro à Airbnb, ocupação máxima de 60 dias por ano e o máximo de quatro pessoas por edifício, os efeitos sociais de descaracterização dos bairros têm sido devastadores. O investimento especulativo junto à forte subida do preço da habitação (também no aluguer a “expats” do mundo empresarial ) está a expulsar progressivamente os habitantes locais, transformando os bairros em plataformas rotativas e contínuas de “idas e vindas” de forasteiros híper individualizados e indiferentes aos locais, e a transformar os antigos bairros em locais alienados onde ninguém se conhece e onde reina o anonimato.

Amsterdão tem fiscalizado intensamente a ocupação através da Airbnb mas é confrontada com a recusa pela própria Airbnb de fornecimento de dados. Num espaço limitado fisicamente como a pitoresca Amsterdão, a invasão turística low-cost / aluguer Airbnb, está a levar a efeitos explosivos no trânsito, no comércio local onde pululam as lojas de vocação turística e de souvenirs e está a provocar uma avalanche de insatisfação traduzida em irritação ou animosidade explícita para com o turismo.

De tal forma que, muito recentemente, a autarquia fez um discurso explícito inteiramente dedicado a estes temas, onde anunciou uma atitude de exigência e fiscalização ainda mais rigorosa para com a Airbnb, medidas legislativas em conjunto com Haia que tornem possível a escolha do tipo de lojas a instalar em cada rua e uma atitude nítida de selecção do tipo de turismo, numa definição e escolha dirigida à clara diferenciação entre o turismo desejável e indesejável.

Numa entrevista publicada a 18 de Janeiro no PÚBLICO, o Director Ibérico da Airbnb anunciava orgulhoso: “A evolução em 2015 face ao ano anterior foi de 65%. Portugal está no 11.º lugar mundial em termos de anúncios na Airbnb, num ranking liderado pelos EUA. A Airbnb captou um milhão de pessoas em 2015.”

Orgulhoso, e claro, satisfeito. A Airbnb não está sujeita a qualquer tipo de regulamento, exigência ou fiscalização em Portugal. Mais. A AIRBNB colabora com a Autarquia e o Governo, de forma a que os impostos sejam cobrados ao Alojamento Local. Estes aumentaram.

Mas os efeitos devastadores são ignorados ou mesmo negados por Fernando Medina que se tem mostrado irónico ou furtivo sobre estes problemas fundamentais para o presente e o futuro estratégico da cidade de Lisboa.

Que este se torne o tema fundamental de discussão de todas as forças políticas em direcção às eleições autárquicas, é um imperativo. Não se trata de cor política, mas de um tema Universal de Ecologia Urbana e de equilíbrio salutar no organismo vivo que constitui uma verdadeira cidade.

A Turistificação desenfreada, a Globalização desmedida e a Gentrificação galopante estão a matar as cidades.

Historiador de Arquitectura

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