A dissolução do Bloco
Por Pedro Lomba HOJE no Público
O Bloco de Esquerda nasceu em 1998. Com esta distância, é seguro que foi um bom tempo para aparecer um partido com o seu perfil e ambição. O Bloco não teve uma, mas duas madrinhas. A primeira foi o Fim da História com que as democracias e os regimes capitalistas cantavam o seu triunfo sobre o comunismo. Eram tempos de arrependimento e migração. Caído o Muro de Berlim, o PCP tinha deixado de ser atractivo para uma multidão de arrependidos que desataram a formar grupos paralelos, pensando no que viria a seguir. Os jovens urbanos e educados, treinados no activismo estudantil, também precisavam de um novo poiso para se reunir.
A segunda figura paternal foi António Guterres. Centrista, católico, genericamente conservador nos costumes, o PS de Guterres não pretendia romper nas "causas sociais", deixando por isso livre o espaço à sua esquerda. As causas integravam as tendências ditas "pós-materialistas" que apelavam a um eleitorado "boémio burguês". Não podendo mudar a economia - na verdade, não dizendo nada de importante sobre o assunto -, lutava agora pelas minorias, pelo ambiente, pela liberalização disto e daquilo. O primeiro referendo da lei do aborto serviu de arranque.
O Bloco inicialmente cresceu. Foi ajudado nesse crescimento por redacções simpatizantes, o mundo das artes e algumas modas universitárias, sobretudo nas ciências sociais. E contou com o populismo estudado de Francisco Louçã, dentro e fora do Parlamento.
Há dez anos, toda a gente anunciava diariamente o fim do PCP e o reforço inevitável do Bloco de Esquerda. Profetizava-se que o PCP não iria resistir à morte de Álvaro Cunhal e estaria destinado a definhar. É claro que nada disso aconteceu. Depois de Carlos Carvalhas, o PCP foi buscar Jerónimo de Sousa e, talvez mais importante do que essa escolha, continuou a mobilizar os seus militantes com uma preparação e uma organização que o Bloco nunca conseguiu ter. O Bloco, formado por individualistas e diletantes, minimizou em absoluto a velha formação orgânica que os dirigentes do PCP aprenderam com a antiga União Soviética.
Em 2011, no meio de uma grave crise económica e com condições ideais, o Bloco averbou uma derrota fatal nas eleições legislativas. Reduziu o seu grupo parlamentar. Tornou-se cada vez mais irrelevante. Explicações? Não foi apenas Sócrates que lançou o anzol naquelas águas, deixando como herança um mini-Bloco dentro do PS. Foi sobretudo o Bloco que deixou de contar. Quando a economia estava em alta, o Bloco pôde prosperar. Com a economia em fanicos, o Bloco é visto como um brinquedo.
Entretanto, Louçã largou a liderança e criou um clube à parte. As duas facções internas, da UDP e do PSR, começaram a embicar. A chefia bicéfala não esconde a fraqueza. A demissão de alguns militantes mais conhecidos, ainda que sem peso interno no Bloco, confirma o seu esvaziamento. O Bloco deixou de federar quem quer que seja. Os próprios militantes já agem por conta própria.
Se António José Seguro não segura a esquerda do PS, o Bloco já não se segura a si mesmo. Está por isso toda a gente à espera do Syriza português. Mas o que poderá ser a variante doméstica do Syriza? Ou isso, ou um Beppe Grillo que saiba amealhar o voto de protesto. Não nos faltam agitadores para o cargo e não faltam votos de protesto para reunir. Mas já não serão para o Bloco de Esquerda. A História dele terminou.
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