Europa,
zona euro, Portugal. E agora?
Bolsas
em queda, subida das taxas de juro da dívida soberana nos mercados,
potenciais efeitos de abrandamento sobre o crescimento económico. É
este o cenário no dia seguinte.
DIOGO QUEIROZ DE
ANDRADE / JOÃO CÂNDIDO DA SILVA / OBSERVADOR / 6-7-2015
A primeira questão
que se coloca é se alguém vai atender Yannis Varoufakis quando este
telefonar para Bruxelas. Ainda antes do anúncio formal dos
resultados do referendo, já o ministro das Finanças grego afirmava
que ia ligar na manhã de segunda-feira para os parceiros de forma a
encontrar um “ponto comum”. A situação real da Grécia é pouco
menos que desesperada porque os bancos estão a ficar
descapitalizados e o Estado não tem dinheiro para fazer face às
exigências. Mas este resultado com mais de 60% de votos não dá ao
governo grego uma força maior para pelo menos exigir ser ouvido e
isso poderá ter peso na forma como os poderes centrais europeus se
relacionam com o Syriza.
Não é de esperar
que, como as coisas estão, o Eurogrupo aceda a fornecer mais
dinheiro aos bancos gregos. O governo grego já enviou ao BCE um
pedido formal para aumentar a liquidez de emergência, até porque as
reservas estão a esgotar-se rapidamente e sem depósitos novos os
cofres ficarão vazios. Ao mesmo tempo os bancos terão de ser
recapitalizados da mesma forma que em 2012, sendo que agora a
situação é mais preocupante – e urgente.
Depois de ter
falhado o pagamento de 1.6 mil milhões de euros ao Findo Monetário
Internacional (FMI) no último dia de junho, a Grécia tem de pagar
três mil milhões ao Banco Central Europeu (BCE) até dia 20. E esse
será um estímulo importante para que se chegue a negociações. Mas
os líderes europeus foram claros em repetir que um “não” no
referendo significaria o fim das conversas. De qualquer forma, até
dia 20 terá de existir uma ajuda de emergência que forneça
dinheiro à Grécia, mas o problema de fundo mantém-se.
O ministro das
Finanças alemão, Wolfgang Schäuble já deu a entender que poderá
existir um período probatório em que a Grécia fica numa espécie
de limbo económico, com assistência financeira que lhe permita
respirar. Seria a “quarentena” de que falou o ministro alemão, e
por isso será decisiva esta segunda-feira. Angela Merkel e François
Hollande vão amanhã reunir e tomar decisões fundamentais para o
futuro da Europa – e da Grécia. O que está em jogo é a
reestruturação da dívida grega e um novo resgate, que poderá
atingir 50 mil milhões de euros e a reestruturação da dívida
grega, se a perspetiva do FMI sobre o tema vingar, sendo que poucos
duvidam que ambos são fundamentais.
A chanceler alemã e
o presidente francês podem aceitar negociar com os gregos de forma
rápida e dar a Atenas a ajuda de que necessitam. Mas podem também
manter a linha dura, escudando-se nas regras rígidas que a União
Europeia tem, recusando abrir conversa e deixar a economia grega
colapsar em poucos dias. Hollande foi o político europeu que mais
tolerância demonstrou nesta semana, tendo Merkel ficado
cuidadosamente em silêncio – deixando em aberto as opções a
tomar esta segunda-feira. E, caso acedam a um corte na dívida, sabem
que estão a aceder a um corte na dívida de Portugal, Espanha e
Irlanda. E isto deverá ser (quase) impossível de aceitar pelas
economias do norte e até do leste europeu.
Turbulência nas
yields da dívida pública?
Há muita incerteza
no ar, mas há consequências que, no imediato, se podem vir a sentir
em Portugal. A desvalorização do euro nos mercados asiáticos faz
adivinhar novos tempos de turbulência nas taxas de juro da dívida
soberana, com as yields em alta. Isto significa que as próximas
emissões a colocar pelo Estado português poderão seguir a
tendência do mercado secundário e forçar os cofres do país a
pagarem mais pelos recursos financeiros que os gestores da dívida
portuguesa têm de ir buscar ao mercado.
O que pode salvar o
Estado português de se financiar a preços mais elevados? A tal
situação dos “cofres cheios” a que a ministra das Finanças
aludiu e que significa, apenas, que uma parte das necessidades de
financiamento da República Portuguesa está preenchida. A urgência
não é, assim, imediata, já que existe margem para esperar que a
tempestade passe, antes de se tornar imperativo o regresso às
emissões, sobretudo àquelas de longo prazo, onde a ponderação do
risco é mais cuidada e conservadora por parte dos potenciais
credores de Portugal.
Como escreveu Luís
Campos e Cunha, ex-ministro das Finanças, num artigo que foi
publicado no Observador, há, ainda, a questão do contágio sobre a
conjuntura económica portuguesa, nomeadamente sobre o ritmo de
crescimento, a taxa de desemprego nacional e oriundo do estrangeiro.
Tudo vai depender do grau de confiança na capacidade de o país
resistir à crise, o que, obviamente, está relacionado com aqueles
que serão os efeitos sobre as economias da zona euro e do conjunto
da União Europeia. Um arrefecimento entre os nossos principais
parceiros comerciais vai produzir efeitos em Portugal, que, embora
com um crescimento débil, estava a regressar a terrenos positivos,
com o desemprego a registar sinais de baixa.
Também é preciso
não ignorar o que poderá ser um novo acordo entre a Grécia e os
credores. Por um lado, uma reestruturação pode implicar perdas para
o Estado português que, durante o primeiro resgate à Grécia, fez
um empréstimo bilateral a Atenas no valor de 1,1 mil milhões de
euros. Uma parte, ou a totalidade desse dinheiro, pode nunca ser
reembolsado. E um segundo resgate tem a grande probabilidade de
deixar o FMI de fora, com o Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE) a
assegurar o dinheiro para manter a Grécia à tona de água.
Portugal tem uma
fatia de 2,49% no MEE, ou seja, num resgate que atinja o valor
sugerido pelo FMI, os tais 50 mil milhões de euros que assegurariam
as necessidades de financiamento da Grécia até 2018 — mais um ano
do que aquilo que foi pedido por Alexis Tsipras –, os cofres
portugueses prestarão garantias avaliadas em 1.225 milhões de
euros. Todos estes são cenários em que haja um acordo entre a
Grécia e os credores. Uma saída desordenada da Grécia da zona euro
poderá agravar os efeitos que já de anteveem.
Uma coisa parece
certa: as bolsas mundiais vão abrir em baixa nesta segunda-feira. E
Lisboa dificilmente escapará à onda negativa, provocada por
investidores que preferem largar ativos de risco e procurar refúgios
enquanto não houver uma clarificação sobre como vai acabar a crise
grega.
“Embora as
empresas e os bancos europeus tenham agora menos exposição à
Grécia do que em 2012, o sentimento de risk off (fuga aos ativos de
risco) deverá penalizar mais os operadores de turismo e o setor
financeiro, em termos setoriais”, escreve Steven Santos, gestor do
Banco BIG em nota de análise. “O setor financeiro, principalmente
na periferia, poderá mesmo registar o movimento [negativo] mais
acentuado”. Ainda assim, a disponibilidade do BCE – hoje
revalidada por um dos seus líderes – para avançar com medidas de
estímulo além das já existentes deverá conter as perdas nas ações
europeias.
Sem comentários:
Enviar um comentário