segunda-feira, 6 de julho de 2015

Europa, zona euro, Portugal. E agora? / OBSERVADOR


Europa, zona euro, Portugal. E agora?

Bolsas em queda, subida das taxas de juro da dívida soberana nos mercados, potenciais efeitos de abrandamento sobre o crescimento económico. É este o cenário no dia seguinte.

DIOGO QUEIROZ DE ANDRADE / JOÃO CÂNDIDO DA SILVA / OBSERVADOR / 6-7-2015

A primeira questão que se coloca é se alguém vai atender Yannis Varoufakis quando este telefonar para Bruxelas. Ainda antes do anúncio formal dos resultados do referendo, já o ministro das Finanças grego afirmava que ia ligar na manhã de segunda-feira para os parceiros de forma a encontrar um “ponto comum”. A situação real da Grécia é pouco menos que desesperada porque os bancos estão a ficar descapitalizados e o Estado não tem dinheiro para fazer face às exigências. Mas este resultado com mais de 60% de votos não dá ao governo grego uma força maior para pelo menos exigir ser ouvido e isso poderá ter peso na forma como os poderes centrais europeus se relacionam com o Syriza.

Não é de esperar que, como as coisas estão, o Eurogrupo aceda a fornecer mais dinheiro aos bancos gregos. O governo grego já enviou ao BCE um pedido formal para aumentar a liquidez de emergência, até porque as reservas estão a esgotar-se rapidamente e sem depósitos novos os cofres ficarão vazios. Ao mesmo tempo os bancos terão de ser recapitalizados da mesma forma que em 2012, sendo que agora a situação é mais preocupante – e urgente.

Depois de ter falhado o pagamento de 1.6 mil milhões de euros ao Findo Monetário Internacional (FMI) no último dia de junho, a Grécia tem de pagar três mil milhões ao Banco Central Europeu (BCE) até dia 20. E esse será um estímulo importante para que se chegue a negociações. Mas os líderes europeus foram claros em repetir que um “não” no referendo significaria o fim das conversas. De qualquer forma, até dia 20 terá de existir uma ajuda de emergência que forneça dinheiro à Grécia, mas o problema de fundo mantém-se.

O ministro das Finanças alemão, Wolfgang Schäuble já deu a entender que poderá existir um período probatório em que a Grécia fica numa espécie de limbo económico, com assistência financeira que lhe permita respirar. Seria a “quarentena” de que falou o ministro alemão, e por isso será decisiva esta segunda-feira. Angela Merkel e François Hollande vão amanhã reunir e tomar decisões fundamentais para o futuro da Europa – e da Grécia. O que está em jogo é a reestruturação da dívida grega e um novo resgate, que poderá atingir 50 mil milhões de euros e a reestruturação da dívida grega, se a perspetiva do FMI sobre o tema vingar, sendo que poucos duvidam que ambos são fundamentais.

A chanceler alemã e o presidente francês podem aceitar negociar com os gregos de forma rápida e dar a Atenas a ajuda de que necessitam. Mas podem também manter a linha dura, escudando-se nas regras rígidas que a União Europeia tem, recusando abrir conversa e deixar a economia grega colapsar em poucos dias. Hollande foi o político europeu que mais tolerância demonstrou nesta semana, tendo Merkel ficado cuidadosamente em silêncio – deixando em aberto as opções a tomar esta segunda-feira. E, caso acedam a um corte na dívida, sabem que estão a aceder a um corte na dívida de Portugal, Espanha e Irlanda. E isto deverá ser (quase) impossível de aceitar pelas economias do norte e até do leste europeu.

Turbulência nas yields da dívida pública?

Há muita incerteza no ar, mas há consequências que, no imediato, se podem vir a sentir em Portugal. A desvalorização do euro nos mercados asiáticos faz adivinhar novos tempos de turbulência nas taxas de juro da dívida soberana, com as yields em alta. Isto significa que as próximas emissões a colocar pelo Estado português poderão seguir a tendência do mercado secundário e forçar os cofres do país a pagarem mais pelos recursos financeiros que os gestores da dívida portuguesa têm de ir buscar ao mercado.

O que pode salvar o Estado português de se financiar a preços mais elevados? A tal situação dos “cofres cheios” a que a ministra das Finanças aludiu e que significa, apenas, que uma parte das necessidades de financiamento da República Portuguesa está preenchida. A urgência não é, assim, imediata, já que existe margem para esperar que a tempestade passe, antes de se tornar imperativo o regresso às emissões, sobretudo àquelas de longo prazo, onde a ponderação do risco é mais cuidada e conservadora por parte dos potenciais credores de Portugal.

Como escreveu Luís Campos e Cunha, ex-ministro das Finanças, num artigo que foi publicado no Observador, há, ainda, a questão do contágio sobre a conjuntura económica portuguesa, nomeadamente sobre o ritmo de crescimento, a taxa de desemprego nacional e oriundo do estrangeiro. Tudo vai depender do grau de confiança na capacidade de o país resistir à crise, o que, obviamente, está relacionado com aqueles que serão os efeitos sobre as economias da zona euro e do conjunto da União Europeia. Um arrefecimento entre os nossos principais parceiros comerciais vai produzir efeitos em Portugal, que, embora com um crescimento débil, estava a regressar a terrenos positivos, com o desemprego a registar sinais de baixa.

Também é preciso não ignorar o que poderá ser um novo acordo entre a Grécia e os credores. Por um lado, uma reestruturação pode implicar perdas para o Estado português que, durante o primeiro resgate à Grécia, fez um empréstimo bilateral a Atenas no valor de 1,1 mil milhões de euros. Uma parte, ou a totalidade desse dinheiro, pode nunca ser reembolsado. E um segundo resgate tem a grande probabilidade de deixar o FMI de fora, com o Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE) a assegurar o dinheiro para manter a Grécia à tona de água.

Portugal tem uma fatia de 2,49% no MEE, ou seja, num resgate que atinja o valor sugerido pelo FMI, os tais 50 mil milhões de euros que assegurariam as necessidades de financiamento da Grécia até 2018 — mais um ano do que aquilo que foi pedido por Alexis Tsipras –, os cofres portugueses prestarão garantias avaliadas em 1.225 milhões de euros. Todos estes são cenários em que haja um acordo entre a Grécia e os credores. Uma saída desordenada da Grécia da zona euro poderá agravar os efeitos que já de anteveem.

Uma coisa parece certa: as bolsas mundiais vão abrir em baixa nesta segunda-feira. E Lisboa dificilmente escapará à onda negativa, provocada por investidores que preferem largar ativos de risco e procurar refúgios enquanto não houver uma clarificação sobre como vai acabar a crise grega.


“Embora as empresas e os bancos europeus tenham agora menos exposição à Grécia do que em 2012, o sentimento de risk off (fuga aos ativos de risco) deverá penalizar mais os operadores de turismo e o setor financeiro, em termos setoriais”, escreve Steven Santos, gestor do Banco BIG em nota de análise. “O setor financeiro, principalmente na periferia, poderá mesmo registar o movimento [negativo] mais acentuado”. Ainda assim, a disponibilidade do BCE – hoje revalidada por um dos seus líderes – para avançar com medidas de estímulo além das já existentes deverá conter as perdas nas ações europeias.

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