O
que se passou de errado no combate ao fogo em S. Pedro do Sul? MAI
vai investigar
ANA HENRIQUES e SANDRA
RODRIGUES 15/08/2016 – 14:03
“Durante quatro dias
estivemos esquecidos", diz presidente da câmara.
Primeiro-ministro ouviu queixa, que considerou ser "fundamentada
e sustentada"
O primeiro-ministro, António
Costa, revelou que o Ministério da Administração Interna abriu um
inquérito para apurar o que se passou de errado no combate ao fogo
em S. Pedro do Sul.
Em Arouca, onde esteve reunido
com vários presidentes de câmara dos concelhos afectados pelas
chamas, o chefe do Governo disse só ter registado, até agora, uma
“queixa fundamentada e sustentada sobre algo que necessita de
inquérito” nos combate aos fogos deste Verão: a mobilização dos
meios de resposta no início daquele incêndio, que ainda não se
encontra extinto, apesar de lavrar há vários dias.
António Costa explicou que o
problema foi suscitado pelo presidente da Câmara de S. Pedro do Sul,
Vítor Figueiredo, com quem também esteve reunido em Arouca, e que
foi na sequência dessa queixa que “o Ministério da Administração
Interna levantou um inquérito” sobre o que terá corrido mal.
O autarca exige que sejam
apuradas responsabilidades pelos quatro dias em que o fogo esteve
“esquecido” no concelho. E na reunião com o primeiro-ministro,
pediu para que fossem investigadas eventuais falhas no ataque
inicial, uma vez que começou por contar "apenas cerca de 30 ou
40 voluntários" para uma frente de incêndio "quase com 16
quilómetros". “Não posso admitir nem aceitar que não se
apurem responsabilidades”, disse a António Costa.
Segundo Vítor Figueiredo,
“tudo indica” que poderá ter havido um “esquecimento” por
parte das autoridades da protecção civil devido à localização do
concelho e à origem das chamas. “O fogo foi sempre pertença do
distrito de Aveiro. No distrito de Viseu existiam outros incêndios.
Foi uma altura em que havia muitos fogos nos dois distritos. A
conclusão a que chego é que, sendo um fogo originário de Aveiro, e
como S. Pedro do Sul está na fronteira entre os dois distritos,
houve esquecimento de ambas as partes”, acusou. O autarca lembra
que nos primeiros dias as chamas apenas estiveram a ser combatidas
pelos bombeiros locais, num número entre 20 a 30 efectivos, e que “o
fogo deveria ter sido combatido a tempo e horas e isso não
aconteceu”. “Só na sexta-feira, quando tomou proporções
gigantescas é que foi dada outra atenção”, lamentou.
“Durante quatro dias
estivemos efectivamente ali esquecidos. Pedi para que abrissem o
inquérito e agora vamos ver quem poderá ter responsabilidades na
matéria, porque o que se pretende é que aquilo que se passou em S.
Pedro do Sul não volte a acontecer no país”, disse também Vítor
Figueiredo. Contactada pelo PÚBLICO, a Autoridade Nacional da
Protecção Civil escusou-se a comentar estas declarações, alegando
que a prioridade neste momento é apagar os incêndios em curso e
remetendo qualquer explicação para o Ministério da Administração
Interna - que também se recusou a reagir às declarações de Vítor
Figueiredo.
Entretanto, o presidente da
Câmara de Arouca, José Artur Neves, estimou em mais de 120 milhões
de euros os prejuízos directos do incêndio que fustigou aquele
concelho do distrito de Aveiro na última semana, e que alastrou
depois a S. Pedro do Sul. A maior parte deste valor, mais de 117
milhões, tem a ver com os prejuízos nas actividades ligadas à
fileira florestal, com 12 mil hectares de eucalipto e cinco mil de
pinheiro que arderam e os custos em novas plantações.
"Cinquenta e oito por
cento da nossa floresta ficou destruída e isso acarreta um prejuízo
imenso, ainda por cima com a agravante de que as celuloses não estão
a receber madeira queimada", disse o autarca, citado pela
agência Lusa, adiantando que a floresta é um dos pilares da
economia do município. O presidente da Câmara referiu ainda que
1185 cabeças de gado não vão ter onde pastar nos próximos sete
meses, porque quase toda a área de pastoreio na serra ardeu.
"Cinquenta e sete
famílias que estão dependentes do pastoreio dos animais não têm
agora que dar de comer aos animais", lamentou o autarca,
referindo que se não tiverem apoio terão de vender os animais e
abandonar as aldeias da serra. José Artur Neves destacou ainda os
prejuízos no sector do turismo, estimando em 4,5 milhões de euros
os custos para a economia local até ao final do ano – valor que
inclui o investimento necessário para recuperar os cerca de 600
metros dos Passadiços do Paiva que arderam, uma das principais
atracções turísticas do concelho.
"O que aconteceu tem
reflexos muito negativos na imagem do próprio território que é
Geopark mundial da Unesco", afirmou o autarca, adiantando que
será necessário recuperar 89% da Rede Natura de Arouca, que foi
dizimada, incluindo flora e vegetação autóctones seculares, que
desapareceram.
O primeiro-ministro admitiu
que a legislação comunitária não dará cobertura a alguns destes
prejuízos, tendo adiantado que estão a ser activadas pelo Governo
linhas de apoio à reposição das capacidades de produção
agrícola. “Também está a ser feito um levantamento para apurar o
que será preciso mobilizar no âmbito do fundo de emergência do
Ministério da Administração Interna”, adiantou.
António Costa frisou que a
prioridade agora é "repor a economia destes concelhos a
funcionar e em particular dos agricultores" e pensar no
reordenamento da floresta, de forma a prevenir que situações destas
venham a ocorrer no futuro. Para o primeiro-ministro, é preciso
"reforçar os poderes dos municípios e pôr termo à
liberalização da forma como têm sido feitos os plantios",
para que uma floresta "mais ordenada, mais sustentável" se
torne "uma fonte de valorização do território, de rendimento,
que contribua para o crescimento da economia", e não volte a
ser "uma ameaça às populações, aos seus bens e à
segurança".
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