Ministro
suspendeu polémico corte de freixos em Marvão
A
empresa pública Infra-estruturas de Portugal ordenou o abate de dez
árvores centenárias na estrada “mais bonita de Portugal”. O
município alega que não foi informado da decisão.
CARLOS DIAS 14 de
Fevereiro de 2017, 15:48
Cumprindo uma
decisão da empresa pública Infra-estruturas de Portugal (IP), um
grupo de trabalhadores procedeu na manhã de segunda-feira ao corte
de sete dos dez freixos (Fraxinus angustifolia Vahl), que estavam
sinalizados para abate, no lugar de São Salvador da Aramenha na
Estrada 246-1, que liga Marvão a Castelo de Vide. A operação foi
“autorizada pelo ICNF [Instituto da Conservação da Natureza e das
Florestas]”, referiu ao PÚBLICO o porta-voz da IP.
A decisão suscitou
o protesto da Câmara de Marvão, que diz não ter sido informada. A
intervenção, entretanto, foi suspensa por ordem do ministro do
Planeamento e Infra-estruturas, Pedro Marques. O governante foi
alertado para o abate das árvores pelo vereador na Câmara de Marvão
(PSD), José Manuel Pires, e pelo deputado socialista Luís Testa,
eleito pelo círculo de Portalegre.
Quando a ordem de
suspensão chegou, tinham sido cortados sete freixos do "Túnel
das Árvores", como é conhecido o friso de árvores pintadas
com cal branca que ladeiam, ao longo de cerca de um quilómetro, o
troço de estrada “mais bonito de Portugal”.
Os freixos foram
sinalizados para abate por se encontrarem “decrépitos, em mau
estado de conservação e sem qualquer possibilidade de recuperação”
e “constituírem um perigo iminente para a segurança rodoviária”,
refere a IP. E acrescenta que nos exemplares abatidos foram
identificadas “algumas patologias resultantes de danos causados nos
troncos por colisão das cargas de veículos pesados, de problemas
fitossanitários provocados por fungos e de alterações na orografia
dos terrenos contíguos à estrada, originando alteração drástica
dos níveis freáticos.”
A empresa pública
diz ter “solicitado ao Parque Natural de S. Mamede, que integra o
ICNF, autorização para abate de dez freixos" e que foi
igualmente solicitada “autorização” para a poda de manutenção
e limpeza nas restantes árvores da EN 246-1 entre Castelo de Vide e
Marvão.
A IP garante ainda
ter informado o Parque Natural de S. Mamede, que entre os dias 8 e 10
de Fevereiro procederia aos trabalhos de poda de manutenção e no
dia 13 de Fevereiro procederia ao abate dos freixos.
Nos esclarecimentos
prestados ao PÚBLICO, o presidente da Câmara de Marvão, Vítor
Frutuoso, confirma que os freixos estavam sinalizados para abate, “há
algum tempo”, mas salientou ter contactado as “entidades
competentes” para que “houvesse alguma coerência na
intervenção”. O autarca refere ter reclamado junto da IP e do
ICNF um diagnóstico “muito rigoroso” de cada uma das árvores,
assumindo o município os encargos dessa intervenção.
Neste sentido, o
município chegou a contactar uma empresa especializada na
conservação e tratamento de árvores, propondo a realização de um
estudo da totalidade do conjunto arbóreo, para definir medidas de
intervenção concretas para cada um dos freixos.
"A nossa
proposta foi ignorada”, afirma o autarca, exigindo que a “decisão
tomada pela Infra-estruturas de Portugal seja analisada, para apurar
responsabilidades por eventuais precipitações nas medidas
adoptadas.”
Vítor Frutuoso já
ordenou aos serviços municipais que indagassem onde se encontra o
depósito do material lenhoso, resultante do abate dos sete freixos,
para tentar confirmar se o seu derrube se justificava, frisando ter
tido uma conversa com o presidente do ICNF sobre a importância de
conhecer o estado vegetativo das árvores e que este “mostrou
vontade em analisar” a proposta do município de Marvão.
Tendo em
consideração que este património está inserido no concelho de
Marvão e está classificado como sendo de interesse público desde
1997, o autarca recorda que, em Fevereiro de 2015, chegou a estar
programada uma intervenção no “Túnel das Árvores”, mas que
foi suspensa pela então presidente do ICNF, Paula Sarmento, por se
entender que a solução “enfermava de um diagnóstico pouco
cuidado”, face à importância que o referido conjunto tem para
toda a região.
Refere ainda que
houve da parte da IP “uma certa forma de ultrapassar o município,
criticando a opção de desviar o trânsito por uma estrada municipal
que “não foi projectada para receber viaturas de grande porte”,
sem que houvesse o cuidado de informar a Câmara de Marvão.
Vítor Frutuoso
admite que possam existir árvores que já não seja possível
recuperar, mas outras “ainda poderão, eventualmente, ser
preservadas através de tratamento adequado". Todavia, o
problema de fundo mantém-se. “Estamos perante um troço
complicado”, ladeado por linhas de freixos e onde dois carros
pesados “não cabem”, salienta o autarca. Defende a construção
de um troço alternativo, que teria pouco mais de um quilómetro de
extensão “e que não teria um custo elevado”. Esta solução,
assinala o autarca, para além de garantir a segurança do tráfego
rodoviário, poderia salvaguardar o património natural com centenas
de freixos que embelezam o troço de estrada “mais bonito de
Portugal”.
O PÚBLICO solicitou
esclarecimentos ao ICNF, mas até à hora de publicação desta
notícia não teve resposta.
COMUNICADO DA
QUERCUS
Quercus
exige apuramento de responsabilidades e divulgação de pareceres
técnicos que levaram à intervenção realizada
Na sequência de
várias denúncias, a Quercus foi alertada para um corte de árvores
que se estava a realizar na Estrada Nacional 246-1, junto à
localidade da Portagem, concelho de Marvão, distrito de Portalegre,
mais em concreto num local conhecido como “Túnel das árvores”
ou “Alameda dos Freixos”. Tendo-se deslocado ao local, verificou
que apesar dos trabalhos de corte se encontrarem interrompidos devido
aos protestos dos populares e da Autarquia de Marvão, tinham já
sido cortados pela empresa pública, Infraestruturas de Portugal,
sete freixos (Fraxinus angustifólia Vahl) adultos de grande porte,
com a justificação que se encontrariam em mau estado de
conservação. Verificou também que era intenção inicial da
empresa cortar mais alguns exemplares desta espécie, já sinalizados
previamente.
O local onde
decorreu este abate está integrado no Parque Natural da Serra de São
Mamede e devido à sua singularidade paisagística, é um autêntico
cartão de visita da região, constituindo-se como um património
natural e cultural que tem sido conservado pelas populações ao
longo dos anos. Os cerca de 300 freixos centenários foram
inclusivamente classificados como árvores de interesse público,
pela sua dimensão e conjunto, que segundo a ficha de caracterização
oficial, forma uma “magnífica alameda de altos e frondosos
freixos”.
Face ao sucedido, e
uma vez que estamos na presença de operações de duvidosa
legalidade e oportunidade, a Quercus solicitou de imediato
esclarecimentos à Infraestruturas de Portugal, tendo em vista o
apuramento de responsabilidades decorrente deste abate de árvores.
Dado que, segundo foi possível verificar no local, algumas das
árvores abatidas, e outras sinalizadas para abate, não apresentavam
quaisquer sinais de má conservação ou perigo para a segurança
pública, a Quercus exige que sejam divulgados os pareceres técnicos
que levaram à intervenção realizada.
Uma vez que
infelizmente são recorrentes as situações em que árvores junto às
vias públicas são abatidas sem justificação ou segundo critérios
muito duvidosos, a Quercus vem exigir ao Governo, e em especial ao
Ministério do Planeamento e das Infraestruturas que tutela a empresa
Infraestruturas de Portugal, uma atuação mais firme e responsável,
de modo a que árvores saudáveis não sejam abatidas sem razões
válidas e sem a ponderação de outras alternativas mais adequadas.
Lisboa, 14 de
Fevereiro de 2017
A Direção Nacional
da Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza
A Direção do
Núcleo Regional de Portalegre da Quercus – Associação Nacional
de Conservação da Natureza
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