sábado, 27 de julho de 2013

"Espera-se de uma ministra de Estado que dê uma resposta política clara e não que se defenda atrás de subterfúgios." "Se fôssemos protestantes os casos seriam preocupantes, mas como católicos culturais os portugueses absolvem facilmente."

As escolhas de Maria Luís

A ministra das Finanças está a enfrentar a crise dos swaps como se ainda fosse secretária de Estado
Há duas linhas argumentativas em confronto no caso da ministra de Estado das Finanças e dos contratos swap. Uma diz-nos que Maria Luís Albuquerque faltou à verdade sobre a informação que lhe foi transmitida pelo anterior Governo sobre os swaps, agiu demasiado tarde, com prejuízos para o Estado que poderiam ter sido evitados e deve sair. A outra diz-nos que o mais importante é lembrarmos que os contratos swap são da responsabilidade do Governo de José Sócrates e que os socialistas não têm o direito a fazer o papel de virgens ofendidas, até porque foi este Governo que estancou o problema. A realidade é mais complexa. Se é verdade que o problema dos swaps vem do tempo de Teixeira dos Santos, o que está agora em questão é se Maria Luís Albuquerque faltou ou não à verdade e se agiu ou não atempadamente. A ministra defendeu-se afirmando primeiro que a informação não constava da pasta de transição. Depois, na quinta-feira, após terem sido divulgados os e-mails trocados com o antigo director-geral do Tesouro, veio afirmar que a informação era insuficiente para compreender a dimensão total do problema. Em ambos os casos, Maria Luís respondeu de forma técnica, fechando o universo da resposta. Limitando-o à "pasta de transição", excluiu outras fontes, apenas para sublinhar que não faltara à verdade. Mas o que precisávamos de saber era a que informação a ministra tivera acesso e não a forma como tivera acesso. Ao referir posteriormente que não tinha dados para compreender a dimensão total do problema, não nos está a dizer que os elementos que tinha eram suficientes para suscitar preocupações. Isto porque os e-mails divulgados na quinta-feira mostram que a ministra sabia, em Julho de 2011, da existência de dois casos em que havia o risco de os contratos serem cancelados, o que obrigaria ao reembolso imediato dos bancos pelo Estado.
Maria Luís Albuquerque pode ter sido suficientemente hábil para não poder ser acusada de ter mentido taxativamente (como faz a oposição), mas foi omissa nas suas respostas. Maria Luís Albuquerque pode sempre argumentar, sem dúvida, que foram os socialistas quem criou o problema (embora os contratos swap não fossem vistos como tão maléficos à época, a ponto de a própria Maria Luís Albuquerque ter celebrado alguns enquanto gestora da Refer) e este Governo quem o resolveu. Mas mesmo esse crédito político ficou diminuído pela forma como a ministra está a gerir esta situação. Espera-se de uma ministra de Estado que dê uma resposta política clara e não que se defenda atrás de subterfúgios. Maria Luís Albuquerque está a enfrentar a sua primeira crise como ministra das Finanças como se ainda fosse secretária de Estado. Até pode ter agido correctamente nos meandros técnicos dos swaps, mas parece não se ter apercebido de que o seu nível de responsabilidade agora é outro. E que este dossier não abonou a favor da credibilidade de quem tem pela frente desafios fundamentais para o país.


Governo renasce ensombrado pelo caso dos contratos swaps

Oposição em bloco pede demissão de Maria Luís Albuquerque e acusa a ministra de "mentir" no Parlamento. Ao mesmo tempo, a remodelação concluía- -se com os novos secretários de Estado
No dia em que o Governo completava a sua remodelação, a ministra das Finanças compareceu perante os jornalistas ao lado do novo ministro da Economia, Pires de Lima, e do secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Paulo Núncio, ambos do CDS, na apresentação da reforma do IRC, que esteve a cargo de António Lobo Xavier (ver pág. 2). Enquanto os centristas respondiam sobre uma possível redução da taxa máxima do IRC já no próximo ano e valorizavam o investimento, Maria Luís Albuquerque prometia dar mais esclarecimentos sobre o caso dos swaps (contratos de alto risco). A conferência de imprensa reflectiu uma imagem de embaraço de todo o executivo perante um caso em que a ministra é acusada por toda a oposição de mentir numa comissão parlamentar de inquérito.
A "monumental mentira", como lhe chamou Carlos Zorrinho, líder parlamentar do PS, é insustentável para a nova ministra, que "perdeu as condições para permanecer no cargo". O passo à frente dado pelo PS é dado um dia depois de o gabinete do primeiro-ministro ter expressado "toda a confiança" na ministra, após a divulgação de uma troca de mensagens de correio electrónico nas quais a ministra teve acesso a informação sobre contratos no sector empresarial público, indicando uma perda potencial de 1,5 mil milhões de euros.
"Estamos a pedir a demissão desta ministra por razoes éticas", afirmou Carlos Zorrinho em conferência de imprensa no Parlamento, apelando ao primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, para "apreciar a incompatibilidade ética de esta ministra permanecer em funções".
Para os socialistas o que está em causa é o facto de Maria Luís Albuquerque ter afirmado que, na transição de pastas do Governo anterior para o actual, não lhe foi passado qualquer documento sobre os contratos de risco financeiro swaps. "Sabe-se agora que, no próprio dia em que tomou posse, 28 de Junho de 2011, a então secretária de Estado do Tesouro e Finanças tratou do tema em encontro com o director-geral do Tesouro e Finanças, que, logo no dia seguinte, lhe deu a primeira informação solicitada sobre a matéria", frisou Carlos Zorrinho.
O líder parlamentar socialista critica a ministra por acusar o anterior Governo de nada ter feito sobre este tipo de instrumentos, quando o executivo de Sócrates aprovou legislação em 2009 que "permitiu que, pela primeira vez, a realidade dos swaps viesse a constar dos relatórios das empresas públicas, aprovados nos primeiros meses de 2011".
O pedido de demissão é apoiado pelo PCP e pelo BE. "Entendemos que um governante que mente ao Parlamento não tem condições para continuar no Governo. Nesse sentido exigimos a demissão de Maria Luís Albuquerque", declarou o deputado Paulo Sá, em conferência de imprensa, no Parlamento. A bancada comunista quer que a ministra volte a ser ouvida até ao fim deste mês. A falta à verdade é também a acusação lançada pelo BE. "Nunca sabemos a verdade pela boca da ministra e uma ministra das Finanças que não fala verdade, que mente sobre as suas responsabilidades, não pode continuar a ser ministra", disse João Semedo, coordenador do partido, que reiterou a "indecência" da nomeação de Rui Machete para ministro dos Negócios Estrangeiros por causa das ligações ao BPN.
Críticas ao consenso com PS
A sétima remodelação e a mais profunda que Passos Coelho concretizou no Governo ficou ontem concluída com a tomada de posse dos novos secretários de Estado e os 11 que foram reconduzidos. Na equipa de Rui Machete só José Cesário se manteve com a pasta das Comunidades. Entraram Luís Campos Ferreira, deputado do PSD e que até agora presidia à Comissão parlamentar de Obras Públicas e Transportes, para o lugar de um ex-jornalista. Francisco de Almeida Leite saiu da equipa, três meses depois de ter entrado. Para os Assuntos Europeus entra um assessor político de Passos Coelho rodeado de alguma polémica. Bruno Maçães, em Abril deste ano, desvalorizou o conceito de consenso e criticou qualquer aproximação do Governo para um entendimento aberto com o PS. Isto, apesar de, no seu currículo enviado às redacções (numa versão única em inglês), ter entre as suas funções a de escrever discursos ao primeiro-ministro e a de ter responsabilidades nas "negociações políticas" com o PS.
"Se convidar o Partido Socialista para um consenso sem condições, o Governo estará a fazer apenas uma coisa: a oferecer a credibilidade e autoridade que Seguro nunca foi capaz de conquistar sozinho. E essa nova credibilidade será apenas a plataforma a partir da qual o Partido Socialista fará as mesmas críticas e lançará os mesmos ataques, numa posição potencialmente mais forte", escreveu num blogue disponível no site do Expresso. Uma posição que se torna relevante quando o Governo se prepara para retomar os pontos de entendimento a que chegou com o PS nas negociações para o compromisso de "salvação nacional" que terminaram sem acordo. As questões europeias constituem boa parte das convergências desde sempre entre PSD e PS.
O nome de Agostinho Branquinho para a secretário de Estado da Segurança Social causou perplexidade na maioria. A escolha deste militante do PSD de longa data provocou estranheza não só pela ligação recente à Ongoing, mas também por não ser conhecido trabalho na área social, à excepção dos últimos meses em que esteve na Santa Casa da Misericórdia do Porto.
Os dois secretários de Estado que trabalhavam com Paulo Portas no Palácio das Necessidades transitaram com ele. Mas ontem ainda não estava decidido onde fica a tutela da diplomacia económica.


Se fôssemos protestantes os casos seriam preocupantes, mas como católicos culturais os portugueses absolvem facilmente.
Ministros-problema
Por Eduardo Oliveira Silva
publicado em 27 Jul 2013 in (jornal) i online
Se fôssemos protestantes os casos seriam preocupantes, mas como católicos culturais os portugueses absolvem facilmente.
A 21 de Junho escrevia-se, exactamente neste espaço, que Maria Luís Albuquerque não tinha condições para se manter como secretária de Estado do Tesouro por causa da questão dos swaps, da sua relação com eles na REFER e por não ter esclarecido o tema depois de tomar posse, pois tinha de o conhecer na dupla condição profissional e política.

Obviamente, ninguém ligou nenhuma ao que foi escrito e, pouco mais de um mês depois, Maria Luís já não é simplesmente secretária de Estado, mas ministra de Estado e das Finanças, o que é um número de furos hierárquicos bastante acima.

Hoje a situação de Maria Luís é a mesma mas agravada porque há provas de ter recebido informação detalhada sobre a matéria oriunda dos serviços do ministério, ao contrário do que disse na Assembleia em comissão de inquérito, o que pode configurar várias coisas: uma falta à verdade, uma inverdade (palavra recentemente introduzida na gíria política, julga-se que por Ângelo Correia) ou uma mentira.

A situação é, em rigor, insustentável, e até já o PS que nestas coisas usa de prudência pediu a demissão da ministra, juntando a voz ao PCP e ao Bloco de Esquerda.

Pode portanto reafirmar-se agora e com mais convicção ainda o que foi dito em Junho: Maria Luís Albuquerque não tem condições para estar no governo.

Sabe-se porém que Pedro Passos Coelho é um político determinado e de convicções firmes. Não há que esperar dele qualquer alteração apesar de tudo o que se passou num mês, o que desde logo se prova pelo facto de ter promovido Maria Luís.

Da parte da ministra é certo também que se manterá impávida e serena nas suas funções, contando com o velho hábito nacional de que tudo se esquece num ápice e de que a consciência não é propriamente um empecilho.

E há nisso uma analogia comportamental entre Albuquerque e Machete. É certo que ela vive uma crise diária, enquanto ele julgava ter ultrapassado incólume o caso SLN/BPN. Não foi o caso, porque ainda levou uns salpicos tardios quando se soube que ia para ministros dos Negócios Estrangeiros. Apesar disso, é de apostar singelo contra dobrado que o assunto morre rapidamente, porque Machete conta com muita condescendência oriunda do chamado centrão.

Assim sucedeu até com Franquelim Alves, que entrou para o governo rodeado de uma gritaria que durou meia dúzia de dias e agora saiu sem ninguém dar por isso, e no caso dele havia ainda menos razões para tentar responsabilizá-lo pelo que quer que fosse no banco de Oliveira Costa.


Dentro de duas ou três semanas este caso Machete já deverá ter sido novamente sepultado, enquanto o dossier swap/Maria Luís se deverá ir arrastando com picos pontuais e estridentes, mas destituídos de qualquer efeito prático.


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