terça-feira, 23 de julho de 2013

Pressão americana atrasa nova lei de protecção de dados na União Europeia.

Os alemães têm-se manifestado junto às instalações da Agência de Segurança Nacional dos EUA perto de Darmstadt, na Alemanha

Pressão americana atrasa nova lei de protecção de dados na União Europeia
Por Alexandre Martins
23/07/2013 in Público
Mais de 4000 emendas apresentadas por deputados europeus põem em risco aprovação antes das eleições de 2014. Algumas são copiadas de documentos enviados por empresas como eBay e Facebook

O Parlamento Europeu está a travar uma batalha contra o tempo para aprovar a nova legislação de protecção de dados antes das eleições de 2014. O número recorde de emendas - muitas delas a reflectir argumentos defendidos por empresas tecnológicas norte-americanas - pode fazer cair o processo em cima das secretárias dos futuros deputados, o que tornaria ainda mais difícil o cumprimento do calendário: a entrada em vigor de uma regulamentação europeia sobre a protecção dos dados de cidadãos, empresas e organismos públicos em 2016.

Para além do objectivo de substituir uma directiva aprovada em 1995 - numa era anterior ao aparecimento das redes sociais online, por exemplo -, a proposta de regulamento europeu para a protecção de dados assumiu uma nova importância após as revelações do analista informático Edward Snowden sobre os programas de vigilância da Agência de Segurança Nacional norte-americana. O debate sobre o registo e armazenamento de dados em larga escala ultrapassou as fronteiras dos Estados Unidos e chegou à Europa e à América Latina nas últimas semanas, com novas revelações sobre o alcance dos programas de espionagem em países como a Alemanha ou o Brasil.

Ainda ontem, em entrevista ao jornal espanhol El País, a comissária europeia da Justiça, Direitos Fundamentais e Cidadania, Viviane Reding, admitia nunca ter visto "um lobby tão poderoso" como o do Governo e de empresas norte-americanas com vista à introdução de emendas nas propostas de leis europeias sobre protecção de dados.

"Os lobbies tinham dez vezes mais colaboradores do que a minha equipa. Houve centenas de despachos de advogados e de representantes pagos pelas grandes empresas", disse Viviane Reding, quando questionada sobre se ela própria se tinha reunido com elementos de grupos de pressão que defendem interesses dos Estados Unidos.

Contactado pelo PÚBLICO, o deputado europeu independente Rui Tavares diz mesmo que "há emendas que são ipsis verbis" propostas que figuram em documentos enviados por empresas a membros do Parlamento Europeu.

"Debilidade da democracia"

A comparação entre as propostas de empresas como a Microsoft, Facebook e eBay e as emendas de deputados europeus pode ser testemunhada no siteLobbyPlag.eu, mantido por um grupo de jornalistas e programadores alemães. A ideia surgiu no início do ano, depois de Max Schrems, o estudante austríaco que levou o Facebook a tribunal por violação de privacidade, ter descoberto que "vários segmentos das petições dos lobbies foram copiados palavra por palavra para as emendas", disse um dos fundadores, Richard Gutjahr, em declarações à Euronews, em Fevereiro.

O deputado Rui Tavares diz-se "testemunha quase directa da muita actividade na entrega de emendas" - mais de 4000 - e reconhece que a equipa do relator Jan Philipp Albrecht está "assoberbada". Não faz previsões, mas afirma que, se o regulamento não for aprovado antes das eleições de 2014, "será um golpe muito fundo" e "uma enorme vitória destes lobbies".

Para Rui Tavares, a culpa é das "debilidades da democracia europeia" e a solução passa por "reforçar a permeabilidade da União Europeia aos cidadãos", porque "os deputados, por si só, não dominam todos os assuntos". Para além da falta de "regras claras" sobre a actividade dos grupos de pressão, o deputado do Parlamento Europeu considera que as instituições europeias "não ajudam os cidadãos a terem um poder de fogo tão grande como o que têm essas empresas".


 Espiões alemães "cúmplices" da NSA
23/07/2013
A polémica dos programas de espionagem revelados pelo norte-americano Edward Snowden começa a contaminar o ambiente político na Alemanha, a dois meses das eleições legislativas. A revista Der Spiegel revelou ontem novos documentos, em que diz ter encontrado provas de que os serviços secretos alemães têm colaborado activamente com as agências norte-americanas, pondo em causa as declarações oficiais da chanceler Angela Merkel. Segundo a revista, a Alemanha não só colabora com os EUA no registo de dados de comunicações de cidadãos alemães, como usa um sistema chamado XKeyscore, criado pela Agência de Segurança Nacional norte-americana e que permite "captar os conteúdos das comunicações". O líder dos sociais-democratas e principal adversário de Merkel, Peer Steinbrück, afirmou que as notícias "confirmam a impressão de que ou o Governo fingiu ignorância, mantendo silêncio sobre a sua cumplicidade, ou os serviços secretos não têm controlo". "Este é um assunto que diz respeito às bases da nossa democracia e do nosso Estado constitucional", clamou o líder dos sociais-democratas.
Tribunal dá luz verde à NSA para continuar a espiar
Por Sérgio Soares
publicado em 23 Jul 2013 in (jornal) i online
Tribunal secreto renova autorização que permite à agência colectar metadados e interceptar comunicações
Tem fotos no Facebook, Flickr, vídeos no YouTube ou enviou mensagens particulares no Gmail ou no Skype? Não se preocupe. Elas ficarão guardadas para a eternidade graças à NSA, uma agência secreta americana que desde 2001 recolhe todo o tipo de metadados disponíveis através de espionagem das comunicações.

A obsessão com a vigilância sobre as pessoas e instituições privadas era no passado a marca de água dos estados autoritários e totalitários. Com a actividade da Agência Nacional de Segurança (NSA), a única superpotência democrática do mundo faz espionagem sobre milhões de norte-americanos e intercepta milhares de milhões de comunicações diárias dos cidadãos de países amigos e aliados, sob o manto diáfano do 9/11, ou seja, prevenir o terrorismo internacional.

Nos Estados Unidos, um tribunal secreto criado para julgar e produzir legislação à medida para combater o terrorismo, o Foreign Intelligence Surveillance Court (FISC), baseou-se numa lei desconhecida do público que justifica a continuação da recolha de metadados de praticamente todos os americanos, algo que nem sequer ao descrever os perigos do totalitarismo da União Soviética de Estaline, o livro "1984", a profecia terrífica de George Orwell, conseguia antever.

Segundo o "Wall Street Journal", o tribunal especial renovou o período de vigilância da NSA com base numa nova interpretação do significado da palavra "relevante" para permitir que, ao abrigo da secção 215 da Patriot Act (lei criada após o 11 de Setembro de 2001), fosse possível recolher, registar e criar uma gigantesca base de dados "relevante" para a investigação do terrorismo internacional.

O escândalo da espionagem da NSA provocou danos nas relações transatlânticas quando se soube, graças a Edward Snowden, que Washington espia os seus aliados europeus e respectivos cidadãos.

Os serviços secretos alemães, acusados de colaborar com a NSA, forçaram o governo a anunciar que irá explicar esta semana ao parlamento a colaboração entre os serviços secretos alemães (BND) e a NSA americana, garantiu ontem um porta-voz do executivo.

O governo alemão quer esclarecer as informações publicadas pela revista "Der Spiegel"segundo as quais os serviços secretos alemães utilizam equipamento desenvolvido pela NSA, acusada de coordenar operações de vigilância PRISM, em grande escala e a nível mundial.

De acordo com o semanário, o BND e o Departamento Federal para a protecção da Constituição (BfV, serviço de informações interno) contam com o programa "XKeyscore" com o objectivo de "apoiar" os homólogos norte-americanos na luta contra o terrorismo.

Apesar das notícias publicadas nas últimas semanas sobre o conhecimento da Alemanha do programa da NSA, a chanceler Merkel e o governo afirmam desconhecer os esquemas de vigilância.

No passado fim-de-semana, a chanceler Angela Merkel disse apoiar um acordo mundial sobre protecção de dados, na sequência das revelações sobre o programa de espionagem PRISM.

Numa entrevista ao "Welt am Sonntag", Merkel disse que "o objectivo deve ser este", admitindo ainda que seria desejável alcançar um acordo mundial sobre protecção de dados do mesmo tipo do Protocolo de Quioto, que tem a ver com as alterações climáticas.

"Deveríamos ser capazes no século xxi de assinar acordos mundiais [...] Se a comunicação de dados levanta no mundo inteiro novas questões, então devemos enfrentar o desafio. A Alemanha vai empenhar-se nesse sentido", disse.


A União Europeia, através da comissária Viviane Reding manifestou inquietação com um "eventual acesso de grande amplitude a dados sobre cidadãos europeus" e reclamou timidamente "explicações e esclarecimentos sobre o programa PRISM e legislação conexa". A Europa quer proteger os dados privados dos seus cidadãos, mas receia que a proposta de Bruxelas para os defender prejudique as empresas, já que as companhia que utilizam dados dos clientes terão de passar a ter um gestor que garanta o cumprimento das regras comunitárias. As grandes empresas americanas do sector (Google, Microsoft, Amazon ou Apple) orquestraram a maior campanha de lobby jamais vista nos corredores da Comissão Europeia com o objectivo de suavizar as exigências para a indústria.

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