Responsabilidades do Estado com o BPN podem chegar aos 816 milhões
Relatório elaborado pela consultora Roland Berger, a pedida da actual ministra das Finanças, mostra que o Tesouro ainda pode desembolsar muitos milhões de euros relacionados com o banco privatizado
As responsabilidades do Estado derivadas da execução
do contrato celebrado com o BIC para a venda do BPN podem chegar até aos 816
milhões de euros. O valor consta de um relatório da Roland Berger pedido pela
actual ministra das Finanças, Maria Luís Albuquerque - na altura, secretária de
Estado do Tesouro e Finanças e que tinha responsabilidades na condução da
privatização do BPN.
A 12 de Novembro de 2011, a consultora alemã enviou um email para o
Ministério das Finanças onde revela que a estimativa do montante geral de
contingências associadas ao contrato de execução da privatização do BPN oscilava
entre 816 milhões de euros e 789 milhões de euros. Estava-se a um mês de ser
assumido o primeiro acordo para a venda do BPN que seria, em Março de 2012,
formalizado.O contacto da Roland Berger surgiu em resposta a um pedido de esclarecimento da própria Maria Luis Albuquerque. Nessa altura, a CGD (que geria o BPN) e as Finanças tinham na sua posse dados que indicavam que em Setembro de 2011 só os litígios judiciais já somavam 311 milhões de euros.
Para além de garantias prestadas pelo BPN e que o BIC não assumiu - indemnizações a trabalhadores dispensados, custos de cancelamento de contratos assinados com prestadoras de serviço, potenciais ajustamentos ao balanço do BPN - a estimativa da consultora alemã envolve litígios judiciais de diversa natureza.
Um deles está relacionado com uma queixa efectuada pelo empresário Joaquim Sousa Lima contra José Manuel Gama Pereira, que, até final de 2008, dirigiu a agência do BPN do Centro Comercial das Amoreiras. As burlas iniciaram-se em 2000 e prendem-se com desvio de verbas para a Instituição Financeira Internacional (IFI) do BPN em Cabo Verde. O gerente aliciava os clientes a transferirem as poupanças para Cabo Verde, oferecendo rendimentos de 30%. Depois, os fundos eram desviados.
Esta é apenas uma de várias fraudes praticadas por colaboradores do BPN detectadas após a nacionalização. Uma das mais mediáticas está associada [ler PÚBLICO de 15 de Julho] ao Instituto Missionário da Consolata, com sede em Fátima, que recebeu uma compensação do Estado de 14 milhões de euros. As religiosas confiaram a um ex-bancário do BPN, Leonel Gordo, cheques e dinheiro vivo no valor de 3,584 milhões de euros, mediante a promessa de atribuição de juros superiores aos dos depósitos a prazo. O dinheiro foi perdido na bolsa. O Supremo Tribunal de Justiça condenou o BPN, ou seja, o Estado, a devolver a verba com juros desde 2006.
Na passada segunda-feira, o PÚBLICO noticiou também que o BIC reclama, no imediato, do Estado cerca de 100 milhões de euros. Inquirido pela comunicação social, o Ministério das Finanças esclareceu que já entregou ao BIC 22 milhões. As Finanças lembraram que o contrato de privatização prevê "responsabilidades contingentes a suportar pelo Estado", como as "relativas a litígios anteriores à compra e venda, garantias bancárias emitidas pelo BPN antes da venda e não seleccionadas pelo Banco BIC, redimensionamento de efectivos do BPN, revisões de rendas dos contratos de arrendamento do banco e outras contingências". E avançaram que o "montante previsto poderia ascender a 158 milhões de euros".
Dado que o valor de 158 milhões de euros não está formalizado em nenhum documento relacionado com o acordo de venda do BPN, o PÚBLICO procurou inteirar-se junto das Finanças sobre qual é o limite máximo previsto para o Estado para reembolsar o BIC. Até ao fecho da edição, o ministério não prestou esclarecimentos.
"O acordo quadro de compra e venda do Banco Português de Negócios, entre o BIC e o Estado, prevê que todos os eventos ocorridos antes da privatização do BPN são da responsabilidade do Estado e não do BIC. Os 22 milhões de euros que o Estado já nos pagou são uma parte do reembolso destas verbas", mas o valor global a receber pelo BIC é superior, confirmou à agência Lusa Mira Amaral, presidente do banco luso-angolano. A declaração contraria o sentido da resposta dada esta segunda-feira pelas Finanças aos jornalistas e reenviada ontem ao PÚBLICO: "Até à presente data, o Estado assumiu, por conta das responsabilidades contingentes acima mencionadas, cerca de 22 milhões de euros, valor este, passados 14 meses da alienação do BPN, muito inferior ao estimado", os 158 milhões de euros.
Já o BIC refere "que cumpre o acordo-quadro da privatização" que é, em todo o caso, omisso em valores. O BIC pagou pelo BPN 40 milhões de euros. Recorde-se que duas auditorias concluídas em Julho de 2011, e tornadas públicas, avaliaram o BPN entre 160 milhões de euros e 60 milhões de euros (limite mínimo). Até ao momento, o Estado já assumiu perdas relacionadas com a gestão do dossier BPN superiores a 4 mil milhões de euros.
Sem comentários:
Enviar um comentário