quinta-feira, 25 de julho de 2013

Como Rui Machete acompanhou a SLN/BPN, um grupo centrado na figura de Oliveira Costa. Machete sobre o BPN: “saímos a tempo”.


Como Rui Machete acompanhou a SLN/BPN, um grupo centrado na figura de Oliveira Costa.

O novo ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, Rui Machete, acompanhou, na qualidade de presidente do conselho superior do BPN, o percurso do grupo SLN/BPN, ao longo dos oito anos que antecederam a nacionalização do banco liderado por Oliveira Costa, o principal arguido do designado "caso BPN". Um período de aparente crescimento meteórico do BPN, da SLN e de muitos accionistas, e que ficou, ainda, marcado por diversas polémicas públicas e pelas recusas de auditores e de gestores em certificarem as contas do banco.
Em 2001, Rui Machete fez a sua estreia na SLN, ex-proprietária do BPN, para onde foi exercer as funções de presidente (não-executivo) do conselho superior, um órgão onde tinham assento os accionistas de referência e onde, entre outras matérias, se analisavam as contas (que apareciam já certificadas pelos auditores) e se discutia a estratégia empresarial do grupo. Em Janeiro de 2009, dois meses depois de o BPN ter sido intervencionado, o actual ministro de Estado de Passos Coelho renunciou ao cargo na SLN.
Nesse mesmo ano, o ex-presidente da FLAD depôs na Comissão de Inquérito parlamentar ao BPN, onde garantiu ter pouca informação sobre o que se passava no grupo e explicou que os dados que chegavam aos órgãos sociais eram escassos. Mas confirmou aos deputados o que Oliveira Costa já lhes tinha dito: Sócrates deu luz verde à venda de parte do grupo a angolanos através da Carlyle, um fundo ligado ao ex-embaixador americano (e ex-director da CIA) Frank Carlucci.
A presença de Machete na SLN, de 2001 a 2009, coincidiu com várias polémicas tornadas públicas ao longo dos anos, ainda que se tenha verificado, mais tarde, que alguns membros dos corpos sociais da SLN/BPN foram colocados à margem do que se veio a revelar ser uma fraude, confirmada após a estatização do banco. Os "avisos" que surgiram na imprensa sobre o que poderia estar a passar-se no BPN não foram, no entanto, suficientes para que levantassem dúvidas.
O ritmo de crescimento meteórico do banco e o modo como a holding se expandia também não geravam consensos: um grupo centrado na figura tutelar de Oliveira Costa, a quem cabia articular as relações entre os investidores, pequenos e médios empresários, com negócios que iam desde a construção civil até à venda de rações para animais, tenderia a colocar reservas. A estrutura de capital era pulverizada, com investidores dependentes do crédito do BPN para desenvolver a actividade. A um contexto accionista intrincado, juntava-se um corpo empresarial disperso, com o BPN a deter posições em sectores adquiridos a accionistas, e que iam da área da saúde à agro-alimentar, passando por oficinas de automóveis.
Estes sinais que não passaram despercebidos. Em 2003, o Banco de Portugal solicitou a Oliveira Costa a clarificação das relações existentes entre a actividade bancária do BPN (os fiéis depositários do dinheiro dos seus clientes) e os investimentos empresariais (não-financeiros) do grupo, por se verificar "uma confusão" entre os diferentes interesses em jogo. Mas a iniciativa do supervisor não teve consequências, pois Oliveira Costa viria a acentuar os traços do modelo empresarial.
Em 2006, o PÚBLICO revelou que a rotatividade nas administrações da SLN/BPN era maior do que nas restantes instituições financeiras. O mesmo acontecia com os auditores. Entre 1998 e 2003 o BPN foi avaliado por quatro empresas: a Ernst & Young, a PriceWaterHouseCoopers, a Deloitte & Touche, a BDO Binder. Havia outra particularidade na SLN/BPN: a sua base política forte, sustentada em ligações pessoais, que ajudaram a alavancar os negócios. Nos órgãos sociais sentavam-se altos dirigentes do PSD no activo (Dias Loureiro, Daniel Sanches, Arlindo de Carvalho, Rui Machete, todos ex-ministros de Cavaco Silva). E havia os clientes/investidores como Duarte Lima, Joaquim Coimbra ou, transitoriamente, a família Cavaco Silva. Foi por esta razão que a nacionalização teve repercussões políticas. A promiscuidade entre a actividade financeira e os interesses dos accionistas tornou o grupo num pólo de atracção de negócios obscuros e tentaculares, que ajudaram à megafraude delineada pelo seu ex-presidente e que levou à insolvência do BPN.
Porém, a passagem de Machete pelo grupo de Oliveira Costa não consta do curriculum entregue ontem pelo Governo à comunicação social, mas que refere que o ministro foi consultor da sociedade de advogados PLMJ & Associados, que se veio já congratular com a sua nomeação. A biografia esquece que Machete faz parte dos corpos sociais da CGD, e que, no mesmo período em que esteve na SLN, integrou o conselho geral do BPP, um banco concorrente (que também seria intervencionado pelo Estado). Na qualidade de presidente da FLAD, o ministro de Estado (que ontem tomou posse) comprou cerca de 3% do capital do BPP. Com a falência do banco, sob investigação do Ministério Público, os accionistas perderam o dinheiro que aplicaram. O dirigente do PSD Mota Amaral, ex-presidente da Assembleia da República, classificou o investimento como ruinoso, mas Machete reagiu garantindo que a ligação ao BPP só deu lucro à FLAD.

Machete sobre o BPN: “saímos a tempo”.
Por Ana Suspiro com António Ribeiro Ferreira
publicado em 25 Jul 2013 in (jornal) i online
Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento, liderada por Rui Machete, vendeu acções da SLN um ano antes da nacionalização do BPN
"É verdade, saímos a tempo." A resposta foi dada por Rui Machete ao deputado comunista Honório Novo na primeira comissão parlamentar de inquérito à nacionalização do Banco Português do Negócios (BPN), a propósito da venda da participação da FLAD na Sociedade Lusa de Negócios (SLN), que era dona do BPN.

Na audição em Abril de 2009, Rui Machete foi questionado sobre o investimento da Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento (FLAD), da qual era presidente, no grupo do BPN.

Machete foi ouvido na qualidade de ex--presidente do conselho superior da SLN, cargo que ocupou até à nacionalização do banco e que resultou da participação accionista da FLAD no capital da dona do BPN, a SLN. "O negócio não foi mau, visto que tivemos uma mais-valia significativa", esclareceu. Os resultados deste investimento, segundo as contas da fundação geraram mais-valias de pelo menos meio milhão de euros desde 2004 - que é o relatório mais antigo disponível no site da FLAD. Nesse ano é referida a alienação de 595 mil acções que geraram uma mais-valia de 402 mil euros. A FLAD ficou com 0,16% que alienou em 2007 por 1,375 milhões de euros, o que resultou em nova mais-valia de 128 mil euros. As duas operações geraram ganhos superiores a meio milhão de euros (530 mil euros). O investimento terá sido realizado em 2001, no mesmo aumento de capital em que o presidente da República, Cavaco Silva, investiu na SLN. A FLAD comprou 1,133 milhões de acções e o próprio Rui Machete deu ordem de compra de 22 650, segundo uma listagem a que o i teve acesso.

O investimento da fundação, que se estendeu a outros bancos, aconteceu porque o BPN tinha uma "remuneração muito interessante". E gerou um "resultado muito interessante que adveio de duas coisas: de que os rendimentos distribuídos eram muito bons e de que nos retirámos atempadamente".

Rui Machete não diz a quem a FLAD vendeu, mas justifica a decisão. "A razão é muito simples: não estávamos satisfeitos com o modelo de gestão do banco, tínhamos sérias dúvidas quanto a isso e quisemos fazê-lo de uma maneira discreta e sempre com a cooperação do Dr. Oliveira Costa, que nunca se recusou a isso." Apesar da desconfiança, "não tive nunca conhecimento de situações que me levassem a suspeitar que estavam a ser cometidos crimes até ao momento em que foi feita a carta ao Banco de Portugal e ajudei a cumprir a obrigação."

A convite de outros accionistas, Rui Machete continua a liderar o conselho superior, órgão que descreve como consultivo. Acompanhou o processo de substituição de Oliveira Costa por Abdool Vakil e mais tarde por Miguel Cadilhe, as tentativas de reestruturação do grupo e as primeiras denúncias feitas ao Banco de Portugal das fraudes no BPN, ainda sob a gestão privada da SLN e pouco antes da nacionalização, em Novembro de 2008. Ainda hoje não é possível fazer as contas à factura do Estado no BPN (ver págs. 8 e 9) , mas admite-se que possa oscilar entre 3500 milhões e 6500 milhões de euros.

Rui Machete, através da FLAD, esteve também envolvido no Banco Privado Português (BPP), mas este investimento não teve bons resultados. A fundação era accionista da Privado Holding, dona do BPP, com 2,6%, e no final de 2008 tinha aplicações de 5,5 milhões de euros. Com a intervenção estatal e posterior insolvência, a FLAD teve de reconhecer perdas e ainda é credora em 1,5 milhões de euros do BPP.

A gestão de Rui Machete na FLAD, da qual saiu em 2010, mereceu duras críticas de um antigo embaixador dos Estados Unidos em Portugal. Num dos telegramas divulgados pelo "Expresso" no âmbito do caso Wikileaks, Thomas Stephenson defendia que tinha chegado a hora de "decapitar Machete". O embaixador americano em 2008 acusava a fundação de gastar 46% do seu orçamento de funcionamento nos seus gabinetes luxuosos decorados com peças de arte, pessoal supérfluo, uma frota de BMW com motoristas e custos com pessoal que incluíam despesas em roupa.


Mas o trio Oliveira Costa, Miguel Cadilhe e Rui Machete aparece ligado também aos polémicos perdões fiscais concedidos entre 1987 e 1990, no segundo governo de Cavaco Silva. Oliveira Costa era então secretário de Estado dos Assuntos Fiscais e Miguel Cadilhe ministro das Finanças. O assunto teve direito a comissão de inquérito parlamentar presidida por Rui Machete que ilibou Oliveira e Costa de quaisquer suspeitas na concessão de perdões fiscais de muitas centenas de milhares de contos.

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