Gustavo Sampaio
Ontem 15:33
Sob crescente
pressão turística, os preços das casas não cessam de aumentar, sobretudo nos
centros das grandes cidades, empurrando as populações residentes para as
periferias e impondo o fecho de lojas históricas e associações
culturais/cívicas. A gentrificação tem efeitos profundos ao nível social,
político, urbanístico, arquitectural, cultural, etc.
Os números
divulgados esta semana pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) são
impressionantes: no terceiro trimestre de 2017, o preço mediano das casas
vendidas em Portugal cifrou-se em 912 euros por metro quadrado, mais 1,8% do
que no trimestre anterior e mais 6,5% do que no período homólogo de 2016. Em
Lisboa, o preço mediano chegou aos 2.315 euros por metro quadrado (mais 15,5%
do que no período homólogo), enquanto no Porto alcançou os 1.254 euros por
metro quadrado (mais 14,1%). Nas freguesias centrais de Lisboa e Porto registaram-se
aumentos do preço mediano ainda mais substanciais. Mas o fenómeno inflacionário
está a expandir-se para a periferia das grandes metrópoles e também para as
cidades de média dimensão na faixa litoral.
Acresce a subida
exponencial do valor das rendas de casas, a crescente pressão turística, a
disseminação de estabelecimentos de alojamento local, o encerramento de lojas
históricas ou o despejo coercivo de inquilinos, com especial incidência nos
centros históricos de Lisboa e Porto. Entre outros componentes do processo de
gentrificação em curso. O que é a gentrificação? “Designa um processo de
atração de capital privado e novas classes médias para bairros tradicionais dos
centros históricos das principais cidades do mundo. Esse investimento requalifica
os bairros, produzindo uma regeneração urbana ao nível económico, cultural e
ambiental, o que acaba por encarecer os preços fundiários e imobiliários.
Perante a subida dos preços de arrendamento e para habitação de casa própria,
as classes populares, que residem nesses bairros, vêem-se incapazes de suportar
os custos e são obrigadas a sair”, define Luís Mendes, geógrafo que leciona no
Instituto de Geografia e Ordenamento do Território da Universidade de Lisboa.
“Por isso digo
que a gentrificação é o processo que melhor materializa a luta de classes no
espaço urbano contemporâneo, porque a substituição social faz-se ao nível de
classe, numa determinada comunidade. Falando de uma forma simplificada e
genérica: entram os ricos e saem os mais pobres e vulneráveis desses bairros
populares”, sublinha.
“A gentrificação
é um dos processos mais fortes de mudança urbana no mundo atual e tem-se
agudizado nos anos recentes, sobretudo em Lisboa e Porto. Em Portugal, começou
nos anos 80 por ser um processo local e relativamente marginal que afetava
apenas alguns fogos ou imóveis isolados e dispersos no centro histórico.
Geograficamente, era um processo fragmentado. Não existia desalojamento com os
contornos a que hoje se assiste, pois muitos dos imóveis renovados já se
encontravam vazios, ou em avançado estado de degradação, e o congelamento das
rendas não permitia a expulsão dos inquilinos. Falava-se de gentrificação
marginal”, explica o geógrafo.
“Neste momento temos prédios inteiros em
Lisboa, totalmente reabilitados e em excelentes condições de habitabilidade,
mas que se encontram fechados há mais de meia década”, critica Luís Mendes.
“Atualmente, o processo de gentrificação
expandiu as suas fronteiras para além do perímetro do centro histórico, podendo
alcançar áreas mais pericentrais ou mesmo periféricas”, realça Mendes. Aliás,
os dados do INE apontam precisamente nesse sentido. “Ao nível mundial, a
expansão também se deu porque a expressão territorial da gentrificação deixou
de se cingir às maiores cidades do capitalismo global, para abranger quase
todas as cidades do mundo desenvolvido ou em desenvolvimento. Por isso se diz
que se tornou numa verdadeira estratégia urbana ao serviço do urbanismo
neoliberal no período austeritário. A escala e extensão, as modalidades de
oferta, os agentes do processo, em tudo mudaram. A gentrificação tornou-se
madura e afigura-se com contornos mais agressivos, o que implica desalojamento
dos mais pobres e uma perspetiva da habitação esvaziada da noção de direito,
para ganhar o estatuto de mero ativo financeiro para atração de investimento
estrangeiro”, alerta.
“Neste momento
temos prédios inteiros em Lisboa, totalmente reabilitados e em excelentes
condições de habitabilidade, mas que se encontram fechados há mais de meia
década”, critica. “Isto é uma evidência empírica do que se pode designar por
especulação imobiliária, pois controla-se a oferta, condicionando o seu
posicionamento no mercado, mantendo a procura muito elevada e encarecendo o
preço do imobiliário. A gentrificação em Lisboa está a fazer-se sem novos
moradores e as dinâmicas que a comandam já não são locais, mas globais,
relacionadas com as geografias do investimento transnacional”.
Na perspetiva de
Mendes, a gentrificação vai continuar a intensificar-se nos próximos anos.
“Lisboa apresenta-se hoje como destino privilegiado para investimento
imobiliário e além de todas as amenidades comummente divulgadas – cultura,
clima, património, gastronomia, segurança, baixo custo de vida, etc. -, o que
me parece ser significativo é o facto de os preços de residência na capital
portuguesa, mesmo os considerados ‘prime’, serem altamente competitivos no
mercado europeu, pois não ultrapassam um terço dos de Berlim ou um décimo dos
de Londres. Esta condição coloca Lisboa no mapa das geografias mundiais do
investimento imobiliário, o que se adensa se considerarmos a lista de fatores
que tornam tão atrativo o investimento e a procura residencial nesta cidade,“
salienta.
“Um fenómeno que
não existe”
Em recente
entrevista ao jornal “La Voz de Galicia”, Rui Moreira, presidente da Câmara
Municipal do Porto, foi questionado sobre o problema da gentrificação inerente
ao crescimento do turismo. “Esse dramatismo ligado ao turismo é uma conversa
aborrecida. O Porto sempre foi uma urbe gentrificada. Por ingleses, alemães,
franceses. […] A ideia de gentrificação é uma ideia aborrecida de uma esquerda
reacionária que fala cada vez mais de um fenómeno que não existe”, relativizou
Moreira. Para o arquitecto portuense Pedro Levi Bismarck, “a afirmação de
Moreira é notável e paradoxal. Se a gentrificação não existe, é estranho que
sempre tenha existido. É um argumento circular que tem pelo menos a vantagem de
revelar o grau de ambiguidade em que estas questões são discutidas
politicamente”.
“A gentrificação
é um daqueles conceitos que, à custa de ser tantas vezes repetido, acabou por
perder eficácia e objectividade. Mas é um conceito de difícil delimitação,
porque o modo como estes processos se desenrolam depende das especificidades
inerentes a cada caso. Não se pode olhar para Berlim e dizer que aquilo é
gentrificação. Como não se pode dizer que não há gentrificação no Porto, porque
estamos perante uma reorganização brutal das funções e valências da cidade,
através do turismo que obviamente tem impactos e se traduz na substituição de
um segmento de população por outro, com mais poder económico e poder de compra.
Basta ver os despejos que têm ocorrido um pouco por todo o lado, sobretudo nas
‘ilhas’, mas também a subida generalizada e incomportável dos arrendamentos que
impossibilita um acesso qualificado à habitação”, argumenta Bismarck,
investigador do Centro de Estudos de Arquitectura e Urbanismo.
“Daqui a algumas
décadas estaremos a discutir o que fazer com a cidade que ficou depois da
explosão de mais uma bolha imobiliária”, avisa Pedro Levi Bismarck.
“A crise
financeira global de 2008-2012, a intervenção da ‘troika’ em Portugal e o
Governo PSD/CDS-PP resultaram num programa neoliberal: liberalização das
rendas, vistos ‘gold’ com condições vantajosas para capital estrangeiro
investir em imobiliário, que em tempos de crise é sempre considerado um valor
seguro; desregulação e precarização do mercado de trabalho e implementação de
outras lógicas de produção baseadas no empreendedorismo; a afirmação do turismo
como grande segmento da economia nacional, o que trouxe uma lógica de
especialização e competição entre cidades, agora elevadas ao nível de ‘marcas’,
veja-se o caso paradigmático do Porto; e, por último, a desarticulação,
extinção ou privatização das instituições democráticas do Estado, cada vez mais
incapazes de lidar com os fluxos globalizados de capital”, enumera, como
factores que exponenciaram a gentrificação.
Na óptica de
Bismarck, “a questão está menos no turismo e mais no neoliberalismo: a cidade
‘gentrificada’ e ‘turistificada’ é produto de uma economia que recusa qualquer
planificação ou intervenção do Estado, que aceita a lógica do mercado como
sendo única e natural, assim como a conversão da habitação num ativo financeiro
a ser rentabilizado e não num direito de todos. A crítica da gentrificação deve
ser, sobretudo, um modo de compreender as lógicas neoliberais que produzem a
cidade hoje, sobretudo nestas dimensões: o primado da economia sobre todas as
outras dimensões da vida individual e coletiva, a afirmação absoluta da lógica
do mercado, a expropriação dos bens comuns, o desmantelamento do Estado social
e das suas instituições públicas mediadoras”.
“Tal como nos
anos 90 se permitiu esvaziar os centros urbanos, em nome da nova vida
suburbana, também hoje assistimos, impávidos e serenos, ao processo inverso. E
daqui a algumas décadas estaremos aqui novamente a discutir o que fazer com a
cidade que ficou depois da explosão de mais uma bolha imobiliária”, avisa.
“Saber conjugar o
global com o local”
Por seu lado,
Andreia Garcia (arquitecta, curadora e professora universitária, atualmente a
residir no centro do Porto) considera que “independentemente da questão do
conceito, é óbvio que está a acontecer no Porto um fenómeno de valorização do
imobiliário que tende a empurrar para a periferia aqueles que nos últimos anos
vinham a habitar o centro da cidade. Constata-se que os tradicionais
arrendamentos de longa duração não conseguem competir financeiramente com as
rendas provenientes do alojamento local. O que, para além do fenómeno
anteriormente identificado, ainda tende a converter a malha urbana num tecido
monofuncional, vocacionado apenas para o turismo”.
A arquitecta que
reside e trabalha no Porto (aliás, é co-fundadora da Galeria de Arquitectura)
identifica vários efeitos negativos da gentrificação. “Além do aumento das
rendas para habitação e consequente afastamento dos moradores do centro da
cidade para a periferia”, Garcia destaca “o desaparecimento do comércio
tradicional, a atração de investimentos que procuram unicamente a rapidez do
retorno, o aumento da desregulação do mercado (que poderá culminar na
amplificação do trabalho precário que tem definido o mercado que se relaciona
com o turismo) e a tendência para a descaracterização acelerada do património
edificado, inclusive classificado, em que apenas sobrevivem as fachadas dos
edifícios”.
Questionada sobre
eventuais efeitos positivos, nomeadamente a reabilitação urbana, criação de
emprego ou valorização do imobiliário, Garcia diz que “não é real a fantasia de
que o centro histórico do Porto sempre foi convidativo à habitação. Hoje vemos
uma cidade mais dinâmica e concorrida e o interesse no seu património edificado
é crescente. E, de facto, não se pode ignorar a importância do turismo para as
cidades e a receita que traz consigo. No entanto, o turismo, a cidade
temporariamente habitada pelos visitantes passageiros, tem que saber conviver
lado a lado com a cidade dos habitantes reais e permanentes. É no seu carácter
genuíno que reside o interesse da identidade de uma cidade e, por isso, é
preciso saber conjugar o global com o local, no interesse de ambas as partes”,
sustenta.
“É fundamental
aprendermos com os outros exemplos [de Barcelona, Londres ou Veneza], lermos as
medidas que estão a ser tomadas e sermos capazes de antecipar cenários mais
apocalípticos”, sublinha Andreia Garcia.
Que medidas
políticas é que deveriam ser aplicadas no sentido de minorar os efeitos
negativos do processo de gentrificação? “Não indico uma medida exata, mas a
necessidade de uma metodologia de ação que decorra do olhar orgânico de
transitividade entre a arquitetura, o turismo, a política urbana e a própria
condição humana. É necessária uma estratégia articulada de defesa do património
arquitectónico, urbano, social e cultural. As cidades estão em constante
mudança, sempre foi assim, sempre será. Há que olhá-las, caso a caso, escala a
escala, sem receitas, ou medidas políticas endémicas e antever a mudança
regulada através de estratégias que garantam uma mentalidade de pensamento
urbano saudável e a longo prazo”, responde Garcia.
Tendo em conta a
evolução da pressão turística, metamorfose urbanística, processo de
gentrificação em cidades como Barcelona, Londres ou Veneza (onde esses fenómenos
começaram há mais tempo e estão num patamar de desenvolvimento mais avançado),
que lições é que deveriam ser apreendidas pelos dirigentes políticos em
Portugal? “Se quisermos ter uma ideia alarmista desta questão, recomendo o
visionamento do documentário ‘Bye, bye Barcelona’ de Eduardo Chibás. Este filme
faz um levantamento dos danos provocados pelo turismo no tecido barcelonês e
servirá com certeza para consciencializar sobre os efeitos nocivos do turismo
no seu expoente máximo. A verdade é que, desde então e sobretudo nos últimos
anos, algumas medidas têm sido implementadas no sentido de resgatar esta cidade
de volta para os seus habitantes”, afirma Garcia.
“É importante não
desconsiderar o que está a acontecer no Porto e encarar as consequências menos positivas
do turismo como uma realidade. Ao mesmo tempo, se em Barcelona o centro
histórico estava na sua maioria ocupado por locais, o que tornou este processo
um pouco mais lento, já no centro histórico do Porto uma grande parte dos
edifícios encontravam-se vazios há muitos anos, o que facilitou o processo de
apropriação da cidade pelo turismo, de um modo muito mais rápido e com um
crescimento diário, exponencial. É fundamental aprendermos com os outros
exemplos, lermos as medidas que estão a ser tomadas e sermos capazes de
antecipar cenários mais apocalípticos”, sublinha.
“A preservação da
identidade dos lugares”
Em busca de uma
perspetiva a partir do exterior, o Jornal Económico contactou também Mariana
Pestana, arquitecta portuguesa (formada no Porto) que vive e trabalha em
Londres desde 2008, fundadora do coletivo “The Decorators” e co-curadora da
primeira exposição do departamento de design, arquitectura e digital do
Victoria & Albert Museum (intitula-se “The Future Starts Here” e vai ser inaugurada
no dia 12 de maio).
Que lições é que
podem ser retiradas do processo de gentrificação em Londres, mais antigo e
desenvolvido, no sentido de não se cometerem os mesmos erros em Lisboa e no
Porto? Ou não são realidades comparáveis? “A gentrificação é um processo
inevitável de crescimento das cidades”, ressalva Mariana Pestana. “Mas o
problema inerente a muitos processos de gentrificação é a deslocação forçada de
comunidades residentes. Os mais afetados são aqueles que vivem em zonas mais
afastadas do centro e que, face a uma crescente valorização da zona e
consequente aumento de rendas e preços de habitação, se vêem obrigados a
afastar-se ainda mais. A gentrificação produz um efeito de expansão contínuo
que afasta progressivamente as pessoas com menos posses dos centros urbanos. É
urgente, por isso, acompanhar o processo natural de gentrificação com políticas
conscientes que amenizem estes efeitos”, sublinha.
Ao nível
arquitectónico, considera que a gentrificação em Londres descaracterizou a
identidade da cidade? Receia que esteja a acontecer o mesmo no Porto? A
identidade ou o património arquitectónico do Porto estão seguros, ou acha que
os dirigentes políticos deveriam tomar mais medidas de proteção e preservação?
“Eu penso que a preservação da identidade dos lugares é muito importante. E a
identidade não é feita apenas de edifícios mas também de pessoas, relações
sociais e hábitos. Para preservar a identidade de um lugar é por isso
necessário preservar a cultura daquele lugar, assegurando que as pessoas e
respetivas dinâmicas sociais que vivem ou trabalham num determinado lugar
possam ali permanecer, a par de novas pessoas e dinâmicas sociais que ali
chegam de novo. Há estratégias inteligentes de gentrificação que aproveitam o
investimento imobiliário para valorizar o património e melhorar as condições de
sociabilidade (espaço publico, habitação, reabilitação de lojas), de forma
consciente e sustentável. Ou seja, os investidores imobiliários são taxados
pela câmara municipal e essa taxa é usada para projetos de carácter cultural e
de integração social. Este modelo parece-me justo”, defende Pestana.
“É fundamental
assegurar a diversidade das identidades de diferentes bairros e centros
urbanos, de baixo para cima. […] As pessoas mudam-se para o centro de Lisboa ou
do Porto por aquilo que eles são, não porque procuram o mesmo que em Londres ou
Nova Iorque, senão mudavam-se para lá”, argumenta Mariana Pestana.
“No entanto, há
situações em que estes projetos culturais contribuem para uma homogeneização da
identidade da cidade, o que a longo prazo tem consequências sociais e
económicas muito negativas”, alerta. “A homogeneização pode ser, por exemplo,
reabilitar lojas com um gosto ‘trendy’ ou importar modelos de desenvolvimento
de lugares que nada têm a ver com aqueles em que se está a trabalhar. Por isso
acho que é fundamental assegurar a diversidade das identidades de diferentes
bairros e centros urbanos, de baixo para cima. E preservar tanto os edifícios
históricos ou antigos (e as dinâmicas) como os contemporâneos. Dito de uma
forma simples, as pessoas mudam-se para o centro de Lisboa ou do Porto por
aquilo que eles são, não porque procuram o mesmo que em Londres ou Nova Iorque,
senão mudavam-se para lá”.
Pestana
exemplifica com o próprio trabalho que desenvolve em Londres. “O coletivo que
eu co-fundei em Londres, ‘The Decorators’, trabalha com comunidades locais no
sentido de desenvolver com elas, a partir delas, modelos de desenvolvimento
consciente. Normalmente nós dizemos que é preciso tratar o que permanece com o
mesmo cuidado com que se trata aquilo que chega ou se transforma. Ou seja, o
desenho de um projeto de gentrificação consciente deve desenhar o que vai ser
transformado, mas também aquilo que não precisa de nenhuma transformação e até
deve mesmo continuar a ser como é”, argumenta.
“Há um enorme
risco de as estratégias virem de cima e privilegiarem os grupos de residentes
que chegam a novos lugares, normalmente os mais afluentes, esquecendo que a
identidade desses mesmos lugares foi construída precisamente por aqueles que já
lá estão. E são esses que devem ser ouvidos e privilegiados, de modo a
construirmos um futuro em que cada cidade, e bairro, tem a sua identidade
própria. A homogeneização, o seguimento de modelos instituídos ou importados, é
a morte da identidade individual de cada bairro e cidade”, diferencia a
arquitecta. “O projeto das lojas com história é um exemplo de valorização de
identidades locais e, a longo prazo, eu penso que vai ter retorno cultural e
económico. Mas acho que também é preciso desenvolver estratégias para preservar
as lojas independentes e locais contemporâneas, para além das históricas”.
Que iniciativas é
que têm sido desenvolvidas em Londres para minorar os efeitos negativos da
gentrificação? E quais dessas iniciativas é que gostaria de ver replicadas em
Lisboa e no Porto? “Acompanhamento dos projetos por estúdios que fazem
investigação junto das comunidades e que trabalham em colaboração com grupos
culturais e sociais locais, a par das câmaras e junto de investidores
imobiliários, de modo a assegurar que os interesses da câmara, dos investidores
e dos residentes estão alinhados de modo a beneficiar todos. Eu penso que este
trabalho é fundamental, no sentido de assegurar o crescimento económico e
transformação cultural das cidades, a par de estratégias sustentáveis e
inclusivas de preservação de identidades locais. Nem todos os projectos
criativos têm estas qualidades. Muitas vezes, e até inadvertidamente, os
artistas, designers e arquitectos servem os interesses instituídos e acabam por
fazer mais mal do que bem”, lamenta Pestana. E conclui: “Por isso é importante
integrar os projectos criativos em estratégias maiores, desenvolvidas em
colaboração com estúdios ou práticas com experiência nesta área, que trabalham
de baixo para cima”.
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