terça-feira, 20 de fevereiro de 2018

Há "verdadeiros hotéis" registados como alojamento local / O “verdadeiro alojamento local” é quando o dono da casa lá vive — “e isso deve ser protegido”


Amsterdão impõe novas e radicais restricões à AIRBNB, BOOKING e similares.
O periodo de ocupação máxima ao ano de 60 dias vai passar para 30 dias ao ano, a partir de 1 de Janeiro de 2019.
Com a afirmação, “Quem impõe as regras aqui somos nós, os Vereadores da Autoridade Municipal e não as Empresas” o Vereador Laurens Ivens, anunciou a medida que pretende reduzir a actividade, no periodo máximo de 30 dias ao ano, exclusivamente ao aluguer de quartos por proprietários que resídam nas habitações e contrariar os gigantescos negócios desenvolvidos por investidores que compram prédios inteiros para esse fim, ou residentes não habituais que compram propriedades que não habitam, e que colocam no Alojamento Local.
OVOODOCORVO

Há "verdadeiros hotéis" registados como alojamento local

Vereador do Urbanismo da Câmara de Lisboa propõe tirar alojamento local de prédios com menos de 2/3 deste tipo de actividade.

LUSA e PÚBLICO 16 de Fevereiro de 2018, 18:20

O vereador do Urbanismo da Câmara de Lisboa disse esta sexta-feira que existem estabelecimentos designados de alojamento local, com licenças de habitação, mas que são "verdadeiros hotéis", adiantando que tal acontece "até nas barbas da Câmara, na Praça do Município".

"Esta história do alojamento local é perfeitamente perversa tal como ela está, inclusive espaços de alojamento local que são verdadeiros hotéis", afirmou o vereador Manuel Salgado, no âmbito do Seminário sobre Reabilitação Urbana, Habitação e Turismo, organizado pelo Instituto de Ciências Jurídico-Políticas da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa.

A Câmara de Lisboa "ainda não tem uma posição formal" sobre a questão do alojamento local, indicou o autarca, assumindo, assim, a exclusiva responsabilidade pelas ideias transmitidas no seminário.

"Não me parece admissível que não se exija a clarificação do alojamento turístico. De uma vez por todas, meter no mesmo saco habitação e alojamento local é fortemente pernicioso para a cidade", declarou o vereador do Urbanismo, referindo que é importante distinguir o que é habitação do que é alojamento turístico, em termos de licenciamento.

A mesma ideia foi defendida há poucos dias pela vereadora da Habitação do município, Paula Marques, em entrevista ao PÚBLICO.

No seminário, Manuel Salgado defendeu que a plataforma de registo do alojamento local "deve ser gerida pelos municípios e não, como hoje, pela administração central", propondo ainda que essa plataforma integre todos os estabelecimentos de acomodação turística, nomeadamente hotéis, apartamentos e alojamento local. "Se a plataforma de registo, que é dinâmica, for do conhecimento municipal e for gerida pelo município, em determinadas zonas, à medida que sai um registo ou se permite que seja substituído ou não se permite", avançou Manuel Salgado, argumentando que para se poder gerir este processo é preciso conhecer a sua dinâmica.

Sobre como se poderá resolver os conflitos gerados pela actual concentração do alojamento local em determinadas zonas de Lisboa, sobretudo no centro histórico, o vereador do Urbanismo sugeriu que "num edifício em que, por exemplo, 2/3 já estão ocupados por alojamento local é preferível que seja todo para alojamento local", permitindo que haja uma substituição das fracções ocupadas por habitação.

Já num edifício em que menos de 2/3 estão ocupados por alojamento local, "procurar que efectivamente saia a actividade turística" e que as frações sejam reocupadas como uso de habitação, acrescentou o autarca.

Neste âmbito, Manuel Salgado defendeu também a criação de um mecanismo que não permita a instalação de alojamento local quando o prédio já está todo ocupado como habitação. "Devia estar definido na lei que os municípios podem fixar quotas por zonas", indicou o vereador.

Para o autarca, os municípios deviam "controlar o conjunto da oferta de alojamento turístico em todas as suas vertentes" para "numas zonas tentar reduzir, noutras zonas estabilizar e noutras até, se calhar, dar incentivos".

Manuel Salgado destacou como primeiro objectivo "defender o direito à habitação", considerando que "não é a mesma coisa que instalem um hotel num edifício que era de escritórios ou que despejem moradores de um edifício de habitação para fazer um hotel ou um alojamento local".

Das várias experiências de cidades europeias na regulamentação do alojamento turístico, o vereador do Urbanismo classificou como "mais interessante" a de Barcelona, explicando que "fixa distâncias mínimas entre hotéis, fixa regras de instalação de hotéis em função da largura das ruas para ter em conta o acesso de autocarros turísticos e fixa características especificas para as zonas históricas".

"Há um conjunto de regras que deviam constar de regulamento municipal não no Plano Director Municipal (PDM)", concluiu o autarca de Lisboa, referindo ainda que tem haver "um ajustamento no PDM para permitir recuar na questão da legalização do alojamento turístico".

Em Julho de 2015, quando o tema do turismo em Lisboa não tinha ainda o destaque que veio a adquirir mais tarde, Manuel Salgado reconheceu que havia "concentração excessiva" de alojamentos turísticos em algumas zonas. Desde então, a autarquia emitiu 33 licenças para novos hotéis.


O “verdadeiro alojamento local” é quando o dono da casa lá vive — “e isso deve ser protegido”

Paula Marques, vereadora da Habitação de Lisboa, defende uma acção coordenada em quatro áreas para garantir casas acessíveis a todos. Abre esta semana o concurso de atribuição de 100 fogos no centro histórico.

 João Pedro Pincha
JOÃO PEDRO PINCHA 14 de Fevereiro de 2018, 8:44

Agora que o Governo e o Parlamento se preparam para legislar em matéria de habitação, a vereadora com este pelouro na Câmara Municipal de Lisboa defende que é preciso mexer simultaneamente em quatro campos: lei das rendas, alojamento local, habitação pública e política fiscal. “Se não tivermos a conjugação destes quatro factores, que têm pesos diferentes, não conseguiremos responder cabalmente àquilo que se nos depara”, avisa Paula Marques.

Em entrevista ao PÚBLICO, a autarca diz, por exemplo, que “é preciso perceber claramente que o alojamento local não é habitação” e que, por isso, não pode ser tratado como tal, nem sequer fiscalmente. “O verdadeiro alojamento local (AL), como complemento de subsistência de uma família, é feito na sua casa. Não há alteração de uso: vives na tua casa, fazes AL em um ou dois quartos. Sendo a tua residência permanente, fazes partilha de alojamento e aí não tens a questão de definir se é habitação ou não porque o uso primário da casa é habitação.”

Para Paula Marques, “isso é uma coisa e deve ser protegido”. Outra coisa é “a compra de edifícios inteiros ou de um apartamento cujo destino primário não é habitação, é AL” – e nesses casos “deve-se fazer uma diferenciação”.

A vereadora defende que as câmaras municipais devem ter o poder de estabelecer quotas de alojamento local consoante os bairros, algo que não acontece actualmente e é olhado com desconfiança pelos empresários do sector. “São opções que têm de se tomar”, afirma Paula Marques. “Quando nós temos em conflito uma questão tão premente e tão pungente como o direito à habitação e a alteração profunda do tecido social das nossas cidades em função desse fenómeno”, diz, “não faz sentido que os municípios não possam determinar, em cada momento, a bem do reequilíbrio, ‘aqui nem mais um’ ou, pelo contrário, ‘nesta zona agora há espaço’”.

Mas as mudanças na legislação sobre AL têm, na opinião da autarca, de ser acompanhadas por outras, nomeadamente nos apoios fiscais. “Eu sou proprietário, tenho um imóvel, faço contas: é muito mais vantajoso ter uma actividade no AL do que ter um arrendamento de longa duração”, exemplifica. Paula Marques defende assim “políticas de benefício aos proprietários” que sejam cumulativas. Isso é, “que o benefício fiscal seja atribuído aos proprietários que tenham como arrendatários pessoas que fazem daquela casa a sua habitação permanente”. Depois, um segundo nível: havendo um “arrendamento a preços acessíveis, tenho outro tipo de benefício fiscal”.

Esta é uma medida, acredita a vereadora, vantajosa para senhorios e inquilinos. Paula Marques diz que a actual lei das rendas “não serve para a protecção nem de uns nem de outros” e que uma mudança na legislação tem de prever “mecanismos que não prejudiquem a expectativa do proprietário em relação à sua propriedade”. “Eu não defendo o congelamento das rendas. Entendo que tenha de haver progressividade no aumento da renda, mas também aí temos de perceber como é que isso impacta na vida dos agregados e dos senhorios”, diz.

Há mais duas mudanças que a responsável gostava de ver na lei do arrendamento urbano. Uma é relativa à estabilidade dos contratos, o que pressupõe um alargamento do período máximo de arrendamento, que é actualmente de cinco anos. É uma questão “aplicável a qualquer pessoa que esteja a organizar a sua vida, independentemente da sua situação económica. Deve haver estabilidade para que as pessoas possam organizar a sua vida e não estejam a pensar nisso de ano a ano, de dois em dois anos ou de três em três.”

A outra mudança passa por tornar definitivas as disposições adoptadas pelo Parlamento no ano passado, que fundamentalmente alargaram de cinco para oito e dez anos os prazos de transição dos antigos contratos para o novo regime, para pessoas com mais de 65 anos ou com carência económica. “Se nós revogarmos e não assegurarmos que estas alterações possam continuar a vigorar, estamos a andar para trás”, diz Paula Marques.

"Não temos muito mais património no centro histórico"
As candidaturas ao concurso extraordinário de habitação no centro histórico devem abrir esta semana, precisa Paula Marques ao PÚBLICO. Trata-se de uma iniciativa exclusivamente destinada a pessoas que residam nas freguesias de Santa Maria Maior, Misericórdia, São Vicente e Santo António há mais de dez anos e que estejam “em comprovado risco de perder a habitação no prazo de um ano ou tenha perdido a habitação no ano anterior”.

“As candidaturas vão poder ser feitas preferencialmente nas quatro juntas de freguesia” e na loja municipal do Campo Grande, explica a vereadora. “Este concurso extraordinário é uma resposta específica para a situação que estamos a viver, que nós esperamos que seja transitória, no sentido em que temos de tomar medidas de fundo a montante para que as pessoas não saiam de suas casas”, diz.

A câmara destinou 100 casas a este concurso, uma das quais, na Graça, a vereadora mostrou ao PÚBLICO. Trata-se de uma habitação térrea T1 que sofreu obras de reabilitação recentemente e que está praticamente pronta a ser entregue. Há ainda 46 casas “em fase de finalização” de obras e concurso a decorrer para intervir nas restantes. A maioria das chaves poderá ser entregue “no final do primeiro trimestre de 2018”, acredita Paula Marques.

A autarca reconhece que não faz ideia de quantas pessoas se vão candidatar e diz que a câmara tem de estar preparada para fazer face a uma eventual enxurrada de pedidos. Isto apesar de o número de casas municipais disponíveis no centro histórico, segundo a vereadora, já ser escasso. “Estamos a fazer a análise de mais património que tenhamos no centro histórico. Não temos muito mais. Não consigo ter exponencialmente muito mais património, mas todo aquele que nós estamos a analisar e que possa engrossar este pilar de intervenção ou outro que nós decidamos, a prioridade é reabilitar.”

A alienação de mais prédios, como aconteceu nos mandatos anteriores, está para já afastada. “Eu acho é que em determinado momento é preciso perceber qual é a prioridade. E neste momento é clara a prioridade de reabilitação, em particular da propriedade no centro histórico”, diz Paula Marques.

Há ainda um quarto pilar a merecer atenção, que é o da oferta pública de habitação. Depois de vários anos a vender património imobiliário, a câmara começou agora a abrandar e a direccioná-lo para a reabilitação e arrendamento directo. “Se nós já defendíamos a utilização do património municipal, havendo uma situação que é pública, que nos chega através das juntas de freguesia, dos cidadãos e das cidadãs directamente, nas reuniões de câmara, na assembleia municipal, nas organizações locais, era por de mais evidente que esta mudança se impunha. Em bom tempo a câmara a decidiu fazer”, afirma a vereadora.

A autarquia prepara-se para lançar um concurso de habitação específico para os habitantes do centro histórico e tem em curso o Programa de Renda Acessível, através do qual quer injectar pelo menos seis mil casas, novas e reabilitadas, no mercado de arrendamento. Compete à administração central fazer o mesmo, defende Paula Marques. Esse é, aliás, um dos objectivos da nova secretária de Estado da Habitação.


Texto corrigido às 12h35 de 14 de Fevereiro: Paula Marques é vereadora da Habitação e Desenvolvimento Local e não do Urbanismo, como a legenda da fotografia dizia erradamente numa primeira versão deste artigo.

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