Arrendar
ou comprar? O dilema está de volta
ROSA SOARES
30/10/2016 – 08:37
Em pouco mais de
três anos, as rendas subiram 20% em Lisboa, mas os preços de venda
também dispararam. Ainda assim, a pressão para a compra de casa
renasceu e até pode compensar.
Arrendar ou comprar
casa no centro de Lisboa e do Porto deixou de ser uma opção para
famílias e jovens com rendimentos médios. A crescente aposta no
arrendamento para turistas reduziu significativamente a oferta de
casas para habitação permanente, e o resultado é visível no
aumento exponencial das novas rendas e dos preços dos imóveis para
venda.
A situação é mais
grave nos centros das duas maiores cidades do país, mas não melhora
significativamente em zonas mais afastadas, ou nas cidades satélites.
Só mesmo nas periferias, sem boas acessibilidades, é que os custos
da habitação são mais baixos.
Dois dos indicadores
que mostram como se tem comportado quer o valor das rendas pedidas
quer o preço de venda revelam subidas exponenciais. No segmento do
arrendamento, o Índice de Rendas Residenciais – Confidencial
Imobiliário mostra que, de 2013 a Junho de 2016, as rendas subiram
em média 21% no concelho de Lisboa, ficando 14 pontos percentuais
acima do valor médio nacional. Este indicador não desagrega, porém,
o centro histórico, porque se o fizesse a subida seria seguramente
bem mais elevada.
21%
subida
das rendas no concelho de Lisboa de 2013 a Junho de 2016
Já no segmento de
venda, o Índice de preços da Confidencial Imobiliária para os
centros históricos de Lisboa e do Porto revelam dados
impressionantes: o valor médio subiu 47,28% em Lisboa, e 36,89% no
Porto, no mesmo período.
O mercado da
habitação em Portugal volta, assim, a revelar sinais de
desequilíbrio: a opção pelo arrendamento é cara e a oferta
escassa; e aumenta a pressão para a compra de casa, alternativa que
também sai cara, mas onde há mais oferta.
A incentivar a
compra volta a estar o sector financeiro, que depois de uma travagem
entre 2008 a 2014, está novamente a conceder mais empréstimos. Este
negócio traz-lhe dupla vantagem, a rentabilização do dinheiro e a
venda de casas que têm em stock. Nesta ofensiva, os bancos contam
com um aliado de peso, as imobiliárias, que recebem comissões bem
mais interessantes que no arrendamento.
Mas a pressão
também vem da aproximação dos valores mensais de renda e das
prestações de um empréstimo no caso de aquisições a crédito. As
taxas de juro, actualmente em valores negativos, explicam parte da
aproximação, mas não toda. É que, com a Euribor, a referência
mais utilizada em Portugal, negativa, a banca sobe os spreads (margem
comercial), o que faz subir a taxa final.
A verdade é que se
for feita uma simulação que compare a compra ou o arrendamento de
uma mesma casa, recorrendo aos valores recentes do SIR-Sistema de
Informação Residencial da Confidencial Imobiliário, podemos
encontrar custos mensais muito aproximados.
Importa salvaguardar
que a aquisição implica despesas iniciais consideráveis, que
podem ou não ser incluídos no crédito, bem como encargos com
condomínios e impostos a suportar pelos proprietários que não
estão incluídos nas simulações. E ainda que os bancos só
emprestam 100% do valor de aquisição/avaliação nos imóveis que
têm em carteira, exigindo para os restantes uma entrada que pode
rondar os 20%.
Para os casos em que
há um bom “pé-de-meia”, a compra, vista apenas na perspectiva
do custo mensal e acumulação de riqueza, compensa
Mas as contas
mostram que, para os casos em que há um bom “pé-de-meia”, a
compra, vista apenas na perspectiva do custo mensal e acumulação de
riqueza, compensa.
Vamos a cálculos: o
preço médio por metro quadrado (m2) na freguesia da Misericórdia,
a mais cara de Lisboa, era de 11,50 euros no segundo trimestre do
corrente ano, o que atira o valor mensal da renda de uma casa com 100
m2 para 1150 euros/mês.
Na mesma freguesia,
mas no caso de compra, o preço médio de venda por m2 era, na mesma
altura, 3286 euros. Ou seja, uma casa com os mesmos 100 m2 custava
328.600 euros.
Se o comprador
recorresse a um empréstimo sobre o valor total, a 30 anos, associado
à Euribor a seis meses (que para este caso conta como zero), e com
um spread (margem do banco) de 2%, a prestação mensal a pagar é um
pouco mais elevada, ascendendo a 1214,57 euros, a que acresce o
condomínio, o seguro, e outros encargos.
Mas se o comprador
desse de entrada 20%, então a prestação mensal desceria para 971,6
euros, menos cerca de 190 euros face ao valor da renda.
No caso do Porto, as
simulações feitas para a União de freguesias de Cedofeita (inclui
centro histórico) e Lordelo do Ouro - Massarelos, os valores mostram
que a prestação do empréstimo, mesmo sobre o valor total de
aquisição, é mais baixa.
Compra tem mais
riscos
O valor a pagar
mensalmente é importante, mas há muitos outros factores a
considerar na decisão de compra ou arrendamento, vários deles
imprevisíveis.
Desde logo, a compra
de casa permite acumular riqueza, porque o empréstimo vai
diminuindo. No arrendamento a riqueza é acumulada pelo senhorio.
Mas se o
proprietário quiser ou precisar de ir trabalhar para outro lado não
pode levar “a casa às costas”. Ou se família aumentou, também
pode não conseguir esticá-la. Tem de a vender ou arrendá-la. No
arrendamento, a solução é mais fácil, apenas é preciso respeitar
os prazos de cessação previstos nos contratos ou na lei.
O proprietário fica
a mercê da política fiscal que, como o prova as alterações ao
imposto municipal sobre imóveis (IMI) incluídas na proposta de
Estado de 2017, pode sofrer alterações frequentes. Nesta matéria,
o inquilino não é directamente afectado, mas uma parte do aumento
do custo fiscal pode chegar através da actualização da renda, se o
contrato o permitir, ou no valor a pagar em contratos futuros.
A compra com recurso
a crédito tem ainda outra imprevisibilidade, a da evolução das
taxas de juro, actualmente muito baixas, mas que poderão subir nos
próximos anos. A acrescer a esta incerteza há ainda o peso das
comissões cobradas pelos bancos, que não têm parado de aumentar.
As obras de
manutenção dos imóveis comuns podem representar custos
apreciáveis. No arrendamento essa factura é paga pelo senhorio. Mas
o proprietário pode fazer obras em casa, enquanto o inquilino terá
de pedir ao senhorio para as fazer, e pode receber uma recusa ou um
aumento de renda.
O proprietário tem
ainda as reuniões e o custo do condomínio. O arrendatário só se
quiser. Há ainda o risco de maus vizinhos, ou de o prédio ter
passado a registar um entra e sai contante de novos inquilinos, a
horas impróprias, a arrastar bagagens. Aqui, a situação é
constrangedora para proprietários e inquilinos, mas estes últimos
podem mais facilmente fazer as malas e partir.
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