Ainda
o Orçamento do Estado
ANTÓNIO BAGÃO
FÉLIX 18/10/2016 – 02:31
O Orçamento do
Estado (OE) é apreciado, todos os anos, em versão a preto-e-branco,
com os seus defensores a só falar da parte branca e os seus
opositores a só falar do lado preto. O OE para 2017 não foge à
regra. Também se ouve muitas vezes “Orçamento de Estado” em vez
de Orçamento do Estado, conceitos nem sempre convergentes, bem pelo
contrário.
Depois de lida a
proposta, parece-me um OE resignado, apesar da redução dos défices
nominal e estrutural. Do lado dos impostos, é mais do mesmo, quer
dizer mais uns pozinhos de impostos e taxas, se possível,
dissimulados, mais focos de instabilidade tributária que minam a
confiança dos agentes económicos, “revogação de revogações”
(sobretaxa do IRS). Aqui se constata o disparate de se ter reduzido a
taxa do IVA sobre a restauração, impedindo o cumprimento pleno da
eliminação da sobretaxa do IRS. Com que sentido social? Um
“pormenor”: este ano não é apresentada a previsão dos impostos
um a um. Porque será?
Do lado da despesa
(com excepção de algumas boas iniciativas de simplificação
administrativa) não se vê o efeito de nenhuma reforma estrutural.
Continua tudo numa boa. E com optimismo. Por exemplo, como poupar 122
M€ na regra “2 por 1” de diminuição do emprego público,
depois da reintrodução das 35 horas e sabendo-se que, na maioria, a
saída conduz a um aumento do lado das pensões (CGA)?
A redução do
défice em 0,8 pontos percentuais deve-se inteiramente a dois
factores: aos estabilizadores automáticos (com a previsão de 1,5%
de aumento do PIB real e de uma exagerada inflação de 1,5%), por
via do aumento da receita tributária e diminuição do desemprego; e
a “outros efeitos” que são o enorme valor dos dividendos do
Banco de Portugal (305 M€) e uma possível recuperação da
garantia do BPP (450 M€).
Um ponto que aplaudo
é o do inadiável aumento de pensões. Mas é questionável não
abranger as pensões não contributivas ou reduzidamente
contributivas (pensão social e rural) e as pensões mínimas do
regime geral. Diz o Governo que agora não são aumentadas nos tais
10 euros em Agosto (curioso mês para aumentos, antes das eleições
autárquicas…) porque já tiveram acréscimos nos últimos 5 anos,
ao contrário de todas as outras que foram congeladas. É um bom
raciocínio aritmético, mas não é uma boa conclusão social.
Afinal estamos a falar de prestações que, mesmo com os aumentos já
verificados, se limitam a 202,34€/mês (pensão social, que tem
condição de recursos) 242,79€ (rurais) e regime geral (263€)
que poderiam ser sujeitos também a uma condição de meios. Lá
está, voltamos às escolhas políticas: a redução do IVA da
restauração (350 M€/ano) a limitar o aumento das pensões, desta
forma tão pouco de “esquerda” …
Positivo é o
alargamento aos 2º e 3º de vida das crianças do abono de família
mais elevado que já existe nos primeiros 12 meses. Está também
prevista uma nova prestação social única para deficientes, cuja
ideia é meritória e simplificadora. Todavia, o modo como tal é
anunciado no OE é, em bom português, intragável. Vejamos: “a
configuração da nova prestação de deficiência materializar-se-á
de forma a permitir uma integração de diferentes objectivos na
arquitectura actual do sistema, tendo por referência a Lei de Bases,
através de uma componente base, inspirada num princípio de
cidadania, associada à compensação de encargos não específicos
que derivam da condição de pessoa com deficiência ou incapacidade
e de um complemento, que visa o reforço do princípio de
solidariedade, enquanto elemento chave da cidadania[…]”.
Percebido?
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