Esquerda
e direita fecham cerco ao presidente da Caixa no Parlamento
MARGARIDA GOMES e
DAVID DINIS 30/10/2016 – 07:30
Com
o PS em completo silêncio, o PSD propõe uma lei nova, só para
forçar administradores da CDG a mostrar património. Bloco quer
esperar pelo TC, mas está disponível para uma solução destas.
PSD, BE, CDS e PCP
concordam que “ninguém está acima da lei” e, por isso, não
aceitam a decisão do presidente da CGD, António Domingues, de a
nova administração do banco do Estado não apresentar a declaração
de património no Tribunal Constitucional (TC). E, desta vez, pode
haver mesmo um consenso que obrigue o novo presidente da Caixa a
fazer aquilo que não quer - e a que o Governo o desobrigou.
Percebendo que a
divergência sobre os salários dos administradores já bloqueou
antes um acordo no Parlamento sobre a Caixa, o PSD decidiu ontem
desdobrar o projecto de lei que visa acabar com a excepção
“escandalosa” para os administradores da CGD, autonomizando o
ponto que diz respeito à transparência para chamar os votos do PCP
e Bloco, sem que isso tenha outra implicação - só mesmo tornar
claras as “obrigações declarativas” de António Domingues. De
fora desta proposta fica, por exemplo, uma outra sobre os salários
da CGD. Seria, portanto, uma lei autónoma, apenas com três artigos
(um dos quais sobre a entrada em vigor, obrigando a aplicar o diploma
já a esta administração). O Bloco, sabe o PÚBLICO, prefere não
discutir já a proposta, para não dar argumentos a Domingues na
resposta que irá dar ao TC. Mas admite que esta via possa ser
utilizada depois de haver uma decisão final do Tribunal
Constitucional.
“A forma mais
expedita de resolver esse assunto é autonomizar a parte relativa à
transparência, que fazia parte do nosso projecto, e suscitar junto
dos partidos uma aproximação para que se resolva de uma vez por
todas uma situação escandalosa. Nós desdobraremos a nossa
iniciativa em duas, para que não haja nenhum alibi por parte dos
partidos”, justificou ontem o líder do grupo parlamentar do PSD,
Luís Montenegro. “Ninguém perceberia no país que o presidente da
Caixa fosse diferente do Presidente da República, do presidente da
Assembleia da República, do primeiro-ministro, dos deputados”.
Oposição mais
próxima
Pedro Filipe Soares,
líder da bancada parlamentar do BE, anunciou ontem, no encerramento
das jornadas parlamentares, que o partido vai apresentar, em sede
discussão na especialidade do Orçamento do Estado (OE), uma
iniciativa semelhante, mas que terá mais dificuldade em passar: é
que o Bloco quer, também no OE e de uma assentada, resolver o
problema das declarações de rendimento, mas também “que os
salários dos gestores públicos, incluindo os da CGD, não sejam
superiores ao salário do primeiro-ministro”.
Colocando as duas
propostas na mesma norma, o Bloco terá menos probabilidades de fazer
passar a proposta (face à oposição do PSD e CDS em ver os
ordenados na banca reduzidos ao nível do do primeiro-ministro). Mais
fácil será o inverso, confirmou o PÚBLICO: que BE e PCP aceitem o
princípio que o PSD agora introduz, visto que não tem implicações
para além de obrigar António Domingues a um recuo.
A líder do CDS
estará de acordo. Ontem, Assunção Cristas acusou o Governo de ter
aprovado legislação que teve o “efeito colateral de isentar
destas obrigações de transparência" a administração da CGD.
Os centristas vão apresentar também, em sede de discussão do OE,
um projecto que garanta a obrigatoriedade de apresentação de
rendimentos e Assunção Cristas afirma estar “certa de que no
Parlamento haverá um consenso alargado” para aprovar a iniciativa.
Quanto ao PCP,
também fará pressão no mesmo sentido. O deputado e líder da
bancada do PCP, João Oliveira, admitiu ontem ao PÚBLICO que o
partido pode vir a apresentar um novo projecto, depois de ter visto o
seu primeiro chumbado (sobre salários e inclusão da Caixa no
estatuto de gestor público). “Tomamos a dianteira nesta questão e
não excluímos a possibilidade de apresentarmos uma outra proposta,
para que essa discussão possa ser feita com perspectiva de se
encontrar uma solução para o problema”, declarou o deputado.
PS em silêncio
total
O PÚBLICO fez ontem
várias diligências no sentido de perceber qual é a posição do
PS, mas ninguém da direcção do partido se mostrou disponível para
falar.
A verdade é que
António Costa já se tentou afastar da polémica, antecipando uma
troca de argumentos entre António Domingues e o Tribunal
Constitucional. O TC deve, nos próximos dias, enviar para o novo
presidente da Caixa uma intimação para apresentar uma declaração
de património. Domingues já tem uma nota de resposta pronta,
alegando que estará dispensado (dada a exclusão da Caixa do
estatuto do gestor público, feita pelo Governo e promulgada pelo
Presidente). O tira-teimas far-se-à à volta da interpretação de
outra lei, sobre o controlo público de riqueza dos titulares de
cargos públicos, que se mantém em vigor e poderá aplicar-se ainda
aos administradores do banco público.
Resta saber se, no
Parlamento, uma das propostas ontem anunciadas recolhe a maioria dos
votos dos partidos. E também ver como votará o PS nestes casos.
Sem comentários:
Enviar um comentário