Imagens e texto do
Dia / OVOODOCORVO
António
Costa e as Lajes “chinesas”
Teresa de Sousa :
( …) 2. António
Costa foi à China numa visita centrada na cooperação económica e
destinada a aproveitar a “parceria estratégica” que existe entre
os dois países e que, na Europa, apenas existe com meia dúzia de
outros países europeus (sobretudo os maiores). Até aqui nada de
novo. O capital chinês (público, privado ou assim-assim) já está
em grandes empresas portuguesas.
Depois da EDP ou da
REN, está a entrar em força no sistema financeiro. A economia
chinesa é uma espécie de “capitalismo selvagem”, dirigido por
um partido único que controla quase tudo. Mas é também, entre as
grandes economias, aquela que mais cresceu e ainda cresce. Não há
líder europeu que não se apresente em Pequim com grandes delegações
de empresários para assinar contratos milionários. Para um país
que precisa desesperadamente de investimento estrangeiro, não convém
ignorar a China. Até aqui tudo bem.
Quando essa parceria
inclui a presença da China num novo modelo de aproveitamento das
Lajes, de onde os americanos estão a sair e em que assenta o acordo
bilateral entre os dois países em matéria de defesa, a mensagem
torna-se mais complexa. O primeiro-ministro já esclareceu que se
tratou apenas de convidar a China a participar num projecto
científico internacional, tirando partido da localização e das
infra-estruturas da base, da mesma maneira que seria bem-vinda a
participação dos EUA, do Reino Unido ou da França.
Pode servir para
atenuar o efeito das suas palavras. Mas não creio que os EUA fiquem
indiferentes, apesar da reacção conciliadora do embaixador
americano em Lisboa. Por várias razões.
A China tem uma
estratégia europeia com princípio, meio e fim que está a aplicar
com eficiência. Aproveitou a crise para investir nos países do Sul
mais vulneráveis e mais necessitados de capital, somando-lhe uma
atenção particular que já tinha nos países de leste. Acresce que
ninguém sabe qual será o futuro da China e que a História nos
ensina que, quase sempre, a emergência de uma nova potência que
quer desafiar o poder das potências estabelecidas pode custar uma
guerra. Na verdade, ninguém tem a certeza de nada, a não ser que
uma implosão chinesa (por razões económicas ou sociais) é um
cenário de pesadelo para o mundo inteiro.
3. Ora, os países
europeus (grandes ou pequenos) habituaram-se a confiar nos Estados
Unidos para garantir a segurança na Ásia-Pacífico, dando-lhes toda
a tranquilidade para fazer os seus negócios.
É uma situação
agradável e barata, mas que ninguém pode garantir que vai continuar
eternamente. E, depois, há as decisões políticas e estratégicas.
No final da era Bush, alguém se lembrou, por óbvia pressão
chinesa, de colocar em cima da mesa do Conselho de Ministros da União
o fim do embargo à venda de tecnologia à China que pudesse ser para
fins militares. A medida foi tomada depois do massacre de Tiananmen.
Houve vários governos (incluindo o nosso) que se mostraram
favoráveis ao levantamento, mas prevaleceu o bom senso e, sobretudo,
a pressão brutal da diplomacia americana. Enfim, com Obama ou com
Bush, mesmo que sejam totalmente diferentes as suas perspectivas
sobre o exercício do poder mundial, há coisas que permanecem.
Os governos europeus
continuam a considerar que a política americana de cooperação/
contenção da China é demasiado dura. Um dia destes, como se viu
nesta campanha eleitoral, os americanos podem cansar-se de garantir a
segurança europeia ou do Japão ou da Coreia do Sul. Claro que há
oportunidades e oportunidades. Portugal tem uma excelente porta
aberta para atrair o investimento chinês em Sines, que ganhou uma
nova dimensão geo-económica com o alargamento do Canal do Panamá
para deixar passar os gigantescos contentores que chegam à Europa,
graças à sua localização e às suas águas profundas. Dir-me-ão
que tudo tem contrapartidas. Pois é. Desde que não ponham em causa
os interesses estratégicos do país.
Teresa de Sousa
Jornalista. Escreve
ao domingo
teresa.de.sousa@publico.pt
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