D. Duarte: "Para muitos espanhóis não faz sentido a independência de Portugal"
01 DE DEZEMBRO DE 2017
João Céu e
Silva
D. Duarte
desconfia do país vizinho e o filho, D. Afonso, na sua primeira entrevista, defende
um referendo sobre o regime
Antes de
dar início à entrevista, D. Duarte critica a atuação recorrente dos partidos:
"Qualquer dona de casa sabe que se gastar o que não tem acaba mal e vemos
que os constantes primeiros-ministros não percebem ou não querem entender isso.
É uma síndrome republicana resolver os problemas até às próximas eleições e que
a população esteja contente." Ao seu lado está o sucessor, o infante D.
Afonso, que fez as primeiras declarações públicas nesse estatuto neste encontro
(no final).
Entrevista
a D. Duarte
Para muitos
espanhóis não faz sentido a independência de Portugal
Estão a
aumentar os simpatizantes dos valores monárquicos?
Esse é um
número difícil de avaliar, mas os valores dizem que há 30% de pessoas que acham
que um rei era melhor que um Presidente e 70% considera que o Estado português
deve reconhecer a família real e dar-lhe um lugar oficial. Ou seja, são
simpatizantes mesmo que não sejam monárquicos. Por outro lado, diria que não há
assim tantos republicanos convictos e muitos dos que existem são por razões que
não têm base política mas afetiva ou familiar. Outro número a ter em conta é
que os inscritos nas reais associações tem aumentado.
Há quem
defenda núcleos monárquicos nos partidos. Concorda?
Sim,
lembro-me até que nos anos 1980 havia um núcleo monárquico no PS. É óbvio que
há mais tendência para os monárquicos escolherem partidos conservadores do que
os de esquerda, embora o grupo de Gonçalo Ribeiro Teles fosse considerado de
esquerda.
O Partido
Popular Monárquico foi um erro?
Não posso
dizer que seja um erro, pois às pessoas que são monárquicas assiste o direito a
terem um partido, mas benéfico não é porque muita gente identifica o movimento
monárquico com o PPM e não se percebe da exata alternativa monárquica à
republicana.
Os
simpatizantes da monarquia votam no PPM?
A maior
parte vota noutros partidos.
Que modelo
de monarquia atual seria melhor para Portugal na sua opinião?
O modelo
excelente tem sido o da Bélgica. Em crises governamentais o rei nomeia governos
e tem funcionado bem.
A questão
do referendo para a restauração da monarquia é uma luta dos monárquicos. Há
condições?
Depende do
espírito democrático dos deputados. Há os que consideram que não se deve fazer
essa pergunta ao povo porque a resposta pode sair errada e não a irão aceitar.
No entanto, já houve uma maioria de deputados favoráveis há uns anos que não
conseguiram os dois terços necessários. A Constituição proíbe sair da forma
republicana de governo, mesmo que o professor Jorge Miranda não concorde com
isso.
O que diria
a União Europeia se houvesse referendo sobre a monarquia?
Muitos
países da UE são monarquias e até dos mais europeístas. Porquê? Os meus primos
da Bélgica e do Luxemburgo não têm reticências à União - mesmo que eu tenha .
Sentem que mesmo que o país perca parte da sua independência política como
mantêm a sua monarquia não perderão identidade. Acho que a União não deve
exagerar na centralização, pois pode criar reações negativas por parte das
populações.
Por isso
foi contra o euro?
Defendi que
a entrada no euro foi má para a economia portuguesa. Sair? Não se deve
dramatizar excessivamente, antes analisar as alternativas.
Quando se o
ouve a dizer isso parece sintonizado com o Bloco de Esquerda!
Há muitos
aspetos em que o PCP e o Bloco de Esquerda têm razão. Mais nas preocupações do
que nas soluções que propõem, embora o PCP tenha mostrado muito boas soluções
no que tem proposto. Só que há um espírito clubista que não permite aos grandes
partidos aproveitar as boas propostas.
Se fosse
rei aceitaria uma geringonça?
Os reis
europeus nunca tomam uma posição pública que possa contrariar a dos políticos,
só o fazem em particular para encontrar bons compromissos. Nem tenho memória de
um rei derrubar um governo, como aconteceu em Portugal, ainda por cima
maioritário.
Quanto à
geringonça...
Tem aspetos
muito positivos, como o de conseguir que partidos que nem sempre se deram bem
sejam capazes de viabilizar um governo. O que é perigoso é não aproveitarem a
situação para diminuir a dívida, por exemplo.
Já o disse
ao primeiro-ministro?
Não, só nos
temos encontrado em ocasiões públicas. Mas gostava de falar com ele sobre o
assunto.
Os
monárquicos estão em vários partidos. A que se deve essa integração?
Porque
existem deputados socialistas que são monárquicos. No PCP, nunca ouvi nenhum
abertamente monárquico mas há muitos simpatizantes. Basta ver como nos recebem
bem.
Acompanha a
crise na Catalunha?
Nós,
portugueses, podemos fazer muito pouco. No entanto, devíamos preparar-nos para
as várias possibilidades deste processo no futuro, mesmo que para os
portugueses seja indiferente.
Quase todos
os seus antecessores tiveram de se defender de Castela. Qual é a sua posição
sobre a nossa integridade?
Prefiro não
falar nisso para não ofender todos os meus amigos espanhóis, a começar pelos
meus primos. Diria que Juan Carlos e Felipe têm conseguido manter a
estabilidade e unidade.
Franco, no
entanto, fez uma tese sobre a invasão de Portugal em 24 horas...
Saiu um
artigo numa revista em França que relata esse projeto de invasão de Portugal e
porque não foi para a frente. Salazar demonstrou a Franco que os EUA iriam
entrar na II Guerra Mundial e o seu potencial levaria à derrota da Alemanha.
Portanto, Espanha não deveria ficar do lado dos derrotados. Essa é uma razão,
há outra: os espanhóis não sabiam qual a reação dos portugueses e como lhes
tinham corrido mal as anexações de territórios em Marrocos... Para muitos
espanhóis não faz sentido a independência de Portugal, mesmo que sejam muito
amigos do nosso país e ótimas pessoas. Recordaria que um político português
perguntou a Juan Carlos se não achava que era hora de pensar a União Ibérica e
a resposta foi que estava mais preocupado com a união espanhola.
Está em
perigo neste momento?
Sim, mas se
tivesse havido consulta popular, o resultado seria maioritariamente a favor da
união com a Espanha.
Juan Carlos
faria o mesmo discurso que o rei Felipe sobre a questão catalã?
Provavelmente
teria evitado tomar uma posição pública.
Como viu a
passagem de testemunho?
Para o
príncipe Felipe teria sido preferível ter tido mais um tempo de liberdade antes
de assumir responsabilidades, mas o estado de saúde de Juan Carlos levaram
Felipe a assumir o cargo.
Ficou
chocado com a destruição do Pinhal de Leiria?
Foi uma dor
de alma deixar arder uma floresta que tem 800 anos só porque não tem sido bem
cuidada.
Dá atenção ao ambiente. Como viu Trump rasgar o Acordo de
Paris?
Estou
convencido que a sua base de apoio é muito empresarial e não gostam da política
ambiental de Obama - melhor que a atual. É um problema tipicamente republicano,
o de satisfazer quem apoiou a sua candidatura.
Foi visto
em programas de TV mais leves ...
... Foi
divertido. A maior parte dos monárquicos que consultei não queriam que fosse -
estavam preocupados -, mas a minha experiência é de que me dou bem nos
programas. Estou à vontade e os entrevistadores são amáveis.
Não acatou
as opiniões mas também foi sempre rebelde, até fez uma greve de fome no Colégio
Militar.
Foi uma
iniciativa conjunta devido a uma injustiça feita a um aluno. Uma experiência
interessante, porque ser adolescente é o máximo da aventura.
Já teve
dessas "experiências interessantes" de rebeldia com os seus filhos?
Muitas
vezes estão em desacordo comigo mas conversamos e chegamos a uma conclusão.
Claro que é mais fácil com homens do que raparigas, elas são por norma mais
emocionais. Mas as mulheres políticas são muito melhores que os homens, pois
quase sempre têm uma visão menos setorial da realidade e são menos agressivas.
Algum dos seus filhos renega o ideal monárquico?
Não, os meus filhos são inteligentes.
Entrevista a D. Afonso
Os
portugueses devem ter direito a escolher o regime
É
partidário da realização do referendo para a restauração da monarquia?
Claro que
sou, Portugal é uma democracia. O que não se percebe é ser uma democracia
limitada como a nossa, quer na Constituição, nos direitos e na imposição das
suas leis. Numa democracia não se deve ter medo da mudança e da opinião dos
cidadãos. Os portugueses devem ter o direito de escolher o regime, quer seja
monárquico ou republicano.
Da sua
convivência com outros jovens, que futuro teria um regime monárquico em
Portugal?
Conheço e
tenho muitos amigos da minha idade, tanto monárquicos, como republicanos ou
"neutrais". Não costumamos falar muito sobre o tema de monarquia vs.
república, mas tenho reparado cada vez mais que a minha geração e futuras
gerações criticam e se queixam da forma de liderar o país, afirmando que
existem formas melhores para Portugal e que é necessário possuir valores mais
sólidos. Muitos me perguntam, uns em tom de brincadeira, outros não:
"Quando é que sobes ao poder para resolver isto tudo?", "Quando
é que se impõe uma monarquia?", ao que respondo: "Quando for altura e
o povo português achar correto."
Sente-se
respeitado enquanto representante da instituição real ou essa sua qualidade não
é tida em conta?
Não é algo
com que me costume importar. Sempre fui bem recebido, tanto com os meus pais e
família. É normal virem ter comigo e perguntarem-me coisas sobre mim ou sobre a
família. Sinto que existe esse respeito, mesmo que por vezes ache em excesso.
Um respeito mútuo é saudável e o meu papel influencia um pouco, mas isso não me
sobe à cabeça.
Como está a
preparar-se para suceder ao seu pai?
Atualmente
pratico uma sólida formação académica, mas também adquiro alguma experiência e
valores através dos meus pais. Acompanho a família em várias cerimónias em
Portugal e no estrangeiro. Tenho consciência de que essas experiências servem
para melhor me preparar para desenvolver o papel que me espera desde muito
cedo.
Frequenta
um curso de Ciência Política. É o mais ajustado?
Acho que
sim. Acho que o curso me pode fornecer forte preparação para uma vida futura,
tanto política como numa cultura geral muito abrangente
Tem votado nas eleições?
Acho que um
rei não se deve meter na política e, atualmente, participo e voto sempre que
posso. Faço uma exceção nas presidenciais, é mais coerente.
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