domingo, 17 de dezembro de 2017

O antes e o depois de um Verão trágico

 Imagens de OVOODOCORVO

A dita frase é / poderá ser “compreensível” no seu contexto, mas isso não a torna aceitável perante o “Annus Horribilis” que foi 2017 para Portugal e as perspectivas futuras ainda mais preocupantes.
“Não fosse Marcelo Rebelo de Sousa a pressionar o Governo, a situação seria pior.”
(…) “Sabemos, sim, que o que se passou no Verão nesses lugares distantes limita o optimismo do primeiro-ministro quando afirma que “este foi um ano particularmente saboroso para Portugal. Foi-o certamente no plano da economia e das finanças públicas (era a isso que António Costa se referia). Mas não o foi na constatação de que havia um Portugal onde o fogo mata nas estradas, nas casas dos centros das aldeias, um país onde ardeu mais de 60% de toda a área florestal queimada este ano na Europa. Não foi ainda na constatação de que, perante uma emergência, o Estado e o Governo não foram capazes de nos proteger.” 
OVOODOCORVO

O antes e o depois de um Verão trágico

Na floresta e no interior há um antes e um depois deste Verão. O “antes” persiste; e o “depois” tem ainda imensas barreiras a superar

Manuel Carvalho
17 de Dezembro de 2017, 6:30

Várzeas, Pobrais, Nodeirinho, Barraca da Boavista, Vila Facaia ou Travancinha eram até este Verão apenas lugares do esquecimento a que Portugal votou o seu território interior. O fogo e a destruição que causou impuseram o seu regresso ao mapa. De certeza ao mapa da culpa e do remorso; provavelmente também ao mapa da esperança e do futuro. Há um antes e um depois de Junho e de Outubro de 2017 e ainda não sabemos ao certo se o antes do esquecimento, da negligência e da incúria se vai impor ao depois das promessas de ajuda, de políticas florestais consistentes e de empenhos sérios na revalorização do interior.

Sabemos, sim, que o que se passou no Verão nesses lugares distantes limita o optimismo do primeiro-ministro quando afirma que “este foi um ano particularmente saboroso para Portugal”. Foi-o certamente no plano da economia e das finanças públicas (era a isso que António Costa se referia). Mas não o foi na constatação de que havia um Portugal onde o fogo mata nas estradas, nas casas dos centros das aldeias, um país onde ardeu mais de 60% de toda a área florestal queimada este ano na Europa. Não foi ainda na constatação de que, perante uma emergência, o Estado e o Governo não foram capazes de nos proteger. 

Resta olhar para o futuro e esse futuro está longe de ser auspicioso. O relato dos apoios do Estado às vítimas prova uma vez mais o fracasso de uma administração centralizada, labiríntica e ineficiente. Os atrasos nos pagamentos, os projectos que se exigem a agricultores idosos e incapazes de seguir o absurdo da burocracia são a prova de quem neste país quem decide está longe de conhecer os destinatários das suas decisões ou os lugares que eles habitam. Não fosse Marcelo Rebelo de Sousa a pressionar o Governo, a situação seria pior.

Mas há também um futuro que promete ser mais risonho. Pela primeira vez, parece haver no ar uma política séria de prevenção dos fogos. A escolha de Tiago Oliveira para comandar as operações é auspiciosa. Os planos do Ministério da Agricultura são sensatos – veremos se saem do papel. O Ministério da Defesa vai ter uma palavra a dizer. As autarquias prometem cumprir a sua parte. A desgraça deste Verão está a forçar mudanças. Não podemos deixar que o tempo, o esquecimento e o entorpecimento dos poderes públicos as comprometam. Será essa a melhor homenagem que podemos prestar aos que pagaram com a vida ou com os seus bens o desleixo que nos perseguiu até este Verão.


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