A dita
frase é / poderá ser “compreensível” no seu contexto, mas isso não a torna
aceitável perante o “Annus Horribilis” que foi 2017 para Portugal e as
perspectivas futuras ainda mais preocupantes.
“Não fosse
Marcelo Rebelo de Sousa a pressionar o Governo, a situação seria pior.”
(…) “Sabemos,
sim, que o que se passou no Verão nesses lugares distantes limita o optimismo
do primeiro-ministro quando afirma que “este foi um ano particularmente
saboroso para Portugal. Foi-o certamente no plano da economia e das finanças
públicas (era a isso que António Costa se referia). Mas não o foi na
constatação de que havia um Portugal onde o fogo mata nas estradas, nas casas
dos centros das aldeias, um país onde ardeu mais de 60% de toda a área
florestal queimada este ano na Europa. Não foi ainda na constatação de que,
perante uma emergência, o Estado e o Governo não foram capazes de nos proteger.”
OVOODOCORVO
O antes e o
depois de um Verão trágico
Na floresta
e no interior há um antes e um depois deste Verão. O “antes” persiste; e o
“depois” tem ainda imensas barreiras a superar
Manuel
Carvalho
17 de Dezembro de 2017, 6:30
https://www.publico.pt/2017/12/17/sociedade/editorial/o-antes-e-o-depois-de-um-verao-tragico-1796261
Várzeas,
Pobrais, Nodeirinho, Barraca da Boavista, Vila Facaia ou Travancinha eram até
este Verão apenas lugares do esquecimento a que Portugal votou o seu território
interior. O fogo e a destruição que causou impuseram o seu regresso ao mapa. De
certeza ao mapa da culpa e do remorso; provavelmente também ao mapa da
esperança e do futuro. Há um antes e um depois de Junho e de Outubro de 2017 e
ainda não sabemos ao certo se o antes do esquecimento, da negligência e da
incúria se vai impor ao depois das promessas de ajuda, de políticas florestais
consistentes e de empenhos sérios na revalorização do interior.
Sabemos,
sim, que o que se passou no Verão nesses lugares distantes limita o optimismo
do primeiro-ministro quando afirma que “este foi um ano particularmente
saboroso para Portugal”. Foi-o certamente no plano da economia e das finanças
públicas (era a isso que António Costa se referia). Mas não o foi na
constatação de que havia um Portugal onde o fogo mata nas estradas, nas casas
dos centros das aldeias, um país onde ardeu mais de 60% de toda a área
florestal queimada este ano na Europa. Não foi ainda na constatação de que,
perante uma emergência, o Estado e o Governo não foram capazes de nos proteger.
Resta olhar
para o futuro e esse futuro está longe de ser auspicioso. O relato dos apoios
do Estado às vítimas prova uma vez mais o fracasso de uma administração
centralizada, labiríntica e ineficiente. Os atrasos nos pagamentos, os
projectos que se exigem a agricultores idosos e incapazes de seguir o absurdo
da burocracia são a prova de quem neste país quem decide está longe de conhecer
os destinatários das suas decisões ou os lugares que eles habitam. Não fosse
Marcelo Rebelo de Sousa a pressionar o Governo, a situação seria pior.
Mas há
também um futuro que promete ser mais risonho. Pela primeira vez, parece haver
no ar uma política séria de prevenção dos fogos. A escolha de Tiago Oliveira
para comandar as operações é auspiciosa. Os planos do Ministério da Agricultura
são sensatos – veremos se saem do papel. O Ministério da Defesa vai ter uma
palavra a dizer. As autarquias prometem cumprir a sua parte. A desgraça deste
Verão está a forçar mudanças. Não podemos deixar que o tempo, o esquecimento e
o entorpecimento dos poderes públicos as comprometam. Será essa a melhor
homenagem que podemos prestar aos que pagaram com a vida ou com os seus bens o
desleixo que nos perseguiu até este Verão.
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