O Airbnb enfrenta um problema existencial: como pode prometer aos turistas viverem como um morador local se há cada vez menos moradores locais nos centros históricos? |
O novo fado de Lisboa
23.12.2016 às 15h00
O Airbnb
enfrenta um problema existencial: como pode prometer aos turistas viverem como
um morador local se há cada vez menos moradores locais nos centros históricos?
NELSON
MARQUES
No fado de
Amália que Carlos Paião escreveu e Gisela João agora canta, uma mulher abre a
porta de casa e vê um ovni pousado no quintal. Pede educadamente ao senhor
extraterrestre que se vá embora, porque tem a roupa a secar e esta ainda se vai
sujar se aquela coisa ali ficar, “a deitar fumo para fora”. “O pior é a vizinha/
que parece que adivinha/ quando vir que estou sozinha/ com um estranho em minha
casa.” Mas já que o senhor extraterrestre estava ali de pé, a mulher convida-o
a entrar. Faz-lhe pena, nem tem cara de mau. “Conte agora novidades:/ É casado?
Tem saudades?/ Já tem filhos? De que idades?/ Só um? A quem é que sai?/ Tem
retratos, com certeza./ Mostre lá. Ai que riqueza!/ Não é mesmo uma beleza?/
Tão gordinho, sai ao pai.”
A letra não
o diz, mas a cena só se pode passar em Alfama, o berço do fado. Mas o fado de
Alfama agora é outro. O bairro velhinho que cantava Fernando Maurício, um dos
mais antigos de Lisboa, lavou a cara. Recuperaram-se edifícios decrépitos,
chegaram estrangeiros endinheirados, mas os que viviam no bairro foram sendo
desprezados. Desalojados à força, sem dinheiro para fazer face às rendas
galopantes, muitos foram empurrados para fora da zona onde sempre viveram.
Alfama tem saudades do tempo em que a saudade era tudo o que tinha. Agora
(quase) só tem turistas. E o tempo, que não volta para trás.
Lisboa deve
ser uma cidade linda debaixo de tanto turista, pensaria um extraterrestre que
aqui aterrasse. Talvez chegasse no mastodôntico navio atracado atrás do Museu
do Fado nesta manhã de dezembro, pronto a despejar milhares de pessoas no
coração de Lisboa (cerca de meio milhão este ano, segundo a Administração do
Porto de Lisboa). Ou então num dos voos low cost que ajudaram a disparar o
número de passageiros que aterraram no aeroporto de Lisboa (mais de 20 milhões
em 2015, um recorde que deverá ser batido este ano). Depois talvez se juntasse
ao magote de gente que se atropela nas ruas e vielas do centro histórico,
escondido atrás de máquinas fotográficas e smartphones. Era provável até que
fosse acelerar num go-car amarelo onde uma voz metalizada debita banalidades
sobre a cidade ou se rendesse ao seu novo ex-líbris, os tuk-tuks, very typical,
como ironizam os graffiti gravados nas paredes de Alfama.
Um desses
modernos riquexós, agora elétricos por força de uma lei que entra em vigor em
janeiro, estaciona por breves instantes junto ao Museu do Fado, com um casal de
turistas. “Isto é Al-fama, o bairro mais típico de Lisboa”, conta Tiago
Salazar, escritor com nove livros publicados (o último dos quais um romance,
“As Escadas de Istambul”), viajante profissional que já conheceu mais de 100
países, marido da cantora e fadista Cristina Branco. No início do ano, quando a
crise apertou, ele virou-se para os tuk-tuks.
O próximo
livro, garante, será sobre a perspetiva que um “mototurista acidental” tem do
turismo na sua própria cidade. “Não sou saudosista nem melancólico, as cidades
devem evoluir. Mas em alguns bairros que conheço melhor, como Alfama e
Mouraria, o facto de haver uma hiperexploração do alojamento local [AL] está a
provocar um fenómeno de rejeição das próprias comunidades.” Vê-o todos os dias.
Nas pessoas da Graça que não conseguem entrar no elétrico ou nas ruas tomadas
“por vandalismos de ocasião que nascem de bebedeiras fortuitas”.
ALFAMA,
BAIRRO ESQUECIDO
Nesta manhã
de dezembro, Lisboa despertou com um sol de verão: estão 17 graus centígrados
ao meio-dia. O sol pode nascer para todos, mas em Alfama só brilha para alguns.
Foi para nos mostrar essa realidade que Maria de Lurdes Pinheiro, presidente da
Associação do Património e População de Alfama (APPA), nos espera à porta do
Museu do Fado. Aceitou guiar-nos pelas ruas e vielas estreitas do bairro, com
os seus becos recatados, onde, mesmo em dezembro, não faltam estrangeiros a
arrastar trolleys.
No
Miradouro de Santo Estêvão, Maria de Lurdes ainda recorda o tempo em que dali
só se viam telhados podres e partidos. “Veja como está agora”, diz, apontando
para um belo terraço com espreguiçadeiras a convidar o sol. Há cinco anos,
quando ainda era presidente da Junta de Santo Estêvão (entretanto integrada na
freguesia de Santa Maria Maior), clamava pela reabilitação de uma zona votada a
décadas de esquecimento. Agora, brame contra o abandono a que a reabilitação
votou os habitantes do bairro, que sempre foi casa de gente desafortunada.
“Aqui viviam os pobres dos mais pobres”, conta.
Alfama
mudou muito nos últimos anos. A atividade económica que lhe dava vida foi
desaparecendo aos poucos: foram-se os despachantes, os bancos, a Alfândega, os
estabelecimentos fabris das Forças Armadas, a atividade portuária... “Hoje
praticamente não há outras atividades económicas além das que estão viradas
para o turismo. Foi saindo população [um quinto entre 2001 e 2011, sobretudo
mais jovens], foi acabando o pequeno comércio, foram retirando carreiras de
autocarro.” Agora há ruas inteiras “onde já não se fala português”. E prédios
renovados onde não mora ninguém, só gente de passagem.
O
debate em torno do Airbnb tem extremado posições: moradores de Barcelona
manifestam-se contra os alojamentos para turistas
Turistas
sempre houve em Alfama, e a atividade é importante quer para a cidade quer para
o país, reconhece a antiga autarca — o sector representa 15% das exportações,
8% do emprego total e 5% do PIB do país, criou 40 mil empregos nos primeiros
nove meses do ano e gerou mais de 11 mil milhões de euros de receitas em 2015.
Não se pode, diz, “é viver em regime de monocultura”, sem gente a morar nos
bairros. “O que se vê é uma reabilitação de prédios virada para o turismo, com
os alojamentos locais a substituírem as casas de habitação.” Há vários
moradores, sobretudo idosos, a receberem cartas dos senhorios para pôr termo
aos contratos de arrendamento, conta. Muitos deles vivem sozinhos, dependem das
pessoas que conhecem ali. “Há quem vá ao café para lhes darem uma injeção de
insulina. O que vai ser dessas pessoas? Vão ser forçadas a sair, porque os
valores das rendas são muito altos.” Segundo o Índice de Rendas Residenciais da
Confidencial Imobiliário, no segundo trimestre de 2016, as rendas na freguesia
subiram 18,5% em relação ao mesmo período do ano passado, praticamente o dobro
do aumento registado no resto da cidade (9,5%). A renda média contratada foi de
10,9 euros por metro quadrado, o que dá 545 euros para um apartamento de apenas
50 metros quadrados. Um imóvel de gama alta com 100 metros quadrados
pode ultrapassar os 2000 euros.
A APPA foi
criada há 30 anos por autarcas, moradores, especialistas e outras pessoas que
se preocupavam com a degradação do bairro e da qualidade de vida dos moradores.
Nos anos 80, a palavra de ordem era “Alfama, recuperação ou morte”. A
preocupação agora é a “turistificação desenfreada”, que, aliada “à desgraça da
nova lei do arrendamento urbano” — que veio facilitar os despejos nos casos em
que o proprietário queira fazer obras no prédio —, está a contribuir para uma
sangria no centro histórico. “A Câmara tinha aqui muito património municipal e
começou a vendê-lo, abrindo a porta à especulação imobiliária, a este negócio em
que os prédios são transformados em apartamentos para turistas. Foi-se tornando
muito difícil morar em Alfama e tornou-se ainda mais difícil ter emprego no
bairro. Mas não começou agora, o Santana Lopes já queria transformar Alfama num
condomínio de luxo.”
O EXEMPLO
DE BARCELONA
Este
processo, conhecido como gentrificação (em que a chegada de novos residentes de
classe média acaba por expulsar as populações de menos recursos), é muito
familiar para Agustin Cocola Gant, investigador do Centro de Estúdios Geográficos
na Universidade de Lisboa. O catalão estudou-o em Barcelona, onde a explosão de
oferta de alojamento para turistas gerou receios de uma ‘disneyficação’ — uma
cidade com muitas atrações mas sem habitantes. A nova presidente da cidade, Ada
Colau, uma antiga ativista de esquerda pelo direito à habitação, suspendeu as
licenças para novos hotéis e apartamentos turísticos e endureceu a sua posição
sobre o arrendamento de curta duração: foi a primeira autarca a multar as
plataformas Airbnb e Homeaway (primeiro em 30 mil euros, depois em 600 mil, por
reincidência), por anunciarem apartamentos ilegais (um tribunal anulou a
primeira coima esta semana, mas o município irá recorrer).
“Em 2010
havia em Barcelona 3000 licenças de apartamentos turísticos. Em 2014 já eram
9000. Este aumento deve-se sobretudo ao Airbnb [a maior plataforma de alugueres
para turistas], que foi criado em 2008 e se popularizou a partir de 2010, 2011.
Não estamos a falar de famílias que partilham a sua casa, mas de investidores e
proprietários que compram imóveis, desalojando os inquilinos, para convertê-los
em alojamentos turísticos. O Airbnb é uma plataforma para especuladores
imobiliários”, refere Gant, que no início de 2015 veio para Lisboa estudar as
relações entre o turismo e a gentrificação no centro histórico da cidade.
Segundo o
investigador, a capital portuguesa “vai pelo mesmo caminho e de uma forma mais
rápida”. A culpa, garante, é da reforma da lei do arrendamento, em 2012, porque
facilitou a expulsão de inquilinos. E se o fenómeno potenciou muito a
reabilitação de prédios que estavam degradados, contribuindo para o
embelezamento da cidade, está também a criar um problema social. “Assemelha-se
muito aos primeiros casos de gentrificação em Londres, com a reabilitação de
prédios para a classe média à custa da saída da classe trabalhadora.” Os
comerciantes também não escapam à subida das rendas e às novas regras, que os
deixaram mais desprotegidos. Se nada for feito para proteger o comércio
tradicional de Lisboa, este “irá desaparecer”. E com ele irão muitos
residentes, “porque o comércio tradicional presta um serviço diário aos
moradores e é um espaço de encontro, cumpre uma função de coesão social. Sem
ele, os residentes terão menos motivos para viver no centro”.
Para Ana
Gago, que está a colaborar no projeto de Gant realizando entrevistas em Alfama,
há a sensação generalizada nos moradores “de que estão em segundo plano
relativamente aos turistas” e de que “o grande problema é o AL”. “Todos os
entrevistados sentem que as obras de reabilitação (tanto públicas como
privadas), o policiamento (a esquadra de Santa Apolónia passou a ser uma
esquadra de Turismo), a limpeza das ruas e o novo comércio servem os visitantes
e os ‘inquilinos’ temporários e não os moradores.” Muitos estão fartos dos
turistas, do barulho fora de horas, do lixo acumulado na rua, dos estranhos a
entrar no prédio a qualquer hora da noite.
DÉCADAS DE
ABANDONO
O acesso à
habitação no centro histórico de Lisboa é igualmente uma bandeira de Rita
Silva, presidente do coletivo Habita, uma organização que luta pelo direito à
habitação e à cidade. A também dirigente do Bloco de Esquerda afirma que a
discussão não deve ser centrada no AL, embora este seja uma parte importante do
problema, “porque tem vindo a subtrair em alguns bairros um elevadíssimo número
de habitações que estariam para o mercado de arrendamento, que já é por si
pequeno e agora está mais pressionado”. Um estudo recente da Universidade Nova
de Lisboa confirma que, desde 2014, o AL teve um impacto de 30,5% no preço das
casas e de 13,2% nas rendas em Lisboa.
Mas a saída
de população do centro histórico não é nova e a sua explicação não é simplista.
Tem raízes mais estruturais e históricas, com o desenvolvimento desde os anos
80 de “uma política única de apoio à expansão urbana” com subsídios diretos e
indiretos à construção nova, “que serviu muito bem à banca e às empresas
promotoras”, à custa de um endividamento privado “muito considerável”. “Não se
investiu nada nem na reabilitação, nem no mercado de arrendamento, nem na
habitação pública. Essa política promoveu o abandono das cidades.”
Rita Silva
aponta ainda o dedo a outro fenómeno nascido com a crise económica iniciada em
2008: a diminuição drástica do acesso ao crédito fez com que toda a pressão do
mercado de habitação se concentrasse no arrendamento, fazendo disparar as
rendas. Juntando a liberalização desse mercado, os incentivos ao investimento
estrangeiro (vistos gold, isenções a residentes não permanentes, isenções a
fundos de investimento imobiliário, etc.) e ainda o AL, ficou criada “a
tempestade perfeita para o aumento da especulação nas rendas e a expulsão
direta e indireta de pessoas de Lisboa”.
No caso dos
apartamentos turísticos, a dirigente da Habita diz ser necessário distinguir
entre os grandes proprietários, “que já têm uma parte muito considerável do
mercado”, e os pequeno proprietários, que alugam a própria casa para pagarem a
renda ou acertarem as contas. Para a Associação do Alojamento Local em Portugal
(ALEP), a ideia de que a maioria do AL corresponde a prédios inteiros de
grandes investidores “é um mito”. Segundo os dados da associação, em Lisboa há
20 prédios com mais de nove unidades destinadas a turistas, com 266
apartamentos, 4,1% da oferta. 71% dos titulares registados no Registo Nacional
de Alojamento Local (RNAL) têm apenas uma unidade, 19% duas ou três, e só 8%
têm entre quatro a oito AL; 2% têm mais de dez imóveis, mas há quem tenha 300.
“O AL em
Lisboa é feito por pequenos proprietários”, garante Eduardo Miranda, que
preside à ALEP. Os dados do Airbnb parecem confirmar isso mesmo. Segundo um
relatório apresentado em julho, 72% dos anfitriões de Lisboa disponibilizam
apenas uma propriedade. Os outros 28% poderão ser considerados profissionais,
já que anunciam mais do que uma casa. Mas os dados escondem uma realidade bem
diferente, alerta o ensaísta canadiano Tom Slee, crítico da autopropalada
“economia de partilha” e autor do livro “What’s Yours Is Mine” (o que é teu é
meu), publicado este ano. “O que não dizem é que 65% dos alojamentos que estão
no site são de anfitriões com múltiplas propriedades e recebem a mesma
proporção de visitas. Lisboa é uma das cidades com um perfil mais comercial”,
garante. E também é uma das que oferece melhor rentabilidade aos investidores.
Segundo a revista “Forbes”, que usa dados da empresa AirDNA — uma consultora
que analisa a informação do Airbnb —, a capital portuguesa é a 8ª cidade a
nível mundial onde é possível fazer mais dinheiro alugando um imóvel comparando
com o valor médio que se receberia por uma renda no mesmo apartamento: num
apartamento com uma renda média de 600 euros por mês, o aluguer a turistas pode
garantir um rendimento anual de 14 mil euros, quase o dobro.
Divisão.
Uma cena very typical: um tuk-tuk com turistas no centro de Lisboa, onde
residentes são desalojados para dar lugar a apartamentos turísticos
D.R.
Os dados de
Slee mostram também que o negócio do Airbnb está concentrado sobretudo em duas
freguesias lisboetas: Santa Maria Maior (que agrega os bairros da Mouraria,
Alfama, Castelo, Baixa e Chiado) e Misericórdia (Bairro Alto, Príncipe Real,
etc.). Juntas acolhem cerca de 40% dos 16 mil imóveis (15º lugar no ranking
mundial da empresa) e recebem mais de metade dos visitantes. Na Misericórdia,
segundo o estudo da Universidade Nova de Lisboa, o peso do AL atinge já 18,5%
do total de habitação disponível. “É natural haver concentração [no centro
histórico], pois é a zona de maior interesse turístico e, por coincidência, era
a zona com maior número de imóveis vagos antes do boom do turismo. Mas o AL
quase não tem relevância fora do coração de Lisboa, que é onde está 90% da
população”, nota a ALEP. Em julho de 2015, o vereador do Planeamento da Câmara
de Lisboa, Manuel Salgado, admitiu numa sessão da Assembleia Municipal que
havia “concentração excessiva” de alojamentos turísticos em algumas zonas de
Lisboa, apontando como exemplos os casos da Baixa-Chiado, dos bairros
históricos, de Belém e do Parque das Nações, e revelou que a autarquia estava a
fazer uma avaliação do impacto do turismo na cidade, que seria concluída até
final desse ano. O Expresso tentou na altura (e insistiu agora) saber os
resultados desse estudo, mas não obteve qualquer resposta.
O geógrafo
João Seixas, professor auxiliar da Universidade Nova de Lisboa, coordenador da
equipa para a Reforma Administrativa da Cidade de Lisboa, fez as contas e
chegou à conclusão de que o rácio de turistas face ao número de residentes, um
indicador para as pressão que o turismo exerce nas cidades, “é um dos maiores
da Europa”: “Peguei nos dados de 2014: Barcelona teve 7,9 milhões de visitantes
e uma estada média de 2,9 dias. Multiplique [dá 22,91]. Esta cidade tem 1,6
milhões de residentes. Dividindo, temos um rácio de 14,3. E Lisboa teve nesse
ano 4,9 milhões de visitantes com uma estada média de 2,4, para 550 mil
residentes. Dá um rácio de 21,4. E se fizermos estes cálculos apenas para os
residentes das zonas mais turísticas e históricas, o rácio fica mais acentuado.
É um ‘indicador sintético’, de análise, mas relevante.”
Ana Mendes
Godinho, secretária de Estado do Turismo, desdramatiza. “Estamos longe de
existir sobrecarga e não devemos generalizar situações. Barcelona tem uma
situação completamente diferente de Lisboa. Basta pensar na diferença do número
de pessoas que visitam essas cidades.” A governante considera que o turismo e o
AL “têm contribuído para devolver a vida aos centros históricos de muitas
cidades portuguesas”, constituindo a única oferta disponível em muitas
localidades do interior. Lembra que cerca de 40% das casas que hoje estão
disponibilizadas para turismo de curta duração eram imóveis desocupados, a
precisar de obras, e que foram recuperados com esse fim — mais de 10 mil no
total. “Reabilitou os imóveis mais difíceis, aqueles nos quais ninguém antes
queria investir: os pequenos apartamentos isolados”, acrescenta Eduardo
Miranda.
O
presidente da ALEP aponta ainda outros impactos positivos que considera que são
pouco falados: por um lado, o AL trouxe um rendimento importante a muitos
habitantes e comerciantes dos bairros ao contratar tarefas como limpeza,
lavandaria, check-ins, pequenos arranjos, consumíveis; depois, os hóspedes
acabam por gastar dinheiro nas mercearias, cafés, restaurantes, lojas e outros
negócios locais (segundo o Airbnb, deixaram 225 milhões de euros no comércio
local em 2015 e mais 42,8 milhões de euros nos anfitriões); por fim, na grande
maioria dos casos, é autoemprego para milhares de pessoas. “Em Lisboa, são
quase 5000 famílias ou microempresas de carácter familiar que dependem em parte
ou essencialmente destes rendimentos”, garante.
O problema
da habitação e do arrendamento no centro histórico, nota, é outro: a falta de
atratividade da zona, situada em colinas de ruas estreitas, o que faz com que
não seja um local de excelência para residência de famílias. “O centro
histórico tem vários problemas: as tipologias dos imóveis, que têm em geral
áreas muito reduzidas, falta de elevador, dificuldade de acesso de carro,
limitações de transporte e de estacionamento... Tudo isso torna a zona muito pouco
adaptada e pouco atrativa para as famílias, em especial para aquelas que se
acostumaram nos subúrbios a um padrão moderno de vida.”
FADO COM
SOTAQUE DO PORTO
No Porto, o
segundo destino dos turistas que entram no país (quase 1,5 milhões de hóspedes
nacionais e internacionais em 2015, um crescimento perto dos 30% em relação ao
ano anterior), o presidente da autarquia, Rui Moreira, também enalteceu o papel
do turismo na reabilitação urbana da cidade num artigo publicado recentemente
no diário “Público”, “Quem não se lembra do centro do Porto há uma década, com
edifícios fechados e em ruínas? Essa é uma verdade que tendemos a esquecer,
atribuindo ao turismo a culpa pela ‘expulsão’ dos habitantes do centro
histórico.” O autarca recorda que a população do Porto diminuiu pelo menos
desde o início dos anos 80 e a do centro histórico “ainda há mais tempo”.
“Quando chegou o turismo, há meia dúzia de anos, já quase ninguém habitava a
Baixa.”
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