Itália
prepara-se para ir a votos com novo sistema eleitoral e muita divisão
26 DE DEZEMBRO DE 2017
Patrícia Viegas
Com a banca
em situação preocupante e dívida nos 135%, Itália prepara-se para ir a votos e
vários são os rostos já na corrida
Itália
prepara-se para ir a eleições, provavelmente em março de 2018, no dia 4 ou no
dia 11. O escrutínio deverá ser anunciado pelo presidente Sergio Mattarella
entre o Natal e o Ano Novo, segundo as agências internacionais. Os partidos
políticos aquecem já os motores e vários candidatos a primeiro-ministro
perfilam-se para entrar na corrida eleitoral. A ocasião servirá para testar o
novo sistema eleitoral misto, aprovado em outubro, depois de um conturbado
processo de emendas e da votação de moções de confiança como forma de contornar
o voto secreto e conseguir aprovar a nova lei. Se tivesse perdido as votações,
o primeiro--ministro Paolo Gentiloni teria de se demitir do cargo (como fez o
seu antecessor Matteo Renzi, também do Partido Democrático, depois de sair
derrotado do referendo constitucional realizado há precisamente um ano em
Itália. O novo sistema eleitoral é contestado pelo Movimento 5 Estrelas,
eurocético, por considerar que o desfavorece. O par- tido de Luigi di Maio
surge em primeiro nas sondagens. Num recente estudo Ixe, o 5 Estrelas recolhe
29% das intenções de voto, seguido do Partido Democrático de Renzi com 22,8%%.
Em terceiro, a Força Itália de Silvio Berlusconi, com 16,2%, e em quarto a Liga
Norte de Matteo Salvini com 12,1%. Na quinta posição o Livre e Igual, do
ex-juiz Pietro Grasso, com 7,3%, na sexta os Irmãos de Itália da jornalista
Giorgia Meloni, com 5%, e, em último lugar, está a Alternativa Popular da ministra
Beatrice Lorenzin, com 1,2%. Com o novo sistema, dificilmente algum partido
terá mais de 40% dos votos e será preciso negociar coligações. A questão é
saber quais, uma vez que há divisões tanto à esquerda como à direita no
espectro político. A atual situação económica de Itália não é propriamente a
melhor. O país tem a segunda maior dívida pública da zona euro a seguir à
Grécia: cerca de 135% do PIB. E a situação da banca também não é saudável e tem
suscitado preocupação nos mercados e na UE.
Luigi di Maio
- O discípulo do humorista que parte como favorito
Foi em
setembro que Luigi di Maio venceu as primárias do Movimento 5 Estrelas para ser
o candidato da formação eurocética a primeiro-ministro.Deputado do Parlamento
italiano desde 2007, tornou-se o vice-presidente mais jovem da casa dos
deputados em 2013. Di Maio tem 31 anos e, para as eleições legislativas de
2018, ele e o seu partido surgem como favoritos nas intenções de voto dos
italianos.Discípulo de Beppe Grillo, o humorista que cofundou o Movimento 5
Estrelas em 2009, Di Maio tem, ultimamente, deixado em aberto aquela que era
uma das principais ideias defendidas pelo partido: um referendo sobre a
permanência de Itália na zona euro (algo que já foi, de certa forma,
experimentado na Grécia e não correu muito bem). "Se formos bem-sucedidos,
a Europa será transformada e não precisaremos de um referendo sobre o euro.
Caso contrário, perguntaremos aos italianos se querem continuar ou não",
disse o candidato do 5 Estrelas, numa entrevista que deu no dia 17 à televisão
pública italiana. O partido eurocético tem vindo a subir, contando com 88
deputados no Parlamento italiano, 35 senadores e 15 deputados no Parlamento
Europeu. Em 2017, Di Maio foi acusado de difamação por uma jornalista, mas
valeu-se da imunidade parlamentar (atitude que antes criticava).
Silvio
Berlusconi - Renascido das cinzas e à espera de tribunal da UE
Magnata dos
media, ex-dono do clube de futebol AC Milan e primeiro-ministro de Itália
quatro vezes, Silvio Berlusconi foi em várias ocasiões dado como acabado
politicamente. Sobretudo depois dos escândalos de corrupção e sexuais (as
chamadas festas bunga bunga) em que esteve envolvido e que o levaram a
tribunal. Em 2013, após condenação por fraude fiscal, Berlusconi ficou
inabilitado de exercer cargos públicos até pelo menos 2019. Uma lei italiana
diz que uma pessoa que seja condenada a mais de dois anos de prisão não pode
ter ou concorrer a cargos públicos durante seis anos. Mas Il Cavaliere, como
era conhecido, quer candidatar-se a primeiro-ministro em 2018 e considera que
os seus direitos estão a ser violados. Por isso, recorreu para o Tribunal
Europeu dos Direitos Humanos em Estrasburgo. Com 81 anos, Berlusconi
ressuscitou para a vida política em novembro, depois de a coligação de direita
que o seu partido, Força Itália, integrava ter vencido as eleições na Sicília,
com quase 40%. Agora, para as legislativas, o partido fez um pré-acordo com a
Liga Norte e o novo Irmãos de Itália, mas ainda não tem candidato oficial a
primeiro-ministro. Para o caso de não poder sê-lo ele, Berlusconi começou já a
falar em nomes, como o do ex-líder dos Carabinieri, o general Leonardo
Gallitelli.
Matteo
Renzi - Ex-líder à procura de votos a bordo de um comboio
Matteo
Renzi foi primeiro-ministro sem ter ido a votos. Tomou posse em fevereiro de
2014 depois de o então chefe do governo, Enrico Letta, ter sido afastado do
cargo depois de perder o apoio do Partido Democrático por não conseguir tirar o
país da grave crise económica em que mergulhara. Ironicamente, teve de se
demitir dois anos depois, após sair derrotado do referendo que promoveu sobre a
reforma da Constituição italiana. Em abril deste ano, Renzi apresentou-se às
primárias do Partido Democrático e venceu. Agora, apesar de o seu sucessor como
primeiro-ministro, Paolo Gentiloni, ser visto pelos italianos como o político
mais confiável do país, Renzi, de 42 anos, é o candidato do partido de
centro-esquerda às legislativas. Recentemente, andou de comboio por toda a
Itália, durante dois meses, a fazer campanha. A iniciativa chamou-se
Destinazione Italia (Destino Itália) e, no website alusivo à mesma, até se
vendia merchandising como pulseiras, malas e T-shirts. Falta ver, em termos
concretos, que impacto produziu nas intenções de voto dos eleitores. No início
do mês, em entrevista ao La Repubblica, Renzi descartou qualquer aliança de
grande coligação com a Força Itália de Berlusconi e assumiu como seu rival
político em Itália o Movimento 5 Estrelas de Di Maio e Beppe Grillo.
Matteo
Salvini - O nacionalista que faz dos imigrantes inimigos
Matteo
Salvini é desde 2013 o líder de um partido que, quando foi criado, nos anos
1990, defendia a separação do Norte de Itália do resto do país. Depois passou a
atacar o euro, chegando a defender a opção de um referendo, considerando como
um crime a criação da moeda única europeia. Mas rapidamente percebeu que o que
realmente dá votos são as afirmações contra os imigrantes e refugiados. E por
isso decidiu fazer deles o seu inimigo n.º 1. "Um governo Salvini terá as
portas abertas para as mulheres e crianças que fogem da guerra, mas não para
aqueles que querem trazer a guerra para o nosso país. Precisamos de bilhetes só
de ida para os mandar de volta", declarou Salvini, em Roma, num comício
realizado no início deste mês. O líder da Liga Norte, que é deputado no
Parlamento Europeu desde 2004 e tem 44 anos, acusa "falsos refugiados"
de "invadirem" Itália e de trazerem consigo a violência. O acordo que
tem com o partido de Berlusconi e (a formação de direita Irmãos de Itália) terá
ficado comprometido recentemente porque o Força Itália recusou apoiar a
proposta da Liga Norte no sentido de endurecer as penalizações para o crime
violento. Apesar do acordo, não existe programa comum, nem candidato comum a
primeiro-ministro. O que torna a aliança algo instável.
Pietro
Grasso - O ex-juiz antimáfia que rompeu com Renzi
Descontente
com o caminho que o Partido Democrático de Matteo Renzi está a seguir, Pietro
Grasso, atual presidente do Senado italiano, decidiu criar um novo partido de
centro-esquerda. O Livre e Igual nasceu neste mês e conta com o apoio de
figuras como o ex-primeiro-ministro Massimo d"Alema e o antigo
secretário-geral do PD Pierluigi Bersani. "Um homem apenas rodeado de sim
senhores não pode ter sucesso", afirmou o senador, numa referência a
Renzi, que acusa de não saber delegar. "O PD já não existe",
acrescentou ainda o ex-procurador e ex-juiz antimáfia, de 72 anos. Uma das
figuras de topo da luta contra a Cosa Nostra, Grasso teve a seu cargo, em 1980,
a investigação do assassínio de Piersanti Mattarella, na altura presidente da
Sicília e irmão do atual chefe do Estado italiano, Sergio Mattarella. Cinco
anos depois, foi nomeado para o coletivo de juízes do primeiro megaprocesso
contra a máfia siciliana, com 475 acusados. Foi então que iniciou uma estreita
colaboração com os famosos magistrados antimáfia Giovanni Falcone e Paolo
Borsellino, que foram mortos em 1992. Após este processo, Grasso continuou
ligado à luta contra a máfia, como procurador de Palermo, procurador adjunto e
procurador da Diretoria Nacional Antimáfia. Carreira que só abandonou em 2012.
Beatrice
Lorenzin - A ministra que mudou várias vezes de partido
O
Alternativa Popular foi criado em março deste ano e tem como presidente
Angelino Alfano, atual ministro dos Negócios Estrangeiros de Gentiloni e
ex-ministro da Justiça de Berlusconi. Alfano chegou, aliás, a ser considerado
como o delfim de Berlusconi e seu provável herdeiro político. Mas não chegou a
sê-lo. Também não será ele o candidato do partido centrista Alternativa Popular
às próximas legislativas italianas. A formação será representada por uma
mulher, Beatrice Lorenzin, atual ministra da Saúde, na corrida à chefia do
governo de Itália. No entanto, a decisão de Alfano em não concorrer deixou o
novo partido dividido, com alguns setores a quererem manter a aliança com o
Partido Democrático (liderado por Matteo Renzi) e outros a quererem romper com
ele. Com 46 anos, Beatrice Lorenzin é a ministra da Saúde desde 2013, tendo
trabalhado para três primeiros-ministros: Enrico Letta, Matteo Renzi e Paolo
Gentiloni. É deputada no Parlamento italiano desde 2008, tendo sido eleita para
o mesmo pelo Povo da Liberdade, de Silvio Berlusconi. Em novembro de 2013, saiu
por recusar juntar-se ao Força Itália (o novo partido de Il Cavaliere). Foi
para o Novo Centro-Direita, o partido que Alfano criou nessa altura e que, em
março deste ano, substituiu pelo Alternativa Popular.
Giorgia
Meloni - A jornalista que pode ter uma palavra a dizer
O Fratelli
d"Italia (Irmãos de Itália) é um partido conservador nacionalista criado
em 2012 por dissidentes do Povo da Liberdade, coligação liderada pelo ex-primeiro-ministro
Silvio Berlusconi. A sua can- didata a primeira-ministra é Giorgia Meloni, uma
jornalista que se envolveu em política. Em 2008, foi nomeada para ministra das
Políticas da Juventude no quarto governo de Berlusconi, tendo permanecido no cargo
até 2011. Foi a mais jovem ministra italiana de sempre. Hoje tem 40 anos. Em
2012, juntou-se a Ignazio La Russa e Guido Crosetto na oposição às políticas do
primeiro-ministro tecnocrata Mario Monti. E também se uniu aos críticos da
deriva política de Berlusconi. Meloni tornou-se líder do Irmãos de Itália em
2014, depois de ter vencido as primárias no partido. Nas legislativas de 2013,
a formação teve apenas 2% dos votos e elegeu nove deputados. Nas próximas,
espera fazer melhor. Em novembro,Nello Musumeci, um conservador próximo do
partido, foi eleito presidente da Sicília. Candidata a presidente da Câmara de
Roma, em 2016, a jornalista saiu derrotada. Ela e o seu partido estiveram do
lado do "não" no referendo constitucional de 2016. Foi o lado que acabou
vencedor e levou à demissão do então primeiro-ministro de Itália, Matteo Renzi,
do Partido Democrático.
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