É
impossível publicar esta notícia sem a contextualizar de forma associativa a
outra publicada no DN a 15 de Deazembro de 2017:
SEF
arquivou auditoria que detetou indícios de vistos ilegais e corrupção
15 DE
DEZEMBRO DE 2017
Valentina
Marcelino
(…) “A
auditoria, ordenada pela anterior diretora, Luísa Maia Gonçalves (que se
demitiu em conflito com a ex-ministra Constança Urbano de Sousa), contou com
uma equipa especial de investigação e reuniu informação que encheu um total de
15 volumes, entre a qual se incluem diversas provas documentais sobre as
ilegalidades.
Em causa
estão milhares de vistos de residência passados, principalmente em 2015, ao
abrigo do artigo 88 que, na altura, permitia, a título excecional, conceder
estas autorizações a estrangeiros que demonstrassem ter uma ligação laboral no
nosso país há mais de um ano, e provassem ter entrado legalmente em território
nacional. Alegadamente por acordo entre os responsáveis do SEF e algumas
associações de imigrantes, que criticavam a excessiva burocracia e a
dificuldade de muitos imigrantes, já a trabalhar em Portugal, em conseguir a
prova de entrada legal, este requisito foi suspenso. Nesse ano, os pedidos de
visto, com base nesta exceção mais que duplicaram (de 5800 em 2014 para 12 200
em 2015), com um crescimento "substancial", admitiu o SEF, das
"nacionalidades hindustânicas" , registando um "efeito de
chamada" de imigrantes "em situação irregular" noutros países.
Quando
tomou posse, no início de 2016, Luísa Maia Gonçalves foi confrontada com a
avalanche de pedidos e em março assinou um despacho a revogar todas as
orientações à margem da lei, embora com uma análise caso a caso para casos
humanitários, que foram legalizados. "O que se tornou mais difícil foi a
regularização de cidadãos que vivem ilegalmente noutros países e que eram trazidos
para Portugal por redes criminosas só para obterem a autorização de residência,
sendo explorado por estas redes na angariação de mão-de-obra ilegal e tráfico
de seres humanos em situação de quase escravatura", justificou o SEF.”
Roubos a
turistas (e não só) são cada vez mais frequentes no Castelo e em Alfama
POR SAMUEL
ALEMÃO • 18 DEZEMBRO, 2017
A
existência de carteiristas sempre foi uma realidade nas zonas mais turísticas e
centrais da cidade. O aumento exponencial do número de visitantes da capital
portuguesa, nos últimos anos, tornou, porém, mais apetecível a actividade dos
respigadores de bens alheios. Nas zonas do Castelo de São Jorge e de Alfama, ouvem-se
com cada vez maior insistência queixas sobre o crescimento dos roubos,
praticados sobretudos por indivíduos ou grupos provenientes do leste europeu.
De mapa da cidade em punho, muitos fazem-se passar por turistas e demonstram
especial agilidade a subtraírem o que não lhes pertence. São muitos os relatos
sobre o fenómeno. Até o presidente da junta já apanhou um indivíduo com a mão
dentro da mochila de um turista japonês. “Fazem isto com uma limpeza e os
turistas não se apercebem de nada”, diz a dona de uma loja de recordações,
junto ao Miradouro de Santa Luzia, de onde observa muitos dos furtos.
Texto: Samuel Alemão
Um vulto sobre o ombro, enquanto se preparava
para entrar no Elevador do Castelo, junto à Rua da Madalena, e descer até à Rua
dos Fanqueiros, fez Inês Bernardes perder, por momentos, a concentração na
conversa telefónica com o pai. “Notei alguém a rondar, mas não liguei muito. Há
sempre gente a chegar para entrar”, rememora a funcionária de 24 anos de um
posto de informação turística privado, situado mesmo junto ao Castelo de São
Jorge. Há cerca de duas semanas, quando voltava de mais uma jornada de
trabalho, ao início da noite de uma segunda-feira, tentaram assaltá-la. “Estava
quase a entrar no elevador e percebi que um indivíduo tinha mexido na minha
mala. Por sorte, como a carteira é grande, senti qualquer coisa e reagi de
pronto”, conta. Assustado com a reacção de Inês, o homem fugiu sem concretizar
o seu intento. Com desfechos parecidos ou distintos, relatos como este
multiplicam-se por estes dias no Castelo e em Alfama.
Visitantes, mas também residentes e
trabalhadores naqueles dois barros de grande afluência turística, têm vindo a
sentir-se acossados, nos últimos meses, por um fenómeno que não é novo, mas se
tem intensificado. Indivíduos, agindo sozinhos ou em pequenos grupos, tentam
furtar quem se lhes assemelha como um alvo apetecível. O acumular de relatos
sobre situações destas moldou um quadro que oscila entre a apreensão e a
resignação. “Carteiristas? Isso é o que mais aí há, cada vez mais”, diz a O
Corvo um merceeiro que explora um estabelecimento junto ao Miradouro de Santa
Luzia. “Fazem isto com uma limpeza e os turistas não se apercebem de nada. Ou,
quando reparam, já é tarde de mais. Alguns entram aqui já com a mochila aberta
e ficam a perceber o que lhes aconteceu”, relata Paula, numa loja de
recordações turísticas situada ao lado.
Há quem prefira não falar do assunto ou o
desvalorize, porque “isso acontece há anos”. Mas mesmo essa sensação de uma
certa normalização do fenómeno dos furtos a turistas, sobretudo, tem dado que
falar nas redondezas e está a preocupar parte de uma comunidade onde a receita
deixada pelos visitantes é tudo menos menosprezável. “Temos reiteradamente
transmitido essa preocupação às autoridades policiais. Mas é importante
referir, e mesmo sublinhar, que isto acontece no âmbito de um fenómeno
internacional. Não é apenas aqui. Estamos a falar, na sua maior parte, de
grupos organizados de cidadãos estrangeiros que se dedicam a essas actividades”,
explica a O Corvo o presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria Maior,
Miguel Coelho (PS), alertando para a necessidade de uma abordagem cautelosa do
fenómeno para que não se crie uma “falsa percepção de insegurança”.
O autarca admite, contudo, a persistência dos
assaltos e considera que “é precisa uma intervenção mais eficaz por parte da
polícia”. Até porque uma das zonas mais sensíveis é, precisamente, a da
passagem pedonal entre a Rua da Madalena e o acesso superior ao Elevador do
Castelo, ao lado da qual se situa a sede da junta de freguesia. O mesmo sítio
onde Inês Bernardes ia sendo assaltada. “Eu mesmo já agarrei um sujeito com a
mão dentro da mochila de um turista japonês”, relata Miguel Coelho. O
expediente é, aliás, bem conhecido. Quase sempre, um ou dois indivíduos
fazem-se passar por turistas, envergando um mapa de Lisboa e fingindo estar em
busca de alguma referência, e aproveitam para se aproximar dos genuínos
visitantes, abrindo-lhes a mochila. “Isso acontece mais com os turistas, alguns
deles mais idosos. Mas não de agora, é algo que vem acontecendo nos últimos
dois ou três anos”, conta José Guedes, 56 anos, residente no Largo do Contador
Mor desde 1975.
“Quando há muitos turistas, eles vêm mais para
aqui. Fazem-se passar por outros. Muitas vezes, são dois casais e um matulão a
vigiar”, conta Rogério Amado, empregado do café Muralha de São Jorge, onde está
há anos suficientes para perceber como operam ali os respigadores de bens
alheios. De trás do balcão, tem vista privilegiada sobre parte da fila de
espera para a entrada no Castelo. “Aqui dentro, não fazem nada, que a gente já
os topa. Mas, olhando lá para fora, apercebemo-nos das coisas. E, quando aqui
não está a dar, eles vão mais ali para a zona do elevador do Pingo Doce”, diz,
referindo-se ao segundo dos elevadores que asseguram um mais rápido acesso ao
muito procurado monumento nacional. Instalado no antigo Mercado do Chão do
Loureiro, e fazendo a ligação entre o Largo do Chão do Loureiro e a Rua da
Costa do Castelo, é um dos “pontos negros”.
Um cidadão holandês, residente na Rua da Costa
do Castelo, foi assaltado e agredido, há três semanas, junto à sua casa,
tendo-lhe sido roubado o telemóvel. “Era de noite e dois tipos apareceram de
repente no escuro, pois esta zona não é muito bem iluminada, e encostaram-me à
parede. Disseram-me para lhes dar o telemóvel e a carteira, mas, como resisti,
começaram-me a puxar pelo casaco e a bater”, conta Thomas (nome fictício), 26
anos, a O Corvo. “Comecei a gritar o mais alto que pude, para alertar a
vizinhança, mas eles conseguiram fugir, com o meu telemóvel”, explica o
residente, salientando que, para além disso, ficou com uma pequena lesão no
ouvido, onde foi atingido por um murro, e uma escoriação no nariz. “Os vizinhos
dizem-me que, nos últimos três meses, se tem registado alguns incidentes do
género”, diz, lamentando que a polícia tenha demorado um hora a chegar.
“Tiveram de vir a pé porque, explicaram, não tinham nenhum carro disponível”.
Outro dos
sítios onde se têm verificado muitos furtos é o já referido Miradouro de Santa
Luzia, bem como o seu vizinho Miradouro das Portas do Sol, pontos de enorme
afluência turística. O Corvo pôde testemunhá-lo no momento em que ali esteve,
durante a hora de almoço de um dia a meio da semana, quando se deparou com um
casal de reformados espanhóis a quem tinham acabado de lhes roubar um
telemóvel. “Meteram a mão no bolso do casaco e tiraram-me o telefone. Só me
apercebi pouco depois”, lamentava a mulher, que, juntamente com o marido, e
acompanhada por uma agente da PSP, se deslocava para a esquadra policial mais
próxima, situada na Baixa. A agente confirmou que situações destas são cada vez
mais comuns. Paula, a dona da tal loja de recordações, diz ser frequente haver
carteiras dentro das papeleiras e caixotes do lixo, para os quais são atiradas
após lhes ser retirado o dinheiro.
Existe,
porém, quem desvalorize o suposto quadro de insegurança. É o caso de Hermínio
Sousa, dono da mercearia Estrela do Castelo, situada no Beco do Recolhimento.
“Não sinto que haja nada de especial. É claro que existe sempre um ou outro
carteirista, mas não mais do que havia já”, diz, enquanto vai atendendo
clientela. Entre ela conta-se um polícia que costuma estar de serviço junto à
entra principal do monumento. “Aqui para dentro do arco, não há carteiristas,
que eu não deixo. Apanho-os logo. Agora, ali para baixo, já não sei”, diz,
sugerindo que os problemas podem até existir na Rua do Chão da Feira, sem que
ele tenha capacidade de resposta. Os turistas que aí se concentram, em romaria
para o castelo, têm sido alvo de muitas investidas.
O Corvo contactou a Polícia de Segurança
Pública (PSP), a 11 de dezembro, questionando o gabinete de relações públicas
sobre a ocorrência de tal fenómeno, naquela zona da cidade, e sobre as medidas
que a PSP terá entretanto desenvolvido para o enfrentar. Até ao momento da
publicação desta reportagem, porém, não foi recebida resposta.
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