segunda-feira, 7 de novembro de 2016

O Web Summit não é em Lisboa, mas na Lisboalândia


O Web Summit não é em Lisboa, mas na Lisboalândia
Já não vale a pena preocuparmo-nos com a possibilidade de Lisboa se tornar um parque temático, porque Lisboa já é um parque temático, uma grande feira popular para os turistas.

Lucy Pepper
6/11/2016,

Talvez seja a altura de desistirmos, pormos as mãos no ar e reconhecermos que tudo está fora do nosso controlo.

Tudo.

Já não vale a pena preocuparmo-nos com a possibilidade de Donald Trump ganhar as eleições americanas, porque já não há nada que possamos fazer agora, se é que alguma vez houve alguma hipótese de a Europa levar os Trumpetistas a serem razoáveis, especialmente depois do Brexit. Só podemos aguardar o resultado.

Já não vale a pena preocuparmo-nos com a possibilidade de Lisboa se tornar um parque temático, porque Lisboa já é um parque temático, uma grande feira popular para os turistas. Temos agora uma loja circense da sardinha no Rossio – muitas latas, mas com uma só variedade de sardinha –, um frango gigantesco de 10 metros da Joana Vasconcelos — pelo menos não tem crochet… ainda – e muitas linhas de eléctrico novas ou recuperadas, que ameaçam ser as vias de circulação de uma nova frota de eléctricos ao estilo do fim do século XIX, para os turistas terem uma experiência “eléctritástica”: “Venha a bordo para viajar no mundo das “Natas e sardinhas!!” (sim, estou a caricaturar, mas esperem e ainda vamos ver isto…). Em suma, já vivemos em Lisboalândia e não há nada que possamos fazer para o evitar. Mas tudo acabará em bem, a cidade há-de desenrascar-se organicamente… por isso, não vale a pena preocuparmo-nos.

E também não vale a pena preocuparmo-nos com o Web Summit. Sim, o equivalente de 10 navios de cruzeiro cheios de pessoas estarão na cidade durante uma semana, mas teremos 10 cruzeiros de dinheiro a inundar a cidade. Sim, o Parque das Nações (durante o dia) e o centro de Lisboa (à noite, o Web Summit vai transportar aqueles 10 cruzeiros de pessoas para o centro) estarão num caos durante a semana, mas talvez algumas coisas boas possam sair desse caos, mesmo se a única coisa boa for que nos vai distrair do Orçamento do Estado ou do facto de o investimento estrangeiro estar a evaporar-se desde a última eleição.

O que me traz ao artigo hilariante do Guardian que entreteve a internet durante a semana passada. Tornou-se mesmo viral por duas razões. Uma das razões foi o costume do “ah, que bom! Há estrangeiros a dizer coisas boas sobre Lisboa, que o mundo vem para Lisboa, e que Lisboa pode ser o próximo Silicon Valley… que bom!!”. A outra razão foi “O que é isto? O que é que isto quer dizer?”, como também é costume.

O artigo avançou a ideia de que Lisboa pode ter potencial para atrair muitos geeks e muitas empresas de “tech”, à procura de “rendas baixas”, de sol e de praias de surf.

Talvez o jornalista – que é o correspondente do Guardian em Madrid – tenha dado um salto de fim de semana a Lisboa, e não saiba que o investimento que vinha de fora vem cada vez menos, e que por isso é pouco provável que muitas empresas se desloquem para Lisboa, tal como é pouco provável que alguém em Lisboa possa sair do escritório e estar a fazer surf 15 minutos depois.


É o costume. Entre os milhares e milhares de participantes do Web Summit há muitos (muitos) jornalistas. Seria bom que alguns deles ficassem por cá como “correspondentes em Lisboa”, a ver se o mundo deixava de ser informado sobre Portugal apenas por jornalistas de passagem, sem experiência e sem saber do país.

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