Requalificação do "Adamastor" é votada na
assembleia de freguesia e depois na Câmara de Lisboa
Presidente da Câmara de Lisboa reconhece erros na condução
do processo, pelos quais se culpabiliza.
Lusa
14 Fevereiro 2019 — 01:11
https://www.dn.pt/cidades/interior/requalificacao-do-adamastor-e-votada-na-assembleia-de-freguesia-e-depois-na-camara-de-lisboa-10575103.html?fbclid=IwAR3Rrp7SsXsQ1QS6f_IWmPME3JvysOQi3sSl-3No49h3Toigd973hiOH1gs
PCP e BE querem Adamastor sempre aberto e sem vedações
O projeto de requalificação do miradouro de Santa Catarina,
em Lisboa, que prevê uma "vedação de segurança", será votado na
Assembleia de Freguesia da Misericórdia e só depois será levado a votação pelo
executivo municipal.
"Solicitei à presidente da junta que fizesse em
primeiro lugar um debate e uma votação em assembleia de freguesia e que
transmitisse à câmara a posição, e depois a Câmara Municipal de Lisboa, os seus
vereadores, os vários partidos políticos, das várias sensibilidades, vão votar",
anunciou o presidente do município, Fernando Medina (PS).
Numa apresentação e debate do projeto na tarde e noite de
quarta-feira no Liceu Passos Manoel, Fernando Mediana reconheceu erros na
condução do processo, que contribuíram para um "clima de desconfiança",
nomeadamente, aquela sessão não se ter realizado antes do início da
intervenção.
"A responsabilidade é minha, foi um erro. Como também
foi um erro o facto de eu ter considerado que a obra se poderia realizar com
recursos internos da Câmara, de forma muito mais rápida e com muito menos
procedimentos do que aqueles que se veio a revelar necessários", afirmou.
O autarca assumiu ainda a responsabilidade pelo facto de à
vedação temporária colocada em julho de 2018 "não ter sucedido uma obra no
imediato", suscitando "dúvidas" e "desconfianças".
"Da mesma forma que eu assumo a falha quanto à forma
como o processo ocorreu, tenho de vos dizer que não assumo qualquer sentido e
orientação para o processo que não a preocupação em cuidar dos residentes desta
zona", sublinhou, sendo aplaudido por alguns moradores.
O presidente da câmara da capital recusou qualquer intenção
de privatizar o espaço público, a maior crítica apresentada pelos detratores da
vedação no miradouro, conhecido popularmente por Adamastor, pela icónica
estátua daquela figura mitológica.
"Todo o controlo do acesso, de horário, de espaço, está
nas mãos de uma entidade pública de forma aberta, transparente, publicitada.
Nunca poderia ser de outra forma, é o espaço público, será sempre um espaço
público", garantiu.
Medina argumentou que a vedação projetada destina-se a
"resolver uma pequena parte do problema do ruído e da frequência a partir
de determinada hora da noite".
Na intervenção que encerrou a sessão, o autarca anunciou
ainda que a gestão da concessão do quiosque localizado no miradouro será feita
pela Junta de Freguesia da Misericórdia.
O auditório do Liceu Passos Manoel esteve lotado durante
mais de quatro horas, com a assistência dividida em torno da solução da
vedação, sendo salientados os problemas de segurança do local.
Queixas de tráfico de droga, agressões e arremesso de
objetos para os telhados, num generalizado ambiente de insegurança, foram
constantes da parte dos moradores que apoiam a vedação, sendo da parte dos
detratores argumentado que uma "privatização do espaço público" não
vai resolver aqueles problemas e reclamando um espaço livre.
Além da "vedação de segurança" contemplada no
projeto, também os espaços verdes serão protegidos por vedações, mais baixas,
colocadas nomeadamente em torno da estátua.
Em torno da estátua, serão colocados arbustos, substituindo
a atual relva.
O arquiteto, que já tinha assinado as alterações feitas ao
espaço em 2003, justificou a nova solução com o aumento da pressão da afluência
de pessoas para aquele local.
O projeto contempla ainda mobiliário urbano com cadeiras
semelhantes às existentes na praça da Batalha, no Porto, numa homenagem ao
arquiteto Adalberto Dias, que as concebeu e que ficou em segundo lugar no
concurso para o miradouro de Santa Catarina.
Fernando Medina reconhece que a câmara de Lisboa errou ao
ter fechado o miradouro há sete meses sem que nada tenha acontecido entretanto.
Moradores da zona dizem-se exaustos de insegurança, falta de sossego e higiene.
Há quem tema que vedar o Adamastor seja só o começo de uma privatização do
espaço público.
João Pedro Pincha
João Pedro Pincha 14 de Fevereiro de 2019, 8:08
“Nunca, em nenhuma circunstância, o Miradouro de Santa
Catarina será um espaço reservado, reservável, privatizado ou privatizável.” A
garantia é do presidente da câmara de Lisboa, Fernando Medina, que esta quarta-feira
à noite esteve numa concorrida sessão pública em que se debateu o futuro
daquele espaço.
Quase sete meses depois de ter sido colocada uma vedação
provisória em redor do miradouro, o projecto de recuperação proposto pela
câmara foi apresentado publicamente pela primeira vez e discutido numa reunião
que durou mais de quatro horas. Como o PÚBLICO já tinha antecipado, o projecto
contempla uma vedação metálica com dois metros de altura e três portas – a
ideia é que fechem a partir de certa hora da noite.
No final da reunião, Fernando Medina reconheceu erros da
autarquia na gestão do processo e assumiu que é difícil fazer face à
“complexidade” de problemas que Lisboa enfrenta, mas afirmou-se um defensor do
espaço público, rejeitando a acusação de que pretende privatizar o miradouro ao
colocar-lhe uma vedação e horários. “Todo o controlo do acesso, de horário, de
espaço, está nas mãos de uma entidade pública de forma aberta, transparente,
publicitada. Nunca poderia ser de outra forma, é o espaço público, será sempre
um espaço público.”
“O espaço público é o coração de uma cidade. É sagrado, é o
núcleo central numa cidade. Não há uma cidade que viva como cidade que possa
pensar em atentar contra o espaço público”, declarou o autarca. “Cometemos um
erro, que foi esta sessão não se ter realizado há uns meses”, disse. Fernando
Medina explicou que mandou encerrar o miradouro em Julho do ano passado pois
pensava que a obra podia avançar rapidamente, mas verificou-se que afinal não.
“É responsabilidade minha”, reconheceu. O fecho repentino do local e a demora
no arranque das obras geraram “dúvidas” e “desconfianças”, pelos quais o
autarca também assumiu a culpa.
“Da mesma forma que eu assumo a falha quanto à forma como o
processo ocorreu, não assumo qualquer sentido e orientação para o processo que
não a preocupação de cuidar dos residentes desta zona”, afirmou ainda.
Moradores queixam-se de insegurança
A colocação ou não de uma vedação no miradouro é o que mais
tem dividido as opiniões e foi também o tema mais abordado na reunião, que se
realizou no Liceu Passos Manuel. Inúmeros moradores da zona relataram diversas
situações de insegurança, insalubridade e falta de sossego, enquanto outras
pessoas alertaram que vedar este espaço abre a porta a que se vedem mais.
Favoráveis ou contrárias à vedação, quase todas as
intervenções salientaram a necessidade de se ir mais longe: combater o tráfico
de droga, aumentar o policiamento, instalar videovigilância e melhorar a
higiene urbana foram algumas reivindicações apresentadas.
“Alguma coisa tem de ser feita. A vedação será um primeiro
ponto, mas obviamente não chega”, declarou Luís Paisana, da Associação de
Moradores da Misericórdia. “É um escândalo autêntico a quantidade de dealers”
na zona, disse um comerciante. “Vedar Santa Catarina é, de facto, importante. O
miradouro é conhecido internacionalmente como um local de venda de droga”,
afirmou Regina Teixeira, residente no bairro, que descreveu um cenário de “alta
marginalidade que não dá sossego aos moradores”. “Nós temos de ter paz. E para
ter paz somos a favor do tal gradeamento”, disse Vigília Santos, da Associação
A Voz do Bairro.
“Por muito que eu gostasse de ter ali polícias 24 horas por
dia, infelizmente não posso fazê-lo. Os polícias são um bem escasso”, afirmou
Paulo Flor. O subintendente da PSP assumiu que o tráfico de droga é um problema
grave naquela área e que ele “não se esgota nem se circunscreve de maneira
nenhuma ao miradouro”, mas deu a entender que brevemente poderia haver
progressos positivos, assim haja tempo e meios para investigar. “A dimensão da
polícia nesta área da cidade não é a ideal, mas é o que é possível fazer.”
“Não entendo, por muito que me esforce, em que é que uma
vedação melhora a segurança. Se tudo isto se passa impunemente no Bairro Alto
há décadas, porque não vedaram ou muraram o Bairro Alto?”, insurgiu-se José
Silveira. Para Rosa Ramos, uma das porta-vozes do movimento Libertem o
Adamastor!, que é contra a vedação, “nenhum destes problemas se resolve com uma
grade no espaço público”. “Quais são os estudos, os relatórios, os pareceres
que dizem que vedar vai resolver o problema?”, quis saber outra interveniente.
“Isto não se resolve com grades, é chutar para canto. Vamos acabar por gradear
a cidade toda”, profetizou um orador.
Como Fernando Medina já tinha anunciado, o projecto vai
agora ser discutido pela Assembleia de Freguesia da Misericórdia. A presidente
da junta, Carla Madeira, defendeu que “qualquer solução tem de ser integrada”,
incluindo, entre outras, melhor iluminação pública e videovigilância. “Não
queremos aquele espaço como está actualmente.”
Depois de a freguesia se pronunciar, caberá aos vereadores
da câmara a palavra final. Se forem aprovadas, as obras poderão começar no
prazo de poucas semanas.
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