Projecto dos contentores no Martim Moniz será, afinal,
submetido a um período de discussão pública
Kátia Catulo
Texto
6 Fevereiro, 2019
Já com a praça vedada por tapumes e, por trás deles, com os
trabalhos de colocação de infra-estruturas no subsolo do espaço público em
curso, fica agora assente que o projecto final de requalificação do Martim
Moniz deverá ser sujeito a um período de discussão e divulgação públicas antes
da sua aprovação em reunião de câmara. O procedimento foi aprovado, na tarde
desta terça-feira (5 de Fevereiro), pela Assembleia Municipal de Lisboa (AML),
ao votar por unanimidade uma recomendação do CDS-PP, na qual se apela à Câmara
de Lisboa que adopte uma atitude mais clara e transparente em todo o processo.
Foi a principal decisão do debate especial sobre a polémica intervenção –
realizado a pedido do PCP, que pedia a interrupção das obras. Fustigado pelas
críticas de todas as forças políticas com assento na AML ao projecto, que prevê
a instalação no largo de contentores onde funcionarão espaços comerciais, e à
forma como foi dado a conhecer à comunidade, Fernando Medina (PS) reafirmou o
que considera ser a correcção de todo o processo. “A câmara actuou sempre em
defesa do interesse público”, disse.
Fazendo a súmula do essencial da contestação ao processo, e
reiterando-a, a recomendação centrista, aprovada pela AML, pede que “antes de
apresentação do projecto final em reunião de CML, que o mesmo seja submetido a
um período de discussão pública e ampla divulgação dos projectos, públicos e
privados, para o local, para efectivo escrutínio da população”. E quer que
semelhante apresentação e discussão tenha lugar nas duas comissões (Urbanismo e
Qualidade de Vida) da assembleia, a quem deverá ser encaminhada toda a
documentação que a autarquia dispõe sobre o processo. A proposta centrista
acaba por ser reforçada pelos dois pontos de uma recomendação do PCP também aprovados,
sem bem que com oposição do PS. Num pede-se que se reavalie “todo o
procedimento de forma a verificar a sua validade” e no outro que se dê “início
a um processo de participação pública que vise a definição de um programa
preliminar para o Martim Moniz de acordo com as necessidades e anseios dos
moradores e comunidades locais”. Já a pretensão de suspensão da obra foi
chumbada pelo PS e um independente, e com a abstenção de CDS, PPM e cinco
independentes.
O pedido de mais debate e esclarecimentos adicionais sobre o
projecto desenvolvido pela empresa Moonbrigade, concessionária do espaço
público prestes a ser requalificado, foi acolhido com agrado pelos deputados
municipais socialistas. “Somos pela transparência e divulgação do projectos. É
importante a discussão”, referiu o eleito Miguel Gama, presidente da 3ª
comissão (ordenamento do território, urbanismo, reabilitação urbana e obras
municipais) da AML, justificando assim a viabilização pelo PS da recomendação
apresentada pelo CDS-PP. O representante socialista lembrara antes que, já após
a contestação à versão inicial do projecto – dada a conhecer à população, numa
sessão pública organizada pela Junta de Freguesia de Santa Maior realizada, a
20 de Novembro, no Hotel Mundial -, foi suprimida a vedação, aumentados espaços
verdes e os locais de fruição pública, com mais mobiliário urbano, estando
também prometida a criação do parque infantil pedido pela junta e pela
população.
Miguel Gama salientou ainda o facto de o assunto ter sido
“discutido em reunião pública de câmara, tendo sido assumido o compromisso,
pelo presidente, de submeter o projecto a discussão e apreciação final por
parte do executivo”. Algo que, na verdade, apenas se ficou a conhecer na semana
passada, já com mais de dois meses de celeuma em redor do caso. Nessa reunião,
realizada a 30 de Janeiro, e depois de confrontado pelos vereadores da oposição
com o facto de a data do licenciamento da intervenção em curso (20 de Novembro
de 2018) coincidir a da sessão pública de auscultação da população, Fernando
Medina salientou que a autorização apenas se referia às obras de
infra-estruturação do espaço público necessárias ao projecto. Este seria, ele
mesmo, e a seu tempo, sujeito a uma apreciação e votação final por parte da
vereação.
Uma realidade a que a recomendação do CDS-PP, aprovada por unanimidade,
faz aliás questão destacar, referindo, porém, os centristas que tal facto “não
dispensa uma apresentação clara e objectiva do que se pretende efectuar na
praça”. Ainda assim, o líder da bancada centrista, Diogo Moura, não deixou de
notar “parecer claro que o projecto de infra-estruturas que foi apresentado tem
por base o projecto de maquetas apresentadas”. A recomendação que apresentou, e
viu aprovada pelo pleno dos deputados municipais, não deixa de frisar que,
tendo tais trabalhos de infra-estruturação já se iniciado, se colocam “dúvidas
quanto às necessárias futuras alterações mediante a discussão a promover sobre
o projecto final de implantação”. O projecto de infra-estruturas é, de resto,
um dos sete conjuntos de documentos que a recomendação da Assembleia Municipal
pede à Câmara de Lisboa que encaminhe com urgência para escrutínio dos
deputados. Entre os quais se contam o “teor do contrato firmado entre a CML e
empresa e a sua avaliação jurídica pelos serviços municipais” e o “memorando do
histórico da relação da CML com a empresa visada e incumprimentos”.
Antes da consensual votação do documento, porém, o tom geral
das intervenções dos partidos no debate convocado pelo PCP para discutir a
polémica requalificação do Martim Moniz foi de forte censura à actuação da
Câmara de Lisboa. Com excepção do PS, como é óbvio – e isto apesar de não
faltar nas fileiras socialistas quem conteste o projecto de forma veemente,
como é o caso de Miguel Coelho, presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria
Maior, que não se tem inibido de mostrar o seu desacordo para a solução
preconizada pela CML. Ante os reparos, o presidente da autarquia, Fernando
Medina, insistiu com argumentos já antes esgrimidos, lembrando que existe uma
relação contratual entre o município e uma empresa para a exploração de uma
concessão. Tal relação, notou, foi estabelecida em 2011 – na altura, pela EPUL,
mas assumida em 2015 pelo município, após a extinção da empresa municipal -,
com vigência até 2022 e eventual prorrogação até 2028.
“Pode a câmara
rescindir livremente um contrato com um privado? Pode, justificando que há
interesse público e indemnizando o privado”, disse Medina, antes de garantir,
todavia, não existirem motivos para tal situação. Tanto que, notou, nem o PCP,
que pediu a realização do debate na assembleia municipal, os invocou nenhuma
vez. “É bem claro que, numa situação de incumprimento do contrato, e durante o
tempo em que estava sob gestão da EPUL, esta podia ter feito a rescisão do
contrato. Ou, pelo menos, manifestado essa intenção. Não é claro, antes pelo
contrário, da análise jurídica efectuada, que houvesse motivo para essa
rescisão, quando há retoma dos pagamentos regulares da renda devida, após a
passagem para a Câmara de Lisboa, por via da extinção da EPUL, em meados de
2015”, argumentou Medina, salientando o “quadro de cumprimento” por parte do
concessionário. O presidente da CML referiu ainda que o acordo dado às
alterações a realizar no Martim Moniz tem apenas a ver com o facto de “as
alterações serem boas para o município e para a praça, face à situação que hoje
lá temos”.
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