Portas reuniu-se com equipa de Woody Allen para negociar
filme em Lisboa
Por Luís Claro
publicado em 24 Set 2013 in (jornal) i online
Paulo Portas reuniu-se em Nova Iorque com a equipa de Woody
Allen. O objectivo foi conhecer as exigências do realizador e demonstrar o
interesse de Portugal. O dinheiro é o maior problema
O governo e a Câmara de Lisboa estão unidos na tentativa de
que Woody Allen venha a realizar um filme em Portugal, como já aconteceu em
cidades como Barcelona, Paris, Roma ou Londres. Foi com esse objectivo que
Paulo Portas já se reuniu, em Nova Iorque, com a equipa de produção do
realizador de "Match Point". O facto de a equipa de Allen ter
aceitado reunir-se com os portugueses é visto como um sinal de que existe
interesse das duas partes, mas ainda há um longo caminho a percorrer para que o
filme se possa concretizar.
Foi há uns meses que Paulo Portas, na altura ministro dos
Negócios Estrangeiros, teve um encontro com a equipa de Woody Allen. O ministro
tinha dois objectivos: mostrar o interesse de Portugal e conhecer as exigências
da equipa do realizador. "Foi uma troca de impressões que serviu para
demonstrar o nosso interesse. Aceitaram marcar a reunião, o que é um sinal de
interesse", resume fonte do governo.
O encontro serviu como ponto de partida para que Woody Allen
possa filmar em Lisboa e foi propositadamente discreto para não levantar falsas
expectativas. No governo, essa possibilidade é considerada real, mas existe a
consciência de que o processo pode demorar anos a concretizar-se e tudo vai
depender das exigências feitas, nomeadamente a nível financeiro.
Certo é que estão lançadas as pontes para Woody Allen e
tanto a Câmara de Lisboa como o Turismo de Portugal estão empenhados em manter
os contactos com o realizador. O presidente da autarquia manifestou mesmo a
convicção, numa entrevista recente ao semanário "Sol", de que
"um dia" esses contactos "terão sucesso".
António Costa reconheceu, porém, que o dinheiro pode ser o
maior entrave. "Infelizmente não estou nas condições de dizer o que o
prefeito Eduardo Paes, no Rio de Janeiro, disse: que pagava o que fosse
necessário para que Woody Allen filmasse o Rio. Mas tenho esperança que um dia
seja possível encontrar as nossas capacidades com as necessidades dele".
O presidente da Câmara do Rio de Janeiro disse, numa
entrevista ao jornal "O Globo", que está disposto a pagar "100%
da produção". A oferta dificilmente estará ao alcance de um país em crise
como Portugal. O próprio Woody Allen admitiu, numa entrevista à RTP, que
"agora Portugal está com dificuldades económicas" e por isso
"não espera que isso aconteça". Mas não fechou a porta a ter
"uma ideia que resulte em Portugal" se o país estiver disposto a
"pagar o filme".
Apesar das dificuldades de financiamento, o secretário de
Estado do Turismo, Adolfo Mesquita Nunes, admitiu no final de Março ao
semanário "Expresso" que se houver contrapartidas o governo não
descarta apostar neste projecto. "Qualquer apoio a existir por parte do
Turismo de Portugal terá de ser dirigido a um filme com manifesto potencial de
captação de turistas e que projecte realmente o destino."
Até agora, a política do governo tem sido procurar apoios
entre os agentes turísticos para financiarem os filmes que têm potencial de dar
a conhecer o país lá fora. É também com esse objectivo que países como Espanha
ou Itália têm patrocinado os filmes de Woody Allen. O realizador, numa
entrevista ao "Telegraph", congratula-se por "os europeus
financiarem" os seus filmes de uma forma "muito, muito
generosa". Mas deixou claro que é ele que define as regras.
"Fizeram-no sob as minhas regras, o que significa que não interferem de
forma alguma, não lêem os meus guiões, não sabem o que vou fazer e só têm fé
que eu vou fazer um filme que não envergonhe ninguém", disse o realizador.
Não é de desprezar que a perda de autoestima que nos faz sofrer seja responsável pelo triste esbracejar sobre o vazio de comunicados que morrem na praia, cansados com tanta(s) generalidade(s), e ainda assim reproduzidos. Mas logo agora que a crise devia estar a acabar, precisamos tanto que Allen inunde os cofres com (o nosso ou o deles?) orgulho patriótico? Não virá esse tal filme tarde demais?
O que é que Londres (Scoop, Match Point), Barcelona (Vicky Cristina Barcelona), Paris (Meia-Noite em Paris) ou Roma (Para Roma com Amor) ganharam com Woody Allen? É uma questão para o turismo das cidades responderem. E o cinema torna-se uma questão de turismo ou é assim que sonham os cinéfilos que nos governam, levando Sharon Stone ao Douro ou imaginando, de forma autárquica e perante a televisão, homenagens a Manoel de Oliveira, na Praça dos Aliados, no Porto, apadrinhadas por Eastwood, Spielberg e Scorsese, nem mais...
Para voltar ao cinema e a Woody Allen: o que ganhámos com a tour europeia? Com excepção da escorregadela moral dada em Match Point, o filme que nos fez sonhar que ele se estava a levantar de uma queda (Hollywood Ending, Anything Else, Melinda e Melinda foram os títulos imediatamente anteriores, isto só para lembrar...), o sistema afectivo de muitos de nós, nostálgicos, permanece acabrunhado. (É compreensível que o Ministério dos Negócios Estrangeiros tenha levado isto tão a peito há um ano: Allen corresponde a uma espécie de "bom gosto" instituído, rosebud de uma geração, alguém lá pelo governo é cinéfilo). Mas quem se mete com Allen, parece ser essa a moral do périplo de Woody pelas cidades, entra num labirinto deceptivo.
O angustiante Blue Jasmine, filme na América, surpreende por ser espesso, por ser uma terra movediça onde se afunda Cate Blanchett, que puxa para baixo, levando com ela todo um filme e assim erguendo o cinema? Sim, Blue Jasmine é assim. Mas não fiando. A experiência com Allen, hoje, é coisa vacilante: ele instalou-se num "cinema de velho" (isto pode não ser necessariamente um insulto, pode ser até um elogio), teimosamente sem curiosidade pelo outro, aproveitando egoisticamente a mão que lhe dá de comer e que cobra mais barato do que na América. Isto para avisar que se calhar, quando surgir o tal filme de Woody Allen sobre Lisboa, reencontraremos uma fadista de caricatura como a de A Gaiola Dourada – mas se já existe uma...? –, Joaquim de Almeida talvez faça em Lisboa o que Banderas e Benigni fizeram em Barcelona e Roma, e o genérico pode contemplar uma marcha popular.
E se...? What if nothing exists and we’re all in somebody’s dream? Or what’s worse, what if only that fat guy in the third row exists?
Quando o provincianismo nacional vai à caça aos gambozinos
O cinema torna-se uma questão de turismo ou é assim que sonham os cinéfilos
que nos governam.
The two biggest myths about me are that I’m an intellectual, because I wear
these glasses, and that I’m an artist because my films lose money. Those two
myths have been prevalent for many years." Woody avisa: ele, o homem de
óculos e dos filmes que perdem dinheiro, é uma criatura mítica: o gambozino. E o
provincianismo nacional de mais alto nível, o do Município e o do Estado
central, anda à caça. É a pantomima da não-notícia, coisa tchekhoviana, e atrai
agentes vários: andar atrás de Woody Allen para ele filmar em Lisboa. Sim, há
cerca de um ano, foi "revelado" nesta terça-feira, o então ministro dos Negócios
Estrangeiros Paulo Portas, aproveitando uma estadia em Nova Iorque em visita
oficial às Nações Unidas, encontrou-se com a equipa de Woody Allen para "abrir
uma primeira porta" na potencial relação da capital com o realizador
norte-americano. E parece que não há mais nada para dizer... Nós, jornalistas,
estamos incluídos nessa dança – ou então a "não-notícia" seria apenas "não..." e
convém participar, não vá o tal filme fazer-se um dia...Não é de desprezar que a perda de autoestima que nos faz sofrer seja responsável pelo triste esbracejar sobre o vazio de comunicados que morrem na praia, cansados com tanta(s) generalidade(s), e ainda assim reproduzidos. Mas logo agora que a crise devia estar a acabar, precisamos tanto que Allen inunde os cofres com (o nosso ou o deles?) orgulho patriótico? Não virá esse tal filme tarde demais?
O que é que Londres (Scoop, Match Point), Barcelona (Vicky Cristina Barcelona), Paris (Meia-Noite em Paris) ou Roma (Para Roma com Amor) ganharam com Woody Allen? É uma questão para o turismo das cidades responderem. E o cinema torna-se uma questão de turismo ou é assim que sonham os cinéfilos que nos governam, levando Sharon Stone ao Douro ou imaginando, de forma autárquica e perante a televisão, homenagens a Manoel de Oliveira, na Praça dos Aliados, no Porto, apadrinhadas por Eastwood, Spielberg e Scorsese, nem mais...
Para voltar ao cinema e a Woody Allen: o que ganhámos com a tour europeia? Com excepção da escorregadela moral dada em Match Point, o filme que nos fez sonhar que ele se estava a levantar de uma queda (Hollywood Ending, Anything Else, Melinda e Melinda foram os títulos imediatamente anteriores, isto só para lembrar...), o sistema afectivo de muitos de nós, nostálgicos, permanece acabrunhado. (É compreensível que o Ministério dos Negócios Estrangeiros tenha levado isto tão a peito há um ano: Allen corresponde a uma espécie de "bom gosto" instituído, rosebud de uma geração, alguém lá pelo governo é cinéfilo). Mas quem se mete com Allen, parece ser essa a moral do périplo de Woody pelas cidades, entra num labirinto deceptivo.
O angustiante Blue Jasmine, filme na América, surpreende por ser espesso, por ser uma terra movediça onde se afunda Cate Blanchett, que puxa para baixo, levando com ela todo um filme e assim erguendo o cinema? Sim, Blue Jasmine é assim. Mas não fiando. A experiência com Allen, hoje, é coisa vacilante: ele instalou-se num "cinema de velho" (isto pode não ser necessariamente um insulto, pode ser até um elogio), teimosamente sem curiosidade pelo outro, aproveitando egoisticamente a mão que lhe dá de comer e que cobra mais barato do que na América. Isto para avisar que se calhar, quando surgir o tal filme de Woody Allen sobre Lisboa, reencontraremos uma fadista de caricatura como a de A Gaiola Dourada – mas se já existe uma...? –, Joaquim de Almeida talvez faça em Lisboa o que Banderas e Benigni fizeram em Barcelona e Roma, e o genérico pode contemplar uma marcha popular.
E se...? What if nothing exists and we’re all in somebody’s dream? Or what’s worse, what if only that fat guy in the third row exists?
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