EDP. Bruxelas investiga preço
demasiado baixo pago por concessões
Por Filipe Paiva Cardoso
publicado em 19 Set 2013 in (jornal) i online
"Comissão Europeia tem
dúvidas de que a EDP tenha pago um preço adequado pelas concessões." Água
portuguesa é dos chineses até 2052
Em 2052, se tudo correr bem na sua vida, António Mexia vai
ter 95 anos. A mesma idade que então terá José Sócrates, primeiro-ministro
português em 2007, ano em que a EDP - agora nas mãos do Estado chinês - assinou
uma série de extensões de prazos de concessão com o governo socialista que,
volvidos seis anos, começam a suscitar a desconfiança de Bruxelas.
Em causa estão suspeitas de violação das regras de
concorrência pela EDP e pelo ex-governo, já que a Comissão Europeia desconfia
não só do preço demasiado baixo pago, pela eléctrica, pelas concessões de
recursos hídricos públicos, mas também do excessivo prazo das mesmas
concessões: algumas vão até 2052, ano em que os responsáveis visados celebrarão
então 95 anos de vida.
A EDP, que lucra mais de mil milhões de euros por ano,
assinou em 2007 com o Estado português o alargamento das concessões que lhe
foram cedidas para a utilização de recursos hídricos na produção de
electricidade. O preço destes prolongamentos de concessão foi de 759 milhões de
euros, dos quais a EDP ainda conseguiu descontar 56 milhões em impostos (não)
pagos ao Estado. Para Bruxelas, e segundo o comunicado de ontem, o acordo
Mexia/Sócrates permitiu à EDP manter sob controlo mais de 27 centrais
eléctricas que, em conjunto, representam quase 30% das capacidades de produção
do país - um controlo que, além de ter custado pouco dinheiro, foi ainda cedido
"por um período de tempo muito longo, só terminando, em certos casos, em
2052", diz a CE. "A Comissão apreciará, em especial, se a medida
proporcionou uma vantagem económica indevida à EDP relativamente aos seus
concorrentes, limitando a entrada no mercado da electricidade em
Portugal", salienta o mesmo comunicado.
A Comissão Europeia já iniciou, aliás, a sua investigação a
esta polémica, numa análise que já lhe permite apontar que, "com base nas
informações disponíveis nesta fase, a Comissão tem dúvidas de que a EDP tenha
pago um preço adequado pelas concessões. Tal poderá ter dado à EDP uma vantagem
selectiva que os seus concorrentes não tiveram, configurando, assim, um auxílio
estatal" incompatível com as regras europeias. Além disso, "a longa
duração da concessão pode ter tido, em si mesma, um efeito anticoncorrencial,
impedindo a entrada de concorrentes interessados no mercado português".
A entrada tardia da Comissão Europeia em cena prende-se com
a total inexistência e/ou inoperância de organismos independentes em Portugal.
É que somente no ano passado a Comissão Europeia teve conhecimento deste dossiê
Mexia/Sócrates. Foi preciso uma denúncia de um grupo de cidadãos, entre os
quais Pedro Sampaio Nunes, José Ribeiro e Castro e António Cardoso e Cunha,
para que Bruxelas abrisse um inquérito formal às concessões dos recursos
hídricos públicos dos portugueses que, por ora, continuam condenados a ficar
sob controlo do Estado chinês por mais quatro décadas.
Comissão Europeia abre inquérito à concessão de barragens à EDP
Bruxelas quer verificar se o negócio, formalizado em 2007, beneficiou a empresa portuguesa em detrimento dos seus concorrentes
A Comissão Europeia abriu um inquérito para apurar se
o preço pago, em 2007, pela EDP pela extensão do seu direito de usar os recursos
hídricos públicos para a produção de electricidade se encontrava em conformidade
com as normas em matéria de auxílios estatais da União Europeia. O objectivo é
verificar se a empresa portuguesa beneficiou de uma vantagem económica face aos
seus concorrentes, segundo o anúncio feito ontem em Bruxelas.
O Governo português promete "total colaboração com a Comissão Europeia neste
processo". Fonte oficial Ministério do Ambiente, Ordenamento do Território e
Energia afirmou à Lusa que essa colaboração será feita com uma "postura de total
transparência", mas sem adiantar mais pormenores.Segundo explica a Comissão Europeia, em comunicado, "em 2007, Portugal alargou as concessões facultadas à EDP para a utilização de recursos hídricos públicos para a produção de electricidade, contra o pagamento de 759 milhões de euros (dos quais 56 milhões de euros reverteram para impostos)". Bruxelas salienta que esta decisão nunca foi comunicada à Comissão e implica "a manutenção de 27 centrais eléctricas, que representam 27% das capacidades de produção do país, sob o controlo da EDP por um período de tempo muito longo, só terminando, em certos casos, em 2052".
Bruxelas adianta desde já que há dúvidas de que a EDP tenha pago um preço adequado pelas concessões. "Tal poderá ter dado à EDP uma vantagem selectiva que os seus concorrentes não tiveram, configurando, assim, um auxílio estatal" segundo as normas da UE.
"Nesta fase, a Comissão duvida de que esse auxílio fosse compatível com o mercado interno da UE. Além disso, a longa duração da concessão pode ter tido, em si mesma, um efeito anticoncorrencial, impedindo a entrada de concorrentes interessados no mercado da electricidade português", adianta a Comissão.
O inquérito surge na sequência de denúncias feitas em Setembro de 2012 por vários cidadãos - entre os quais Pedro Sampaio Nunes, José Ribeiro e Castro e António Cardoso e Cunha, segundo o Jornal de Negócios.
Recorde-se que a negociação dos custos de manutenção do equilíbrio contratual (CMEC) e o prolongamento do prazo de concessão das barragens foram alvo de uma queixa na Procuradoria-Geral da República (PGR) em Março.
O PÚBLICO tentou, sem sucesso, obter uma reacção da EDP.
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