25 Setembro 2013, 12:34 por Jornal de Negócios |
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O verniz estalou. Pela primeira vez, o BES assume
estar em guerra com o angolano Álvaro Sobrinho. E acusa o ex-presidente do BES
Angola de promover uma agenda que o coloca até como sucessor de Ricardo
Salgado.
As acusações são oficiais e estão contidas numa carta
enviada às redacções ontem à noite por Paulo Padrão, director de comunicação do
Banco Espírito Santo.
A carta é enviada na sequência de uma notícia entretanto
publicada na edição de hoje do diário "i", jornal no qual o grupo de
Álvaro Sobrinho, a Newshold, tem um contrato de gestão. Noticia o "i"
que Ricardo Salgado foi chamado ao Banco de Portugal, para dar explicações sobre
uma comissão de 8,5 milhões de euros que terá recebido por consultoria a um
cliente.
Na carta enviada (ver na íntegra em baixo), Paulo Padrão
desmente que o líder do BES tenha sido chamado: “Desmentimos peremptoriamente
que o Dr. Ricardo Salgado tenha sido “chamado” ao Banco de Portugal por causa
do dito artigo. É completamente falso que o Dr. Ricardo Salgado se tenha
deslocado ao Banco de Portugal na passada segunda feira.”
“Estas informações falsas podem ser facilmente verificadas
junto do Banco de Portugal”, repete.
O director de comunicação relaciona esta notícia com outra
do mesmo jornal: “Pela 2ª vez no curto espaço de um mês o i avança com a
informação falsa de que o Dr. Ricardo Salgado foi “chamado” ao Banco de
Portugal (já o tinha feito com falsidade na edição de 28 de Agosto – desmentido
formal do BES facilmente aferível junto do Banco de Portugal).”
Sobrinho sucessor de Salgado?
Mais do que um desmentido de uma notícia, a carta do
porta-voz do BES assume a guerra entre as duas partes. Essa guerra tem sido
noticiada por vários jornais, incluindo o Negócios, mas nunca até hoje qualquer
das partes a tinha assumido. Silêncio que o BES hoje rompe:
“Com esta informação, que desmentimos totalmente, o i
reforça a sua agenda principal dos últimos meses: atacar de forma ostensiva e
sistemática o BES e o seu Presidente Executivo. Essa agenda coincide de forma
perfeita, primeiro com a saída do patrão do i de presidente da comissão
executiva do banco do grupo em Angola (no final de 2012) e, agora, com a saída
de presidente do conselho de administração (durante o Verão).”
Álvaro Sobrinho foi presidente executivo do Banco Espírito
Santo Angola até Outubro de 2012, tendo em Novembro passado a ser “chairman” do
mesmo banco. Esta mudança foi na altura entendida como um “pontapé para cima”,
afastando o gestor da vida executiva do banco, na sequência do conflito que já
então germinara. Já este ano, Álvaro Sobrinho saiu totalmente dos órgãos
sociais do BESA, tendo assumido uma participação de controlo no Banco Valor.
Foi até noticiado que Sobrinho está a contratar quadros do BESA para reforçar o
Valor.
Paulo Padrão recorre ainda a uma notícia do i de há duas
semanas, em que o jornal noticia a proximidade da sucessão de Ricardo Salgado
no BES, avançando com uma infografia com quatro possíveis sucessores: Amílcar
Morais Pires (actual administrador financeiro do BES), José Maria Ricciardi
(actual presidente do BES Investimento, e primo de Ricardo Salgado), Bernardo
Espírito Santo (também da família e líder das operações no Brasil) e Álvaro
Sobrinho. Todos estes nomes já haviam sido noticiados como possíveis
sucessores, menos o de Sobrinho, que assim apareceu pela primeira vez.
“O i chegou ao desplante máximo e despudorado de dar o seu
patrão como candidato à liderança do Grupo BES”, escreve Paulo Padrão. Que
ironiza: “No grupo BES aguarda-se com incontida ansiedade pela confirmação
desta intenção comunicada pelo i.”
O conflito era até aqui latente e negado. Em Dezembro de
2012, numa entrevista ao Negócios por altura da inauguração da nova sede do
BESA, em Luanda, Álvaro Sobrinho dizia ter as melhores relações com Ricardo
Salgado. “Tenho uma relação de confiança com o Dr. Ricardo Salgado. Do ponto de
vista profissional ele é líder do BES. Do ponto de vista pessoal tenho com ele
uma relação do melhor que podia acontecer. Não tenho nada a apontar”.
A Newshold detém várias participações em órgãos de
comunicação social em Portugal. Além da gestão do i, é dona do “Sol” e é
accionista minoritária com cerca de 15% da Cofina, grupo que detém o Negócios.
O Negócios tem tentando ao longo da manhã contactar a
Newshold, até ao momento sem sucesso.
Leia a carta de Paulo Padrão às redacções na íntegra:
A título de esclarecimento, venho prestar a seguinte
informação.
O jornal i prepara-se para publicar amanhã (25 de Setembro)
mais um artigo de ataque ao BES e ao seu presidente executivo.
Pela 2ª vez no curto espaço de um mês o i avança com a
informação falsa de que o Dr. Ricardo Salgado foi “chamado” ao Banco de
Portugal (já o tinha feito com falsidade na edição de 28 de Agosto – desmentido
formal do BES facilmente aferível junto do Banco de Portugal).
Diz o i que o Dr. Ricardo Salgado foi “chamado” ao Banco de
Portugal ontem, 2ª feira (23 de Setembro), na sequência de um artigo do Sol.
Desmentimos peremptoriamente que o Dr. Ricardo Salgado tenha sido “chamado” ao
Banco de Portugal por causa do dito artigo. É completamente falso que o Dr.
Ricardo Salgado se tenha deslocado ao Banco de Portugal na passada segunda
feira.
Estas informações falsas podem ser facilmente verificadas
junto do Banco de Portugal.
Com esta informação, que desmentimos totalmente, o i reforça
a sua agenda principal dos últimos meses: atacar de forma ostensiva e
sistemática o BES e o seu Presidente Executivo. Essa agenda coincide de forma
perfeita, primeiro com a saída do patrão do i de presidente da comissão executiva
do banco do grupo em Angola (no final de 2012) e, agora, com a saída de
presidente do conselho de administração (durante o Verão).
O i chegou ao desplante máximo e despudorado de dar o seu
patrão como candidato à liderança do Grupo BES (edição de 18 de Setembro). No
grupo BES aguarda-se com incontida ansiedade pela confirmação desta intenção
comunicada pelo i.
Atentamente,
Paulo Padrão
Diretor de Comunicação
Grupo Banco Espírito Santo
Nota da direcção do jornal i
Por Jornal i
publicado em 26 Set 2013
O BES não pode esperar que os jornalistas deixem de exercer
a sua profissão
A administração do Banco Espírito Santo (BES) teve ontem uma
reacção desproporcional, violenta e inaudita face ao trabalho de investigação
jornalística que o jornal i tem vindo a fazer sobre o envolvimento de
administradores e altos quadros do Grupo Espírito Santo em diversos processos
judiciais.
O jornal i solicitou um comentário do BES durante o dia de
terça-feira ao facto de o dr. Ricardo Salgado ter sido chamado ao Banco de
Portugal, mas não recebeu qualquer resposta – como tem sido habitual nos
últimos contactos feitos pelos nossos jornalistas.
Através de uma carta enviada às redacções durante o dia de
ontem (que não chegou ao i), a administração do BES acusa o nosso jornal, num
tom inusitado para uma instituição financeira quase centenária, de “atacar de
forma ostensiva e sistemática o BES e o seu presidente executivo”, ligando as
notícias que temos vindo a publicar com a saída do dr. Álvaro Sobrinho da
administração do Banco Espírito Santo de Angola. Tais acusações levaram mesmo o
“Jornal de Negócios” a afirmar que a administração do BES “assume estar em
guerra com o angolano Álvaro Sobrinho”.
A direcção do jornal i rege o seu trabalho por critérios
exclusivamente jornalísticos, avaliando a credibilidade e a veracidade da
informação recolhida pelos seus jornalistas de forma independente de qualquer
poder político ou económico. Tal como assume, de boa-fé, os erros quando os
mesmos se verificam.
O jornal i não está portanto em guerra com ninguém.
Desde o início da investigação jornalística que a
administração do BES tem recusado esclarecer de forma clara as dúvidas dos
nossos jornalistas, optando, ao invés, por tentar descredibilizar o trabalho do
i. Essa política de comunicação do BES visa igualmente condicionar o trabalho
dos nossos jornalistas.
O BES tem tentado pressionar igualmente a direcção e os
jornalistas do i que têm feito o seu trabalho.
A direcção do jornal i não se deixa intimidar com o poder
económico e publicitário do BES e continuará a garantir o direito de informar e
a acompanhar toda a informação que os seus jornalistas recolham com
profissionalismo, isenção e respeito pelo nosso código deontológico.
Compreendemos, obviamente, que a administração do BES não
goste de ver escrito que dois dos seus principais administradores foram constituídos
arguidos por suspeitas do crime de inside trading, percebemos que o BES não
queira que se saiba que o dr. Ricardo Salgado, presidente executivo, e o dr.
Morais Pires, administrador executivo, fizeram rectificações dos respectivos
IRS de 2011 num valor que supera os 9,6 milhões de euros na sequência do
processo Monte Branco, entendemos que a liderança do BES prefira que não sejam
conhecidas declarações de três administradores da Escom que, após serem
informados da sua condição de arguidos por corrupção activa, branqueamento de
capitais e tráfico de influências, afirmaram que actuaram sempre com “o total
conhecimento e concordância dos seus então accionistas”, isto é, o Grupo
Espírito Santo.
Compreendemos igualmente que a administração do BES prefira
não fazer comentários ao facto de o dr. Ricardo Salgado ter sido remunerado em
8,5 milhões de euros através de uma offshore por uma consultoria externa
realizada a um cliente do banco.
Compreendemos, enfim, que estes factos sejam incómodos para
a liderança do BES. Mas uma coisa o BES não pode esperar: que os jornalistas
tenham medo do seu poder financeiro e deixem de exercer a sua profissão.
O jornal i, com toda a certeza, continuará a fazer o seu
trabalho respeitando todos os poderes da sociedade portuguesa, mas sem ceder um
milímetro na missão jornalística da busca de informação verdadeira, factual e
com relevância pública.
A direcção do i
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