Classificação também teve em conta o "testemunho notável de vivências ou factos históricos" do edifício |
Mercado do Bolhão classificado como monumento antes da reabilitação
Edifício emblemático da Baixa do Porto foi classificado como monumento de interesse público. À espera de reabilitação há décadas, espera-se agora que candidatos autárquicos cumpram promessa de obras
Degradado, abandonado, esvaziado de gentes, mas ainda
um íman para os turistas e para as promessas dos candidatos à presidência da
Câmara do Porto, o Mercado do Bolhão foi ontem classificado como monumento de
interesse público. É a conclusão de um processo iniciado em 1994 que distingue o
edifício - desenhado pelo arquitecto António Correia da Silva - antes da
comemoração do seu centenário, no próximo ano. A Livraria Lello e Irmão, outro
espaço emblemático do Porto, também foi classificada (ver texto lado).
A portaria do secretário de Estado da Cultura, Jorge Barreto Xavier, que fixa
também a zona especial de protecção do mercado, refere que o edifício obedece
aos critérios que permitem descrevê-lo como um "testemunho simbólico", bem como
um "testemunho notável de vivências ou factos históricos", com comprovado "valor
estético, técnico e material intrínseco". A classificação é também uma distinção
"à sua concepção arquitectónica e urbanística, e à sua extensão, e ao que nela
se reflecte do ponto de vista da memória colectiva".Curiosamente, o Mercado do Bolhão é classificado naquela que será a pior fase da sua história. A necessidade de reabilitação já foi reconhecida na década de 90, quando o socialista Fernando Gomes ainda era presidente da autarquia. Na altura, foi encomendado, aprovado e pago um projecto ao arquitecto Joaquim Massena, que nunca foi executado. Seguiu-se a gestão de Rui Rio e a decisão de, em 2005, escorar a ala sul do edifício, com a justificação que esta estava em risco de ruir. Sobre esse risco não se insistiu mais e, no final do ano passado, quando ainda admitia fazer pequenos arranjos no edifício antes do fim do mandato (e depois de ter falhado a sua intenção de o concessionar), Rio admitiu retirar as escoras.
Velho, escorado e reduzido a uma percentagem ínfima dos comerciantes que já teve, o Mercado do Bolhão consegue, mesmo assim, a classificação, em véspera de eleições autárquicas e quando está, de novo, no centro das promessas dos candidatos. Honra para o trabalho do arquitecto Correia da Silva, que soube, defende a portaria, "conjugar nele as linhas arquitectónicas e a gramática decorativa de inspiração neoclássica tardia com uma tendência racional e modernista, expressa na conjugação dos novos materiais, como o betão armado, o vidro e as estruturas metálicas, com as coberturas em madeira e as tradicionais cantarias de granito".
À espera do futuro, mas cansados de promessas, os comerciantes aguardam, de novo, que se cumprem os projectos dos candidatos que já puseram as cartas na mesa sobre o que querem para o local. O candidato do PSD, Luís Filipe Menezes, que hoje mesmo vai andar pelo mercado em campanha, promete reabilitar o Bolhão num ano, recuperando o projecto de Joaquim Massena, mas ajustando-o.
O Bolhão de Menezes terá estacionamento no subsolo e em torno do edifício e a reabilitação será paga pela concessão desse estacionamento. O autarca que quer trocar a presidência de Gaia pelo Porto promete criar "600 ou 700 empregos". Manuel Pizarro, o candidato socialista, fala num projecto mais modesto, que não estará pronto antes de 2015 (e afirma que quem promete obra antes disso está a mentir) e que não incluirá estacionamento nem cobertura. Assim, diz, será possível reabilitar o mercado com cerca de "oito milhões de euros". No seu programa eleitoral, Pizarro diz que o novo Bolhão permitirá criar "300 postos de trabalho".
Rui Moreira é quem tem a proposta mais detalhada para o mercado, no seu programa eleitoral. O independente, apoiado pelo CDS - que já veio ontem a público defender que a classificação "impossibilita" o projecto do rival Menezes (apesar do grau de protecção não se ter alterado) -, defende, no seu programa: "O edifício do Mercado do Bolhão vai manter a sua traça e preservar a sua função, com bancas e comércio tradicional, assegurando todas as condições para a permanência dos comerciantes que actualmente ali desenvolvem a sua actividade. O projecto inclui ainda áreas culturais, restauração e residências para universitários, não envolvendo a construção de qualquer tipo de estacionamento subterrâneo". A instalação de residências universitárias no Bolhão já mereceu a contestação dos adversários de Moreira e não é ainda claro se o Plano Director Municipal, que classifica o espaço como "equipamento", permite que o edifício seja usado para esse fim.
Já Pedro Carvalho (CDU) e José Soeiro (Bloco de Esquerda) defendem que a reabilitação do mercado seja feita com base no projecto elaborado pela Direcção Regional de Cultura do Norte, que contempla a manutenção da actividade actual, mas renovada e alargada, e dota o edifício de estacionamento subterrâneo e cobertura - esta última fazia parte do projecto original de Correia da Silva. A diferença entre os dois está na forma de financiamento desta reabilitação - o comunista pretende garantir financiamento comunitário enquanto Soeiro quer pagar o novo Bolhão com o valor arrecadado pelo município com o Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI).
A uma semana das eleições e com as sondagens a não darem, para já, maioria absoluta a nenhum candidato, falta saber o que será o Bolhão de futuro. Uma proposta irá sobrepor-se às outras? Haverá cedências? E será, finalmente, reabilitado?
Várias classificações num só dia. Mais 15 novos monumentos de interesse público
Igrejas, palacetes, solares e até uma estação
ferroviária foram ontem classificados como monumento de interesse público um
pouco por todo o país. As portarias assinadas pelo secretário de Estado, Jorge
Barreto Xavier, incluem o edifício da Estação Nova de Coimbra, o Convento e a
Igreja de Corpus Christi (Lisboa) e o Palace Hotel da Curia (na foto), com o
Chalet das Rosas, a Capela da Senhora do Livramento, a Piscina Paraíso, garagem
e jardins. Entre os imóveis classificados estão também a Fonte das Bicas, no
Alandroal (Évora), a Casa do Terreiro (Tondela), a Casa do Corpo Santo
(Setúbal), a Casa de Pielas e a Casa de Lamas, em Cabeceiras de Basto (Braga),
bem como a Casa e Capela de José Guilherme Pessoa Pereira ou Solar Seabra
Beltrão (Mangualde). Foram também classificados o Solar da Quinta da Cruz
(Silves), o Solar de Simas Cardoso (Fronteira), o Palacete de António José Gomes
(Almada), o conjunto de casa nobre, capela e antigas dependências agrícolas da
Horta do Ourives (Faro) e as igrejas de São Tiago (Pombal) e da N.ª S.ª da
Assunção (Loulé). Foram ainda fixadas as zonas especiais de protecção da Igreja
de Santo Isidoro (Marco de Canaveses), do Abrigo do Lagar Velho (Leiria) e do
Mosteiro e Memorial de Odivelas.
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