Por onde andam os gestores dos swaps especulativos?
Dois secretários de Estado e três administradores foram demitidos, mas muitos dos gestores que aprovaram contratos considerados de risco continuam a ocupar cargos em empresas e organismos públicos. E há até dois candidatos às autárquicas
A mensagem do Governo parecia clara: afaste-se quem
autorizou swaps especulativos. E assim caíram, entre Abril e Junho, dois
secretários de Estado e três gestores. Mas nos conselhos de administração que
subscreveram contratos de risco tinham assento dezenas de outros responsáveis
que hoje continuam a desempenhar papéis de destaque na esfera pública. Alguns
mantiveram-se no cargo, outros são altos quadros de empresas e organismos do
Estado e até há dois candidatos às autárquicas.
A lista das seis empresas com swaps desequilibrados, que não se
destinavam apenas a cobrir o risco de variação da taxa de juro e tinham
cláusulas que beneficiavam os bancos, chegou às mãos do Governo a 7 de Janeiro.
Daí por duas semanas, ainda a polémica não tinha rebentado, o ministro da
Administração Interna, Miguel Macedo, nomeava um ex-administrador do Metro de
Lisboa para presidente da Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária.A nomeação, oficializada a 30 de Janeiro, aconteceu numa altura em que o executivo já sabia que a transportadora pública era responsável por mais de metade das perdas potenciais acumuladas com estes contratos (que superaram os 3000 milhões de euros) e que tinha subscrito 40 dos 56 swaps considerados especulativos numa auditoria da Agência de Gestão da Tesouraria e da Dívida Pública (IGCP).
Antes de ser escolhido para liderar a Autoridade Nacional de Segurança Rodoviária, Jorge Jacob foi administrador do Metro de Lisboa durante seis anos, entre 2006 e 2012 (período em que a empresa contratualizou derivados de risco). O gestor ocupava-se da vertente mais operacional do negócio, mas, tal como todos os elementos da administração, dava o aval à subscrição destes produtos.
A função específica de cada gestor nas seis empresas em que o IGCP detectou swaps desequilibrados (Metro de Lisboa, Carris, Metro do Porto, STCP, CP e Egrep) foi uma variável importante na decisão do Governo. A resolução aprovada no Conselho de Ministros de 6 de Junho para afastar os presidentes do Metro de Lisboa/Carris e Egrep e um administrador da Entidade de Serviços Partilhados da Administração Pública clarificava que as demissões tinham como destinatários presidentes, administradores e directores com o pelouro financeiro à data da subscrição de contratos de risco (ver caixa).
Uma extensa lista
O facto de terem ficado de fora muitos dos gestores envolvidos na aprovação de derivados especulativos tem gerado críticas desde que começaram a rolar cabeças. O mal-estar intensificou-se com as audições aos gestores públicos que estão a decorrer, desde Setembro, na comissão de inquérito ao caso dos swaps e que hoje continuam com dois ex-presidentes do Metro de Lisboa (Joaquim Reis e Francisco Cardoso dos Reis).
Numa das audições da semana passada, um dos visados pelas demissões, o ex-secretário de Estado adjunto da Administração Interna, fez questão de enumerar os nomes de todos os que se sentaram ao seu lado na administração da Metro do Porto. Juvenal da Silva Peneda, que esteve na transportadora pública entre 2004 e 2008, desfiou um verdadeiro rol de autarcas: Valentim Loureiro (Gondomar e que ainda hoje é presidente da mesa da assembleia geral da empresa), Rui Rio (Porto), Mário Almeida (Vila do Conde) e Narciso Miranda (ex-presidente da Câmara Municipal de Matosinhos).
Na terça-feira, foi a vez de um dos antigos presidentes da Metro do Porto, Ricardo Fonseca, recordar que as decisões tomadas pela administração da Metro do Porto também contaram com a aprovação de Marco António Costa, vice-presidente do PSD.
O coordenador da comissão política dos sociais-democratas foi administrador não executivo da transportadora pública entre 2007 e 2011, período em que foram subscritos derivados considerados problemáticos. Rumou depois ao Governo como secretário de Estado da Segurança Social. Apesar do afastamento de Silva Peneda e de Paulo Braga Lino (que era secretário de Estado da Defesa e tinha sido director financeiro da Metro do Porto), Marco António Costa manteve-se no lugar. Acabou por sair apenas em Julho para se ocupar de novas funções dentro do partido.
Mas há casos de gestores que nunca chegaram a deixar os postos a partir dos quais tomaram decisões sobre swaps. No Metro de Lisboa, uma das cadeiras da administração pertence actualmente a Pedro Bogas, que já tinha estado na empresa entre 2006 e 2009 e que, no intervalo, passou pela Refer e pelo Governo.
Também na Metro do Porto há uma situação semelhante. Gonçalo Mayan Gonçalves é administrador não executivo da empresa desde 2010, tendo sido nomeado aquando da saída de Rui Rio deste cargo. Os dois estão, aliás, juntos na Câmara Municipal do Porto, onde Mayan Gonçalves é vereador com o pelouro do Urbanismo e Mobilidade.
Em Junho, a transportadora pública readmitiu Braga Lino, agora como director administrativo. E tem ainda nos seus quadros um gestor que esteve na administração da STCP no período em que esta empresa subscreveu dois derivados problemáticos junto do BNP Paribas e do Santander. Trata-se de Paulo Sá, que é hoje técnico da direcção de planeamento e controlo da Metro do Porto.
De cargo em cargo
A maioria dos ex-administradores envolvidos na subscrição de swaps especulativos já não se encontra nas seis empresas identificadas pelo IGCP. Mas muitos deles ainda estão em cargos públicos - porque regressaram aos lugares de origem de onde foram requisitados ou porque encontraram novas oportunidades em empresas e organismos do Estado.
Há o caso de Maria Gorete Rato, que foi administradora da Metro do Porto entre 2008 e 2012 e voltou depois ao cargo de directora na Caixa Geral de Depósitos. Carlos Mineiro Aires, ex-presidente do Metro de Lisboa entre 2003 e 2006, é hoje administrador da Simarsul (uma empresa do grupo Águas de Portugal).
Miguel Roquette, que esteve no conselho de administração da mesma transportadora pública no mandato seguinte (2006 a 2010), surge como presidente da mesa da assembleia geral de duas empresas do Estado: Gare Intermodal de Lisboa e Baía Tejo.
Na ANA, a gestora aeroportuária que o Governo está prestes a vender ao grupo privado francês Vinci, um dos assentos na equipa de gestão é ocupado desde 2012 por Luís Silva Ribeiro, que foi administrador do Metro de Lisboa, com o pelouro financeiro, a partir de 2010. E há ainda o caso de João Marrana, ex-vogal da STCP que é um dos administradores do ON.2, o programa operacional que gere os fundos comunitários na região norte.
Mas o currículo destes gestores, muitas vezes nomeados mediante a cor dos governos em funções, também se tem desviado por caminhos assumidamente políticos. A actual directora de Finanças da Câmara Municipal de Lisboa, por exemplo, foi administradora da Carris para a área financeira entre 2006 e 2012.
E há ainda dois candidatos às próximas autárquicas, agendadas para 29 de Setembro, que também fizeram parte de administrações de empresas públicas aquando da subscrição de derivados especulativos. Um deles, Pedro Pinto, foi vogal do Metro de Lisboa entre 2003 e 2005 e concorre agora a Sintra pelo PSD e CDS. Os socialistas também têm em mãos uma situação idêntica: o candidato à autarquia da Maia, Ricardo Bexiga, foi administrador da CP entre 2008 e 2009.
De todos estes gestores envolvidos na autorização de contratos de risco e que se mantinham em cargos públicos quando a polémica rebentou, apenas cinco acabaram por ser afastados pelo Governo: Braga Lino, Silva Peneda, Silva Rodrigues (presidente do Metro de Lisboa/Carris), João Vale Teixeira (presidente da Egrep) e Paulo Magina (ex-gestor da CP que era administrador na Entidade de Serviços Partilhados da Administração Pública).
Há muitos outros casos, como o dos ex-presidentes que hoje serão ouvidos no Parlamento, em que não foi possível apurar que funções exercem actualmente. E uma pequena parte destes gestores reformou-se recentemente, como aconteceu com José Benoliel (ex-presidente da CP) e Fernanda Meneses (que liderou a STCP entre 2006 e 2012).
in Público
Ignorância, necessidade e muitas críticas
Parlamento já ouviu sete gestores públicos e prepara-se para ouvir outros
cinco, no seio de uma polémica em que têm sido os principais alvos. Os
sucessivos governos não têm sido poupados a críticas
Ao longo das audições que já decorreram, houve casos em que se assumiu um desconhecimento sobre os contratos, como aconteceu com Juvenal Silva Peneda (afastado do cargo de secretário de Estado adjunto da Administração Interna por ter sido administrador da Metro do Porto). E outros em que se explicou que a situação destas empresas, especialmente as do sector dos transportes, sempre foi muito frágil. De um lado, um accionista que pedia obra mas não tinha dinheiro para pagar e, do outro, os bancos que ofereciam financiamento com condições mais vantajosas caso fossem subscritos swaps. Isto numa altura em que se previa uma escalada das taxas de juro.
Estes derivados são vulgarmente utilizados pelas empresas (públicas e privadas) para cobrir o risco de variação da taxa de juro. O problema é que, de acordo com a auditoria do IGCP, há swaps em seis empresas do Estado que têm elementos especulativos e incluem cláusulas que beneficiam as instituições financeiras (como a possibilidade de liquidarem antecipadamente os contratos).
O Governo também não tem sido poupado. Silva Rodrigues, que foi afastado da presidência do Metro de Lisboa/Carris, garantiu que foi demitido por "razões políticas" num "processo sumário", que pretende contestar judicialmente. E a ex-presidente da STCP, Fernanda Meneses, questionou as negociações que estão a ser feitas com a banca para cancelar os derivados, tornando as perdas potenciais em reais.
Ontem, Manuel Frasquilho (antigo líder da Metro de Lisboa) manifestou "desagrado" com a forma como os gestores têm sido tratados, lamentando que sejam considerados "os maiores incompetentes". E o seu sucessor, Carlos Mineiro Aires, garantiu que todas estas questões sempre foram acompanhadas pelas tutelas governamentais, como têm frisado muitos ex-administradores. Mas a polémica só agora rebentou.
Pela comissão de inquérito aos swaps já passaram
antigos e actuais governantes, dirigentes de organismos do Estado e de entidades
supervisoras. Mas só agora, nas audições aos gestores públicos que subscreveram
derivados, é que as responsabilidades começaram a ser assumidas. Até aqui,
reinava a retórica da culpabilização alheia e, em muitos casos, um absoluto
vazio.
Desde o início de Setembro, o Parlamento já recebeu sete ex-administradores
de empresas do Estado, estando marcadas mais duas audições para hoje e outras
três para a próxima semana. Entre segunda e quarta-feira vserão ouvidos
Almerindo Marques (ex-presidente da Estradas de Portugal), Luís Pardal
(ex-presidente da Refer) e Oliveira Marques (ex-presidente da Metro do
Porto).Ao longo das audições que já decorreram, houve casos em que se assumiu um desconhecimento sobre os contratos, como aconteceu com Juvenal Silva Peneda (afastado do cargo de secretário de Estado adjunto da Administração Interna por ter sido administrador da Metro do Porto). E outros em que se explicou que a situação destas empresas, especialmente as do sector dos transportes, sempre foi muito frágil. De um lado, um accionista que pedia obra mas não tinha dinheiro para pagar e, do outro, os bancos que ofereciam financiamento com condições mais vantajosas caso fossem subscritos swaps. Isto numa altura em que se previa uma escalada das taxas de juro.
Estes derivados são vulgarmente utilizados pelas empresas (públicas e privadas) para cobrir o risco de variação da taxa de juro. O problema é que, de acordo com a auditoria do IGCP, há swaps em seis empresas do Estado que têm elementos especulativos e incluem cláusulas que beneficiam as instituições financeiras (como a possibilidade de liquidarem antecipadamente os contratos).
O Governo também não tem sido poupado. Silva Rodrigues, que foi afastado da presidência do Metro de Lisboa/Carris, garantiu que foi demitido por "razões políticas" num "processo sumário", que pretende contestar judicialmente. E a ex-presidente da STCP, Fernanda Meneses, questionou as negociações que estão a ser feitas com a banca para cancelar os derivados, tornando as perdas potenciais em reais.
Ontem, Manuel Frasquilho (antigo líder da Metro de Lisboa) manifestou "desagrado" com a forma como os gestores têm sido tratados, lamentando que sejam considerados "os maiores incompetentes". E o seu sucessor, Carlos Mineiro Aires, garantiu que todas estas questões sempre foram acompanhadas pelas tutelas governamentais, como têm frisado muitos ex-administradores. Mas a polémica só agora rebentou.
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