Lisboa. Seara quer voltar a ser surpresa da noite eleitoral, mas Costa é favorito
Ao actual presidente as sondagens reservam maioria absoluta. O cabeça de lista do PSD ataca garantindo que estará com os dois pés na capital, negando estar em trânsito para o Parlamento Europeu
Nas autárquicas de 2001, a eleição de Fernando Seara
como presidente da Câmara de Sintra foi uma das maiores surpresas da noite,
contrariando, os vaticínios. Se a história não se repetir, e se o favoritismo
que sondagens e politólogos atribuem a António Costa se confirmar, o advogado já
tratou de encontrar um bode expiatório: os "tribunais de Lisboa", cujas decisões
diz terem-no colocado "em desvantagem".
Fernando Seara tem no Tribunal Constitucional(TC) um obstáculo que ainda não
se sabe se será ultrapassado. No final de Julho, o TC atribuiu efeito suspensivo
ao recurso interposto pelo advogado contra a acção judicial do Movimento
Revolução Branca, que pretende impedir a sua candidatura. A decisão final,
estabelecendo como deve ser interpretada a lei de limitação de mandatos, poderá
só chegar a menos de um mês das autárquicas de 29 de Setembro. "Parto com a desvantagem natural de quem se viu constrangido, de quem se viu sujeito a decisões dos tribunais de Lisboa diferentes das de tribunais de todas as outras instâncias do país", lamentou o candidato da coligação PSD/CDS/MPT, que nos últimos anos conquistou notoriedade não tanto pelo trabalho discreto à frente da Câmara de Sintra mas pelos seus comentários sobre futebol na televisão. Agora, garante Fernando Seara nos cartazes espalhados pela cidade, está "em Lisboa com os dois pés", slogan com o qual de uma assentada critica as supostas ambições de António Costa para além da autarquia e procura calar os rumores segundo os quais teria negociado um lugar no Parlamento Europeu caso fosse derrotado nas autárquicas.
Num documento a que chamou "7 colinas, 7 ideias", e que pode ser visto na página da candidatura "Sentir Lisboa na Internet", o social-democrata dá a conhecer algumas ideias para a capital. Entre elas a criação de "uma empresa pública que reúna a Administração Central e a câmara para a gestão de todos os monumentos de Lisboa" e uma velha proposta defendida por Santana Lopes em 2009: a construção de um túnel no Saldanha, que "conclua o desnivelamento do eixo Campo Grande-Amoreiras".
António Costa parte como favorito. Dizem-no as sondagens, a mais recente das quais lhe dá 50,5% dos votos e apenas 29,5% a Fernando Seara, mas também politólogos ouvidos pelo PÚBLICO. José Adelino Maltez fala numa possível "vitória esmagadora" do candidato do PS há seis anos à frente da Câmara. O professor catedrático do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas recorda os exemplos de Jorge Sampaio, de João Soares, e até de Nuno Abecasis, que "Lisboa tem distinguido os seus autarcas, mesmo em contraciclo", do que acontece nas eleições legislativas.
Quanto a Fernando Seara e ao imbróglio judicial em torno da sua candidatura, o politólogo admite que este não parte para as eleições "em igualdade de oportunidades" e defende que "já saiu bastante cara ao PSD" a sua escolha: "Cheira muito a reciclagem de caciques locais, pegaram na caixa dos políticos profissionais disponíveis e espetaram um aqui, outro ali...", avalia. Ainda assim, Adelino Maltez não acredita que esse vá ser o factor determinante. "O eleitorado não liga muito a esse tipo de juízo de valor moral, senão não votava em autarcas corruptos", constata o politólogo, para quem a previsível derrota de Seara ficará a dever-se acima de tudo ao facto da sua candidatura representar "uma alternativa pouco mobilizadora dos cidadãos".
Já André Freire começa por sublinhar que é "altamente indesejável" a polémica da lei de limitação de mandatos, que "não é minimamente clara", reconhecendo depois que pode ser um problema para a coligação PSD/CDS/MPT, que sai "enfraquecida" da situação. "Se não fosse isso Fernando Seara era um candidato forte", diz o politólogo, lembrando a sua notoriedade "como comentador de futebol".
"O que se espera é que António Costa vença, eventualmente com uma maioria absoluta", conclui o professor do ISCTE, para quem o socialista "é um candidato que globalmente tem feito um bom trabalho". André Freire acredita que o eleitorado poderá premiar o actual presidente por ter tentado uma solução à esquerda com o PCP e o BE.
O programa de António Costa ainda não é conhecido, mas dos "acordos de coligação" estabelecidos com o movimento Cidadãos por Lisboa (de Helena Roseta) e a associação Lisboa é Muita Gente (de José Sá Fernandes), repetindo a fórmula de sucesso de 2009, constam já algumas propostas para a cidade. Entre elas, "defender uma profunda reforma do sistema de transportes", "promover a instalação de uma Feira Popular" e "assegurar que não se executem, com excepção de eventuais equipamentos de uso público de grande relevância e reduzido impacto paisagístico, novas construções" na frente ribeirinha.
A CDU apresenta como cabeça de lista João Ferreira, um biólogo de 34 anos, do comité central do PCP e deputado no Parlamento Europeu. O comunista diz que "esta candidatura está disposta a aceitar todas as responsabilidades, incluindo a presidência da câmara", mas as sondagens são claras: conquistar um segundo vereador, perdido em 2009, é o máximo a que o partido pode aspirar. João Ferreira reconhece que a reorganização administrativa com a diminuição de freguesias de Lisboa de 53 para 24, pode "colocar dificuldades acrescidas" à CDU. Nas últimas autárquicas, esta força ganhou a presidência de cinco juntas de freguesia, mas com o novo mapa pode não conseguir mais do que a de Carnide, pois as restantes quatro foram alvo de fusões. Quanto ao BE, o partido aposta forte em Lisboa, levando a votos um dos coordenadores. João Semedo assume que o seu objectivo é recuperar o vereador que o partido tinha conseguido eleger em 2005, quando apoiou a candidatura independente de José Sá Fernandes. O bloquista considera que urbanismo e habitação, transportes e emergência social são "os três mais importantes problemas da cidade" e diz que o trabalho de António Costa nessas áreas ficou aquém do que era necessário fazer.
À Câmara de Lisboa concorrem ainda Nuno Correia da Silva (Partido Popular Monárquico/Partido Portugal Pró Vida/Partido Nova Democracia), que propõe a criação de uma taxa de dormidas na capital para apoiar idosos no acesso a medicamentos, Joana Miranda (Partido Comunista dos Trabalhadores Portugueses), cujo slogan é "Resgatar uma capital sequestrada", João Patrocínio (Partido Nacional Renovador) e Paulo Borges (Partido pelos Animais e pela Natureza).
Afinal em quem vamos votar?
Por António Sérgio Rosa de Carvalho
22/08/2013 in Público
A grave crise de representatividade e de prestígio da classe
política é preocupante.
Esta crise que foi acentuada pela crise económica, é
acompanhada e assim ilustrada, no entanto, por uma crescente exigência de
transparência e autenticidade e tendência de participação por parte dos
cidadãos.
A Internet, transformada em agora/fórum do aqui/agora
imediatista, plataforma de debate e opinião imediatista, da qual a própria
imprensa não pode prescindir na sua indefinição de modelo jornalístico neste
tempo de transição, tornou-se por vezes num imenso omnipresente/omnipotente
símbolo do velho "voto" grego de ostracismo.
Os "cacos" que serviam de instrumento de voto na
velha Grécia, foram substituídos pelo imediatismo dos "like" e os
perigos do populismo acompanham as vantagens da inquestionável liberdade.
A classe política tem consciência da necessidade imperativa de
purificação, de reforma, mas foi largamente ultrapassada pela velocidade dos
acontecimentos/tendências e surpreendida pela explosão de liberdade,
irreverência e exigência por parte dos votantes.
Tal como os dinossauros se extinguiram no passado, os candidatos
nas autárquicas sentem-se agora ameaçados pelo cataclismo/malaise de uma
opinião pública que deixou de ser influenciável pelo velhos clichés da
polarização baseada nas etiquetas ideológicas.
Em Lisboa estamos perante as autárquicas mais excêntricas
desde que a democracia representativa se instalou.
Assim temos como principal candidato um presidente sem
adversário alternativo e com uma "agenda política" futura que o
poderá levar a assumir "outros cargos" num futuro próximo.
Do outro lado temos um "candidato mistério" que
até agora não exprimiu uma só ideia ou conceito sobre Lisboa, e somos inundados
por um fluxo permanente, irrevelante e especulativo, de notícias sobre a sua
vida privada.
Para aqueles verdadeiramente interessados em Lisboa, e
interessados em encontrar uma alternativa à situação presente, esta situação é
desesperante, e acentua este profundo sentimento de vazio e de incapacidade do
sistema e da classe política em proporcionar um verdadeiro candidato, capaz de
representar uma alternativa que os represente.
Sim, já sabemos que no famoso dia 28 de Julho de 2005 foram
dados três minutos de discussão aos deputados de cada força partidária antes de
aprovarem a famosa lei dos mandatos.
Sim, a democracia participativa "cumpriu" a sua
vocação através de meios de pressão, mas a lei de demarcação continua a ser a
total independência e pureza de intenções e o voto nunca pode ser substituído
pelos tribunais.
A efectividade e o papel da democracia participativa termina
em ambições eleitorais.
Um "líder" da "cidadania" nunca poderá
ser membro de um partido político ou de uma "organização secreta" ou
motivado por um "programa" pessoal, terá de ser e permanecer exterior
ao sistema e aos jogos do poder.
Para isso já nos bastam os processos de politização dos
"independentes" "Zé"/Helena Roseta. O papel da cidadania
participativa é o de exclusivamente "estimular" de forma crítica e
permanente a reforma do sistema de representatividade política e de representar
sem o constrangimento dos "compromissos" as verdadeiras ansiedades
dos cidadãos, transformados posteriormente em votantes.
Transformar e elevar "os cacos" (sinais) vindos da
sociedade de forma totalmente independente, a fim de que eles possam ser
assimilados e traduzidos em programas reformados pelos representantes
políticos/candidatos nos quais podemos votar.
Este não é o caso em Lisboa. Afinal em quem vamos votar!?
Historiador de Arquitectura
Lixo continua a conspurcar as ruas, mas
quiosques deram nova vida aos jardins
Um espaço público cuidado gera atitudes de maior brio. Um caixote a
abarrotar afugenta as pessoas e incentiva comportamentos impróprios
Cada bairro tem o seu recanto infecto. Bem o sabe Cavaco Silva, que quando celebrou o 10 de Junho em Lisboa, no ano passado, pediu mais civismo aos lisboetas. Da Travessa do Possolo onde mora chega-se à Av. Infante Santo por entre prédios atulhados de dejectos caninos. Vizinha do Presidente, Inês Vassalo já se deu ao trabalho de contar as poias de cão entre a sua casa e o café. "Isto é nojento! Não é normal!", indigna-se. "O desinvestimento de António Costa na limpeza prejudicou a saúde pública. É verdade que fez coisas como abrir o Arco da Rua Augusta ao público. Mas a rua cheira mal e vêem-se baratas de um tamanho imenso!"
Quando tomou posse em 2007, a higiene não passou despercebida a António Costa, que prometeu "uma acção de limpeza de emergência geral, centrada na recolha de detritos, lavagem de passeios e remoção de cartazes". Seis anos mais tarde o executivo camarário apela ao civismo dos cidadãos, mas reconhece que as contingências económicas inviabilizam a contratação de mais gente para a limpeza, tarefa que quer transferir, em parte, para as freguesias. "Se isso vai resolver o problema? Sinceramente acho que não", diz uma cantoneira. Nem todos os seus colegas são da mesma opinião. Numa coisa, porém, concordam: é necessária mais fiscalização.
Autora de um doutoramento sobre o lixo no quotidiano, Susana Valente frisa o relacionamento ambivalente que os portugueses têm com o espaço público, que é de todos e não é de ninguém, para explicar a importância do estado de ruas no comportamento dos habitantes. Um espaço público cuidado gera atitudes de maior brio, tal como um caixote do lixo a abarrotar afugenta as pessoas, incentivando comportamentos impróprios. Resolver os problemas da higiene urbana não é fácil, admite Susana Valente: "A limpeza é das tarefas que mais dinheiro consome ao orçamento das câmaras."
E se é sobre o espaço público que incide parte das queixas, foi também aqui que o executivo camarário aplicou uma das suas medidas mais bem conseguidas. O surgimento dos quiosques com esplanadas em muitos dos jardins trouxe os lisboetas para a rua. De inóspito corredor automóvel ladeado por comércio de luxo, a Avenida da Liberdade, onde hoje mora António Costa, voltou a ganhar algum do espírito do velho passeio público. Concessionados aos comerciantes que se habilitaram a explorá-los, os quiosques revelaram-se ainda uma fonte de receitas para a autarquia.
Ainda é só meio-dia e já Luísa Lopes, veterana dos bailaricos de idosos do mercado da Ribeira, assentou arraiais no jardim do Campo de Santa Clara com bacalhau, rissóis de camarão e outros pitéus. As mesas onde vai improvisar este almoço regado a vinho verde para os comparsas de dança, marido incluído, pediu-as emprestadas à esplanada aberta em 2009. "À noite as mamãs vêm aqui jantar com os filhos", elogia a octogenária. "O que deu alma ao jardim foi este quiosque!"
O cenário é quase irreal de tão perfeito: o casario
da colina em frente encavalita-se até ao castelo, o Tejo muito azul ao fundo, o
céu sem uma nuvem. Sentado num banco, um cantor de rua entoa uma melodia a
condizer com o magnífico panorama do jardim de S. Pedro de Alcântara, rente ao
Bairro Alto. Magnífico? Não. Ao lado do quiosque com refeições ligeiras que
tanta gente tem chamado para desfrutar da paisagem alinham-se nada menos de 12
caixotes e enormes sacos pretos com mais detritos. "Os sacos estão aí pelo menos
há três dias", lamenta um dos empregados da esplanada. "A empresa privada que
limpa o jardim deixa-os aí e a recolha da câmara não os leva por não terem sido
postos dentro dos contentores."
No Bairro Alto os passeios encardiram de vez, de tanta porcaria ao longo dos
anos. Há lixo doméstico acumulado ao ar livre esquina sim, esquina não. No Largo
do Camões duas gavetas de plástico misturam-se com borras de café e ossos. Mais
adiante são os copos de plástico da noite passada a fazerem companhia a uma bota
e garrafas. "Isto é imundo", observa um casal de reformados. Com casas
pequeninas enfeitadas com buganvílias coloridas, o Beco do Príncipe Real
defronte de onde moram tem tudo para ser um recanto romântico - não fora ter
sido "transformado num urinol e num vazadouro de lixo". Cada bairro tem o seu recanto infecto. Bem o sabe Cavaco Silva, que quando celebrou o 10 de Junho em Lisboa, no ano passado, pediu mais civismo aos lisboetas. Da Travessa do Possolo onde mora chega-se à Av. Infante Santo por entre prédios atulhados de dejectos caninos. Vizinha do Presidente, Inês Vassalo já se deu ao trabalho de contar as poias de cão entre a sua casa e o café. "Isto é nojento! Não é normal!", indigna-se. "O desinvestimento de António Costa na limpeza prejudicou a saúde pública. É verdade que fez coisas como abrir o Arco da Rua Augusta ao público. Mas a rua cheira mal e vêem-se baratas de um tamanho imenso!"
Quando tomou posse em 2007, a higiene não passou despercebida a António Costa, que prometeu "uma acção de limpeza de emergência geral, centrada na recolha de detritos, lavagem de passeios e remoção de cartazes". Seis anos mais tarde o executivo camarário apela ao civismo dos cidadãos, mas reconhece que as contingências económicas inviabilizam a contratação de mais gente para a limpeza, tarefa que quer transferir, em parte, para as freguesias. "Se isso vai resolver o problema? Sinceramente acho que não", diz uma cantoneira. Nem todos os seus colegas são da mesma opinião. Numa coisa, porém, concordam: é necessária mais fiscalização.
Autora de um doutoramento sobre o lixo no quotidiano, Susana Valente frisa o relacionamento ambivalente que os portugueses têm com o espaço público, que é de todos e não é de ninguém, para explicar a importância do estado de ruas no comportamento dos habitantes. Um espaço público cuidado gera atitudes de maior brio, tal como um caixote do lixo a abarrotar afugenta as pessoas, incentivando comportamentos impróprios. Resolver os problemas da higiene urbana não é fácil, admite Susana Valente: "A limpeza é das tarefas que mais dinheiro consome ao orçamento das câmaras."
E se é sobre o espaço público que incide parte das queixas, foi também aqui que o executivo camarário aplicou uma das suas medidas mais bem conseguidas. O surgimento dos quiosques com esplanadas em muitos dos jardins trouxe os lisboetas para a rua. De inóspito corredor automóvel ladeado por comércio de luxo, a Avenida da Liberdade, onde hoje mora António Costa, voltou a ganhar algum do espírito do velho passeio público. Concessionados aos comerciantes que se habilitaram a explorá-los, os quiosques revelaram-se ainda uma fonte de receitas para a autarquia.
Ainda é só meio-dia e já Luísa Lopes, veterana dos bailaricos de idosos do mercado da Ribeira, assentou arraiais no jardim do Campo de Santa Clara com bacalhau, rissóis de camarão e outros pitéus. As mesas onde vai improvisar este almoço regado a vinho verde para os comparsas de dança, marido incluído, pediu-as emprestadas à esplanada aberta em 2009. "À noite as mamãs vêm aqui jantar com os filhos", elogia a octogenária. "O que deu alma ao jardim foi este quiosque!"
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