POR O CORVO • 28
JUNHO, 2016 •
Em entrevista ao
Corvo, Duarte Cordeiro, vice-presidente da Câmara Municipal de
Lisboa e vereador com os pelouros da Higiene Urbana e da Economia e
Inovação, discorda de quem se queixa da sujidade recorrente das
ruas. A capital, diz, está mais limpa e com melhor espaço público.
O que, considera, até torna mais apetecíveis e compreensíveis os
grandes ajuntamentos de jovens a beberem na rua. O autarca afirma que
até “há poucos espaços de diversão noturna, deveriam haver mais
e mais espalhados pela cidade”. Mas apela à “responsabilidade
colectiva” dos comerciantes para ajudar a manter limpo o espaço
público. E fala na necessidade de se criarem“conteúdos” para
atrair turistas às freguesias mais periféricas. Para aliviar a
pressão do centro de Lisboa.
Texto: Samuel Alemão
O Corvo – Para
muita gente, persiste a ideia de que Lisboa é uma cidade suja e com
problemas de manutenção do espaço público…
Duarte Cordeiro –
Não sei de quem….Mas, do nosso lado, temos noção que estamos a
fazer um trabalho muito grande do ponto de vista daquilo que são as
áreas de manutenção. É uma prioridade que temos neste mandato. As
coisas vão passar a ser mais claras à medida que vamos avançando
para o final do mandato e os investimentos começarem a tornar-se
mais visíveis.
Do ponto de vista
da higiene urbana, houve uma primeira fase, no início deste mandato,
em que fizemos a reforma administrativa, transferimos competências
para as juntas de freguesia, as quais, grosso modo, têm competências
de lavagem, varredura, substituição de papeleiras, limpeza de
dejectos caninos.
Têm, portanto,
muitas responsabilidades nesta área. Globalmente, temos recebido
elogios em relação a esta prestação. Na maioria dos bairros de
Lisboa tem-se detectado uma melhoria da lavagem, da varredura e até
da dimensão e visibilidade das equipas de proximidade das juntas de
freguesia.
O Corvo – Está a
correr bem nesse aspecto, portanto?
DC – Sinto que
sim. Temos tido relatos nesse sentido. Admito que não seja idêntico
em todo o lado. Haverá sempre algumas razões de queixa. Mas essa
era uma dimensão muito importante e temos sentido, por essa via,
elogios à reforma administrativa e a esta área da limpeza. Não
bastava essa divisão para as coisas melhorarem, havia também
necessidade de uma adaptação por parte da câmara, tínhamos de
fazer muitas coisas. O primeiro aspecto foi o pessoal, com a
transferência de funcionários e tivemos a necessidade de readmitir
pessoal do lado da câmara e temos um concurso de admissão a
decorrer.
Há, depois, a
questão dos equipamentos e ainda agora aprovamos a aquisição de
contentores enterrados. Já temos alguns sítios onde colocamos os
contentores enterrados e que ainda está para perceber como será.
Fizemos isso na rua da Moeda e do Chão do Loureiro. Estes
contentores têm como objectivo serem uma segunda rede de recolha,
complementar à recolha selectiva.
O objectivo é, por
um lado, responder aquelas situações onde não há recolha
selectiva porta a porta e, por outro, ao que é a pressão turística
e comercial, que gera muito mais pessoas em determinados espaços que
não estavam habituados a tal, têm muito mais lixo. E este sistema
vem ajudar também o comerciante dessas zonas, porque passa a poder
recorrer a este sistema de forma muito mais cómoda, porque passa a
poder despejar o vidro, o papel, o plástico, mas também o
indiferenciado. E acaba por haver mais capacidade de aguentarmos
picos de procura, como, por exemplo, sempre que há um cruzeiro e há
muita gente que visita a cidade. Por outro lado, já identificámos
mais 300 localizações para colocar as tais eco-ilhas e vamos
colocar, de certeza absoluta, até ao início do próximo ano, em 170
localizações.
O Corvo – Como é
que são essas eco-ilhas?
DC – São
ecopontos enterrados, com bocas muito maiores que os antigos,
tornando-os compatíveis com qualquer tipo de lixo, há menos de lixo
à volta. Além disso, têm chips, que nos permitem perceber, a todo
o momento, a sua capacidade. Esses chips, numa primeira fase, vão-nos
permitir ser mais rápidos recolher os contentores, quando estão
cheios. Numa segunda fase, vamos fazer com que seja possível ao
cidadão saber, através da internet, quais são ecopontos perto da
sua casa que não estão cheios e podem, naquele momento, ser usados.
Esses ecopontos poderão responder a muita da pressão.
Em zonas como o
Príncipe Real, por exemplo, vamos não só substituir o ecoponto que
lá está como colocar dos dois lados. No Rossio, vamos colocar um de
grandes dimensões, de um lado e do outro. No Terreiro do Paço,
vamos colocar contentores compactadores de grande dimensões. E vamos
colocar um pouco por todas as zonas de maior pressão turística. E
aí o comerciante vai ter um cartão que lhe vai permitir aceder a
uma porta comercial. Já temos sete colocados em regime de teste.
Também estamos a
fazer outras coisas. Se for à Rua Augusta e ao Chiado, já verá
papeleiras de muito maior dimensão. Isto vem dar resposta aquela
situação de, em picos de maior procura, ter as papeleiras a
transbordar. As papeleiras de maior dimensão permitem suportar
melhor esses picos, podendo as equipas das juntas de freguesia manter
as suas rotinas de limpeza.
Para além disto,
temos noção que temos de alterar alguns sistemas. Vamos alterar,
agora em julho, o sistema de recolha na Bica, que deixará de ser de
saco e passará a ser de contentor. A ideia é a população passar a
usar contentores e não colocar sacos na via pública. Isto vai
também dar uma percepção de limpeza da via pública completamente
diferente. E também estamos em fase de concurso para a limpeza de
graffitti e tags, num prazo de três anos.
O Corvo – Essa é
uma batalha que a CML está a ter alguma dificuldade em vencer…
DC – Não
concordo. Há dois aspectos que têm de ser tidos em consideração.
Primeiro, o fenómeno aumentou muito a popularidade. Basta ver o
número de lojas que vendem latas de graffitti, para perceber que o
fenómeno disparou em popularidade. Em segundo lugar, acho que a CML
tem tido sucesso em muitos aspectos. Há um programa municipal,
através da Galeria de Arte Urbana, que tem tido sucesso na
normalização da arte de rua, exactamente para dar espaço a quem a
quer fazer, organizando e tentando escolher espaços adequados para
esses fins. E isso tanto pode ser nos vidrões, ou mesmo em empenas
de prédios ou em freguesias onde há festivais de arte de rua, para
tentar encontrar locais adequados para esta forma de expressão.
Por outro lado, tem
sido um fenómeno mais popular e mais difícil de combater. Estudamos
o assunto e temos noção das formas mais adequadas de combater,
vamos entrar com sete contratos de limpeza, que funcionarão por
zonas correspondentes a conjuntos de freguesias. E ainda haverá mais
duas em zonas turísticas. Acredito que se vai sentir uma melhoria
significativa. O facto de termos este projecto não desresponsabiliza
as várias entidades de terem um papel pedagógico junto dos mais
novos, explicando as consequências que isto traz. Acreditamos que
vai haver uma melhoria significativa, mas também temos plena
consciência que o número de tagers e graffitters disparou.
O Corvo – Essa
atitude pedagógica também deverá ser adoptada com os problemas de
higiene urbana e da vida nocturna? Estes fenómenos estão ligados.
Os miúdos que vão grafitar e fazer tags, muitas vezes, são os
mesmos que vão para o Bairro Alto e Bica beber uns copos e atirar
lixo para o chão…
DC– Do ponto vista
da noite, é, de facto, um problema multissectorial. A questão não
se resume ao ruído ou aos horários. É um conjunto de matérias na
quais a higiene urbana tem um papel muito importante. Temos estado
atentos aos que se está a fazer noutros países. Há alguns
trabalhos que vamos começar a fazer. Primeiro aspecto, que é muito
importante, é requalificar o espaço público. Uma das coisas que
temos aprendido é que, quando o espaço público está requalificado
ou mais qualificado, as pessoas tendem a respeitar mais –
independentemente de haver gente quem não tem respeito por nada nem
por ninguém. Há uma maior incidência de tags e graffittis em
prédios devolutos ou em espaços abandonados. Quando os espaços são
recuperados, há maior respeito.
No Largo de Santos,
com o programa Uma Praça em Cada Bairro, vai-se permitir mais
esplanadas, elas vão ocupar mais espaço. E isso terá um efeito
positivo no comportamento, no ambiente geral. Obviamente, isso não
nos demite de colocar mais contentores para as pessoas depositarem o
lixo. Esse trabalho pedagógico junto dos jovens é necessário,
como, muito provavelmente lá mais para o fim do ano, uma grande
campanha de sensibilização ao comportamento ambiental e cívico dos
lisboetas. Foi feita uma campanha há alguns anos atrás. Acho que
está na altura de começarmos a pensar noutra campanha.
O Corvo – Não
poderão tais campanhas ser contraproducentes, tendo em conta que
temos um regime 100% liberal na venda de bebidas alcoólicas? A ideia
que existe é que, em vários pontos da cidade, há um consumo
desregrado de álcool na via pública…
DC – É muito
difícil pedir a alguém para estar em Lisboa e não aproveitar o ar
livre e o espaço público. Seria até contranatura não termos
problemas destes. A questão é quando eles saem fora de controlo. O
caminho que está a ser feito é o de dar resposta a todas as
questões que têm sido identificadas. E aí tanto podemos falar na
requalificação do espaço público de Santos, como do projecto de
requalificação da Rua da Ribeira Nova, no Cais do Sodré, quer a
colocação de papeleiras e contentores, mas também do novo
regulamento de horários e de, juntamente com outras entidades,
realizar uma sensibilização de alteração de comportamentos. E até
podia ir mais longe e falar da alteração das cargas e descargas no
Bairro Alto.
Tem existido da
nossa parte uma preocupação global face a estes problemas. Não
estamos a fingir que eles não existem, não os estamos a varrer para
baixo do tapete. Sabemos que os problemas existem, estamos a
trabalhar em soluções e fomos ao estrangeiro ver o que melhor se
faz nesse sentido. Em Eindhoven, na Holanda, descobrimos que estão a
trabalhar num sistema piloto, que só existe lá e em Amsterdão, de
sensores de rua para tentar detectar não apenas questões de
segurança, como gritos de agressão e para detectar de onde surge o
ruído, tentando assim ser mais eficaz na fiscalização.
O Corvo – Um
sistema desse género poderá ser testado em Lisboa?
DC – Vamos
convidá-los, eles vêm cá. Vamos pedir para ser o primeiro país,
para além da Holanda, onde se estuda a aplicação deste projecto.
Vamos trazê-los cá e queremos experimentar a sua utilização. Há
questões que não podemos, obviamente, contornar, como são as
relacionadas com a Comissão Nacional de Protecção de Dados. Tudo
isso tem de ser analisado e avaliado. Já agora, no novo regulamento
de horários, vamos ter um conjunto de avanços, como os limitadores
de volume de som nas aparelhagens, onde vamos tentar controlar um
pouco melhor a questão do ruído.
O Corvo – Mas o
sistema holandês é mesmo exequível na nossa cidade?
DC – Fomos a
Eindhoven para tentar perceber como é que eles estão a tentar
resolver o problema. Uma das coisas que seria interessante cá
testar, na Rua Cor de Rosa, por exemplo, era com os sensores de ruído
na rua. Lá, aquilo funciona numa rua onde os comerciante se
associaram, em colaboração com a autoridade de segurança e o
município. Fizeram depois um candidatura a fundos comunitários. Com
um centro de investigação que têm, ligado à Philips, estudam o
impacto da gestão de multidões numa zona de bares. E procuram
fazê-lo de forma a gerir os conflitos e melhorar a qualidade de
vida.
Os sensores de rua
servem para dois efeitos. Um é o da segurança, com os microfones a
detectarem os sons de agressão. Quando isso acontece,
automaticamente, enviam um sms para os seguranças da rua e à
polícia, a dizer a localização exacta do indício de agressão.
Isto permite velocidade na reacção e aumenta substancialmente a
segurança. Em segundo lugar, detecta o ruído de cada um dos
estabelecimentos, com uma leitura semelhante ao de um mapa de calor.
Dá para perceber de onde vem o ruído. E o sistema tem uma atitude
preventiva, ao enviar um sms ao dono do estabelecimento a
comunicar-lhe que o estabelecimento está com níveis de ruído acima
do que é suposto, dando-lhe oportunidade de corrigir a situação.
Se não o fizer, haverá um mecanismo que será accionado: um
restrição, uma contraordenação ou mesmo alguém da polícia
dirigir-se lá.
O Corvo –
Persiste, porém, o problema das lojas de conveniência que vendem
álcool…
DC – Com os
instrumentos que estão disponíveis do lado da CML, temos tentado
intervir na resolução dos problemas. Mas não temos a faculdade de
decidir se se pode ou não vender na via pública. É óbvio que é
legal vender bebidas no território nacional, a qualquer hora do dia.
Podemos é agir em alguns locais, onde detectamos situações que são
anormais. Por exemplo, detectamos que, na zona de Cais do Sodré,
Bica e Santos, havia 40 lojas de conveniência. É um bocadinho
estranho haver tanta loja de conveniência naquela zona. Percebemos
que, se limitássemos o horário daqueles estabelecimentos, como é
óbvio, teríamos menos efeitos negativos.
A CML não tem
interesses divergentes de um dono de um estabelecimento noturno que
tenha condições para ter clientes no seu estabelecimento. Pelo
contrário. O que queremos é que, se possível, os clientes estejam,
a partir de uma certa hora, dentro dos estabelecimentos e que estes
estejam insonorizados. E existe também a convergência de interesses
entre os moradores e a CML. Quando limitámos os horários das lojas
de conveniência, diminuímos o problema na zona do Cais do Sodré e
de Santos. Obviamente, não controlamos a totalidade, pois muitos
trazem as bebidas de casas, de outras zonas de Lisboa.
A ideia que temos é
a de tentar mitigar, com os instrumentos ao nosso dispor, os efeitos
negativos. Mas temos uma estratégia que passa pelo princípio de que
faz sentido que a cidade se divirta até às horas que bem entenda,
nas zonas que definimos para tal. E definimos a Zona Ribeirinha. Aí,
não deve haver restrições de horários, e, no nosso entender,
todos os comerciantes que quiserem explorar estabelecimentos até
mais tarde devem fazê-lo nessa área. Para nós, mais importante que
restringir por restringir é educar a cidade sobre as zonas onde faz
mais sentido. Porque faz todo o sentido que a cidade, com o tempo que
tem e com o espaço público que tem, que o aproveite. Mas sabemos
que há zonas mais conflituosas, porque têm moradores, porque se
estraga o espaço público…
O Corvo – É o
caso do Arco do Cego.
DC – No Arco do
Cego…É saudável que hajam jovens que aproveitem o jardim do Arco
do Cego para conviver e tomar uma bebida durante a tarde. Nenhum de
nós deverá ter problemas com isto, pelo contrário. É sinal de que
temos uma cidade com bom tempo e jardins e espaço público de
qualidade. A questão aqui tem que ver com o facto de, como está a
ser feito, estar a tirar qualidade de vida a quem vive naquela zona.
Porquê? Por causa do ruído, a partir de uma certa hora, e por causa
das questões de higiene urbana.
O que fizemos ali
foi sentarmo-nos com a Junta de Freguesia das Avenidas Novas e com os
moradores e ouvi-los. Estamos a tentar perceber como é que podemos
desenhar o espaço público de forma a que as pessoas que querem
estar ali a divertir-se fiquem mais distantes dos passeios,
sujando-os menos, criando menos problemas de restrição de
mobilidade nesses passeios, além de reforçar a capacidade dos
contentores no jardim.
Outra dimensão do
problema é a dos horários dos estabelecimentos. Não tivemos
problemas nenhuns em restringir para as 21h, para evitar o ruído
noturno. Vou reunir com os comerciantes do Arco do Cego e ter uma
conversa adulta. Acho que os comerciantes que exploram
estabelecimentos que têm por objectivo ter clientes jovens, a quem
vendem bebidas, devem participar em toda a dimensão da questão e
não apenas vender a cerveja. É fundamental a CML chamar os
empresários para a responsabilidade colectiva. Isto passa pela
limpeza, pela segurança e pelo horário.
O Corvo – O que é
que significa essa “responsabilidade colectiva”?
DC – Significa
que se deviam constituir como associação e manter representantes
designados para os moradores poderem falar com eles, para poderem
ajudar a gerir os conflitos. Deveriam eles próprios reforçar as
rotinas de limpeza da zona. Deveriam ter cuidado com o tipo de copos
que utilizam. A alternativa a não se envolverem, se o problema
subsistir, é a CML continuar a impor restrições e a envolver-se
diretamente de forma coerciva. Acho que não faz sentido uma câmara
municipal estar constantemente a actuar.
Acho que o que faz
sentido é os responsáveis dos negócios envolverem-se e ajudarem a
controlar o problema – em vez de estarem apenas fechados no seu
negócio e gerarem um problema que, depois, pode, no limite levar à
sua ruína. Isso passa por serem os primeiros a mediarem os conflitos
com os moradores, envolverem-se na lavagem do local e até da
concepção do próprio local. Isto para que consigamos viver em
sociedade. Nós temos actuado em tudo o que podemos fazer.
O Corvo – Não
estará Lisboa a atingir o ponto de ruptura na capacidade de ter
zonas de diversão noturna?
DC – Até acho
que temos menos zonas do que tivemos no passado. Com o novo
regulamento de horários e a consequente permissão para que a zona
ribeirinha seja mais liberal neste aspecto, espero que se recuperem
zonas que foram fortes pólos de diversão noturna no passado. As
Docas são um bom exemplo, ou mesmo a Expo, que tinha imensos bares.
Temos 24 freguesias em Lisboa e haverá apenas três ou quatro onde
serão mais frequentes as queixas. Na maioria da cidade, este
fenómeno é ocasional. Não me queixo das queixas, porque elas nos
ajudam a fazer melhor o nosso trabalho. Detectam situações que, por
vezes, não detectamos e ajudam-nos a perceber as prioridades. Temos
hoje uma cidade muito mais participativa.
Resumindo, para
mim, até há poucos espaços de diversão noturna. Deveria haver
mais e mais espalhados pela cidade, indo de encontro à tal vocação
original de muitos espaços da cidade. Para nós, seria óptimo que a
Doca do Espanhol ganhasse outra vitalidade em termos de clientes, que
as docas sob o tabuleiro da Ponte 25 de Abril também ou que o Parque
das Nações também. Espero que o novo regulamento de horários
ajude nisso.
O Corvo – Muita
gente queixa-se de que bairros como Alfama se tornaram sítios
dedicados ao alojamento local, com os inconvenientes que tal
acarreta. O que pode a CML fazer?
DC – A CML quer
encontrar as respostas adequadas para a cidade continuar a ter a
atratividade que tem. E isso passa por analisar corretamente as novas
realidades e tentar encontrar pontos de equilíbrio. O turismo é
algo muito importante para a vida económica da cidade, num contexto
em que Lisboa entrou em contracorrente ao país. Não é só de
turismo que vive a cidade de Lisboa. Felizmente, ao nível da CML,
temos tido estratégias de política económica a vários níveis,
mas não podemos escamotear que o turismo tem uma importância
determinante para a vida económica da cidade.
O alojamento local
é uma dupla realidade. Tem um conjunto de constrangimentos, mas,
acima de tudo, tem uma virtude muito grande. Não só dá resposta a
uma procura significativa – muitas vezes, está associado a
edifícios que ficam reabilitados definitivamente, tornando-se um
activo para a cidade.
Além disso, é
também importante porque muito desse alojamento local representa
aquilo que se chama economia partilhada. Ou seja, estamos a falar de
fontes de rendimento alternativas para muita gente. Não podemos, por
isso, olhar para estas realidades de forma muito simplista, com o
risco de podermos, com os mecanismo errados, estar a destruir um
conjunto de aspectos que são positivos.
O Corvo – Mas há
aqui uma clara distorção do mercado habitacional.
DC – Dito isto,
achamos que faz sentido analisar esta situação. Há várias coisas
que têm de ser feitas e que nós temos feito, como o desenvolvimento
de outras zonas da cidade, para não haver um fenómeno de tanta
concentração. Tem de haver mais conteúdos e mais interessantes
noutras zonas da cidade, que possam arrastar alojamento para essas
zonas. Isso é um aspecto importante para o futuro da cidade.
Por outro lado,
julgo ser consensual ter de haver algum tipo de intervenção. Vamos
ter um debate sobre esta questão na Assembleia Municipal, que deverá
ser um debate alargado e que permita chegar a medidas que sejam
consensuais.
Tenho ideia que o
governo tem interesse em intervir sobre esta matéria. Há várias
intervenções que temos de perceber se serão mais eficazes a nível
nacional ou local. Podemos pensar ao nível da distinção em termos
de impostos para os alojamentos locais.
O Corvo – Seria
viável uma solução como a de Berlim, que decidiu travar os
alojamentos locais feitos através da Airbnb?
DC – Não sei se
terá eficácia, confesso. Outra coisa que seria importante, no
debate temático que está ser preparado na Assembleia Municipal, era
chamar cá os responsáveis de cidades europeias onde estão a ser
tomadas medidas nesta matéria. O alojamento local em Lisboa paga
hoje taxa turística, porque está baseado, essencialmente, numa
plataforma. O que, muitas vezes, acontece é que, se tomarmos medidas
restritivas, pode haver uma migração para outras plataformas que
não cumprem as regras que são impostas ou para fenómenos mais
informais. Não sei se em Berlim o resultado final não será o de um
aumento da informalidade.
Temos, de facto, de
responder, a prazo, de forma muito forte ao problema da
acessibilidade à habitação na cidade. Queremos intervir com o
programa de rendas condicionadas, entrando com o terreno ou o
edifício, e, desta forma, conseguir sete mil fogos a rendas
acessíveis. Isto poderá trazer muitos milhares de pessoas para a
cidade e, ao mesmo tempo, acreditamos que tal poderá ter um efeito
positivo no mercado. Queremos aumentar a população na cidade.
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