Imagem do Dia / Cavaleiro "Andante" Operação Cavaleiro Móveis e quadros do Museu da Presidência em casa do director e de amigos |
Móveis
e quadros do Museu da Presidência em casa do director e de amigos
MARIANA OLIVEIRA
30/06/2016 – PÚBLICO
Diogo Gaspar
venderia igualmente a terceiros a sua suposta influência junto de
decisores públicos, que ninguém quer identificar.
Móveis antigos,
tapeçarias e quadros foram alguns dos objectos do espólio do Museu
da Presidência da República que foram apreendidos esta quinta-feira
pela Polícia Judiciária em casa do director da instituição, o
historiador Diogo Gaspar, e de amigos seus.
Este responsável de
45 anos foi o único detido da Operação Cavaleiro dirigida pelo
Departamento de Investigação e Acção Penal (DIAP) de Lisboa e
levada a cabo por inspectores da Unidade Nacional de Combate à
Corrupção da Polícia Judiciária (PJ). Diogo Gaspar deverá ser
ouvido esta sexta-feira por um juiz do Tribunal de Instrução
Criminal de Lisboa.
Os objectos
apreendidos terão pertencido a antigos Presidentes da República ou
terão sido oferecidos aos chefes de Estado nas suas visitas oficiais
ao estrangeiro. Até o Museu da Presidência ter sido inaugurado, em
2004, não havia qualquer regra que estabelecesse quem ficava com o
quê e qual o destino a dar às peças, que ainda hoje podem ser ou
não doadas ao museu.
Alguns dos “bens
culturais e artísticos”, nas palavras de um comunicado daquela
polícia, também foram encontrados em empresas ligadas a Diogo
Gaspar que prestariam serviços à Presidência de República e ao
respectivo museu.
As autoridades
acreditam que estas empresas, pelo menos uma na área da museologia e
outra do catering, serão de Diogo Gaspar, apesar de formalmente este
não integrar os respectivos órgãos sociais. O director do Museu da
Presidência usaria o seu lugar para contratar serviços a ele
próprio, por valores acima do valor de mercado que prejudicariam o
erário público. “Investigam-se suspeitas de favorecimento de
interesses de particulares e de empresas com vista à obtenção de
vantagens económicas indevidas”, refere um comunicado da
Procuradoria-Geral da República. Usaria igualmente uma dessas
empresas para escoar objectos do espólio do museu. Mas havia mais.
Diogo Gaspar
venderia igualmente a terceiros a sua suposta influência junto de
decisores públicos. Isso mesmo se precisa na nota do Ministério
Público que fala no pedido de benefícios “como contrapartida da
promessa de exercício de influência junto de decisores públicos”.
No entanto, ninguém quer precisar quem são esses decisores,
rejeitando, apenas, que essa influência esteja directamente ligada a
qualquer Presidente da República, actual ou passado. Ressalve-se,
contudo, que o crime de tráfico de influência de que Diogo Gaspar é
suspeito basta-se com a venda da alegada influência, mesmo que essa
influência não seja real. Ou seja, o crime é cometido mesmo que o
suspeito não tenha qualquer capacidade para influenciar o decisor
público.
“Investigam-se,
igualmente, o uso de recursos do Estado para fins particulares, a
apropriação de bens móveis públicos e a elaboração de
documento, no contexto funcional, desconforme à realidade e que
prejudicou os interesses patrimoniais públicos”, acrescenta o
comunicado da Procuradoria.
Investigação tem
mais de um ano
Esta investigação
começou em Abril de 2015 e não foi a Presidência da República que
fez a denúncia, sabe o PÚBLICO. Neste inquérito estão a ser
investigados crimes de tráfico de influência, falsificação de
documento, peculato, peculato de uso, participação económica em
negócio e abuso de poder, precisa a PGR. A PJ adianta, por seu
turno, que realizou dez buscas “domiciliárias e não
domiciliárias” na área da Grande Lisboa e em Portalegre.
As buscas ocorreram
na secretaria-geral da Presidência da República e no respectivo
museu, em Lisboa; no Palácio da Cidadela em Cascais (que também faz
parte do património da Presidência), em residências e empresas. Os
inspectores da Unidade Nacional de Combate à Corrupção
deslocaram-se a Portalegre para fazer buscas em pelo menos uma casa
onde foram apreendidos vários objectos que fariam parte do espólio
do museu. Participam na operação oito magistrados do Ministério
Público e cerca de três dezenas de elementos da PJ, além de
peritos desta polícia. Este caso está nas mãos dos procuradores da
9ª Secção do DIAP de Lisboa, uma unidade especializada na
investigação de criminalidade económico-financeira.
Ao início da tarde
desta quinta-feira, a PJ informou, em comunicado, que foram
apreendidos "relevantes elementos probatórios, bem como
diversos bens culturais e artísticos que, presumivelmente, terão
sido descaminhados de instituições públicas".
Diogo Gaspar, que
está no Museu da Presidência desde que este começou a ser
instalado, em 2001, era então Presidente da República Jorge
Sampaio, foi condecorado por este chefe de Estado socialista e, em
Fevereiro deste ano, por Cavaco Silva. Curiosamente, esta
condecoração foi entregue já o historiador estava a ser
investigado há dez meses.
Entretanto, esta
quinta-feira o Presidente Marcelo Rebelo de Sousa anunciou que
instruiu as Casas Civil e Militar e a secretaria-geral “para darem
toda a colaboração possível às autoridades judiciais, em total
transparência e abertura”. Num comunicado, o Presidente refere que
“instruiu o Conselho Administrativo e a Secretaria-Geral para
reforçarem as medidas, já em curso, de fiscalização, controle da
despesa e luta contra actividades ilícitas, auditando
sistematicamente a gestão orçamental". A presidência
esclarece ainda que o museu “é administrativamente uma direcção
de serviços da secretaria-geral”.
Um historiador
condecorado
Diogo Gaspar nasceu
em Lisboa, a 23 de Abril de 1971, e foi também na capital, na
Faculdade de Letras, que se licenciou em História, variante de
História de Arte, aos 22 anos. Quatro anos depois, especializou-se
em Ciências Documentais, opção Arquivo. Nessa altura, já havia
iniciado funções no Instituto dos Arquivos Nacionais Torre do
Tombo, onde chegou a ser coordenador do Gabinete de Leitura Pública.
Em Setembro de 2001,
nomeado pelo então chefe de Estado Jorge Sampaio, torna-se o
primeiro e único coordenador do recém-fundado Museu da Presidência
da República (só três anos depois, quando o museu é inaugurado,
assume o cargo de director, que não existia anteriormente). Também
deu aulas na Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias, no
Instituto Superior de Línguas e Administração, na Associação
Portuguesa de Bibliotecários, Arquivistas e Documentalistas e no
Instituto Superior de Línguas e Administração de Bragança.
Em Março de 2006
foi condecorado por Sampaio com o grau de comendador da Ordem
Nacional do Infante D. Henrique. Em Junho do mesmo ano, venceu o
Prémio Europa Nostra, na Categoria de Investigação, pelo trabalho
desenvolvido no museu. Já este ano, em Fevereiro, Cavaco Silva
condecorou-o com o grau de Cavaleiro da Ordem de Santiago. Com Sónia
Sapage
Sem comentários:
Enviar um comentário