Os
cenários possíveis em caso de saída
TERESA DE SOUSA
23/06/2016 – PÚBLICO
Noruega,
Canadá, “membro por metade”, “país terceiro”.
David Cameron disse
aos britânicos que, se perdesse o referendo, accionaria
imediatamente o artigo 50º do Tratado de Lisboa, no qual está
prevista a possibilidade de um Estado membro sair por sua livre
vontade. O primeiro-ministro britânico esclareceu, igualmente, que
quer ser ele a tratar do período de negociações, pelo que não
tenciona abandonar Downing Street. O seu irmão-inimigo, Boris
Johnson, cabeça de cartaz do "Brexit", diz o contrário:
que não há pressa nenhuma. Porventura porque as soluções
possíveis não são nada agradáveis. Boris chegou a falar de uma
“meia permanência” na União Europeia. Os juristas de Bruxelas
falam de várias possibilidades. Em qualquer caso, diz Jean-Claude
Piris (durante anos o chefe do gabinete jurídico da União) à AFP,
o Reino Unido “enfrentaria barreiras tarifárias mais altas entre a
sua economia e o seu principal mercado”. Piris publicou no Centre
of European Reform um texto com os cenários possíveis à luz dos
tratados. O processo será sempre muito complicado, dada a forte
integração das economias europeias, que não se desfaz de um dia
para o outro, arriscando um longo período de instabilidade.
1.Solução
norueguesa. Erna Solberg, primeira-ministra conservadora da Noruega,
foi a Londres contar a sua experiência. A Noruega tem acesso ao
Mercado Único através do Espaço Económico Europeu (EEE), que
partilha com a Islândia e o Liechtenstein, incluindo a livre
circulação de pessoas. Em contrapartida, tem de adoptar toda a
legislação europeia que rege o Mercado Único e pagar a sua
quota-parte para os cofres de Bruxelas. O EEE não inclui a
agricultura, pesca e Justiça e Assuntos Internos, mas a Noruega é
parte de Schengen. Oslo tenta manter a sua influência em Bruxelas
através de um lobby permanente. Outro pormenor interessante: os
polacos são a sua maior minoria. “A Noruega é o único país onde
o canalizador polaco não é uma palavra negativa”, diz ela.
2. A solução
canadiana. Boris Johnson referiu por diversas vezes esta opção, mas
o Canadá levou sete anos a negociar um acordo de livre comércio da
última geração (mais harmonização de normas e padrões do que
tarifas), que facilita o acesso mútuo aos mercados, ainda que com
algumas restrições, por exemplo, a dificuldade de participar nos
concursos públicos, e não envolve o sistema financeiro. Os peritos
dizem que o tamanho da economia britânica e o que ela representa
para as economias dos seus parceiros europeus permitiria uma boa
negociação. Próxima, aliás, da negociação do TTIP com os
Estados Unidos.
3. Um membro “pela
metade” da União Europeia. Boris Johnson também já defendeu esta
solução na campanha, mas ela não tem qualquer viabilidade. O Reino
Unido usufruiria de um “estatuto especial” que lhe permitiria
continuar no Mercado Internos e participar nas decisões respectivas,
obtendo o direito de opt-out na maioria dos outros domínios. Seria a
solução “perfeita” que provavelmente nenhum dos seus parceiros
estaria disposto a conceder-lhe, além de abrir um precedente
inesgotável. O problema é que isso só seria possível com a
alteração dos tratados, que ninguém está disposto a fazer.
4. A solução de
país-terceiro. Na impossibilidade de um acordo de outra natureza, a
relação do Reino Unido com o Mercado Único europeu seria idêntica
à de qualquer outro país membro da Organização Mundial do
Comércio, que se limita a estabelecer limites tarifários nos
mercados de bens e produtos. Jean-Claude Piris esclarece que o Reino
Unido teria o estatuto de “país terceiro”. O problema é que
isso implicaria uma fronteira com a Irlanda, complicando
drasticamente a situação na Irlanda do Norte e o próprio acordo de
paz.
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