Adivinhem
quem lixou a Caixa
JOÃO MIGUEL TAVARES
16/06/2016 – 00:15
Com
Armando Vara, a Caixa transformou-se num imenso caldeirão onde os
mais variados interesses se foram servir.
José Sócrates foi
eleito primeiro-ministro em Março de 2005. Três meses e meio depois
(Agosto de 2005) correu com o anterior presidente da Caixa Geral
Depósitos, que não chegou a aquecer o lugar (Vítor Martins, 10
meses no cargo), e nomeou Armando Vara administrador, com a
responsabilidade de gerir as participações financeiras da CGD em
várias empresas estratégicas. Sete meses depois, a comunicação
social anunciava que os seus poderes haviam sido “reforçados”.
Cito o PÚBLICO de 9 de Março de 2006: “Armando Vara assumiu agora
as direcções de particulares e de negócios das regiões de Lisboa
e do Sul, assim como a direcção de empresas da zona Sul. Entre as
suas competências estão ainda a coordenação das participações
financeiras do banco público, EDP (4,78%), PT (4,58%), PT Multimédia
(1,27%), BCP (2,11%) e Cimpor (1,55%).”
Vara permaneceu três
anos como administrador da Caixa Geral de Depósitos, até sair em
2008 para a vice-presidência do Millenium BCP, com o dobro do
salário, o sucesso que se conhece e um pedido de licença sem
vencimento para poder continuar nos quadros da Caixa. Ainda em
representação da CGD, Vara foi administrador não-executivo da PT,
desempenhando um papel decisivo na oposição à OPA da Sonae em
2006, devido aos poderes mágicos da golden share. Justiça lhe seja
feita: não se pode dizer que a CGD tenha sido um tacho para Armando
Vara. Foi muito pior do que isso: a Caixa transformou-se num imenso
caldeirão onde os mais variados interesses se foram servir, cabendo
a Vara decidir quem enchia a gamela. (Ouvido no âmbito da Operação
Marquês a propósito do empreendimento de Vale do Lobo, Armando Vara
recusou tal ideia, tendo declarado que estas decisões nunca eram
aprovadas por uma só pessoa, mas por um colectivo da CGD.)
E que gamelas encheu
a Caixa nos últimos anos? O Correio da Manhã teve acesso a uma
auditoria recente e revelou a lista dos maiores credores do banco. A
lista está ordenada por exposição ao risco de crédito, mas eu
prefiro ordená-la pelas imparidades já registadas – e aí o
cenário é simultaneamente desolador e esclarecedor. No topo da
lista está o grupo Artlant, que tencionava construir em Sines um
daqueles megaprojectos PIN pelos quais o engenheiro Sócrates se
pelava: uma “unidade industrial de escala mundial” para a
produção de 700.000 toneladas/ano de um componente do poliéster,
que levaria à “consolidação do cluster petroquímico da região
de Sines”, segundo um comunicado do Conselho de Ministros de Junho
de 2007. José Sócrates chegou a lançar a primeira pedra em Março
de 2008 e agora cabe-nos a nós apanhar os calhaus: 476 milhões de
dívida, 214 milhões em imparidades.
Em segundo lugar
(imparidades: 181 milhões; exposição: 271 milhões) estão as
Auto-estradas Douro Litoral. São 79 quilómetros adjudicados em
Dezembro de 2007 e cada milímetro de alcatrão deve hoje três euros
e meio à CGD – ou seja, a mim e a si, caro leitor. Em terceiro vem
o famoso empreendimento de Vale do Lobo, o tal com o qual o
Ministério Público está a tentar agarrar José Sócrates, e que
tem uma astronómica dívida de 283 milhões (imparidades: 138
milhões). Segue-se um grupo imobiliário espanhol que não conheço
(Reyal Urbis), mas que fiquei com muita vontade de conhecer, e dois
nossos velhos conhecidos: o grupo Espírito Santo e o grupo Lena,
todos com dívidas acima dos 200 milhões. Digam-me: com uma lista
destas, alguém se espanta por a Caixa estar a precisar de quatro mil
milhões? Eu não.
Sem comentários:
Enviar um comentário