‘Bora
lá, Portugal: vamos sair da UE!
Adoro
quando Catarina faz voz grossa e imagino o pânico de Merkel – um
Tuguexit!
JOÃO MIGUEL TAVARES
28/06/2016 – PÚBLICO
Uma das
consequências maçadoras do Bloco de Esquerda fazer parte da solução
de governo inventada por António Costa é sermos obrigados a levar a
sério aquilo que Catarina Martins propõe. Antigamente, os
congressos do Bloco eram uma breve notícia que líamos ensonados nos
diários de segunda-feira. Agora dão origem a várias páginas nos
jornais e directos nas televisões. Antigamente, se o Bloco ameaçava
com um referendo sobre a permanência de Portugal na União Europeia,
o comentário mais longo sobre o tema seria “pfffff”. Agora
estamos tristemente condenados a articular palavras.
Articulemos, pois,
até porque Catarina Martins teve este fim-de-semana o seu momento
Pedro Nuno “As Pernas Até Lhes Tremem” Santos. Recordam-se com
certeza que em 2011 o então escanhoado vice-presidente da bancada
parlamentar do PS disse, a propósito do pagamento da dívida, que
estava a “marimbar-se para os nossos credores”. “Nós temos uma
bomba atómica que podemos usar na cara dos alemães e dos
franceses”, afirmou. “Ou os senhores se põem finos ou nós não
pagamos. E se nós lhes dissermos que não pagamos a dívida, as
pernas dos banqueiros alemães até tremem.”
Certamente inspirada
pela presença de Pedro Nuno Santos no congresso, Catarina Martins
teve o seu momento “As Pernas Até Lhes Tremem”, não com a
dívida, mas com um referendo à presença de Portugal na União
Europeia. “Se a Comissão Europeia aplicar uma sanção inédita e
inaceitável e provocatória pelo mau desempenho das contas de Passos
Coelho e Maria Luís Albuquerque, enquanto aplicaram as medidas da
troika, declara guerra a Portugal. Neste caso, Portugal só pode
responder recusando as sanções e anunciando que está disposto a
pôr na ordem do dia um referendo para tomar posição contra a
chantagem.” Adoro quando Catarina faz voz grossa e imagino o pânico
de Merkel – um Tuguexit! Conhecem a anedota do elefante e da
formiga que foram ao cinema? A formiga ficou sentada atrás do
elefante. Como não conseguia ver nada, levantou-se, foi sentar-se na
cadeira à frente do elefante e disse-lhe: “É tramado, não é?”
É, Catarina, é
tramadíssimo. Proponho, aliás, um duplo referendo: perguntamos aos
portugueses se querem a União Europeia e perguntamos aos cidadãos
da União Europeia se querem Portugal. Porque quando Catarina Martins
acusa os políticos europeus de “mostrarem todos os dias que estão
dispostos a destroçar a Europa para aguentar uma política que
assusta os povos”, ela esquece-se de responder a duas questões
fundamentais: que “política” e que “povos”. Um dos maiores
atentados à lógica nas discussões acerca do futuro da Europa está
em considerar que existe uma única política responsável por todos
os males e um povo europeu imbuído de um único desejo. Nada disso
existe. Os ingleses não votaram pela saída do euro porque os
portugueses sofreram muita austeridade. Votaram “leave” por
quererem mais soberania, mais controlo de fronteiras, mais foco nos
seus problemas e menos países – como Portugal, Espanha ou Grécia
– a chatear. Convém recordar que foram ingleses que inventaram a
sigla PIIGS. O problema da União Europeia é precisamente esse: a
incapacidade em conciliar interesses contraditórios. E dá-se o
notável fenómeno de os pobres países torturados do Sul quererem
com toda a força permanecer na União – até os gregos! E os
países ricos do Norte, esses torturadores, começarem a querer dar à
sola. Explica lá isto, Catarina.
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