sábado, 5 de maio de 2018

Saída de moradores e lojistas transforma centro de Lisboa e motiva preocupação / O mistério das lojas asiáticas por ANTÓNIO SÉRGIO ROSA DE CARVALHO



Saída de moradores e lojistas transforma centro de Lisboa e motiva preocupação
04.05.2018 às 15h52

http://expresso.sapo.pt/…/2018-05-04-Saida-de-moradores-e-l…

TIAGO MIRANDA

Rendas altas, saída dos moradores para a periferia da cidade e falta de apoios são alguns dos problemas para o abandonado do centro de Lisboa. “Houve algum exagero que importa corrigir” é a opinião de Victor Silva, dirigente da Associação de Valorização do Chiado, sobre medidas aplicadas às habitações lisboetas

LUSA
A transformação do centro da cidade de Lisboa, com o aumento das rendas, a saída de moradores e o fecho de lojas, preocupa crescentemente associações e coletividades da zona, onde já é mais difícil encontrar participantes para as marchas populares.

Segundo o vice-presidente da Associação de Dinamização da Baixa Pombalina, Vasco Melo, a Baixa tem assistido ao encerramento de muitas lojas "quer por negociação entre as empresas e os senhorios, quer por denúncia dos senhorios para a realização de obras profundas, quer por fim do período transitório do NRAU [Novo Regime de Arrendamento Urbano]".

Em declarações à Lusa, Vasco Melo lamentou que muitos estabelecimentos comerciais estejam a ser substituídos por lojas de 'souvenirs' - e não percebe como é que "têm rentabilidade para pagar rendas elevadas" - ou por hotéis, hostels e alojamentos locais.

O NRAU, sublinhou, pretendia nivelar o valor das rendas novas e antigas, mas o que aconteceu foi que "as rendas novas dispararam para preços que hoje qualquer empresa comercial normal que vá por racionalidade económica não consegue pagar".

COMERCIANTES JÁ SE “CONTAM PELOS DEDOS”
O dirigente da Associação de Valorização do Chiado, Victor Silva, acredita que "havia muitos negócios instalados que não geravam negócio e se mantinham pelo não aumento das rendas", o que "também não era bom para a cidade". No entanto, considera "que houve algum exagero que importa corrigir", até porque os comerciantes já se "contam pelos dedos".

A cidade de Lisboa, apontou, perdeu cerca de 300 mil habitantes nos últimos 30 anos, "enquanto o investimento ia todo para as periferias".

No entender do responsável, "o caos com o trânsito" e os valores excessivos de estacionamento fazem com que as pessoas "comecem a deixar de ir para o centro histórico" e escolham as grandes superfícies.

"Chega a ser colocada sinalética a indicar o [centro comercial] Colombo na Baixa e nós temos de pedir para retirar", apontou.

As dificuldades chegam também às coletividades históricas no centro de Lisboa, como é o caso da Academia Recreio Artístico, que está a sofrer com o aumento do valor das rendas, uma "asfixia" que coloca a segunda coletividade mais antiga de Portugal em risco de "ter de fechar portas".

O presidente, Armando Oliveira, disse à Lusa que a coletividade, na freguesia de Santa Maria Maior, "sofreu e está a sofrer as consequências drásticas de um aumento inusitado de rendas", com valores que rondavam os 400 euros e que aumentaram para 1300 euros.

Segundo o representante, hoje é imperativo conter custos, uma vez que os auxílios "são praticamente inexistentes" e que as receitas da Academia Recreio Artístico "não se compadecem com uma renda deste tipo".

HABITANTES EXPULSOS E MENOS PESSOAS PARA AS MARCHAS
Já o Grupo Desportivo do Castelo e o Grupo Desportivo da Mouraria não têm sofrido com o aumento das rendas uma vez que ocupam espaços camarários, mas mantêm-se de pé com dificuldades associadas à falta de pessoas e de apoios.

O vice-presidente do Grupo Desportivo do Castelo, Carlos Oliveira, referiu que há muitas pessoas "a serem expulsas das casas onde nasceram porque o aumento das rendas foi brutal" e acrescentou, com ironia, que "a cidade já perdeu os seus bairros mais emblemáticos, a tal ponto que esta casa, organizadora desde os anos 30 da marcha do Castelo, está a pensar em propor para o próximo ano que em vez de arcos sejam turistas a arrastar os tróleis".

"Uma marcha popular são cerca de 70 pessoas. O grupo desportivo está a organizar a marcha deste ano e o Castelo vai sair novamente. Apenas três pessoas moram no bairro. Todos os outros são filhos desta comunidade, mas têm de vir de fora", acrescentou.

No bairro da Mouraria, a situação é idêntica. A coletividade não tem sofrido com as rendas, por estar instalada num edifício camarário, mas há outras despesas para pagar, nomeadamente água e luz, exigindo assim "esforço e trabalho", referiu à Lusa a vice-presidente do espaço, Carla Correia, destacando que a associação se mantém de pé por gosto e que quem trabalha no bar não é remunerado.

FALTA DE APOIOS COLOCAM ASSOCIAÇÕES EM RISCO
Muitos habitantes têm sido despejados do bairro e já não há pessoas suficientes para duas marchas populares, como antigamente.

Ainda assim, Carla Correia está confiante de que "com muito esforço" a associação continuará erguida.

No que diz respeito a apoios externos, os dirigentes destas associações dizem que a Associação das Coletividades do Concelho de Lisboa, à qual os associados têm de pagar 75 euros por mês, não presta qualquer apoio.

"Podiam congregar vontades, levar as coisas por diante, não me parece que estejam interessados", referiu Carlos Oliveira.

A Lusa tentou contactar a associação, o que não foi ainda possível.


O mistério das lojas asiáticas


O perigo de generalizações exige-nos prudência e cautela, mas também não nos pode conduzir à paralisação e à apatia.

ANTÓNIO SÉRGIO ROSA DE CARVALHO
12 de Julho de 2017, 6:06

Este artigo é totalmente baseado e sustentado por citações e constitui um convite aos ilustres jornalistas para traduzirem estas perguntas e questões em investigações, que possam contribuir para o desvendar deste mistério.

“Durante o primeiro período de trabalho de campo havia 60 lojas de bangladechianos nesta zona de Lisboa. Em 2006 eram já 80 ao longo da Avenida Almirante Reis, Rua da Palma, Calçada dos Cavaleiros, Rua do Benformoso, Largo do Intendente, Rua de São Lázaro e nos centros comerciais Mouraria e Martim Moniz. Em 2008, ocupavam já mais de 150 lojas, entre a Praça Martim Moniz e imediações, os Anjos e a baixa lisboeta (onde, só no último ano, abriram mais de 30 lojas).”

Isto afirma José Mapril em 2010 num estudo académico publicado na Etnográfica Revue. Num levantamento desenvolvido pelo sociólogo Guilherme Pereira ele assinala que desde 2010/12, na zona da Baixa, as lojas de souvenirs low-cost (LLC) de fabrico massificado e pretensamente português ou representativos de Lisboa passaram de nove para 90!

Muito recentemente, Carla Salsinha (2017), a presidente da UACS, avisava com pertinência e urgência: “Todos os tipos de comércio têm direito a existir”, mas confessou ter dificuldade em entender a concentração de lojas de recordações turísticas de baixo custo e de kebabs, “em locais onde os comerciantes portugueses não conseguem sobreviver”. Apesar das rendas cada vez mais altas, só na Baixa haverá 97 lojas de souvenirs detidas por cidadãos do Bangladesh, disse a presidente da UACS. E depois, para além dessas, há todo um mundo de lojas muito caras e das grandes cadeias multinacionais. Tudo isto estará a criar um quadro muito desfavorável para o comércio convencional.

Salsinha denuncia uma total ausência de planeamento estratégico por parte da CML, do chamado Urbanismo Comercial nos licenciamentos, de forma a garantir um equilíbrio. Além disso, os produtos de fabrico massificado e pretensamente “portugueses” garantem um tsunami de plástico e quinquilharia híbrida, que afecta e domina largamente o ambiente e a imagem de uma zona que se pretendia como a historicamente central e nobre de Lisboa.

Em 2014, a conceituada e respeitada professora Raquel Varela, especialista nas questões do Trabalho, já tinha referido o efeito nocivo e incompreensível deste fenómeno: “As mercearias asiáticas em Portugal fazem dumping como fazem as empresas-monopólio portuguesas cujos preços e a produção é inteiramente — e sem qualquer livre concorrência que não a da aparência jurídica — por estas fixada. Não faço ideia se as ditas mercearias são indianas, do Bangladesh, ou do Paquistão, nem me interessa, se fossem alentejanas e fizessem dumping eram as mercearias alentejanas que, como fazem dumping, não podem vender produtos de qualidade nem ter trabalhadores com condições dignas. Entram em Lisboa, e noutras cidades, com salários mais baixos, horários não controlados por ninguém e condições laborais desconhecidas — muitas com um regime fiscal abonatório durante cinco anos.”

Seguindo esta linha de questões, a jornalista Sónia Simões publicava um artigo no Observador (18 Março 2016): “Nos últimos meses, o número de mercearias e frutarias tem crescido abruptamente nas ruas dos bairros históricos de Lisboa. E não só. Já se começam a fazer notar noutros concelhos. Para tal, também contribuíram as leis portuguesas. Por um lado, como sublinhou ao Observador o vereador Duarte Cordeiro com o pelouro da Economia e Inovação da Câmara de Lisboa, o Licenciamento Zero, que vem simplificar a vida aos empresários que queiram abrir um negócio. Por outro, refere o responsável pelo SEF, a própria Lei dos Estrangeiros, que dispensa os vistos de trabalho para a autorização de residência no país.

Assim, qualquer cidadão estrangeiro que obtenha um contrato de trabalho e faça descontos para a Segurança Social consegue automaticamente uma autorização de residência — o que não acontece noutros países da Europa. ‘Temos indícios de que algumas lojas possam estar a ser usadas para esse fim’, reconhece o investigador. Sempre que os serviços de fiscalização do SEF se deparam com vários contratos de trabalho em nome de uma mesma empresa, abrem um inquérito para apurar se existe, de facto, uma relação laboral, ou se é uma relação fictícia. Daí as empresas estarem frequentemente ‘a rodar’. Isto é, a abrir e a fechar, mas mantendo os mesmos espaços comerciais.”

Para terminar, o perigo de generalizações grosseiras e de estigmatizações ou mesmo de inaceitáveis discriminações de grupos étnicos exige-nos prudência e cautela, mas também não nos pode conduzir a uma paralisação e apatia impedidora, inibidora e neutralizadora dos mais básicos princípios de análise, dedução e discernimento daquilo que é evidente. Trata-se do equilíbrio e futuro de Lisboa!

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