Freguesia de Santa Maria Maior aperta fiscalização para quem
não cumprir regras do lixo
Sofia Cristino
Texto
31 Maio, 2018
Santa Maria Maior é uma das freguesias com mais lixo de
Lisboa e, por isso, a Junta de Freguesia andou esta quarta-feira (30 de Maio),
numa acção de sensibilização junto de comerciantes e moradores para que limpem
o espaço público e separem os resíduos. Alguns foram receptivos ao apelo, mas
outros estranharam o pedido, argumentando que “toda a gente coloca o lixo na
rua”. Há ainda quem atribua a culpa aos outros. “Isto está uma javardice. E é
sujo por gente que não é nossa. A culpa é deles!”, acusava um morador. Nesta
iniciativa pedagógica também houve espaço para a participação de crianças de
escolas da freguesia, que receberam ecopontos. Na freguesia onde vivem menos
pessoas do que aquelas que por lá passeiam, a preocupação da junta tem vindo a
aumentar nos últimos anos. “Ou servimos os residentes ou os turistas. E, claro,
a nossa prioridade são os residentes”, diz o presidente da junta de freguesia,
sem deixar de criticar os alojamentos locais que metem o lixo na rua ao
meio-dia.
“Qual é o problema de
colocar o lixo aqui, agora? Toda a gente o faz”, diz um morador de
nacionalidade brasileira, na Rua Benformoso, no Martim Moniz, quando é abordado
pelo presidente da Junta de Freguesia de Santa Maria Maior, Miguel Coelho (PS),
que andou na tarde desta quarta-feira (30 de Maio), a sensibilizar os moradores
e comerciantes para a importância de manterem as ruas limpas. O autarca
respondeu prontamente ao habitante. “Mas o facto de os outros não o fazerem não
quer dizer que tenhamos o direito de o fazer. Veja no panfleto, só pode colocar
o lixo na rua depois das 19h”, explicava. “Se todos utilizarem esta justificação,
vamos viver numa imundice completa. É por isso que temos mesmo de sensibilizar
as pessoas”, dizia, depois, em declarações a O Corvo. Os moradores e os
comerciantes foram ainda elucidados a remover os dejectos dos seus animais
domésticos da via pública e a não alimentar os pombos, portadores de doenças
transmissíveis ao homem e responsáveis pela degradação do património.
Um pouco mais à frente, um habitante português não poupava
nas críticas ao comportamento dos seus vizinhos estrangeiros e dos visitantes
do bairro. “Isto está uma javardice. E é sujo por gente que não é nossa. Tem de
fazer alguma coisa, a culpa é deles!”, acusava o morador num tom irritado.
Enquanto os moradores iam aproveitando para fazer queixas, os elementos da
divisão de Higiene Urbana da Junta de Freguesia iam distribuindo panfletos
informativos da hora de recolha do lixo e do valor das coimas que os infratores
podem pagar, se não cumprirem estes horários. Multas que podem ir até aos 727
euros.
Os comerciantes do
Bangladesh, uma grande percentagem da população deste bairro multicultural,
aceitavam as informações sem se manifestarem muito, até porque o idioma é
diferente do presidente da Junta de Freguesia. A O Corvo dizem que a acção faz
sentido. “É preciso a ajuda de todos para manter as ruas limpas, não é? É um
grande problema, há lixo por todo o lado”, comentava um deles, enquanto
assistia a uma conversa do presidente da junta com outro morador sobre quem
teria colocado uma caixa de cartão no contentor do lixo orgânico.
Uma das grandes dificuldades em inspeccionar eficazmente
quem coloca o lixo na rua, explica Miguel Coelho, é a falta de acompanhamento
da Polícia Municipal nos momentos da fiscalização. “Não podemos exigir que as
pessoas se identifiquem sem a presença da polícia e acabam por não sentir tanto
os efeitos dos seus actos. Por isso, vamos incrementar o nosso nível de
fiscalização para que elas sintam que não cumprir também pode trazer
consequências, designadamente pôr o lixo na rua a qualquer hora e de qualquer
forma, sem disciplina”, explica Miguel Coelho.
Depois de percorrida
a Rua Benformoso e de uma subida pela Rua Santo António dos Cavaleiros, até ao
coração do bairro, a marcha prosseguiu até ao Largo Adelino Amaro da Costa,
onde se encontravam oitenta de crianças do jardim de infância da Escola Básica
Maria Barroso, da Escola Básica do Castelo e do ATL (Actividades de Tempos
Livres) Ambijovem. Estes estabelecimentos de ensino receberam cerca de duas
dezenas de mini ecopontos da Junta de Freguesia – um para cada sala de aula –
para começarem a fazer reciclagem na escola.
“O verde é para as garrafas de vidro”, diz logo Guilherme,
um dos alunos, antes do presidente da Junta de Freguesia voltar a assumir as
rédeas do discurso e alertar para a importância da reciclagem. “Para que
possamos substituir todo o papel que deitamos fora precisamos deitar uma árvore
abaixo e se abatermos uma árvore temos menos oxigénio para respirar. Uma garrafa de plástico demora 200 anos a
renovar-se. Por isso, temos obrigação de aproveitar tudo, até o lixo”,
explicava, para surpresa de alguns dos alunos, que depois desfilariam pela rua
até à Sé de Lisboa em cânticos em prol da limpeza. “Lixo no chão, não!”,
cantavam, recebendo elogios de vários turistas que por ali passeavam.
“A minha rua é linda!
Quando está limpa” foi o mote da terceira edição de sensibilização para a
limpeza das ruas realizada uma vez por ano pela freguesia que perdeu mais
moradores e ganhou mais turistas nos últimos seis anos. Em Santa Maria Maior
vivem 12 mil pessoas, um número bastante inferior ao de visitas diárias,
estimado em cerca de 250 mil turistas, dados que acrescem a preocupação já
“elevada” da autarquia com a limpeza e manutenção do espaço público.
“Infelizmente, já são poucos os residentes, com todo este Alojamento Local
(AL). Por vezes debatemo-nos com a questão: ou servimos os residentes ou os
turistas. E, claro, a nossa prioridade são os residentes. O impacto desta carga
diária de visitantes é brutal”, explica Miguel Coelho.
O presidente da Junta
de Freguesia de Santa Maria Maior reconhece que o lixo é um dos maiores
problemas da freguesia e, por isso, tem solicitado, junto da Câmara Municipal
de Lisboa (CML), uma quota da taxa turística. “Temos a expectativa de que
possamos vir a fazer parte da distribuição da taxa turística. Penso que é o que
a CML está a tentar fazer, mas quanto mais tempo demorar, pior para todos. Se
não for possível, espero que possa ser criada uma espécie de dotação financeira
extra, um contrato entre a junta e a câmara, de forma a que o município nos
possa compensar da circunstância da carga turística enorme que temos”, propõe.
Miguel Coelho realça
ainda que, mesmo que estas soluções sejam postas em prática, “nada disto
funcionará, se as pessoas forem indisciplinadas e continuarem a colocar o lixo
a qualquer hora do dia na rua, com o AL a colocar ao meio-dia o lixo das casas
que gere”. “Só funcionará, se houver uma coresponsabilização de todos pela
defesa do espaço público, a começar pelos próprios comerciantes e residentes.
Tem de ser feito com mais periodicidade talvez, vamos ver se conseguimos fazer
outra logo no Outono”, promete.
A recolha do lixo é
uma competência da Câmara de Lisboa, mas acaba por ser a própria Junta de
Freguesia a fazê-lo durante o dia, quando este toma proporções desmedidas, tal
como O Corvo pôde presenciar nesta iniciativa pedagógica de separação de
resíduos. “Investimos muito nisto em termos de recursos humanos e meios,
nomeadamente em carrinhas para andarem durante o dia a recolher o lixo, como se
viu hoje. Precisamos de mais meios financeiros e logísticos, claro”, concluiu.
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