Associação
São João de Deus poderá ser despejada e deixar 90 crianças sem creche e
pré-escolar
Samuel
Alemão
Texto
Areeiro
28 Maio,
2018
A
Associação São João de Deus, situada na Avenida António José de Almeida, junto
ao Instituto Nacional de Estatística, poderá estar na iminência de ser
despejada do edifício que ocupa desde a fundação, há 42 anos, e assim deixar
sem creche e pré-escolar cerca de nove dezenas de crianças. A instituição
particular de solidariedade social foi notificada, no princípio do ano, da
vontade dos senhorios de acabar com o contrato de arrendamento, para venderem o
imóvel. Não tendo os donos mostrado disponibilidade para negociar, os
responsáveis da associação têm-se desdobrado em contactos com diversas
entidades, tentando encontrar soluções. Os pais dos menores e os funcionários
já terão, porém, sido informados da forte probabilidade de saída do local.
Apesar da intensa busca por novas instalações, os valores do mercado imobiliário
estão a tornar a tarefa quase impossível. Mas a Câmara de Lisboa garante a O
Corvo estar a acompanhar a situação e diz que o recente reconhecimento como
instituição com interesse social e histórico local assegura protecção contra
despejos, por cinco anos.
De acordo
com a informação prestada a O Corvo por fonte da Junta de Freguesia do Areeiro,
a existência tranquila da Associação São João de Deus naquele imóvel terá
chegado ao fim após o recente falecimento do senhorio de longa data. O conjunto
de herdeiros do edifício terá então decidido que seria mais vantajoso vendê-lo,
tendo comunicado tal decisão à instituição dedicada ao ensino pré-escolar e à
actividade de infantário. Os dirigentes foram apanhados desprevenidos e
tentaram, desde logo, evitar a anunciada situação de denúncia de contrato. Mas
os novos proprietários não terão demonstrado disponibilidade para mudar de
posição. Desde então, todos os esforços estão a ser desenvolvidos para
encontrar uma alternativa que permita ter esperanças na continuação da
actividade. Se não ali, noutro lugar. A demanda tem esbarrado, porém, na dura
realidade do mercado imobiliário. Os valores pedidos para espaços com
capacidade equivalente à das actuais instalações encontram-se fora do alcance
financeiro da instituição.
Um cenário
confirmado a O Corvo por Rute Freitas, directora pedagógica da Associação São
João de Deus. “Estamos aqui há 42 anos, mas os senhorios informaram-nos que
querem o imóvel de volta. Ainda estamos a gerir a situação, que não é fácil.
Falámos com os pais e com os funcionários, explicámos-lhes o que se passa.
Estamos à procura de alternativas, mas estas coisas demoram o seu tempo”,
explica a responsável, admitindo a grande apreensão que a situação está a
causar junto da comunidade. Sobretudo porque a busca por novas instalações se
está a revelar tão difícil quanto deixaria adivinhar o actual estado do mercado
imobiliário. “A prioridade é ficar nesta da cidade, como é óbvio. Mas não está
fácil encontrar espaços com estas dimensões a valores que possamos comportar”,
explica Rute Freitas, deixando entrever que o arranque da actividade da
instituição após as férias estivais está longe de estar assegurado.
Antes de
partirem em busca de alternativas de localização, os responsáveis por esta
instituição particular de solidariedade social encetaram múltiplos contactos
para tentar travar o que, por agora, parece uma inevitabilidade. Tanto a Câmara
Municipal de Lisboa como a Junta de Freguesia do Areeiro foram alertados para a
situação. À junta, foi solicitado um parecer sobre a papel da associação na
comunidade para que esta pudesse requerer o estatuto de utilidade pública,
tendo a autarquia emitido o documento em pouco tempo. O parecer estará já nas
mãos dos responsáveis camarários. Mas o eventual decretar do estatuto deverá
chegar já demasiado tarde. “Este é um equipamento fundamental para a freguesia,
não pode agora fechar de um dia para o outro”, diz a O Corvo o presidente da
junta, Fernando Braancamp (PSD), que culpa a “Lei das Rendas” pelo actual
estado de coisas.
O provável
fecho da instituição está a causar grande apreensão na freguesia do Areeiro
Também a
coordenadora do núcleo de acção social da junta, e responsável pelo referido
parecer, admite em declarações a O Corvo a enorme dificuldade em reverter o
actual cenário. “Estamos aqui numa corrida contra o tempo, pois existe muito
pouca margem de manobra. A indicação que nos deram é que terão de abandonar as
instalações até ao início de Agosto”, explica Mónica Clemente Leitão,
assinalando também ela a quase impossibilidade de encontrar, em tempo útil e a
valores aceitáveis, um lugar que permita assegurar a continuidade da normal
actividade da associação. A técnica da junta admite que o provável encerramento
da actividade da Associação São João de Deus “terá algum impacto” na freguesia,
até pela “escassez de equipamentos do género” naquela zona da cidade. Além
disso, assinala, a instituição tem um forte vínculo com a comunidade, não
apenas pela sua vertente pedagógica mas também pela “cultural”. “Há pais de
crianças que eles mesmos andaram ali, quando eram pequenos”.
Menos
pessimista quanto ao desfecho do caso está a Câmara Municipal de Lisboa. Fonte
do pelouro dos Direitos Sociais informou O Corvo de que o vereador Ricardo
Robles (BE) terá despachado, a 2 de Abril, o reconhecimento e protecção da
Associação São João de Deus como entidade de interesse histórico e cultural ou
social local, ao abrigo da Lei 42/2017, e no mesmo momento em que o fez também
para outras duas entidades. Tal mudança de estatuto, de acordo com este
enquadramento legal surgido para mitigar os efeitos do Novo Regime do Arrendamento
Urbano (NRAU), permite suspender por um período de cinco anos a eficácia de um
despejo. Ou seja, em teoria, e passando o referido estatuto a ser efectivo,
estará instituído um mecanismo legal que permitirá escudar a São João de Deus
da situação com que se debate. “A Câmara de Lisboa vai fazer tudo o que seja
possível e esteja ao seu alcance para evitar despejos de instituições deste
género e que estejam a passar por situações similares”, assegura a O Corvo uma
fonte do vereador Ricardo Robles.
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