May
recusa alteração à lei do "Brexit" e mantém calendário
Primeira-ministra
pressiona deputados a rejeitarem emenda votada pelos Lordes quando
diploma regressar à Câmara dos Comuns. Artigo 50 não será
accionado na próxima cimeira europeia.
Ana Fonseca Pereira
ANA FONSECA PEREIRA
2 de Março de 2017, 19:57
“A
primeira-ministra já deixou claro que a sua intenção é que a lei
passe sem alterações”, afirmou a sua porta-voz
A primeira-ministra
britânica, Theresa May, não cede e recusa aceitar a emenda aprovada
na Câmara dos Lordes à lei que lhe confere o poder de desencadear
as negociações para a saída do Reino Unido da União Europeia.
Apesar do revés, Londres mantém o plano de notificar formalmente
Bruxelas até ao final deste mês.
A derrota nos Lordes
na quarta-feira é a primeira sofrida por May desde que a lei do
“Brexit” chegou ao Parlamento, no final de Janeiro, dias depois
de o Supremo Tribunal britânico ter decidido que o Governo só
poderia invocar o artigo 50 do Tratado de Lisboa – que enquadra o
processo, sem precedentes, de saída de um Estado-membro da UE –
depois de obter o aval dos deputados. O diploma, composto por apenas
duas alíneas, passou sem qualquer alteração na Câmara dos Comuns,
com os votos da maioria conservadora e de grande parte da oposição
trabalhista, que optou por não bloquear o processo mesmo depois de
duas emendas que apoiava terem sido chumbadas.
Mas cedo se percebeu
que o mesmo não sucederia na Câmara dos Lordes, onde o Governo
conservador não tem maioria e a questão dos direitos dos cidadãos
comunitários que residem no Reino Unido se tornou tema central nos
debates da última semana. A alteração aprovada, incluindo com os
votos de sete conservadores, dá ao executivo três meses (a contar
do momento em que o artigo 50 for invocado) para assegurar que os
europeus que já residem no Reino Unido mantêm os direitos de que
gozam actualmente.
A primeira-ministra
insiste que este é também o seu objectivo, mas insiste que estas
garantias só devem ser dadas no âmbito das negociações com a UE,
a fim de garantir que há reciprocidade em relação aos britânicos
que residem no Continente. O seu Governo foi, por isso, rápido a
assegurar que a decisão dos Lordes será revertida quando a lei
regressar aos Comuns.
“A
primeira-ministra já deixou claro que a sua intenção é que a lei
passe sem alterações”, afirmou nesta quinta-feira a sua
porta-voz, recordando que foi assim que a lei passou na Câmara dos
Comuns – a única das duas câmaras cujos membros são eleitos,
como recorda o executivo. “Já a votaram uma vez sem alterações e
esperamos que isso aconteça novamente”, afirmou a porta-voz.
Diferentes
personalidades com assento na câmara dos Lordes começaram já a
pressionar os deputados conservadores para aceitarem a emenda,
insistindo que o futuro de mais de três milhões de pessoas não
pode ser moeda de troca das negociações. “Há 30 deputados
conservadores que dizem que podem apoiar esta alteração”, disse
ao jornal Guardian Molly Meacher.
No entanto, várias
fontes citadas pelos jornais britânicos consideram pouco provável
uma rebelião em número suficiente para obrigar May a ceder (o
Governo tem uma maioria de 16 votos nos Comuns). É de esperar que os
deputados voltem a aprovar o texto na sua versão original. E se isso
acontecer será politicamente difícil os lordes insistirem na sua
posição, sob risco de darem a impressão de estarem a bloquear uma
decisão tomada em referendo pelos eleitores e confirmada pelos
deputados.
Essa conclusão é
partilhada mesmo por quem apoiou a emenda na quarta-feira. “Esta
lei vai passar, não há dúvida nenhuma”, disse à Sky News Dick
Newby, o líder do Partido Liberal Democrata nos Lordes. “È
completamente idiota a ideia de alguém iria pôr em causa o prazo de
31 de Março”, garantiu.
Uma primeira
consequência, contudo, é que May não poderá dar início ao
processo na cimeira de 9 e 10 de Março, como seria a sua intenção,
segundo fontes próximas de Downing Street. A versão final da lei
será votada na Câmara dos Lordes a 7 de Março, devendo regressar a
debate na Câmara dos Comuns no dia 13. O jornal Daily Mail
assegurava que Londres pode dar início ao processo formal para a
saída da UE a 15 de Março.
No entanto, esse
será o dia das legislativas holandesas, que o partido xenófobo e
eurocéptico de Geert Wilders pode vencer e a coincidência seria
certamente mal vista em Bruxelas. Pela mesma razão, May pode não
dar início ao processo antes da cimeira de Roma, a 25 de Março, na
qual a UE assinala os 60 anos do Tratado de Roma, o que lhe deixaria
apenas a última semana para cumprir o calendário que ela próprio
definiu.
Downing Street não
revela os seus planos e o ministro para o “Brexit”, David Davis,
assegurou nesta quinta-feira que “o processo está a avançar”.
“O mais importante é que sejamos capazes de o concluir a tempo
para enviarmos a carta [invocando o] artigo 50.”
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