domingo, 29 de janeiro de 2017

Não me dão condições para explorar / Lojas históricas, fãs histéricas / José Diogo Quintelea



Atenção ! Estas duas crónicas não são humorísticas !!
São verdadeiramente fedorentas e objectivamente reveladoras da verdadeira natureza de José Diogo Quintela.
Quando o BOBO perde a “graça” , a sua máscara cai e a sua cabeça fica em perigo !
OVOODOCORVO

JOSÉ DIOGO QUINTELA
Não me dão condições para explorar
Quando aceitei fazer a empresa, o objectivo era claro: tornar-me num grande patrão explorador

Por José Diogo Quintela|28.01.17

Como um dos donos da Padaria Portuguesa (PP), fiquei chocado com as declarações do meu primo e sócio Nuno Carvalho à SIC, sobre o aumento do Salário Mínimo Nacional (SMN) e legislação laboral. Disse o Nuno que, com o aumento, 25% dos trabalhadores da PP, que até agora ganhavam acima do SMN, passam a recebê-lo. É um escândalo! Quer isso dizer que os trabalhadores da PP são pagos? Em dinheiro, ainda por cima? Mais indignado fico com a preocupação do Nuno com a flexibilização da lei laboral. Então a PP respeita legislação? Mau! Não foi com esses pressupostos que entrei no negócio. Quando aceitei fazer a empresa, o objectivo era claro: tornar- -me um grande patrão explorador (passe a redundância). Basicamente, ambicionava parasitar empregados. Qualquer que fosse o negócio. Calhou a panificação por ser uma área em que não existia concorrência (quem já tinha ouvido falar em ‘padarias’?), mas que, por outro lado, já tinha um mercado estabelecido. Toda a gente se lembra das filas de potenciais consumidores à porta de lojas devolutas espalhadas por Lisboa, a acenar com notas e a dizerem: ‘Queremos pão de Deus! Como é que ninguém nos vende pão de Deus quando nós, potenciais consumidores, demonstramos enorme desejo de pão de Deus e até nos organizámos à volta de 50 localizações ideais para situar lojas que vendam pão de Deus?’ Pessoalmente, preferia um negócio que envolvesse burlar idosos, mas a padaria era a via mais rápida para me tornar num porco capitalista. Só precisámos de: 1) expropriar uma fábrica que produzia próteses gratuitas para vítimas de minas em África, para passar a fazer pão; 2) obrigar órfãos sírios a construírem lojas a troco de não lhes batermos muito; 3) adquirir vários contentores de escravos prontos a oprimir. Depois, o plano era esmifrar trabalhadores, vampirizar fornecedores, ludibriar consumidores e gastar o esbulho na compra de marfim e diamantes de sangue, como boas sanguessugas plutocratas. Descubro agora que fui enganado e não ando a espoliar empregados como era suposto. Pelos vistos, a PP cumpre leis e obrigações. Assim não é giro. Se era para isso, não me convidavam. O meu primo traiu-me. Aliás, já não vale a pena disfarçar. O leitor decerto percebeu que não somos primos. Os humanos é que têm primos. A única relação familiar que temos é que os nossos ovos foram incubados na mesma cova. Quando saímos da casca, a primeira língua bífida que lhe silvou foi a minha. Os répteis são animais de sangue frio, de modo que não ficaremos zangados muito tempo. Em breve faremos as pazes, enquanto brindamos com o sangue de um pasteleiro (reserva de 2012, um óptimo ano) e combinamos o próximo negócio. De preferência, que envolva tortura de gatinhos ou extorsão de invisuais sem abrigo. Quando fazemos o que gostamos, o dinheiro é secundário.

JOSÉ DIOGO QUINTELA
Lojas históricas, fãs histéricas
Se estas lojas fecham, perde-se uma das maiores características portuguesas: a economia subsidiada pelo Estado.
Por José Diogo Quintela|09.04.16

Em Lisboa há três tipos de lojas: as recentes, as antigas e as com história. As recentes são recentes, as antigas são antigas e as com história são falidas. A diferença entre uma loja antiga e uma com história é que a loja antiga vende produtos a clientes; a loja com história, não. Uma é parte activa da economia da cidade, a outra é património imaterial. Literalmente: não tem material que atraia clientes. Mas aguenta-se porque é "histórica" no sentido em que, historicamente em Portugal, todos desejam viver a expensas do Estado, que vai manter as rendas baixas. Às custas dos proprietários. A loja com história não tem clientes, tem fãs. Que, como se lembram de ter lá ido em criança, decretam que deve permanecer aberta. Na Baixa é costume ouvir: "Ai, que loja tão apetitosa! Vinha cá com a minha avó. Tem algum produto útil a preço acessível?" "Não. Mas tenho história." "Dê-me então 1,3 kg de história, por favor." Para conservar a memória deste tipo de serviço, a Câmara de Lisboa vai recongelar as rendas destas lojas. A CML quer preservar a personalidade própria das lojas falidas da Baixa. (Ao mesmo tempo que, com regulamentos que obrigam os toldos e esplanadas a serem todos iguais, não deixa que lojas que tentam ter lucro tenham personalidade própria). O objectivo é impedir que Lisboa fique igual a outras cidades que atraem turistas, descaracterizando-a. Se estas lojas fecham, perde-se uma das maiores características portuguesas: a economia subsidiada pelo Estado. Lisboa não pode ter as mesmas lojas de Londres, Paris e NY. Quem quer produtos de lojas que há em Paris ou NY dirija-se a Paris ou NY, que é o que fazem os lisboetas que gostam dos produtos que há em Paris e NY, desde que não haja em Lisboa. São Arnaldos Matos do gosto, educadores da classe consumidora. Se a loja tem brasões dourados, é kitsch e aldrabice histórica; se tem cadeiras desirmanadas e mobília manca, é kitsch irónico e vintage. Atenção, estes lisboetas não são contra o turismo. São contra certo tipo de turismo. Sim, os turistas gastam cá dinheiro (no ano passado, em transacções com multibanco, foram 4929 milhões), mas não são os turistas ideais. Se há um turista ideal, é isso mesmo: idealmente, um turista. Único. A gastar os mesmos 4929 milhões. Em Pasta Medicinal Couto. Comprada durante a semana, para não maçar os lisboetas que vão Sábado ao Chiado comer brunch, a refeição predilecta de quem não consegue decidir se gosta mais de pequeno-almoço ou de almoço, mas consegue decidir que tipo de lojas as outras pessoas devem frequentar. (Brunch, mas não no Pap’açorda. O Pap’açorda era um restaurante com história, mas traiu a causa ao mudar de sítio para continuar a ter sucesso comercial. A CML devia obrigá-lo a ficar onde estava, a embelezar o roteiro saudosista.)

A mercearia/taberna da esquina Chamávamos-lhe "Sr. Pedro", pois o dono era o Sr. Pedro. Era uma tradicional mercearia/taberna, com o tradicional livro de fiado, a tradicional aldrabice no livro de fiado, os tradicionais víveres a granel, as tradicionais barricas de vinho, os tradicionais ébrios, o tradicional etc. Fechou há uns 25 anos. A causa foi o tradicional falecimento do merceeiro/taberneiro, pela tradicional velhice. Hoje é uma clínica de análises, frequentada pelos antigos ébrios, actuais idosos com maleitas de ébrios. O que é pena. Gostaria de passar por lá, não para comprar nada, que hoje há o Pingo Doce, mas para sentir a mesma nostalgia que sinto quando ouço a música do Dartacão. Tenho pena que há 25 anos não houvesse o Comité das Lojas com História, para embalsamar o Sr. Pedro e mantê-lo à porta da mercearia, como quando eu era menino.


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