A novela da TSU é absolutamente patética
A deterioração da situação económica vai dar razão a
Passos. Mas até por isso, convém que a comunicação do PSD assente na coerência
ideológica, e não no amuo político.
João Miguel Tavares
17 de Janeiro de 2017, 6:47
Este caso em torno da diminuição da TSU é extraordinário: o
PSD tem toda a razão no que está a querer fazer, patrocinar o aumento do
salário mínimo com a diminuição da TSU é um absurdo, o chumbo da medida é mais
do que justificado, só que as explicações do partido têm sido tão atabalhoadas
e tão pouco focadas no essencial que o PSD consegue o prodígio de fazer de mau
da fita num filme onde nem sequer deveria ter entrado. É ridículo. É injusto.
Mas, sobretudo, é estúpido. Bloco e PCP colocaram ao lume uma panela onde
deveria ir a cozer António Costa e, de repente, quem cai lá para dentro é
Passos Coelho.
O PSD não pode, nem deve, justificar o chumbo da diminuição
da TSU com o facto de não fazer favores ao governo. Com este tipo de argumentos
é facílimo passar a ideia de um partido oportunista que, na verdade, concorda
com a medida, só que em vez de beneficiar o país prefere lixar António Costa.
Espantosamente, a justificação cínica foi a primeira coisa que saiu da boca dos
sociais-democratas. Luís Montenegro disse que “o PSD não funciona como bombeiro
de serviço da geringonça”. Passos Coelho, que tem tanto jeito para a ironia
como eu para o bilhar às três tabelas, perguntou: “Vão andar sempre a pedir ao
PSD para apoiar o Governo porque [Bloco e PCP] este ano estão de baixa, meteram
folga?” Ora, a questão não está em ser ou não bombeiro, nem em fazer ou não as
folgas dos outros –, a única questão que realmente importa e que deveria ter
sido verbalizada é que o salário mínimo está a ser artificialmente aumentado
ano após ano, sem acompanhar a produtividade do país, e que essa subida que
tanto satisfaz a extrema esquerda está a pesar sobre o orçamento de Estado e
sobre a Segurança Social, de forma a não comprometer a descida do desemprego.
Dir-me-ão: mas Luís Montenegro e Pedro Passos Coelho também
usaram esses argumentos. Pois usaram, mas como, ao mesmo tempo, fizeram
observações picantes sobre bombeiros e sobre folgas, os bombeiros e as folgas
saltaram para os primeiros parágrafos de todas as notícias, enquanto as
justificações substanciais ficaram como uma espécie de nota de rodapé que foi
imediatamente triturada no espaço mediático. A actual direcção do PSD nunca foi
muito popular entre os barões do partido e já se faz fila à direita para ficar
com a sua cabeça. Marcelo Rebelo de Sousa, Marques Mendes, Manuela Ferreira
Leite, Rui Rio, Paulo Rangel, Nuno Morais Sarmento, José Eduardo Martins,
Pacheco Pereira, e até, segundo consta, Marco António Costa – todos eles
tiraram senha para fazer a cama ao líder do PSD. Quando se soma aqueles que têm
grande peso político àqueles que têm grande peso mediático, já dá para contar
as facas nas costas e dormir de capacete.
Ainda assim, Passos Coelho tem um grande trunfo do seu lado:
os nomes disponíveis para o substituir não são grande coisa e ninguém percebe
que políticas alternativas iriam apresentar, já que todos eles estão mais
perto, e não mais longe, de António Costa. Há ainda um outro trunfo, o maior de
todos: a deterioração da situação económica vai dar razão a Passos. Mas até por
isso, convém que a comunicação do PSD assente na coerência ideológica, e não no
amuo político. O PSD deve chumbar a descida da TSU porque ela é uma medida
errada; não deve chumbá-la por não querer apoiar o governo. Há uma diferença
radical entre agir por convicção e agir por cinismo. Confundir uma coisa com a
outra é um erro enorme, e Passos já tem idade para saber isso.
Jornalista
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